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domingo, 19 de fevereiro de 2023

Oh que lindo arraial!

 

inspirados nos Bonecos de Estremoz,

A Boniqueira - Joana Santos Ceramista publicou ontem na sua página do Facebook, um texto associado à imagem acima, o qual reproduzo aqui na íntegra:

“Não foram a tempo do dia dos namorados mas ficaram prontinhas para o carnaval, o que, com a explosão de cores que delas emana, até é capaz de ser mais adequado.
É que bem vistas a coisas, o Amor é para ser celebrado todos os dias!
Agora, é vê-las a desfilar, pimponas e coloridas, na @gente.da.minha.terra , em Évora!
Feliz Entrudo!”

Naturalmente que fiquei fascinado pela suas bonecas, o que longe de constituir um caso isolado, se tornou uma prática corrente: a minha admiração pelo binomio “criações – escritos que lhe estão associados”.
Não é, pois, de admirar que eu, que não sou dado a morrer de pasmo a olhar para aquilo que gosto, tenha resolvido dar publico conhecimento de que gosto e porque gosto. É esse texto que partilho aqui com o leitor:

“Oh que lindo arraial!
Que bebedeira de cores, de luz e de formas!
Figuras saídas das mãos da Joana, que com alma e com calma, lhes deu alma, como elas precisavam e nos revelam na plenitude da sua individualidade.
Em termos plásticos e estéticos são ao mesmo tempo manifestos primaveris e hinos à alegria. São um abrir Abril das portas que se estão abrindo. É o povo, neste caso as mulheres, em marcha. É o Tempo Novo!”

Hernâni Matos

quarta-feira, 16 de novembro de 2022

Irmãs Flores recebem louvor da Câmara Municipal de Estremoz

 

Fotografia de Bruno Oliveira e Maria Manuela Restivo, recolhida com a devida vénia
no blogue ARTE POPULAR PORTUGUESA  (http://www.artepopularportuguesa.org/ )

Em reunião ordinária da Câmara Municipal de Estremoz, realizada a 16 de novembro de 2022, foi aprovada por unanimidade, após a sua apresentação pela Vice-presidente do Município de Estremoz, Sónia Caldeira, a seguinte:

Proposta de atribuição de Louvor ás Irmãs Flores
"As barristas denominadas por "Irmãs Flores”, Maria Inácia Fonseca, nascida em São Bento do Ameixial no ano de 1957 e Perpetua Fonseca, nascida na mesma freguesia um ano depois, celebraram 50 anos de carreira no passado dia 15 de novembro.
Maria Inácia Fonseca teve o primeiro contacto com os Bonecos de Estremoz a 15 de novembro de 1972, através da artesã Sabina Santos, em cuja oficina, sita na
Brito Capelo, entrou também como colaboradora a sua irmã Perpétua, três anos depois, com o objetivo de pintar peças realizadas pela Mestra.
Na oficina de Sabina Santos ganharam o gosto pela arte bonequeira e aprenderam os fundamentos basilares de modelação, cozedura e pintura, os quais ainda hoje seguem com particular gosto.
Montaram oficina própria em 1987/88, tendo-se mudado da sua antiga oficina sita na Rua das Meiras em 1999, para o Largo da República, dispondo aí de um espaço comercial e oficina.
Desde muito cedo decidiram enveredar pelo caminho da salvaguarda da tradição na modelação e estética do figurado. As portas da sua oficina estão sempre abertas a pedidos de entrevistas, programas de televisão, grupos de estudantes, turistas e a todos aqueles que querem conhecer esta arte que está hoje inscrita na Lista Representativa do Património Cultural Imaterial da Humanidade.
As Irmãs Flores têm o seu trabalho exposto em diversos museus nacionais e internacionais, figurando ainda nas principais coleções nacionais, deixando descendência no seu sobrinho Ricardo Fonseca.
O Município de Estremoz, pelo trabalho desenvolvido pelas Irmãs Flores em prol desta arte identitária local, que é hoje pertença de toda a Humanidade, quer com esta proposta de atribuição de Louvor, expressar-lhes reconhecimento e gratidão pelos seus 50 anos de dedicação efetiva ao Boneco de Estremoz, pelo apuro técnico e estético do seu trabalho e pela disponibilidade que sempre demonstraram na salvaguarda e valorização desta arte multisecular.”

Como coleccionador e investigador dos Bonecos de Estremoz, considero que se tratou de um oportuno louvor de reconhecimento do mérito da actividade das Irmãs Flores, o qual aplaudo e subscrevo, porque justo e merecido.

Irmãs Flores completam 50 anos de carreira



Transcrito com a devida vénia de
newsletter do Município de Estremoz,
de 15 de Novembro de 2022


O Município de Estremoz felicita no dia de hoje as Barristas Irmãs Flores pelos seus 50 anos de carreira.
As duas irmãs, Maria Inácia Fonseca e Perpétua Fonseca nasceram em São Bento do Ameixial em 1957 e 1958, respetivamente. No dia 15 de novembro de 1972 começaram a trabalhar na oficina da Mestre Sabina Santos como tarefeiras para pintar as peças modeladas por esta. Aqui tomaram gosto pela arte bonequeira e aprenderam as técnicas básicas de modelação, cozedura e pintura, as quais ainda hoje seguem.
Montaram oficina própria entre 1987/88 e desde então têm participado em inúmeras exposições e feiras de artesanato de norte a sul do país, levando mais longe o nome do Boneco de Estremoz. Têm tido, desta forma, um papel muito importante na divulgação e valorização desta arte.
É de realçar a sua participação e disponibilidade para a colaboração em projetos, sejam eles de caráter educativo, de investigação ou de promoção do Boneco.
Entendendo a importância da candidatura da Produção do Figurado em Barro de Estremoz a Património Cultural Imaterial da Humanidade, disponibilizaram-se desde o início a apoiar e colaborar na iniciativa. Também conscientes do grande problema que é a salvaguarda desta arte têm-se preocupado com a sua transmissão, tendo já passado o seu saber-fazer e formado Ricardo Fonseca como seu seguidor assegurando desta forma que a sua oficina deixa sementes para o futuro. Tal como a Mestra Sabina Santos um dia fez com elas.
O Município de Estremoz apresenta o seu reconhecimento e gratidão para com estas barristas que dedicaram os últimos 50 anos da sua vida a produzir esta arte secular, com apuro técnico e respeito pela técnica e estética tradicionais do Figurado de Estremoz

quinta-feira, 21 de julho de 2022

Os Bonecos de Estremoz na vida de Madalena Bilro


A barrista Madalena Bilro ladeada por Isabel Borda d’Água e José Sadio,
respectivamente directora do Museu Municipal e presidente do Município.

Fotografias de Luís Mendeiros - CME 

Este o título da exposição inaugurada no Centro Interpretativo do Boneco de Estremoz, no passado sábado, dia 16 de Julho, pelas 11 horas e que ali ficará patente ao público até ao próximo dia 4 de Setembro.
Ao acto inaugural compareceram cerca de 3 dezenas de pessoas, entre familiares, amigos, admiradores, clientes e oficiais do mesmo ofício, que ali foram testemunhar o apreço que têm pela barrista e pelo trabalho que vem realizando.
O evento foi liderado pelo Presidente do Município, José Sadio, que elogiou o trabalho da barrista, a quem felicitou, bem como salientou a importância desempenhada pela Academia Sénior e pelo Curso de Formação sobre Técnicas de Produção de Bonecos de Estremoz, na formação da barrista. Anteriormente, usara da palavra, Isabel Borda d’Água, directora do Museu Municipal de Estremoz, que historiou o processo formativo da barrista, cujo êxito em grande parte lhe é devido como formadora. Finalmente, usou da palavra a barrista, que emocionada agradeceu os testemunhos de carinho ali manifestados, bem como o trabalho de excelência dos seus formadores e todo o enquadramento viabilizado pelo Município, pelo CEARTE e pela ADERE.
Para compreender o significado e o alcance da presente exposição, torna-se necessário passar em revista uma súmula da vida de Madalena Bilro.

Infância e juventude
A 9 de Abril de 1959 numa casa da rua Bento Pereira, na freguesia da Matriz, Borba, nasceu uma criança do sexo feminino a quem foi posto o nome de Madalena dos Prazeres Grego Bilro. Filha de Joaquim Álvaro Bilro (agricultor e trabalhador das pedreiras) e de Aldonsa dos Prazeres Grego (doméstica). O casal já tinha dois filhos, João e José, actualmente com 73 e 69 anos, ambos aposentados.
Madalena foi baptizada na Igreja Matriz de Borba, localidade onde fez a Instrução Primária e concluiu o Ciclo Preparatório.
Durante a infância e a juventude, para além de brincar com as crianças da sua idade, ajudava a família nas vindimas, na apanha da azeitona e na recolha de erva em propriedades da sua família. Mas o que mais a fascinava eram os lavores femininos, como o tricot e o croché que aprendeu com as tias e a com a mãe. Com esta última aprendeu mesmo a fazer flores em folha de milho, tecido e papel, parafinado ou não, as quais eram utilizadas para decorar maquinetas de Presépio, enfeitar bolos de casamento ou fazer pequenos raminhos com que as senhoras ornamentavam o vestuário. Tudo isto tinha sido aprendido pelas mulheres da sua família com as freiras que estavam na Misericórdia e que pertenciam à Ordem das Servas do Senhor. Foi assim que Madalena Bilro ingressou no mundo das Artes Tradicionais, por via da Arte Conventual.

Início da actividade profissional
Em 1976 começou a trabalhar na Adega Cooperativa de Borba.
Em 30 de Outubro de 1983, com a idade de 24 anos, casou na Igreja Matriz de Borba com Sebastião Joaquim Faia Martins, de 23 anos de idade, adegueiro na Adega Cooperativa de Borba, adoptando do marido o sobrenome Martins.
Do casamento nasceram dois filhos que são a luz dos seus olhos: João, de 38 anos de idade, Engenheiro Civil e, Ângela, de 29 anos de idade, Terapeuta da Fala. Tem igualmente dois netos que são o seu enlevo: Tomás com 5 anos de idade e Pedro com 2.
Madalena trabalhou durante 36 anos nos mais diversos sectores da Adega Cooperativa de Borba: no armazém, na linha de enchimento, no laboratório, na loja de vinhos, na portaria e nas visitas guiadas. Era uma funcionária muito activa e empenhada em tudo aquilo que fazia, gostando muito em especial de comunicar com o público. Graves problemas com a coluna, levaram-na a aposentar-se por invalidez. Vê então a sua vida desmoronar-se e entra em depressão, devido a inactividade forçada.
Entretanto, Madalena já residia desde 1987 na Vila de Arcos e sendo borbense de nascimento, considerava-se também há muito uma arcoense do coração e como tal era reconhecida pela comunidade local. Aí ouviu falar na Academia Sénior de Estremoz, enquanto espaço de acolhimento e de integração, onde são ministradas inúmeras disciplinas, que os interessados podem escolher, de acordo com os seus interesses. Madalena resolveu então inscrever-se em várias disciplinas da Academia Sénior, sendo uma delas a Barrística, para a qual se sentiu desde logo atraída, dado exigir habilidade manual, sensibilidade e dedicação, qualidades que há muito reunia, desde que começou a trabalhar em Artes Tradicionais com as tias e a mãe. A opção de Madalena foi determinante, uma vez que na sequência da mesma, conseguiu ultrapassar os graves problemas pessoais que a atormentavam.

A génese da barrista
Entre 2014 e 2019 frequentou a Academia Sénior de Estremoz, onde teve aulas de Barrística com Isabel Borda d’Água, dos Serviços Educativos do Museu Municipal de Estremoz.
Nessas aulas tomou conhecimento da História dos Bonecos de Estremoz e aprendeu as técnicas das várias fases de produção dos mesmos, desde a modelação até à decoração e acabamento. Isabel Borda d’Água soube motivá-la com a sua acção pedagógica, pelo que como aluna, Madalena Bilro se vai interessando cada vez mais pela Barrística, de tal modo que a sua actividade acaba por transvasar a sala de aula e lhe passa a ocupar também os tempos livres em sua casa. Madalena compra barro e modela Bonecos que depois com o apoio da professora, coze na mufla do Museu Municipal. São Bonecos que generosamente oferece aqueles que lhe são gratos: familiares, amigos e médicos.
Em 2019 frequentou o Curso de Formação sobre Técnicas de Produção de Bonecos de Estremoz, que teve lugar no Centro Interpretativo do Boneco de Estremoz, no Palácio dos Marqueses de Praia e Monforte. O Curso foi promovido pelo CEARTE - Centro de Formação Profissional para o Artesanato e Património, em parceria com o Município de Estremoz. No Curso aprofundou os conhecimentos de Barrística de Estremoz, com Mestre Jorge da Conceição.
Ainda em 2019 recebeu Carta de Artesão e de Unidade Produtiva Artesanal na área da Cerâmica Figurativa, emitida pelo CEARTE.
Também em 2019 foi reconhecida como artesã produtora de Bonecos de Estremoz. O reconhecimento consta de um certificado atribuído pela Adere-Certifica, organismo nacional de acreditação a quem compete a certificação de produções artesanais tradicionais, com garantia da qualidade e autenticidade da produção.
O ano de 2019 é um ano marcante na vida de Madalena Bilro, que inflecte as características da sua actividade, passando a produzir e a comercializar como artesã certificada. Para tal, adapta uma dependência da sua casa a oficina, onde passa a modelar e a pintar os seus Bonecos, que numa primeira fase são cozidos na mufla do Museu Municipal, até que numa segunda fase passam a ser cozidos em mufla própria, adquirida no início de 2020.

A exposição em si
A exposição visa mostrar o percurso da barrista desde o seu primeiro contacto com o barro, até à actualidade. Para tal, integra 26 figuras ou conjuntos de figuras distribuídos por 3 núcleos de diferentes temporalidades e cuja composição é a seguinte:
1 - FIGURAS PRODUZIDAS NAS AULAS DE BARRÍSTICA DA ACADEMIA SÉNIOR DE ESTREMOZ: Dama-1, Dama-2, Maquineta com Presépio, Nossa Senhora da Conceição, Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa, O Amor é Cego.
2 - FIGURAS PRODUZIDAS NO I CURSO DE TÉCNICAS DE PRODUÇÃO DE BONECOS DE ESTREMOZ: Peralta, Senhora de pezinhos, Mulher das galinhas, Nossa Senhora da Conceição.
3 - FIGURAS PRODUZIDAS NA ACTUALIDADE: - Imagens devocionais (Menino Jesus de Oratório, Santo António, Rainha Santa Isabel e São João Baptista); - Presépios (Presépio de 3 figuras – 1, Presépio de 3 figuras – 2); - Figuras da faina agro-pastoril nas herdades alentejanas (Cozinha dos ganhões, Mulher com patos, Pastor do harmónio); - Figuras intimistas que têm a ver com o quotidiano doméstico (Mulher a lavar o menino); - Figuras de Carnaval (Bailadeira Grande, Bailadeira Pequena, O Amor é Cego, Primavera, Rei Negro); - Assobios (Cesto com jarros).

Características do trabalho de Madalena Bilro
A modelação é sóbria, mas cuidada. Nela, a barrista dá sempre o melhor de si própria, na busca permanente da perfeição.
O cromatismo das suas figuras é inconfundível. A decoração recorre à utilização de cores e tonalidades suaves e calmas, que nos parecem querer transmitir uma mensagem de Paz, que brota do mais fundo da alma da barrista e que decerto tem a ver com o modo como idealiza o Mundo e a Vida.
Sem sombra de dúvida que as marcas identitárias, indeléveis, da barrista, são o cromatismo inconfundível das suas figuras, aliado a uma representação “sui generis” do olhar das mesmas.
Do binómio modelação-decoração, transparece a entrega total da barrista na criação de cada figura com a magia das suas mãos prendadas, habituadas de longa data a lavores femininos de matriz conventual, cultivados em contexto familiar com sua mãe e suas tias.

Hernâni Matos
Publicado no jornal E nº 294 - 21 de Junho de 2022




A barrista na sua oficina.

quarta-feira, 13 de julho de 2022

Exposição "Os Bonecos de Estremoz na vida de Madalena Bilro"



Transcrito com a devida vénia
do comunicado
do Município de Estremoz,
de 13 de Junho de 2023

O Centro Interpretativo do Boneco de Estremoz vai receber a exposição "Os Bonecos de Estremoz na vida de Madalena Bilro", com inauguração no dia 16 de julho, pelas 11:00 horas.
Madalena Bilro deste criança sempre gostou de fazer trabalhos artesanais. Em 2014 inscreveu-se na Academia Sénior de Estremoz na disciplina de Barrística e ali conheceu a História do Boneco de Estremoz e aprendeu a técnica de modelação e pintura para a produção do mesmo.
Desde então, mostrou-se sempre muito interessada por esta arte popular e assim que começou a sentir mais confiança nos conhecimentos já adquiridos, começou a fazer peças com um notável gosto pela arte e com as quais presenteou alguns familiares e amigos.
Em 2019 frequentou o I Curso de Técnicas de Produção de Bonecos de Estremoz, promovido pelo CEARTE em parceria com o Município de Estremoz, e é aqui que tem a oportunidade de aprofundar a sua aprendizagem com o Mestre Jorge da Conceição.
Terminado o curso, decidiu seguir o desejo que vinha demonstrando há já algum tempo, criou uma pequena oficina na sua casa e iniciou a atividade de produção de Figurado de Estremoz para comercializar. Em 2018 obteve a Certificação da sua produção.
A exposição “Os Bonecos de Estremoz na vida de Madalena Bilro” apresenta o percurso da Barrista no mundo do Figurado em barro de Estremoz. As peças aqui expostas são uma representação do seu trabalho desde o primeiro contacto que teve com o barro nas aulas da Academia Sénior, passando pelas figuras produzidas no Curso com o Mestre Jorge da Conceição, até à produção atual.
Não deixe de visitar esta mostra que estará patente até dia 4 de setembro de 2022.

Hernâni Matos

sexta-feira, 22 de abril de 2022

Joana Santos e o “Ti Manel do tarro”



Ti Manel do Tarro (1922). Joana Santos (1978-  ). 

É sabido que de há largos anos a esta parte, sou coleccionador e estudioso da Arte Pastoril Alentejana. Quer daquela que saiu das mãos de criadores anónimos, como da criada por aqueles que tendo saído do anonimato, me concederam a prerrogativa da sua amizade. Foi o caso do veirense Roberto Carreiras (1930-2017), com quem tive o privilégio e o prazer de privar, bem como com sua esposa Rosa Mariano Machado, no decurso das Feiras de Artesanato em Estremoz.
Roberto Carreiras partiu há 5 anos, completados no transacto dia 8 de Janeiro. No elogio fúnebre (*) que lhe fiz na altura do seu falecimento, disse: “Pessoalmente, orgulho-me de as minhas colecções de Arte Pastoril integrarem especímenes afeiçoados pelas suas mãos, que comandadas pela sua alma de visionário, nunca se renderam à rudeza do uso do cajado e do mester de vaqueiro. Foram mãos hábeis que aliadas a um espírito sensível, conseguiram filigranar e esculpir os materiais com mestria.”
Decorridos 5 anos, a barrista Joana Santos teve acesso a uma excelente fotografia de Isabel Borda d'Água, na qual figura Roberto Carreiras, sentado, a manufacturar um tarro de cortiça. De imediato, pensou em criar um Boneco de Estremoz, que perpetuasse no barro a actividade daquele lídimo representante da Arte Pastoril Alentejana. E se bem o pensou, melhor o fez, para gáudio daquele que viria a ser o seu felizardo destinatário, que como devem ter calculado fui eu.
“Ti Manel do tarro” chamou a barrista à sua criação. Ora, Manuel é um nome bastante comum no Alentejo, pelo que ao cognominar a figura com aquele epíteto, a barrista regionaliza a sua criação, que assim transcende a figuração de Roberto Carreiras e ascende à condição de representação generalista dum mesteiral de Arte Pastoril Alentejana.
Fascinado pela obra da barrista, dei-lhe conta desse meu estado de espírito, através da presente missiva:
"Joana:
O “Ti Manel do tarro” está uma maravilha das maravilhas. É um monumento e simultaneamente um hino à matriz identitária da Arte Popular Alentejana. Digo hino, porque para deleite de espírito, da figura que criou, flui o cante da Alma Alentejana. A mesma alma que conjuntamente com as suas mãos benditas, perpetuou no barro a figura icónica do meu grande amigo, o veirense Roberto Carreiras, uma referência eterna da Arte Pastoril Concelhia.
Bem-haja Joana, por toda a beleza que vem criando e connosco partilha."


(*) – MATOS, Hernâni. Roberto, guardador de vacas e artista popular. [Em linha]. Disponível em:





Roberto Carreiras (1930-2017). Fotografia de Isabel Borda d'Água.

quinta-feira, 17 de março de 2022

Ilustrações de Margarida Maldonado em Exposição



Transcrito com a devida vénia de
newsletter do Município de Estremoz,
de 16 de Março de 2022.

"As Velhas" é o nome da exposição de ilustrações de Margarida Maldonado que irá ser inaugurada, dia 19 de março, pelas 15:00 horas, na Sala de Exposições Temporárias do Museu Municipal de Estremoz.
Margarida Maldonado é de Estremoz, pintora autodidata, Educadora de Infância já reformada e autora e ilustradora de vários livros de história e poesia, sobre esta exposição diz-nos:
“Os ricos viajam no espaço, o covid por toda a parte. Em Glasgow decide-se o futuro da humanidade, por cá cai o governo. Os Partidos degladiam-se nas respetivas Sedes; multidões nas ruas pelo clima. Sobe o preço da água, da luz, da gasolina. Não há médico de família para todos, o dinheiro não chega para os medicamentos. As velhas só querem estar! Tranquilamente e cheias de gratidão pelo sol quente do dia, pelo brilho da lua para espreitar à noite. A luz e o silêncio, o céu azul e as flores bravias, os frutos e os pássaros. O cheiro e as cores dos campos , os animais e as couves da horta. Dão os bons dias à vizinhança os novos agricultores recém chegados. Nada lhes consegue roubar a felicidade de viver no espaço rural. Sorriem, desatam os nós dos dedos e crescem-lhes rendas brancas contra as saias pretas.” (Margarida Maldonado)
A mostra vai estar patente até dia 19 de junho de 2022 e é composta por cerca de cinco dezenas de ilustrações que representam mulheres, às quais carinhosamente chama as Velhas, que vivem tranquilamente no interior do Alentejo completamente alheias aos problemas que se passam no Mundo e trabalhos que ilustram os tranquilos campos e Vilas no Alentejo.

quarta-feira, 9 de março de 2022

Inocência Lopes e a mulatitude de “O Amor é cego”

 


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Estado da arte
No conjunto dos Bonecos de Estremoz destaca-se pela sua garridice e simbolismo, “O Amor é Cego”, considerado uma figura de Entrudo e que constitui uma alegoria ao “Cupido de olhos vendados”. Trata-se de uma figura [i] que recomeçou a ser produzida por Sabina Santos (1921-2005), a qual se inspirou em exemplar criado por Oficinas de Estremoz do séc. XIX e que pertence ao acervo do Museu Municipal de Estremoz.

Atributos
“Quem conta um ponto aumenta um ponto”, sentença que se aplica aos Bonecos de Estremoz. Daí que depois de Sabina, o modo como é abordada a representação de “0 Amor é Cego”, nem sempre seja convergente e antes pelo contrário, seja maioritariamente divergente. Apesar de tudo, existem invariantes nas representações dos diferentes barristas. Eles constituem os atributos de “O Amor é Cego” e são: olhos vendados, toucado enfeitado com plumas e decoração frontal com um coração, flores numa mão, coração(ões) trespassado(s) por seta(s) na outra, vestido com saia curta e calçado com fitas atadas às pernas.

Mulatitude
A universalidade do amor, arrasta consigo a cegueira desse mesmo amor, independentemente da cor da pele. Daí que Inocência Lopes, que já revogara o imperativo da pele ser branca e proclamara a eventualidade da sua negritude, anuncia agora a possibilidade da sua mulatitude.

Cromatismo
Sob o ponto de vista cromático, a decoração da figura é uma hexacromia, integrada pelas seguintes cores: ZARCÃO (vestido, toucado, botas, flores do bouquet), VERMELHO (corações, seta, asas, meias, plumas, lábios), CASTANHO (cor da pele), VERDE (folhos e barra do vestido, cordões das botas, toucado, folhas do bouquet), PRETO (cabelo), BRANCO (venda dos olhos). As cores quentes (zarcão, vermelho, castanho) predominam sobre a única cor fria (verde) e as cores neutras (branco e preto). Deste modo e globalmente, a figura vê associada a ela a quentura da paixão do amor carnal. Os dois corações trespassados pela seta, sugerem que a figura já foi atingida duas vezes pela cegueira do amor, o qual terá dado mau resultado, uma vez que o coração verde da parte frontal do toucado, sugere a esperança num amor tranquilo e duradouro.

Requebros
A mulatitude da figura leva-me a associar-lhe requebros: uma voz quente com uma sonoridade sensual e o movimento lascivo do corpo. Só não é visível a expressão amorosa do olhar, pois a venda que o cobre, não deixa. Já os lábios carnudos e húmidos parecem convidar a beijar.
Olhando para esta figura, ecoam na minha cabeça os acordes do samba “Mulata assanhada” do compositor e cantor Ataulfo Alves (1909-1969)

Ô, mulata assanhada
Que passa com graça
Fazendo pirraça
Fingindo inocente
Tirando o sossego da gente!

Gratidão
Obrigado Inocência, pela quentura e sensualidade da figura com que nos estimulou os sentidos. Bem haja.



[i] Há quem associe androginismo à figura, associando-lhe ambiguidade sexual. A meu ver, trata-se de uma leitura bastante aceitável de uma figura de Entrudo do séc. XIX, época cujos costumes não permitiam que uma mulher se mascarasse com roupa tão reduzida, pelo que seriam homens a envergar roupa de mulher.









domingo, 20 de fevereiro de 2022

Vera Magalhães e a escultura em alto-relevo


Peralta (2022). Escultura em alto relevo. Vera Magalhães (1966- ).

O alto-relevo da barrista Vera Magalhães enquadra-se na bem conhecida estética dos altos-relevos de Sabina Santos: figura implantada segundo uma das diagonais da base quadrangular, verde bandeira e com a orla em zarcão. Um orifício posicionado na parte superior da placa, assegura a sua suspensão numa parede, com recurso a um fio ou a um arame. As dimensões da placa são 14 x 14 x 1 cm.
A figura escolhida pela barrista foi o bem conhecido Peralta, com as mãos na anca como é seu atributo. O cromatismo da figura assenta numa tetracromia: castanho (fato), branco (camisa), preto (sapatos e chapéu) e vermelho (lenço). A cor dominante é o castanho, o que me leva a admitir que a barrista se possa ter inspirado no bem conhecido Peralta de Mestre Mariano da Conceição, pertencente à colecção do Museu Rural de Estremoz. O castanho é a cor da terra e da madeira. Com ela e a meu ver, a barrista terá procurado transmitir à figura, as impressões de simplicidade, estabilidade, qualidade e seriedade.
Indubitavelmente que o alto-relevo ostenta as marcas identitárias muito próprios da barrista, a qual me confessou ser muito crítica do seu próprio trabalho, interrogando-se muitas vezes sobre o caminho a seguir, todavia sem nunca parar.
À laia de remate ao presente texto, sou levado a dizer:

Reparem que o alto-relevo
Que a Vera tão bem criou,
Se revela em si um enlevo
com o qual bem nos brindou.

Parabéns, Vera!
Hernâni Matos

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2022

Cerimónia de deposição de cinzas de Asta-Rose Alcaide

 

Estátua da autoria do escultor Domingos Soares Branco (1925-2013), inaugurada em
1987 pelo então Presidente da República, Mário Soares (1924-2017).
Fotografia de Município de Estremoz

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Transcrito com a devida vénia de
newsletter do Município de Estremoz,
de 15 de Fevereiro de 2022.


O monumento em homenagem a Tomaz Alcaide será palco, dia 19 de fevereiro, pelas 15:30 horas, da cerimónia de deposição das cinzas de Asta-Rose Alcaide.
Asta-Rose Alcaide nasceu no Brasil, em 1922, local onde faleceu a 30 de novembro de 2016. A bailarina e coreógrafa foi casada com o tenor estremocense Tomaz Alcaide, que conheceu num encontro no Teatro Municipal de São Paulo quando o já reconhecido tenor era famoso. Em 1941 casaram-se e foram morar na Argentina, mas durante a segunda guerra mundial mudaram-se para Portugal, onde Asta-Rose trabalhou na Embaixada dos Estados Unidos e ambos contribuíram intensamente para o desenvolvimento cultural europeu e Asta-Rose enriqueceu o seu conhecimento na área da música clássica.
A última vez que esteve em Estremoz, a 12 de dezembro de 2011, foi para assistir à Cerimónia promovida pelo Município de Estremoz, onde foi entregue a Tomaz Alcaide o título de Cidadão Honorário e a Medalha de Ouro da Cidade e, com honras militares, foi depositada a urna com as cinzas do artista, junto ao monumento em sua homenagem, em frente à casa que o viu nascer, a 16 de fevereiro de 1901, data que inspirou o Município para mais uma cerimónia, desta vez, a deposição das cinzas da sua amada Asta-Rose, conforme desejo manifestado pela própria.
Juntos em vida, juntos para além da morte!
Do programa consta a deposição de uma coroa de flores, um momento musical de clarinete e violino, com Mário Tiago e Margarida Espírito Santo, seguido da inauguração de uma exposição sobre Tomaz Alcaide, no Teatro Bernardim Ribeiro.
Hernâni Matos

quinta-feira, 23 de setembro de 2021

Luísa Batalha e a escultura em alto relevo


Senhora de pezinhos (2021). Escultura em alto relevo. Luísa Batalha (1959-  ).


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Pródomo
Em Junho deste ano reconheci a existência de uma nova tipologia ignorada na minha proposta de Sistemática dos Bonecos de Estremoz, formulada no meu livro BONECOS DE ESTREMOZ, dado à estampa pelas Edições Afrontamento, no Outono de 2018. Tratava-se das “Esculturas em alto relevo”. Descrevi então dois tipos dessas esculturas. Um característico de José Moreira e o outro de Sabina Santos e das Irmãs Flores.
Na mesma ocasião lancei um repto à retoma da produção desse tipo de figuras, o qual encontrou eco junto dos novos barristas. Destes, a primeira a responder ao desafio, foi Luísa Batalha.

Placa relevada com “Senhora de pezinhos”
A criação de Luísa Batalha apresenta as características que passo a descrever. A placa relevada tem geometria quadrangular com 14 cm de lado e cerca de 19 cm de diagonal. O fundo é verde bandeira e a orla zarcão. A disposição do motivo é a da diagonal do quadrado. A suspensão da placa na parede é assegurada através de uma argola de arame cravada no topo superior do lado posterior da placa. No verso ostenta a marca manuscrita “Luisa Batalha / Estremoz / 2021”, distribuída por 3 linhas sensivelmente paralelas.
O vestido, de cor ocre amarelo, tem componentes volumétricos que foram modelados em barro: a gola, os punhos, a orla inferior do vestido e os botões. Estes elementos, assim como as costuras que à frente descem dos ombros, são cor de zarcão. Na zona dos cotovelos são visíveis as dobras das mangas.
O chapéu encontra-se ornamentado por uma garbosa fita cor de zarcão onde está inserida uma pluma de igual cor e deixa ver cabelo castanho ondulado que cobre as orelhas, das quais sobressaem pendentes que configuram ser de ouro.
Os sapatos são em castanho escuro.
O rosto tem bem definidos o nariz, a boca e as maçãs do rosto, os quais conjuntamente com o olhar, se revelam marcas identitárias da barrista.

Desenlace
O cromatismo da figura assenta numa harmoniosa bicromia de duas cores quentes, o zarcão e o ocre amarelo, sendo este a cor dominante. O ocre amarelo associa à figura, um misto de sentimento de alegria e de estado de felicidade. Já o zarcão alia à imagem uma sensação de energia.
O fundo verde bandeira da placa e a figura no seu todo, constituem uma bicromia de frio e quente, o que enfatiza a figura.
A modelação perfeita associada a um cromatismo de bom gosto, traduzem-se num regalo para os olhos: uma placa relevada com uma Senhora de pezinhos bela, elegante, alegre, aparentando felicidade e vigor.
A criação de Luísa Batalha é reveladora de toda a sua sensibilidade, bom gosto, espírito de minúcia e ânsia de perfeição. A barrista é, pois, merecedora dos meus maiores encómios, o que aqui registo e sublinho para memória futura.

Publicado inicialmente a 23 de Setembro de 2021

sexta-feira, 16 de julho de 2021

Barristas de Estremoz do passado

 



ANA DAS PELES (1869-1945)
75 anos da morte de Ana das Peles
MARIANO DA CONCEIÇÃO (1903-1959)
FRANCISCA VIEIRA DE BARROS (1874-1957)
ACLÉNIA PEREIRA  (1927-2012)
ARMANDO ALVES (1935 -  )
SABINA SANTOS (1921-2005)
LIBERDADE DA CONCEIÇÃO (1913-1990)
JOSÉ MARCELINO MOREIRA (1926-1991)
ISABEL CARONA BENTO
ANTÓNIO LINO DE SOUSA (1918-1982)
QUIRINA ALICE MARMELO (1922-2009) 
MÁRIO LAGARTINHO (1935-2016)
IRMÃOS GINJA (1938,1949 - )
MARIA LUÍSA DA CONCEIÇÃO (1934-2015)
PAULO CARDOSO (1968 -   )
RUI BARRADAS (1953 - )
JOÃO FORTIO (1951 -  )
GUILHERMINA MALDONADO (1937-2019)
FÁTIMA LOPES (1974)

Hernâni Matos

quinta-feira, 15 de julho de 2021

Barristas de Estremoz do presente





ANA CATARINA GRILO (1974- )- 
Auto dos ganchos de meia
Todos diferentes, todos iguais!
A Senhora de pezinhos de Ana Catarina Grilo
Ana Catarina Grilo, uma barrista que veio para ficar
AFONSO GINJA E MATILDE GINJA (1949, 1953 - )
INOCÊNCIA LOPES (1973-   )
CURIOSIDADES - Figurado de Estremoz de Inocência Lopes
Bonecos de Estremoz de Inocência Lopes
IRMÃOS GINJA (1938- , 1949- )
IRMÃS FLORES (1957, 1958- )
NATIVIDADE - uma tipologia de cantarinha enfeitada, criada pelas Irmãs Flores 
EXPOSIÇÃO "IRMÃS FLORES, 50 ANOS EM 50 BONECOS" 
Exposição "Irmãs Flores, 50 anos em 50 Bonecos" 
Figurado de Estremoz em selo
JOANA OLIVEIRA (1978-   )
Joana Santos e o “Ti Manel do tarro”
O Carlos e a Joana: Olha que dois!
A Boniqueira Joana
JORGE CARRAPIÇO (1968 -  )  
Bonecos de Estremoz: Jorge Carrapiço
JORGE DA CONCEIÇÃO (1963- ) 
JOSÉ CARLOS RODRIGUES (1970-  )
MADALENA BILRO (1959-  )
MARIA ISABEL CATARRILHAS PIRES (1955-  )
Um singular berço das pombinhas de Ricardo Fonseca
Contributo para uma Simbólica das Figuras de Presépio
SARA SAPATEIRO  (1995-  )
Sara Sapateiro e o aristocrata rural
VERA MAGALHÃES (1966- ) 
TRADIÇÃO E CULTURA - Bonecos de Estremoz de Vera Magalhães
Bonecos de Estremoz de Vera Magalhães
Seis esculturas em alto relevo
Vera Magalhães e a escultura em alto-relevo
As Manas Perliquitetes de Vera Magalhães
Auto das damas dos girassóis
Vera Magalhães no Reino de Liliput
A Dama dos Girassóis de Vera Magalhães