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domingo, 5 de outubro de 2025

Quando a mudez fala por si

 

Fig. 1 - Bacia em barro vermelho vidrado de Redondo.


Prólogo
Proponho-me analisar um objecto cerâmico (Fig. 1) que não pode integrar a chamada “cerâmica falante”, visto não conter dizeres inscritos. Todavia, tem muito para nos contar, como veremos de seguida.

Identificação e dimensões
Trata-se de uma bacia em barro vermelho vidrado de Redondo, decoração pintada em tons de verde, amarelo e ocre. As dimensões são as seguintes: diâmetro da base: 34 cm; diâmetro exterior da abertura: 46 cm; diâmetro interior da abertura: 44 cm; largura do bordo: 1 cm; Altura: 11 cm.

Decoração
Bordo liso, pincelado irregularmente a verde. Pinceladas amarelas, ocres e verdes, reunidas em grupos afastados entre si. Estas pinceladas dirigem-se todas do bordo para o fundo, ao longo do covo, desviadas para a direita.
O fundo da bacia está decorado com uma bandeira quadrada e bipartida verticalmente em duas cores, verde escuro e ocre, ficando o ocre do lado da tralha. Ao centro e sobreposta à união das cores, figura uma esfera armilar em amarelo e assente sobre elas um escudo de armas com uma alegoria à República. Esta é materializada sob a forma de figura feminina, usando na cabeça um barrete frígio vermelho, o qual desde o séc. XVIII é conhecido como um símbolo de liberdade.

Bandeira nacional
Com a queda da Monarquia a 5 de Outubro de 1910, ocorre uma mudança de paradigma. As instituições e símbolos monárquicos (Rei, Cortes, Bandeira Monárquica e Hino da Carta) são proscritos e substituídos pelas instituições e símbolos republicanos (Presidente da República, Congresso da República, Bandeira Republicana e A Portuguesa), o mesmo se passando com a moeda e as fórmulas de franquia postais.
Visando a criação de uma nova bandeira para o regime republicano, por decreto de 15 de Outubro de 1910, o Governo Provisório nomeou uma “Comissão da Bandeira” integrada por Columbano Bordalo Pinheiro (pintor), Abel Botelho (escritor), João Chagas (jornalista e político), Ladislau Pereira (tenente) e Afonso Palla (capitão).
Poucos dias depois, em 29 de Outubro, a Comissão apresentou ao Governo Provisório uma primeira proposta de bandeira (Fig. 3), assente num cromatismo verde-rubro, o qual remonta ao movimento do 31 de Janeiro de 1891. Também em 5 de Outubro, foi utilizado por Machado Santos na Rotunda e, depois, em todos os quartéis e no alto do Castelo de São Jorge. A proposta, foi de resto, inspirada na bandeira da Carbonária (Fig. 2), sociedade secreta e revolucionária, que teve papel determinante na Revolução de 5 de Outubro de 1910.
Para além daquela proposta e como resultado do entusiasmo popular que então se vivia, surgiram ainda inúmeras outras propostas, suscitando todas elas um debate público muito vivo, centrado no cromatismo e no simbolismo da bandeira.
A 29 de Novembro, após algumas alterações à primeira proposta da Comissão, o Governo Provisório aprovou o projecto final da bandeira (Fig. 4): a bandeira verde e rubra, que após ser produzida pela Cordoaria Nacional, foi distribuída por todo o país.
A decisão do Governo Provisório viria a ser ratificada por decreto aprovado pela Assembleia Nacional Constituinte, na sua sessão inaugural, a 19 de Junho de 1911.

Datação da bacia
A bandeira que decora o fundo da bacia não corresponde ao modelo aprovado pelo Governo Provisório, pelo que se trata de um dos inúmeros projectos que vieram a público, antes do modelo ser aprovado. Tal facto, leva-nos a admitir que a bacia tenha sido produzida no período 1910-1911. Vejam lá a estória que a bacia tinha para nos contar.

BIBLIOGRAFIA

- ARQUIVO NACIONAL ALFREDO PIMENTA. República na Cidade. [Em linha]. Disponível em: https://www.amap.pt/p/hist-republica-na-cidade-2 [Consultado em 01 de Outubro de 2021].
- COMISSÃO NACIONAL PARA AS COMEMORAÇÕES DO CENTENÁRIO DA REPÚBLICA. Projectos de bandeira nacional. [Em linha]. Disponível em: https://5outubro.centenariorepublica.pt/index.php?option=com_content&view=article&id=100&Itemid=98 [Consultado em 01 de Outubro de 2021].
- MUSEU DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Bandeira Nacional. [Em linha]. Disponível em: https://www.museu.presidencia.pt/pt/conhecer/simbolos-nacionais/bandeira-nacional/ [Consultado em 01 de Outubro de 2021].
- PARTIDO POPULAR MONÁRQUICO DE BRAGA. Bandeira nacional de Portugal. [Em linha]. Disponível em: https://ppmbraga.blogspot.com/2014/02/bandeira-nacional-de-portugal.html [Consultado em 01 de Outubro de 2021]. 

Publicado inicialmente a 4 de Outubro de 2021

Fig. 2 - Bandeira da Carbonária.

Fig. 3  - Bandeira portuguesa - 1.ª proposta da Comissão de Bandeira.

Fig. 4 - Bandeira portuguesa - 2.ª proposta da Comissão de Bandeira.

quinta-feira, 2 de outubro de 2025

A tradição oleira de Estremoz

 

Púcaro com decoração polida. Produção da Escola Industrial António Augusto Gonçalves.
Finais dos anos 30 do sé. XX.

Excerto da comunicação por mim proferida
no decurso do colóquio "RECENTRAR / Memória, Barro e Saber-fazer", 
que entre 20 e 21 de Setembro teve lugar no Castelo de Évora Monte,
 integrado no Encontro Nacional de Olaria.

A olaria tradicional de Estremoz é extremamente rica em múltiplos aspectos. Na verdade, observando-a como um todo, revelam-se de imediato uma grande variedade de funcionalidades, tipologias, morfologias, tipos de decoração e tamanhos. Como tal, é uma das expressões mais elevadas da nossa identidade cultural local.

Funcionalidade
A funcionalidade das peças oláricas de Estremoz é servirem predominantemente de vasilhame para conter e transportar água, conter flores, dinheiro, velas, ou então servirem de elementos decorativos. Algumas funcionalidades deixaram de ser utilizadas, devido ao desenvolvimento tecnológico. É o caso dos tijolos, telhas, canos, sifões e manilhas.

Tipologia
É diversificada a tipologia das peças oláricas de Estremoz. As principais são: Assadores, Barris, Bilhas, Cafeteiras, Cântaros, Cantis, Cinzeiros, Copos, Fogareiros, Garrafas, Jarras, Mealheiros, Medalhas, Moringues, Palmatórias, Pratos, Púcaros, Reservatórios, Troncos, Vasos de flores, etc.

Morfologia
A uma dada tipologia de objecto olárico podem corresponder várias morfologias. Assim um moringue pode ter um corpo ovóide, esferóide, cilindróide segundo a vertical ou a horizontal, bem como qualquer outra forma distinta das anteriores.

Dimensões
Em geral, uma peça olárica de determinada tipologia e com uma dada morfologia, existe em vários tamanhos, os quais eram numerados de tal modo que ao tamanho maior correspondia o número maior. Este número pode aparecer gravado na base da peça ou aí marcado a giz, depois da cozedura ou então nem sequer ter sido marcado.

Proporções
É óbvio que as proporções entre as 3 dimensões de qualquer peça olárica no seu todo ou entre os seus componentes, não é arbitrária. São proporções que os oleiros de várias gerações foram perpetuando no barro, após a magia das suas mãos as ter tornado harmoniosas.

Tipos de decoração
Os tipos de decoração utilizados nas peças oláricas de Estremoz são de cinco tipos principais:
- 1 - O polido, que utiliza o contraste entre a superfície baça e os motivos que foram polidos com recurso a um seixo ou a um teque;
- 2 - O empedrado, no qual meniscos convexos de argila, decorados com minúsculos fragmentos de quartzo, são colados à peça com barbutina;
- 3 - O riscado, que recorre a sulcos gravados na superfície, com recurso a um teque, um arame, um prego ou uma sovela;
- 4 - O picado, que utiliza formas geométricas que são gravadas na superfície por percussão de objectos ou perfis cuja secção tem uma determinada geometria, como é o caso dos invólucros de bala e dos cartuxos de caça;
- 5 - A relevada, na qual brasões de Estremoz ou outros, assim como inscrições como “RECORDAÇÃO DE” ou “LEMBRANÇA DE”, bem como elementos fitomórficos (folhas, bolotas, ramos de sobreiro) ou zoomórficos (coelhos, lagartos) são moldados em barro e colados com barbutina à superfície;
Para além disso são conhecidos exemplares que ostentam uma decoração obtida pela utilização conjunta de alguns dos tipos referidos anteriormente.

Marcas
O levantamento das marcas de olaria de Estremoz é um trabalho que ainda está em curso, que precisa de ser continuado e que nunca se pode dar por concluído. Para além das marcas de fabrico, apostas por carimbo ou gravadas manualmente, podem existir também marcas de tamanho, gravadas manualmente ou manuscritas a giz. Podem, finalmente, aparecer ainda marcas simbólicas com significado apotropaico, apostas por carimbo ou gravadas manualmente. Caso das estrelas de 5 e de 6 pontas (Signo de Salomão), do trevo de 4 folhas ou da cruz trevolada).

Estética
A estética das peças oláricas de Estremoz é determinada por quatro factores distintos, mas de igual importância: o cromatismo vermelho do barro, aliado à morfologia, às proporções e à decoração. É da conjugação desses factores, sabiamente combinados, que resulta a excelência das peças oláricas tradicionais de Estremoz, por transmitirem sempre harmonia, perfeição, beleza e elegância.

Hernâni Matos

Moringue antropomórfico com decoração polida.
Fabrico da Olaria Alfacinha.

Depósito com tampa, onde estão patentes 3 tipos de decoração: 
empedrado, o riscado e o polido. Mestre Mário Lagartinho (1935-2016).

Pote com tampa e duas asas, no qual foram usados 2 tipos de decoração:
 o riscado e o picado. Mestre Mário Lagartinho (1935-2016).

Jarro de forma cilíndrica com decoração relevada fitomórfica,
picada e polida.

Bilha em forma de tronco, com decoração relevada, brasonada, fitomórfica, 
zoomórfica, picada e polida.

Moringue com decoração relevada fitomórfica, picada e polida.

Jarro de forma ovóide com decoração relevada fitomórfica, picada e polida.

Garrafão com decoração polida, picada, relevada fitomórfica e brasonada.
Fabrico desconhecido. 1ª metade do séc. X

Prato com decoração relevada. Início do séc. XX. Fabrico da Olaria Alfacinha.

terça-feira, 30 de setembro de 2025

O curso natural das coisas

 

Fig. 1 - Com cerca de 1 ano de idade, no Largo do Espírito Santo, em Estremoz.

Excerto da comunicação por mim proferida
no decurso do colóquio "RECENTRAR / Memória, Barro e Saber-fazer", 
que entre 20 e 21 de Setembro teve lugar no Castelo de Évora Monte,
 integrado no Encontro Nacional de Olaria.

Nasci em 1946 no número 14 do Largo do Espírito Santo em Estremoz, mesmo ali ao cantinho (Fig. 1 e Fig. 2). Ao meio da Rua dos Banhos, do lado direito, morava o mestre oleiro e barrista Mariano da Conceição. Bem perto da casa dos meus pais era também a rua do Lavadouro, onde ao meio funcionara a Cerâmica Estremocense de Mestre Emídio Viana. Não seria isto um augúrio de que iria estar ligado à olaria? É caso para dizer que “Eu não acredito em coincidências, mas que as há, há”.

Fig. 2 - Largo do Espírito Santo - Estremoz. Foto Tony, cerca de 1950.

Na minha juventude, os passeios pelo Rossio levavam-me invariavelmente a deter nos stands da Olaria Alfacinha (Fig. 3) e da Olaria Regional, onde mirava e remirava as peças oláricas, mas onde não comprava nada, não só porque não chegara ainda a altura de o fazer, mas porque como jovem de então, só tinha cotão nos bolsos das calças.

Fig. 3 - Stand da Olaria Alfacinha no Rossio Marquês de Pombal em Estremoz, no ano de 1974.

Em 1963, a participação da olaria e da barrística no Cortejo Etnográfico integrado nas Festas da Exaltação da Santa Cruz (Fig. 4 a Fig. 11) foram determinantes na tomada de consciência de um jovem de 17 anos como eu, de que tanto a olaria como a barrística eram manifestações vigorosas não só da identidade cultural estremocense, como da identidade cultural alentejana.


Fig. 4 - Acarreto de barro previamente extraído do barreiro.

Fig. 5 - Oleiro  modelando uma peça na roda.

Fig. 6 - Brunideiras decorando o vasilhame de barro antes de ser cozido.

Fig. 7 - Bonequeiras modelando e pintando Bonecos de Estremoz. 

Fig. 8 - Fabrico de tijolo burro por moldagem.

Fig. 9 - Retirados dos moldes os tijolos burros são postos a secar ao sol durante vários
dias, antes de ser cozidos no forno

Fig. 10 - Uma carrada de lenha para alimentar o forno onde são cozidas as peças de barro.

Fig. 11 - Alimentação com lenha do forno onde será  efectuada a cozedura
 das peças de barro.  

Entretanto, ingressei na Universidade e só em 1972 comecei a comprar objectos oláricos e Bonecos de Estremoz, após ter ingressado como professor na então Escola Industrial e Comercial de Estremoz. Eram compras às pinguinhas, já que em início de carreira ganhava pouco mais do que coisa nenhuma,

Naturalmente, que as aquisições causadas pelo fascínio do barro precisavam de ser consolidadas com conhecimentos. Foram determinantes na minha formação como coleccionador, livros como “Barros de Estremoz” de Azinhal Abelho (Fig. 12), “Algumas palavras acerca de Púcaros de Portugal” de Carolina Michaëlis de Vasconcelos,(Fig. 12), “La céramique populaire du Haut-Alentejo” de Solange Parvaux (Fig. 13),e mais tarde “Barros de Estremoz”, de Joaquim Vermelho (Fig. 13),, a que se seguiram outros livros e brochuras, adquiridos muitas vezes no mercado alfarrabista.

Fig. 12 - Barros de Estremoz” de Azinhal Abelho e  “Algumas palavras acerca de Púcaros
de Portugal” de Carolina Michaëlis de Vasconcelos.

Fig. 13 - La céramique populaire du Haut-Alentejo” de Solange Parvaux e “Barros de
Estremoz”, de Joaquim Vermelho.

As leituras levaram-me a formular questões relativamente àquilo que leio e aos objectos oláricos que vou adquirindo, pelo que a minha formação científica me induz a investigar, visando "Pôr o preto no branco".

Em 2009, criei o blogue “Do tempo da Outra Senhora” (Fig. 14), onde vou publicando escritos de olaria e de barrística de Estremoz, com a pedalada que me é possível, pois as minhas motivações culturais dispersam-se simultaneamente por outros centros de interesse. Foi assim que em 2018 publiquei o livro “BONECOS DE ESTREMOZ” (Fig. 15), dado à estampa pelas Edições Afrontamento.

Fig. 14 - Aspecto parcial da página de entrada do blogue "Do Tempo da Outra Senhora".

Fig. 15 - "BONECOS DE ESTREMOZ”, de Hernâni Matos. Edições Afrontamento, 2018.

Com a morte em 2016 de Mestre Mário Lagartinho, decano da olaria e o último oleiro de Estremoz, constituiu uma tragédia cultural. Tornou-se real a necessidade de preservação e salvaguarda da olaria tradicional de Estremoz, acção que em devido tempo veio a ser despoletada pelo Município de Estremoz, em parceria com entidades oficiais para isso vocacionadas. 

Fig. 16 - Mestre Mário Lagartinho (1935-2016), decano da olaria e o último oleiro de Estremoz.
 Fotografia do Arquivo Fotográfico Municipal de Estremoz / BMETZ –
Colecção Joaquim Vermelho.

Fig. 17 - Uma aula do 1º módulo do Curso de Olaria em 2021. Fotografia da ADOE.

Creio que a realização do presente colóquio, integrado neste 1º Encontro Nacional de Olaria, indicia que os trabalhos de preservação e salvaguarda da olaria tradicional de Estremoz, marcham no bom caminho. Creio igualmente que nessas tarefas de missão é relevante o papel dos coleccionadores, no duplo papel de colectores e de investigadores, produtores de conhecimento, que dão um inestimável contributo para a arte avançar. Daí que me atreva a efectuar aqui, ainda que duma forma sucinta, aquela que é na minha óptica a caracterização da tradição oleira de Estremoz.

Hernâni Matos

terça-feira, 23 de setembro de 2025

A ADOE no rescaldo do 1º Encontro Nacional de Olaria em Évora Monte

 



No passado dia 21 de Setembro tive o privilégio de participar no Castelo de Évora Monte no Colóquio “RECENTRAR - Memória, Barro e Saber-fazer“, integrado no Encontro Nacional de Olaria, que ali teve lugar.

A minha participação foi fruto do honroso convite que me foi formulado pela Senhora Doutora Mathilda Dias Coutinho, coordenadora do projecto de investigação 2LEGACY, no sentido de participar no Colóquio na qualidade de coleccionador e investigador da olaria de Estremoz, convite a que naturalmente acedi e que muito me congratulou.

A minha comunicação subordinada à epígrafe O guardador de memórias e acompanhada de projecção em PowerPoint, teve o seguinte epílogo:

O legado da antiga tradição oleira de Estremoz constitui indiscutivelmente Património Cultural Imaterial de Interesse Municipal. O legado é caracterizado pela excelência dos exemplares oláricos que o integram, o que é revelador da exigência que constitui a sua recuperação e preservação, visando a salvaguarda da identidade cultural estremocense.

Nessa missão está envolvida a ADOE, cujos associados têm recebido formação continuada, ministrada por Mestre Xico Tarefa, visando o seu aperfeiçoamento técnico e artístico. Tal só foi possível com o apoio indispensável e insubstituível do Município de Estremoz e do CEARTE - Centro de Formação Profissional para o Artesanato e Património.


Se me permitem endereço aqui uma saudação muito especial à Inês Crujo, Presidente da ADOE – Associação Dinamizadora da Olaria de Estremoz, que é a timoneira encarregada de “levar o barco a bom porto”. Parafraseando “O Mostrengo”, da “Mensagem” de Fernando Pessoa, é caso para dizer: “Ali ao leme é mais do que ela. É um povo que quer a olaria que é sua”.


Por fim e os últimos são os primeiros, uma saudação também muito especial para Mestre Xico Tarefa, "decano" da olaria de Redondo, reconhecido pelo seu vigoroso contributo para a preservação da arte oleira, o qual tenho o privilégio de conhecer desde o I Encontro Regional de Olaria do Alto Alentejo, realizado em Vila Viçosa, em 1980, há 45 anos atrás. Tem sido ele que com a sua mestria de saber fazer”, empenho e dedicação que são o seu timbre, tem dado formação aos Adoeiros, desculpem-me o neologismo, para que estes sejam bem-sucedidos na nobre missão a que se propuseram: "Revitalizar a produção oleira tradicional de Estremoz. Bem hajam por isso.

Hernâni Matos

quarta-feira, 13 de agosto de 2025

Poetas em defesa da olaria de Estremoz - 03


António Sardinha (1887-1925)
Político, historiador e poeta, natural de Monforte – OBRA POÉTICA:  - Quando as
Nascentes Despertam (1821); - Tronco Reverdecido (1910); - Epopeia da Planície
(1915); - Na Corte da Saudade (1922) - Chuva da Tarde (1923); - Era uma Vez um
Menino (1926); - O Roubo da Europa (1931); - Pequena Casa Lusitana (1937).

O elogio do púcaro

Tu és a minha companha,
eu tenho-te á cabeceira
ó pucarinho de barro,
enfeite da cantareira.

Amigo certo e sabido,
matas a sede e o calor.
Tu vales mais do que pesas,
não se te paga o valor!

Meu bocadinho de barro,
chiando como um cortiço,
tu dás-te com toda a gente,
não te deshonras por isso!

Prantas a agua fresquinha,
sem ti não passa ninguem.
Mimo de reis e de bispos,
não custas mais que um vintem!

Assim, singelo e sem pompa,
ganhaste fama a Estremoz.
Ah, desgraçado daquele
que nunca a bôca te pôs!

És a cubiça das velhas,
contigo se enche um mercado.
Então a vista que metes,
quando tu és empedrado?!

Quero casar-me. Já tenho
dois pucarinhos pequenos.
Pois, p'ra principio de arranjo,
outros começam com menos!

- Amor, se fôres á feira
traz-me uma prenda galante.
Não tragas nada do ourives,
- um pucarinho é bastante!

Vae alta a febre, vae alta,
- p'ra que é que os médicos são?
Ó pucarinho de barro,
acode a esse febrão!

Eu nunca vi neste mundo,
que é gastador e que é louco,
coisa que tanto valesse,
mas que custasse tão pouco!

Assim, singelo e sem pompa,
tu déste fama a Estremoz!
- Ah, desgraçado daquele
 que nunca á bôca te pôs!
Hernâni Matos
Publicado em 5 de Março de 2017

terça-feira, 12 de agosto de 2025

Poetas em defesa da olaria de Estremoz - 07


Maria de Santa Isabel (1910-1992).
 Pseudónimo literário de Maria Palmira Osório de Castro Sande Meneses e Vasconcellos
Alcaide, poetisa estremocense. OBRA POÉTICA: - Flor de Esteva (1948); - Solidão Maior
(1957); - Terra Ardente (1961); - Fronteira de Bruma (1997); - Poesia Inédita (A editar).

Pucarinhos de barro

Pucarinhos de barro, quem me dera
Sentir, na minha boca, essa frescura
Da vossa água perfumada e pura,
Que me traz o sabor da primavera!

Quanta boca ansiosa vos procura,
Num símbolo de crença e de quiméra
Simples imagem viva, bem sincera,
Dum mundo de ilusões e de ternura!

Meus santos pucarinhos, milagrosos,
Cumprindo as gratas obras do Senhor,
Dando a beber aos lábios sequiosos

Minha boca vos beija com fervor,
Como se, noutros tempos luminosos,
Beijasse ainda o meu primeiro amor!

Publicado pela 1ª vez em 8 de Abril de 2017

segunda-feira, 11 de agosto de 2025

Bonecos de Estremoz: Duarte Catela


Duarte Catela (1988-  ). Fotografia de 2018 da autoria de Joana Serrano.
Arquivo fotográfico do autor. 

Duarte Miguel Menezes Catela nasceu a 4 de Fevereiro de 1988, nas traseiras da Rua Alexandre Herculano, n.º 33 em Estremoz. Filho legítimo de Luís Miguel Ramalho Catela, de 22 anos e de Helena Maria Lopes Bravo Menezes Catela, de 22 anos. É bisneto dos barristas António Lino de Sousa (1918-1982) e Quirina Alice Marmelo (1922-2009). Frequentou a Escola Secundária Rainha Santa Isabel, em Estremoz, na qual concluiu em 2006, o 12º do Agrupamento 1 – Curso de Carácter Geral. Tem o curso de Hotelaria da Escola Profissional de Hotelaria e Turismo de Lisboa, concluído em 2009.  Começou a trabalhar na Pousada de Sagres e passou a sub-chefe de cozinha nas Pousadas de Portugal, permanecendo nessa condição na Pousada de Queluz. Actualmente é chefe de cozinha na Pousada de Palmela e no Restaurante Cozinha Velha (Palácio Nacional de Queluz). O seu interesse pelos Bonecos de Estremoz remonta à juventude quando, à guarda da bisavó, a observava na modelação e pintura dos Bonecos, acabando por seguir o seu padrão de execução, ao mesmo tempo que utiliza os moldes das faces que dela herdou. Cozinheiro de profissão, procura conciliar a actividade profissional com a arte bonequeira que herdou da família. Modela os Bonecos na sua residência em Lisboa e estes depois de secos, são transportados para Estremoz onde são cozidos na mufla eléctrica que pertenceu à sua bisavó Quirina Marmelo e se encontra na antiga oficina-loja na Rua Arco de Santarém, nº 4, onde moram os seus avós. Em Estremoz, a sua mãe Helena Catela, colabora na pintura dos Bonecos. A venda dos seus Bonecos é feita no Museu Municipal de Estremoz, na Mercearia Figo no Rossio Marquês de Pombal n.º 73 em Estremoz e directamente a clientes que lhe fazem encomendas. Em Estremoz tem participado na FIAPE, já expôs individualmente e tem participado em exposições colectivas, bem como em feiras onde não estando presente, está representado no stand da Câmara Municipal de Estremoz.

Publicado inicialemente em 17 de Março de 2020


Presépio de 3 figuras.

 Nossa Senhora da Conceição.

 Nossa Senhora dos Mártires.

 Matança do porco - 1.

Matança do porco - 2.
  
Pastor de tarro e manta.
  
 Homem do harmónio.

 Pastor debaixo da árvore.

 Ceifeiro.

Cozinha dos ganhões.
  
 Mondadeira.

 Mulher das castanhas.

 Senhora ao toucador.

 Primavera de arco.

Amor é cego.