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quinta-feira, 13 de março de 2025

Ganchos de meia e meias de cinco agulhas (2ª edição)

 

Tipo 3 – Da esquerda para a direita e de cima para baixo: Tarro, bolota, jarra, balde,
 bolota, suporte de copo, sapato com lira, sapato com cruz.

Uma das características mais importantes das peças de arte pastoril é a de corresponderem a uma necessidade sentida por alguém, o que leva essa peça a desempenhar uma função. É o caso dos chamados “ganchos de meia”, que as mulheres das nossas famílias usavam quando faziam croché ou tricotavam peças de vestuário, de lã ou algodão, como era o caso das chamadas “meias de cinco agulhas”.

Ganchos de meia
Independentemente da sua morfologia e decoração, estes ganchos de meia, confeccionados em madeira ou osso, têm um sulco ou um buraco, por onde passa o fio, que do novelo é redireccionado para as agulhas. É fixado na blusa ou no vestido da mulher, na parte superior do peito, geralmente do lado esquerdo. Aí é seguro através dum alfinete-de-ama ou cozido com linha, podendo eventualmente o gancho de meia incluir um pedaço de arame dobrado em U (gancho) para pregar no vestuário.
No decurso do trabalho, o fio que passa pelo gancho de meia, posiciona-se sempre entre o corpo e o trabalho, enrolado no dedo médio e sendo a cada malha, movimentado com o polegar esquerdo.
Tanto os ganchos de meia com sulco como os ganchos de meia com orifício, podem-se desprender da roupa onde estão fixados, sempre que se interromper a execução do trabalho. Todavia, só os ganchos de meia com sulco se podem soltar da peça em execução, pois os ganchos de meia com orifício têm o fio introduzido nele desde o início do trabalho e só o libertam quando este é cortado.

Tipologias dos ganchos de meia
Na minha colecção identifiquei as seguintes tipologias de ganchos de meia:
TIPO 1 – Com um orifício para passar o fio do novelo e um gancho de arame para prender no vestuário;
TIPO 2 - Com um orifício para passar o fio do novelo e 2 orifícios para passar o fio que o prende ao vestuário;
TIPO 3 – Com um sulco para passar o fio do novelo e um orifício para passar o alfinete-de-ama ou o fio que o prende ao vestuário;
TIPO 4 – Com dois sulcos para passar o fio do novelo e um orifício para passar o alfinete-de-ama ou o fio que o prende ao vestuário;
TIPO 5 – Com uma argola por onde pode passar simultaneamente, o fio do novelo e o alfinete-de-ama ou o fio que o prende ao vestuário;
TIPO 6 – Com 3 argolas que permitem a passagem do fio do novelo e do alfinete-de-ama ou do fio que o prende ao vestuário;
TIPO 7 – Com várias aberturas que permitem a passagem do fio do novelo e do alfinete-de-ama ou do fio que o prende ao vestuário;

Meias de 5 agulhas noutros tempos
Com cinco agulhas se fazia o tricô circular usado na manufactura de meias. Estas, eram lisas ou lavradas com motivos diversos, monocromáticas ou multicolores, decoradas com barras ou motivos florais ou geométricos.
Sempre houve quem manuseasse com mestria as cinco agulhas, com a mesma rapidez e precisão que as mãos dum virtuoso, percorrem o teclado dum piano. Mãos que falavam e davam resposta às necessidades caseiras, mas que também faziam para vender para fora, pois era necessário engrossar o magro orçamento familiar.
Havia quem começasse as meias de cima para baixo, em direcção à calcanheira e à biqueira, mas também havia quem as começasse exactamente em sentido contrário.
Quando as meias se gastavam pelo uso, geralmente na calcanheira ou na biqueira, eram reparadas, recorrendo novamente às cinco agulhas. A vida não dava para extravagâncias e poucos se podiam dar ao luxo de desperdícios inúteis. Apesar disso, o aparecimento no comércio de meias baratas, de fabrico industrial e a pressão da vida moderna, conduziram ao decaimento por desuso da manufactura artesanal das meias de cinco agulhas.
Na região onde me insiro, Estremoz, a manufactura das meias de cinco agulhas era uma prática corrente nas suas treze freguesias. Bem próximo de nós, eram famosas as meias manufacturadas pelas mulheres da Aldeia da Serra.

Meias de 5 agulhas na actualidade
Actualmente, a reacção ao consumo desenfreado suscitado pela sociedade capitalista, tem levado mulheres, especialmente jovens, a um “regresso às origens”, manufacturando meias para si e para as suas crianças. São estilos de vida alternativos e salutares, que se saúdam. É o retomar de práticas que retiram das vitrinas, jóias da arte pastoril, como os ganchos de meia que estiveram na génese do presente texto.

Publicado inicialmente em 2 de Junho de 2023

Tipo 4 – Coração.

Tipo 1 – Sapato, bolota.

Tipo 2 – Sapato (vista superior e vista lateral).

Tipo 5 – Gral, panela de ferro, bolota, bolota, badalo.

Tipo 6 – Par de sapatos, par de bolotas, par de bolotas.

Tipo 7 – Cadeirinha de prometida [1]


[1] Símbolo usado para “selar” o contracto pré-matrimonial no Alentejo de antanho. Através dele, o moço oferecia à sua “prometida” uma cadeirinha em madeira que ela passaria a usar, presa na fita do chapéu de trabalho, até à altura do matrimónio. Depois disso poderia vir a adquirir outra funcionalidade, como a de gancho de meia.

sexta-feira, 24 de janeiro de 2025

Praça de toiros de Estremoz



Praça de toiros de Estremoz

Luís Brito da Luz  *

  

"Queria ser toureiro mas só cheguei a Prémio Nobel"
 Camilo José Cela

Artigo reproduzido com a devida vénia da
Callipole – Revista de Cultura n.º 30 – 2024, pp. 151-162


Resumo: Este artigo trata da história da actual Praça de Toiros de Estremoz desde a sua fundação, no ano de 1904, passando pelo seu apogeu, declínio e renascimento assim como da comemoração da sua centúria e mais vinte anos de vida.

Palavras-chave: Efeméride; Praça de Toiros de Estremoz; Equipamento; Associação de Beneficência de Estremoz; Centro de Bem-Estar Social de Estremoz.

* Economista e Mestre em Economia – Especialidade em Estudos Europeus pela Universidade Técnica de Lisboa, Instituto Superior Técnico.

Este artigo foi escrito ao abrigo do antigo acordo ortográfico.

*****

No passado dia 3 de Setembro uma importante efeméride estremocense foi efusivamente celebrada e comemorada na cidade, os cento e vinte anos de um dos edifícios mais icónicos, a Praça de Toiros de Estremoz, outrora, aquando da sua inauguração, a Praça de Toiros de Santa Catarina, vizinha à porta com o mesmo nome, uma das entradas seiscentistas pertencentes à fortificação abaluartada de Estremoz, e edificada no baluarte do Reguengo.
Desde o berço que foi vista como um melhoramento de extraordinário alcance para a então vila, particularmente para o seu comércio e um empreendimento que há muito se impunha como indispensável, a nova praça andou de braço dado com os ventos do progresso.
Até se estabelecer definitivamente neste local onde actualmente pontifica, saltitaram por vários sítios as corridas de touros nos séculos XVIII e XIX.
O primeiro passo para o nascimento da actual praça dá-se no ano de 1899, no dia 19 de Julho, dia em que se dá a arrematação ao Ministério da Fazenda de um terreno[1] e suas dependências denominado Baluarte do Reguengo, junto às Portas de Santa Catarina, adquirido por Manuel Vicente da Graça Zagalo e sua mulher D. Maria da Graça da Natividade Hunter Reynolds, compra que teve direito a parangonas no jornal local e a elogios aos protagonistas[2].
A ideia subjacente a esta aquisição seria a constituição de uma comissão organizada[3] com a finalidade de construir a praça de touros, comissão essa que depois entregaria a mesma praça à Associação de Beneficência de Estremoz, para com o seu produto fazer face às despesas com o seu estabelecimento de caridade, há pouco tempo inaugurado. Em dezassete de Março de 1900, segundo o Jornal d’Estremoz, já estava constituída a comissão e realizado o projecto e respectiva planta para a nova praça, a qual seria construída de ferro e alvenaria devendo comportar aproximadamente cinco mil pessoas, estando orçada entre doze e treze contos de réis.
Após o anúncio com a devida publicidade, da arrematação por empreitada das obras de alvenaria, carpintaria e serralharia inerentes a tal construção sob as condições do caderno de encargos respectivo, e, tendo terminado o prazo no dia 29 de Fevereiro para a recepção das propostas em carta fechada, abertas que foram as mesmas nesse mesmo dia, por escritura de um de Março de 1904[4], foi celebrado o contrato de empreitada entre Manuel Vicente da Graça Zagalo na qualidade de presidente da direcção da empresa construtora da praça de touros, representando ele toda a direcção[5], e os empreiteiros a quem foram adjudicadas essas tais obras.
A Joaquim Miguel Anastácio e António Luís Coelho, carpinteiros de profissão, entregou a empresa a obra de carpintaria, nos termos da sua proposta, obrigando-se para além disso os empreiteiros a construírem a trincheira de madeira com um metro e sessenta centímetros de altura por cinco centímetros de extensão e com a distância de dois metros entre os pés direitos e cuja secção seria de vinte centímetros por vinte centímetros, formando painéis móveis que se fixariam aos prumos entrando em ranhuras cavadas nos mesmos para esse efeito. Cada prumo destes teria que estar enterrado no solo pelo menos noventa centímetros e seria assente em pedra para permitir maior solidez e estabilidade. Ao longo de toda a trincheira, quer na parte interior, quer na exterior da mesma, um estribo de altura conveniente seria colocado, assentando o mesmo sobre chapuzes ligados aos respectivos prumos e aparafusados aos painéis respectivos. Assumiu o encargo de fiador desta empreitada o empregado público e industrial José Nunes Adegas[6].
A empreitada de alvenaria foi adjudicada a Jacinto José Cachudo, também nos termos da proposta apresentada, com a alteração do preço inicial apresentado de seis contos quatrocentos vinte cinco mil réis, saldando-se a adjudicação final em seis contos de réis. Adicionalmente, obrigava-se este a adquirir o material já existente na praça pelo preço que tinha sido fornecido, cuja importância lhe seria descontada na última prestação, aceitar ainda a cal que havia de fornecer Joaquim José de Rosa Bastos até à quantia de duzentos mil réis na qual seria incluída a já entretanto fornecida, pagando a que viesse de futuro ao preço corrente na altura e a fazer uma parede de tijolo ao alto na parte inferior das abobadilhas a fim de substituir o enchimento de alvenaria indicado no projecto. Finalmente, caso fosse necessário, mudar as duas pequenas portas existentes uma de cada lado da porta principal, trabalho que seria por conta do empreiteiro. As mesmas teriam que ser colocadas de forma a que o eixo correspondesse em linha recta ao eixo das escadas de acesso para as bancadas do sol e sombra respectivamente. Assumiram o encargo de fiadores desta empreitada os proprietários Francisco Fragoso e Venceslau Vieira[7].
Já a empreitada de serralharia, que compreendia toda a obra em ferro, foi confiada a João Francisco Rodrigues nos termos da sua proposta que se socorreu do comerciante desta vila e também proprietário, Narciso da Silva Ribeiro, para fiador da mesma[8].
Foram testemunhas deste contrato de empreitada, que se saldou no montante total de 7:930$000 réis, mais 555$526 réis que o valor inicial orçamentado em 7:374$474, dois estremocenses, António Maria de Almeida, casado e barbeiro de profissão e José Francisco da Silva Capeto solteiro e alfaiate[9].
Os trabalhos tinham começado com extraordinária actividade logo no dia seguinte, na quarta-feira dia 2 de Março, perspectivando-se logo aí a conclusão da obra para finais de Agosto. Nessa altura já existiam trabalhos realizados que ajudavam e muito a rápida conclusão da arena, em particular toda a parede exterior assim como os curros com capacidade para doze touros.
Na rua da Rainha D. Amélia[10], na casa de residência de Manuel Vicente Graça Zagalo e D. Maria da Graça da Natividade Hunter Reynolds, aos seis dias do mês de Maio e com os trabalhos de construção da nova praça em grande desenvolvimento, antecipando mesmo a conclusão das obras antes do prazo estipulado[11], teve lugar a escritura de doação[12], no valor de dez contos de réis, do Baluarte do Reguengo que fizeram este casal de beneméritos à Associação de Beneficência de Estremoz[13]. Tratava-se de uma doação pura e condicional na medida em que esta associação donatária só entrava na posse do prédio mediante três condições que tinham que ser realizadas simultaneamente. Em primeiro lugar, tinha que ser construída uma praça de touros, a qual já estava em andamento, depois tinha que estar integralmente pago ou reembolsado o capital empregado nesta construção e, finalmente, também tinham que estar definidos os direitos dos subscritores que para tal fim concorreram com quantias. Manuel Vicente ficou encarregado de angariar estes investidores por meio de obrigações, com valor de cinco mil réis cada uma, até ter a importância suficiente (nunca superior a doze contos de réis) para a construção da praça[14].
Definiram-se os sócios subscritores em duas categorias, a dos fundadores, que seriam todos aqueles cujos nomes constassem do registo da empresa ou comissão administrativa até à data da distribuição das respectivas obrigações e a dos secundários que eram todos aqueles que adquirissem obrigações à posteriori, não gozando estes últimos dos direitos que assistiam aos primeiros, com excepção apenas do reembolso do capital que as suas obrigações representassem.
Depois, hierarquizaram-se os fundadores em função da importância subscrita, aqueles que subscrevessem obrigações com importância total não inferior a um conto de réis teriam o direito de propriedade a um camarote e por cada parcela de cem mil réis, além daquela quantia, mais um lugar reservado nas bancadas de sombra. Para os que subscrevessem obrigações com importância total não inferior a quinhentos mil réis teriam direito a três lugares de cadeira e mais um lugar de sombra nas bancadas por cada adicional de cem mil réis. Para aqueles subscritores cujas quantias eram inferiores a quinhentos mil réis teriam à mesma um lugar reservado nas bancadas de sombra por cada cem mil réis realizados, tendo os que realizassem metade dessa quantia um lugar reservado nas bancadas de sol e os de vinte cinco mil réis realizados a meia entrada nestas bancadas. Todos estes lugares de direito ficavam pertença dos subscritores fundadores podendo os mesmos ser unicamente transmissíveis aos seus herdeiros ou sucessores.
Estava também estipulado que todos estes subscritores proprietários de lugares tinham direito em todos os espectáculos a trocar os lugares por outros de categoria superior pagando a diferença de preço, bastando avisar com antecedência de, pelo menos um dia, a comissão.
Todos os subscritores seriam reembolsados do capital representados pelas suas obrigações por amortização que todos os anos se realizava por sorteio única e exclusivamente com o rendimento líquido e disponível da praça.
Ainda estava previsto a alienação das obrigações, por parte dos subscritores fundadores e seus herdeiros ou sucessores, sem perda dos seus direitos aos lugares que lhes pertenciam, mas caso optassem pela venda da propriedade desses lugares a associação donatária teria preferência em igualdade de circunstâncias, caso já estivesse na posse da praça, pois se a transmissão ainda não estivesse efectuada seria a comissão que estivesse encarregada da sua exploração a exercer essa preferência. Ainda havia um caderno em duplicado para a inscrição e apuramento dos subscritores fundadores, essencial, para de pronto se conhecerem os direitos que tinha cada subscritor. Quando depois de reembolsado o capital dos subscritores e se ter transmitido à Associação de Beneficência de Estremoz a posse da praça de touros, dada por esta escritura, foi entregue a esta um dos livros ficando o outro depositado no Arquivo da Administração do Concelho desta então vila verificando a direcção desta associação, nesta ocasião, a exactidão dos dois livros[15].
Para além disto tudo, se, no futuro deixassem de existir os estabelecimentos de caridade, a cargo da Associação de Beneficência, ou os que esta pudesse vir a fundar, reverteria a praça de touros a favor dos subscritores fundadores ou seus herdeiros na proporção para cada um correspondente ao capital que tivessem subscrito[16]. Se esta associação donatária também decidisse não continuar na posse do objecto doado podia livremente devolver o mesmo aos subscritores fundadores ou aos seus sucessores que seriam obrigados a aceitar sem que tivessem direito a exigir qualquer indemnização.
Enquanto não se realizou a transmissão da praça foi encarregada da sua administração e exploração uma comissão composta pelo próprio Manuel Vicente Graça Zagalo e também por José Rodrigues Tocha, Roberto Rafael Reynolds, João Augusto Silvério Carapeta e Francisco das Dores Rosado, estes dois últimos também bastante louvados pela imprensa local devido ao empenho e persistência neste projecto, os quais iriam escolher entre si quem iria exercer os cargos que entendessem dever distribuir. Daria esta comissão anualmente, em reunião de assembleia geral, contas aos subscritores, os quais deliberavam por maioria de dois terços do capital representado pelos subscritores presentes[17]. Testemunharam este acto notarial os proprietários estremocenses Rui de Sande Menezes e Vasconcellos e Carlos Frederico Luna.
Em meados do mês de Maio, ainda com a inscrição aberta a todos aqueles que até àquele momento não tinham subscrito qualquer obrigação, os trabalhos da praça estavam em colossal desenvolvimento, surgindo adicionalmente algumas inovações que iriam contribuir para a solidez e embelezamento da praça, cujo aumento de despesa foi justificado pela sua necessidade. Começavam a ser conhecidos dos estremocenses alguns pormenores da arena. Os camarotes em número de sessenta ficavam arrumados em meia circunferência da praça e directamente sobre a bancada dos cento e cinquenta e cinco fauteuils com as dimensões de 1,63m de largura por 1,80m de fundo, tendo a coxia 1,20m de largura. Os fauteuils ocupavam as doze bancadas inferiores aos camarotes. Nos lugares do sol as bancadas eram em número de dezassete, medindo 0,50m de largura por 0,40m de altura. Tanto estas bancadas como as dos fauteuils eram cobertas de lajes pretas (xisto) cujo fornecimento já estava contratado na empreitada de alvenaria, enquanto o pavimento dos camarotes era em mosaico (mosaico hidráulico). Por esta altura, a gradaria que havia de circundar a praça já estava quase concluída, as colunas de ferro que sustentariam a cobertura em toda a sua circunferência, os tabuleiros de zinco e outros aprestos estavam em vias de chegar[18], trabalhando nesta azáfama setenta operários[19].
Por esta altura, com os trabalhos em velocidade de cruzeiro e vislumbrando-se no horizonte a obra concluída, reuniu a assembleia geral de accionistas no dia 4 de Junho, onde, para além de tratar dos negócios relacionados com os trabalhos em curso, também se concentrou nas duas corridas inaugurais, decidindo para o efeito que essas mesmas corridas fossem dadas por conta da comissão, apesar das propostas existentes para o arrendamento da praça. Ficou aquela autorizada a despender as quantias necessárias, depois de esgotadas as verbas pagas pelos accionistas para completa conclusão da praça, sendo a diferença saldada pelo resultado dos primeiros eventos[20].
Já com o mês de Julho bem adiantado, pela primeira vez foram anunciados com exactidão os dias 3 e 4 de Setembro[21] para os dois espectáculos inaugurais, por ocasião das grandiosas festas à Exaltação da Santa Cruz. Estipulou-se que as portas da praça abriam às duas da tarde e que pelas quatro horas entraria na arena a azémola das farpas conduzida pelos moços de forcado seguindo-se os artistas contratados, primeiro os cavaleiros Manuel Casimiro e Francisco Simões Serra coadjuvados pelos bandarilheiros Teodoro e Carlos Gonçalves, Francisco Saldanha, José Martins e J. Ribeiro Tomé. Participariam também, para além do grupo de forcados da praça, o grupo da praça do Campo Pequeno, liderado pelo cabo Manuel Alcorriol. Nesta altura, ainda estava em contratação um matador espanhol e sua quadrilha, o qual só a meados de Agosto se soube ser Manuel González, El Rerre com seus bandarilheiros, Vicente Vegas e José Garcia (Moreno). Para além destes artistas ainda figurariam nas cortesias todo o pessoal da arena e touril, campinos a cavalo, quatro cavalos de combate rigorosamente ajaezados e conduzidos à mão por outros tantos criados dos cavaleiros. Os dois curros de dez touros cada um seriam pertença da Companhia das Lezírias do Tejo e Sado e de D. Caetano de Bragança (Lafões). A banda de música escolhida para abrilhantar os dois eventos foi a de Infantaria 2, de Lisboa, que para esse fim, chegou a Estremoz na noite de sexta-feira 2 de Setembro, a direcção técnica desta nova arena ficava a cargo de J. Carlos Martins e estavam previstos comboios a preços reduzidos de Setúbal, Évora e outras estações. E tudo isto no meio de uma azáfama devido à progressão tremenda dos trabalhos, para além do habitual boicote dos Velhos do Restelo, criaturas mesquinhas que através da política tudo faziam, ingloriamente, para que esta aspiração dos estremocenses não tivesse êxito[22].
A meados de Agosto com os trabalhos exteriores em estado muito adiantado, o trabalho de alvenaria no interior do recinto já estava concluído, estando nessa altura em acção as execuções nos gradeamentos, camarotes e madeiramentos[23]. A tal respeito o jornal lisboeta A Arena, especializado na arte da tauromaquia, falando da praça de touros de Estremoz dizia num artigo alongado “Está em via de conclusão n’esta villa uma nova praça de touros que comportará umas sete mil pessoas e ficará sendo uma das melhores de quantas existem em Portugal. A nova praça é construída com toda a solidez e elegancia, e os materiaes que entram principalmente na construção, alem da cal e areia, são a pedra e o ferro. A madeira entra apenas como adorno, à semelhança do que acontece com a praça do Campo Pequeno[24]. O conjuncto dá uma ideia da bonita praça de Villa Franca,…”[25].
Os vinte touros seleccionados para serem lidados na inauguração, acompanhados dos respectivos cabrestos, tinham iniciado a sua viagem rumo a Estremoz, desde os campos de Vila Franca, na manhã do dia 24, uma quarta-feira. Ficariam até ao dia dos eventos nos terrenos da herdade do Chalrito, na coutada, propriedade de Manuel Vicente Graça Zagalo, a poucos quilómetros de Estremoz. Entretanto, por esta altura, os trabalhos no interior da praça já se encontravam concluídos, estando apenas as lavagens das lajes das bancadas e dos mosaicos nos camarotes em realização[26].
Na segunda-feira dia 29, pelas cinco horas da tarde teve lugar a inspecção à praça com presença do Administrador do Concelho Domingos Joaquim da Silva, acompanhado pelo seu secretário Carlos Frederico Luna e também pela comissão de vistoria composta pelo engenheiro civil e de minas António Maria da Silva, pelo técnico de obras públicas, João Filipe Pereira Pinho e pelo técnico de obras municipais Francisco Maria de Campos Torres, sendo esta de parecer favorável à abertura do recinto pois o mesmo gozava de condições de resistência e estabilidade sem o mais pequeno risco para o público[27].
Finalmente chega o tão ansiado dia da inauguração com uma animação delirante por parte dos aficionados. As embolações principiaram pelas nove horas da manhã tendo entrada livre aqueles que tivessem bilhete para a corrida, pagando os que não possuíssem ingresso e quisessem assistir a este acto um bilhete especial que estava à venda por cinquenta réis. Para além das entradas poderem ser adquiridas nas bilheteiras da praça no dia da corrida, a partir das oito horas da manhã, também se poderiam comprar em mais outros três espaços comerciais consoante o tipo. Assim, para os Camarotes e Fauteuils as mesmas eram encontradas na ourivesaria Carapeta & Irmãos enquanto as da Sombra estavam à venda na loja de Joaquim Lourenço Costa e as de Sombra-Sol e Sol na drogaria de Francisco Fragoso. No geral foram brilhantes e entusiásticas as duas corridas que marcariam para sempre esta praça e a então vila de Estremoz. A de Domingo, sem sombra para dúvidas, foi muito melhor que a inaugural de sábado pois os touros assim o ditaram. No primeiro dia o gado da Companhia foi em geral fraco não se prestando à lide, impossibilitando os artistas de brilharem[28]. Mesmo assim, os artistas com a fraca matéria prima que lhes calhou em sorte conseguiram satisfazer suficientemente o público. Já no dia seguinte tivemos umas das melhores corridas, daquelas de primeira linha que nos enchem as medidas. O gado de D. Caetano de Bragança era bravíssimo prestando-se com destreza ao desafio dos artistas que, com denodo e arte, os lidaram, especialmente os cavaleiros que foram muito felizes com uma prestação magnífica nos ferros curtos sendo muito ovacionados pelo público. Dos bandarilheiros, que em geral trabalharam bem, destacaram-se José Martins na sorte de cadeira, Ribeiro Tomé no salto de vara, Teodoro Gonçalves e Francisco Saldanha nas farpas. Também o matador espanhol deixou boa impressão de um artista razoável[29]. Quanto aos forcados causaram também muito boa impressão nas sortes arriscadas que fizeram com pegas de valor que lhes valeu muitos aplausos. As duas touradas com muito boa direcção, confiada a J. Carlos Martins, que vestiu a pele de inteligente, estiveram muito bem concorridas com a de sábado com poucos lugares vagos enquanto a de domingo esteve literalmente à cunha[30].
A meados de Setembro estavam já quase terminados os trabalhos de aformoseamento no exterior do muro do lado norte e sul, os quais, infelizmente, não tinham podido ser concluídos antes da inauguração[31].
Tal como acontece com tudo nesta vida, naturalmente, nasce-se, vive-se e morre-se, assim se passou também com esta infraestrutura, que após o seu nascimento registou aqui momentos de glória durante décadas, passando por este tauródromo as principais figuras do toureio, a elite da tauromaquia nacional assim como espectáculos musicais e outros mais bizarros para este tipo de recinto, como combates de boxe, realizados no ano de 1935. Este recinto esteve sempre umbilicalmente ligado à renomada dinastia de cavaleiros tauromáquicos estremocenses, a conhecida família Maldonado Cortes, liderando a mesma João Maria de Almeida de Matos Cortes que foi cavaleiro amador, seguido por seus filhos Mestre José Francisco Maldonado Cortes, figura de primeiro plano da tauromaquia, que tal como seu pai foi empresário desta praça, e seu irmão Afonso Manuel Maldonado Cortes exímio equitador, os dois cavaleiros de alternativa. Seu neto José Francisco Macedo Maldonado Cortes (Kiko), filho mais velho do Mestre José Maldonado Cortes, e, também ele, cavaleiro de alternativa fez aqui os seus primeiros treinos assim como seus filhos e bisnetos do patriarca, o mais velho, Francisco Maria Marouço Maldonado Cortes, cavaleiro praticante que aqui toureou pela primeira vez em público e seu irmão José Maria Marouço Maldonado Cortes (Pepe), bandarilheiro praticante aí também se vestiu de toureio. As homenagens gravadas no mármore estremocense e cravejadas na entrada principal desta praça atestam esta antiga relação de cumplicidade com esta família[32]. Definhou este espaço ficando desactivado por muitos anos, encontrando-se em 2011 em muito mau estado de conservação. Com a finalidade de recuperar a histórica praça, o Centro de Bem-Estar Social de Estremoz, proprietário do edifício, cedeu gratuitamente por vinte e cinco anos a arena ao município estremocense para que este promovesse obras de restauro com vista à sua reabertura. O edifício foi reconvertido e adaptado a espaço multifunções, ficando as obras concluídas no ano de 2013, tendo a sua reabertura ao público ocorrido em 30 de Agosto de 2013 com uma corrida de touros nocturna onde foi lidado um curro de sete touros da ganadaria Pinto Barreiros para os cavaleiros António Ribeiro Telles, João Salgueiro, Rui Fernandes, Vítor Ribeiro, João Moura Caetano, João Ribeiro Telles Jr. e João Maria Branco, acompanhados pelos grupos de forcados Amadores de Montemor e Monforte.
Para a celebração dos cento e vinte anos deste recinto tauromáquico teve lugar no passado dia 30 de Agosto, pelas vinte e duas horas, a corrida de comemoração desta efeméride. Lidaram-se seis touros da ganadaria Veiga Teixeira para os cavaleiros João Moura, José Francisco Cortes (Kiko), Filipe Gonçalves, João Moura Caetano, Tiago Carreiras e David Gomes. Também foi corrido um novilho dos irmãos Moura Caetano pelo amador Tomás Moura, filho do prestigiado cavaleiro João Moura, figura principal deste cartaz. Marcaram também presença nesta festa os grupos de forcados amadores de Alcochete e Monforte, capitaneados respectivamente por António José Cardoso e João Maria Falcão. Abrilhantou esta festa a banda estremocense, Sociedade Filarmónica Luzitana.
Não podendo ter assistido ao seu nascimento por razões óbvias, marquei orgulhosamente presença na sua renascença assim como neste centésimo vigésimo aniversário.

Bibliografia

Fontes Manuscritas
Arquivo Distrital de Évora
Fundo: Cartório Notarial de Estremoz – Livro de Notas de João Baptista Pires de Campos, Livro 1113, 1904-02-08 a 1904-05-05 – PT/ADEVR/NOT/CNETZ/001/0649
Arquivo Municipal de Estremoz
Fundo: Câmara Municipal de Estremoz - Série: 019 - Autos de Inspecção às Escolas Primárias, 1902 – 1904 - PT/AMETZ/CMETZ/Q-C/019/0001
Monografias
ALMEIDA, Jayme Duarte de - Enciclopédia Tauromáquica ilustrada. - Lisboa: Editorial Estampa, 1962.
ALMEIDA, Jayme Duarte de - HISTÓRIA DA TAUROMAQUIA. Técnica e Evolução Artística do Toureio. - Lisboa Artis Lda, 1951-1953. - 2 vol.
Publicações em série
JORNAL D' ESTREMOZ, O - Semanário Político, Imparcial, Literário e Noticioso / Fund. José Maria da Silva. – Estremoz : Tipografia de José Maria da Silva, 1887-1922. – Publicação semanal referente aos n.ºs 642, 22 de Julho 1899; 676, 17 de Março 1900; 855, 15 de Agosto 1903; 871, 27 de Fevereiro; 872, 5 de Março; 877, 9 de Abril; 882, 14 de Maio; 883, 21 de Maio; 886, 11 de Junho; 891, 16 de Julho; 892, 23 de Julho; 893, 30 de Julho; 895, 13 de Agosto; 896, 20 de Agosto; 897, 27 de Agosto; 898, 3 de Setembro; 899, 10 de Setembro e 900, 17 de Setembro de 1904.

Agradecimentos

O autor agradece ao Arquivo Distrital de Évora, pela mão da assistente técnica de arquivo, Srª Célia Malarranha, ao Arquivo Municipal de Estremoz na pessoa da directora Drª Paula Gonçalves e à Biblioteca Municipal de Estremoz cuja directora é a Drª Maria Helena Mourinha.
A João Malta pelos acutilantes detalhes, sempre bem-vindos.
Finalmente, a João Ruas, por tudo.

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[1] Registado na Conservatória do Registo Predial de Estremoz sob o n.º 6511 a folhas 105 do Livro B – dezassete.
[2] Informava O Jornal d’Estremoz do dia 22 de Julho de 1899, n.º 642, que o baluarte em praça tinha sido adquirido por Manuel Vicente da Graça Zagalo e Roberto Reynolds (Roberto Rafael Reynolds, irmão de D. Maria da Graça e cunhado de Manuel Vicente) com a finalidade de ser reconstruída a antiga praça de touros, de que ainda existia uma parte importante, sendo por isso louvável “o procedimento dos dois distinctos cavalheiros, que toda a gente que se interessa pelo progresso d’esta povoação applaude e elogia”.
[3] N'O Jornal d’Estremoz de sábado 17 de Março de 1900, n.º 676, vem a notícia “Sabemos que se acha constiuida uma comissão composta dos srs. dr. João da Silveira Couto Leitão, presidente, Roberto Reynolds, tesoureiro, José Rodrigues Tocha, secretario, e Manoel Vicente Graça Zagallo e dr. Francisco Maria Namorado, como vogaes, comissão que tomou a seu cargo o empreendimento da realização do melhoramento aludido”.
[4] Livro n.º21 - Para as notas dos actos e contractos entre vivos. Notário J. B. P. de Campos – Estremoz, de 8 de Fevereiro a 5 de Maio de 1904, folhas 6 v. e seguintes.
[5] Informava O Jornal d’Estremoz do dia 27 de Fevereiro de 1904, n.º 871 que no dia 17 deste mesmo mês e sob a presidência de Manuel Vicente Graça Zagalo se tinha reunido a comissão que tinha a seu cargo a reconstrução da praça, onde foi resolvido proceder imediatamente aos trabalhos que deviam ser feitos por meio de empreitadas já anunciadas a concurso.
[6] A respeito desta empreitada noticiava O Jornal d’Estremoz do dia 5 de Março de 1904, n.º 872 que a adjudicação tinha sido feita por 1:280$000 réis, menos 47$400 réis que o montante inicial de 1:327$400.
[7] Em relação à empreitada de alvenaria O Jornal d’Estremoz do dia 5 de Março de 1904, n.º 872 referia que a adjudicação, para além de ter sido feita ao empreiteiro Jacinto José Cachudo também tinha sido entregue a António Luís Coelho e Carlos Faleiro. Mencionava ainda uma diferença para mais de 865$930 réis em relação aos 5:134$070 réis iniciais, muito diferente do que foi escriturado.
[8] O Jornal d’Estremoz do dia 5 de Março de 1904, n.º 872 refere que o valor deste contrato se situou em 650$000 réis, menos 263$000 réis que o valor inicial de 913$000 réis.
[9] Informação prestada por O Jornal d’Estremoz do dia 5 de Março de 1904, n.º 872. O valor correcto dos orçamentos iniciais, segundo este periódico, seria de 7:374$470 e a diferença para mais de 555$530 réis.
[10] Actualmente rua 5 de Outubro.
[11] O Jornal d’Estremoz do dia 9 de Abril de 1904, n.º 877.
[12] Livro nº21 - Para as notas dos actos e contractos entre vivos. Notário J. B. P. de Campos – Estremoz, de 8 de Fevereiro a 5 de Maio de 1904, folhas 45 e seguintes.
[13] Compareceram na escritura em representação desta Associação, José Rodrigues Tocha na qualidade de Provedor, o padre António Joaquim Neves Vieira como secretário, João Augusto Silvério Carapeta na qualidade de tesoureiro e os vogais Roberto Rafael Reynolds, Malaquias José Cardoso Ramos e Francisco Inácio Costa.
[14] O Jornal d’Estremoz do dia 15 de Agosto de 1903, n.º 855 vem registar com agrado a tenacidade de dois homens que “conseguiram d’esta vez fazer vingar”, à custa dos seus esforços o velho desejo de construção de uma praça de touros. Acrescenta que dos dez contos de réis, quantia necessária para a edificação do edifício apenas faltava subscrever a quantia de setecentos mil réis, sendo digno do maior louvor o esforço, iniciativa e zelo diligenciados por estes dois homens de nome João Augusto Silvério Carapeta e Francisco das Dores Rosado. O mesmo jornal na sua edição de 5 de Março do ano seguinte, n.º 872, volta a tecer elogios a estes dinâmicos estremocenses referindo-se aos mesmos “Este importante melhoramento é sem duvida de extraordinário alcance para Estremoz… o que muito se deve aos esforços, iniciativa e zelo de dois cavalheiros…são elles os srs. Francisco das Dores Rosado e João Augusto Silverio Carapeta…”.
[15] Este caderno em duplicado e em poder da comissão administrativa continha termos de abertura e encerramento, estavam as suas folhas devidamente numeradas e rubricadas por todos os vogais da dita comissão, devendo no último dia para a inscrição dos subscritores fundadores, lavrar-se um termo de encerramento imediatamente a seguir à inscrição do último subscritor desta categoria. Dos mesmos cadernos seriam dados a cada subscritor fundador certidões, assinadas por todos os membros da comissão administrativa, das quais constasse a sua categoria, número de obrigações subscritas pelos próprios e quais os direitos que lhe assistiam por tal facto. Estas certidões constituíam para todos os efeitos os títulos que garantiam aos subscritores os direitos que por esta escritura lhes eram consignados.
[16] Em conformidade com o preceituado no artigo 1473 do Código Civil.
[17] Para a assembleia geral se constituir em primeira convocatória era necessário que estivessem presentes ou devidamente representados, subscritores que representassem pelos menos cinquenta por cento do capital que estivesse à data por amortizar. Não concorrendo número de subscritores, na primeira reunião, suficientes para as condições expostas, poderia reunir a assembleia geral em segunda convocatória e deliberar com qualquer número de subscritores presentes, fosse qual fosse o capital que representassem.
[18] O Jornal d’Estremoz dos dias 14 de Maio, 11 de Junho e 16 de Julho de 1904, n.ºs 882, 886 e 891. Acrescentava o periódico de Maio que “Se a subscripção dos dez contos não fôr coberta por mais subscriptores, e por esse motivo a praça não possa ficar concluída, no seu todo, até fins d’agosto, ficará, todavia, nas condições de poder funccionar n’esse tempo.”.
[19] O Jornal d’Estremoz do dia 21 de Maio de 1904, n.º 883 mencionava “33 alvenéos (pedreiros), 36 trabalhadores e 1 canteiro”.
[20] O Jornal d’Estremoz do dia 11 de Junho de 1904, n.º 886.
[21] No, O Jornal d’Estremoz do dia 14 de Maio n.º882 ainda era referido com previsão os dias 4 e 5 de Setembro, domingo e segunda-feira respectivamente, para as corridas de inauguração.
[22] O Jornal d’Estremoz dos dias 23, 30 de Julho e 20 de Agosto de 1904, n.ºs 892, 893 e 896 e cartaz da corrida.
[23] O Jornal d’Estremoz do dia 13 de Agosto de 1904, n.ºs 895.
[24] Inaugurada a 18 de Agosto de 1892.
[25] O Jornal d’Estremoz do dia 20 de Agosto de 1904, n.ºs 896.
[26] O Jornal d’Estremoz do dia 27 de Agosto de 1904, n.ºs 897. Na notícia aparece o termo popular “chocas” em vez de “cabrestos”. Como esta expressão não é utilizada no Alentejo e Ribatejo optei por não a utilizar.
[27] Fundo: Câmara Municipal de Estremoz - Série: 019 - Autos de Inspecção às Escolas Primárias, 1902 – 1904 - PT/AMETZ/CMETZ/Q-C/019/0001 e O Jornal d’Estremoz do dia 3 de Setembro de 1904, n.ºs 898.
[28] A distribuição dos touros para este primeiro espectáculo, segundo o cartaz das corridas foi o seguinte: o primeiro touro foi para Manuel Casimiro, o segundo para Teodoro Gonçalves e José Martins, o terceiro para Saldanha e Carlos Gonçalves, o quarto para Simões Serra e o último antes do intervalo para os bandarilheiros espanhóis. Manuel Casimiro abriu a segunda parte, enquanto Teodoro Gonçalves e Ribeiro Tomé lidaram o sétimo e Martins, Saldanha e Carlos Gonçalves tourearam o oitavo. O nono saiu para Simões Serra finalizando a corrida os bandarilheiros espanhóis.
[29] Para a segunda corrida e segundo o mesmo cartaz a distribuição dos touros foi a seguinte: Manuel Casimiro abriu o torneio seguindo-se os bandarilheiros Teodoro Gonçalves e Francisco Saldanha que tourearam o segundo enquanto o terceiro coube a José Martins e Ribeiro Tomé. Simões Serra e os bandarilheiros espanhóis fecharam a primeira parte lidando o quarto e quinto da tarde respectivamente. Abriu a segunda parte novamente Manuel Casimiro, seguindo dos irmãos Gonçalves e dos bandarilheiros espanhóis. O nono da tarde coube a Simões Serra encerrando o espectáculo Saldanha, Carlos Gonçalves e Ribeiro Tomé.
[30] O Jornal d’Estremoz do dia 10 de Setembro de 1904, n.ºs 899.
[31] O Jornal d’Estremoz do dia 17 de Setembro de 1904, n.ºs 900.
[32] Actualmente, encontram-se nas paredes oito placas de homenagem: os vinte e cinco anos de alternativa de Mestre José Maldonado Cortes e de seu filho José Francisco Macedo Maldonado Cortes (Kiko), a despedida do Mestre José Maldonado Cortes, os vinte e cinco, quarenta e quarenta e cinco anos de alternativa do Maestro João Moura, a homenagem a José Maria Cortes, antigo cabo do Grupo de Forcados de Montemor-o-Novo, figura ímpar da forcadagem, por ocasião da abertura da praça e a homenagem póstuma aos antigos forcados do Grupo de Lisboa, António Lapa e José Caraças.

sábado, 7 de dezembro de 2024

Aconteceu há 7 anos: Inscrição da Produção de Figurado em Barro de Estremoz na Lista Representativa do Património Cultural Imaterial da Humanidade

Parte da delegação portuguesa que se deslocou à República da Coreia. Da esquerda
para a direita: Luís Mourinha (Presidente da Câmara Municipal de Estremoz), Manuel
António Gonçalves de Jesus (Embaixador de Portugal na República da Coreia), António
Ceia da Silva (Presidente do Turismo do Alentejo) e Hugo Guerreiro (Director do Museu
Municipal de Estremoz e Responsável Técnico da Candidatura). Fotografia reproduzida
com a devida vénia, a partir do Facebook de António Ceia da Silva.


Importa aqui e mais uma vez, salientar o mérito daqueles a quem se deve o êxito de uma candidatura que se viria a tornar vitoriosa:
1º) Hugo Guerreiro, Director do Museu Municipal de Estremoz, que despoletou e argumentou a candidatura, a qual veio a ter êxito e que corresponde ao primeiro figurado do mundo a merecer a distinção de Património Cultural Imaterial da Humanidade.
2º) Os barristas do passado e do presente, que com o labor e criatividade das suas mãos mágicas e desde as bonequeiras de setecentos, transmitiram de geração em geração e até à actualidade, uma produção sui generis de Bonecos em barro, dita ao “modo de Estremoz”.
3.º) O escultor José Maria de Sá Lemos, que nos anos 30 do séc. XX e recorrendo à velha bonequeira Ana das Peles primeiro e ao Mestre oleiro Mariano da Conceição depois, deu um contributo decisivo para a revitalização da produção de Bonecos de Estremoz, considerada extinta desde 1921.
4º) Os estudiosos, investigadores, escritores e publicistas que com o seu esforço não deixaram morrer a memória dos Bonecos de Estremoz: Luís Chaves, D. Sebastião Pessanha, Virgílio Correia, Azinhal Abelho, Solange Parvaux, Joaquim Vermelho e outros.
5.º) Os coleccionadores, dos quais o mais destacado é Júlio dos Reis Pereira, que ao longo de décadas foram reunindo, catalogando, estudando, comparando e interpretando espécimes que viabilizaram a apresentação de uma candidatura pelo Município de Estremoz.
- BEM HAJAM!

sábado, 16 de novembro de 2024

Estórias do autor

 

Hernâni Matos (1946 - ). Desenho a carvão de Filipa da Silveira.


O presente texto integra o meu livro
publicado pelas Edições Afrontamento
no Outono de 2018


Recolector
Desde os longínquos tempos do bibe e do pião que sou recolector de objectos materiais que fazem vibrar as tensas cordas de violino da minha alma. Nessa conjuntura, tornei-me filatelista, cartofilista, bibliófilo, ex-librista e seareiro nos terrenos da arte popular, muito em especial a arte pastoril e a barrística popular de Estremoz.
Respigador nato, cão pisteiro, farejador de coisas velhas, o meu olhar cirúrgico procede sistemática e metodicamente ao varrimento de scanner no Mercado das Velharias em Estremoz, no qual sou presença habitual e onde recolecto objectos que, duma forma virtual, pré-existiam no meu pensamento.

Coleccionador
Desde os dez anos de idade que transporto na massa do sangue o espírito de coleccionador. Marca genética ou atávica, não sei, mas que veio ao de cima lá por essa idade, veio. E é um facto tão real como o odor da flor de esteva ou o castanho da terra de barro.
Coleccionar é reunir num todo, objectos que têm, pelo menos, uma característica ou funcionalidade comum. A motivação para o fazer pode ser diversa, como distintas podem ser as consequências de uma colecção. Pode ficar guardada numa caixa ou arrumada numa prateleira de estante ou mesmo numa vitrina, como também pode ser objecto de estudo numa procura de respostas, desde sempre procuradas pela alma humana.
Há objectos que, pelos mais diferentes motivos, somos levados a coleccionar. E nenhuma colecção é estática, mas antes bem pelo contrário, dinâmica, uma vez que com o porvir há que a reformular, pelo aumento do grau de exigência imposto e mesmo fruto de uma certa especialização, os quais diminuem o espectro daquilo que se colecciona.

A cartofilia como trampolim para a Etnografia.
Sou cartófilo desde que me reconheço como coleccionador e tenho-me dedicado a tópicos como a Etnografia Portuguesa, com especial incidência na Etnografia Alentejana. A Cartofilia servir-me-ia de trampolim para outros voos como a Etnografia, uma vez que a Cartofilia é um poderoso auxiliar daquela, visto os bilhetes-postais ilustrados registarem para a perpetuidade, elementos recolhidos num dado contexto geográfico, social e temporal, relativos às características de uma determinada comunidade, rural ou urbana: o seu traje, a sua faina, os seus usos e costumes, as suas festas e romarias. De resto, colecciono postais topográficos de todo o país, muito especialmente do Alentejo e predominantemente de Estremoz. O meu interesse pela Cartofilia estendeu-se à Fotografia, pelo que acabei por adquirir colecções de fotografias antigas, as quais servem para ilustrar temas sobre os quais me debruço e investigo.

Coleccionar Bonecos de Estremoz
Uma das coisas que colecciono são os Bonecos de Estremoz, os quais descobri há mais de quarenta anos. E digo que descobri, porque efectivamente, nado e medrado em Estremoz, tinha os olhos abertos, mas não via, como acontece a muito boa gente. Até que um dia, os meus olhos foram para além da missão elementar de observar o óbvio. Então a minha retina transmitiu às redes neuronais um impulso nervoso que se traduziu numa emoção com um misto de estético e de sociológico. Foi tiro e queda a minha atracção pelos Bonecos de Estremoz.
Bonecos que duplamente têm a ver com a nossa identidade cultural estremocense e alentejana, Bonecos que antes de tudo são arte popular, naquilo que de mais nobre, profundo e ancestral, encerra este exigente conceito estético-etnológico.
Bonecos moldados pelas mãos do povo, a partir daquilo que a terra dá - o barro com que porventura Deus terá modelado o primeiro homem e as cores minerais já utilizadas pelos artistas rupestres de Lascaux e Altamira no Paleolítico, mas aqui garridas e alegres, como convém às claridades do Sul.

A Bibliofilia como suporte para a Escrita
Sou bibliófilo há cerca de 50 anos, com interesses focalizados na Cultura Portuguesa, ainda que espraiados por uma vasta gama de sub-domínios: Arte Popular, Arte Erudita, Etnografia, Literatura de Tradição Oral, Poesia Popular, Poesia Erudita, Teatro, História de Portugal, História de Arte, História Local, Regionalismo, Monografias, Agricultura, Dicionários, Publicações Periódicas Nacionais, Imprensa local. Daí que possua na minha biblioteca pessoal a quase totalidade da bibliografia referida no presente livro.

Um corolário natural
Sou um homem de escrita e esta é um meio de que me sirvo para dar conta de tudo aquilo que me estimula a alma. Por isso, este livro é um corolário natural de um dos meus múltiplos percursos de vida, o de coleccionador e investigador da barrística popular de Estremoz. 

Publicado inicialmente a 16 de Novembro de 2024

sábado, 14 de setembro de 2024

A olaria tradicional de Estremoz é de se lhe tirar o chapéu


Moringue

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A olaria tradicional de Estremoz é extremamente rica em múltiplos aspectos. Na verdade, observando-a como um todo, revela-se de imediato uma grande variedade de funcionalidades, tipologias, morfologias, tipos de decoração e tamanhos.

Assim, por exemplo, a funcionalidade “recipiente para água”, depara-se imediatamente com a possibilidade de assumir várias tipologias: ânfora, barril, bilha, cafeteira, cântaro, cantil, copo, depósito, garrafa, jarro, moringue, pote, púcaro, reservatório, tronco. A qualquer uma destas tipologias, podem corresponder múltiplas morfologias, dependendo do modo como a volumetria do objecto olárico foi preenchendo o espaço tri-dimensional, à medida que o mesmo crescia na roda, até atingir a sua forma final. Daí que seja notável, por exemplo, a diversidade morfológica dos moringues. A uma tal variedade há que acrescentar a multiplicidade introduzida pelo tipo de decoração escolhido: pedrado, riscado, polido, relevado e suas possíveis combinações.

Creio que o leitor perceberá agora a razão de ser do presente texto, assim como perceberá decerto a dureza da tarefa hercúlea que constitui a recuperação da extinta olaria tradicional de Estremoz. 

Hernâni Matos

Publicado em 14 de Setembro de 2024

Pote com tampa

Depósito com tampa


Cafeteira

Ânfora


Bilha


Garrafão

Tronco

sábado, 3 de agosto de 2024

Alforge – Mercado das Velharias de Estremoz



Os burros usados outrora no transporte de carga podiam ser portadores de um “alforge”, faixa de tecido grosseiro com dois sacos nas extremidades, os quais ficavam dependurados de cada lado do animal, após o alforge se encontrar assente na “albarda”, sela grosseira cheia de palha que era aparelhada no dorso do animal.

O alforge aqui apresentado, fazia parte do recheio de um monte alentejano e foi confeccionado em tecido grosseiro com quadrados vermelhos e brancos. Encontra-se guarnecido à volta com um debrum branco e o topo dos sacos ostenta um recorte branco com um bordado cor-de-rosa. De cada uma das extremidades do saco pende uma borla cor-de-rosa.

Os sacos encontram-se monogramados com as letras “M” e “A, bordadas a linha cor-de-rosa, correspondentes decerto às iniciais do(a) proprietário(a) e cada uma das letras está ladeada por dois pés de uma flor indefinida, bordada a vermelho, cor-de-rosa e verde claro.

A decoração do alforge não faria sentido em exemplares usados no serviço diário, o que me leva a admitir que se destinava a ser usado apenas em dias festivos, como era o caso da “bênção do gado” pelo pároco da freguesia, tradição rural cuja origem se perde na memória dos tempos.

Hernâni Matos

domingo, 21 de julho de 2024

Os Bairros do Castelo e de Santiago em Estremoz, um levantamento de Rui Pimentel

 




Créditos fotográficos:
Maria Miguéns - Município de Estremoz

Este o título da exposição inaugurada ontem pelas 16 horas na Galeria Municipal D. Dinis em Estremoz e que ali estará patente ao público até ao próximo dia 15 de Setembro.

A mostra é constituída por um conjunto de fotografias e plantas arquitectónicas elaboradas pelo arquitecto Rui Pimentel do grupo CIDADE e visam estudar a zona que constitui o cerne que está na génese da cidade de Estremoz.

Ao acto inaugural, presidido pelo Presidente do Município José Daniel Sadio, compareceram cerca de duas dezenas de pessoas que ali se deslocaram atraídas pelo trabalho de Rui Pimentel, cuja actividade polifacetada transpôs há muito o domínio formal da arquitectura e se espraiou aos campos do design gráfico, cenografia para teatro, banda desenhada, ilustração, concepção de exposições, caricatura e cartoon.

Coube a Isabel Borda d’Água, directora do Museu Municipal de Estremoz, a apresentação do arquitecto Rui Pimentel, que de seguida explanou o trabalho efectuado. A finalizar, o Presidente do Município, José Daniel Sadio, agradeceu o trabalho do arquitecto Rui Pimentel e referiu-se aos desafios que se põem ao Município e às condicionantes a que este está sujeito. Verificaram-se ainda algumas intervenções por parte de alguns elementos do público, que não quiseram deixar de exprimir as suas opiniões pessoais acerca de toda a problemática suscitada pela presente exposição.

sábado, 6 de abril de 2024

LAAF - LISBON ART AND ANTIQUES FAIR 2024



Entre 12 e 21 de Abril terá lugar em Lisboa, na Cordoaria Nacional, a LAAF - LISBON ART AND ANTIQUES FAIR 2024.
Trata-se da mais prestigiada Feira de Arte e Antiguidades de Portugal, organizada pela Associação Portuguesa dos Antiquários (APA) desde os anos 90. Em 2019, o evento alterou o seu nome para a actual designação, entrando definitivamente no calendário internacional de Feiras de Arte e Antiguidades.
Nesta 21.ª edição, a Feira contará com 34 expositores;

ACHRONIMA – FÁBIO SOUSA
ÂNFORA ASIAN ART
ANTÓNIO COSTA ANTIGUIDADES
ARISTOPASSAGEM
ALBA CABRERA GALERIA DE ARTE
BARROS & BERNARD
CARLOS CARVALHO ARTE CONTEMPORÂNEA
D’OREY AZULEJOS E ANTIGUIDADES
ESPADIM 1985
GALERIA BELO-GALSTERER
GALERIA BESSA PEREIRA
GALERIA DA ARCADA
GALERIE PHILIPPE MENDES
GALERIA SÃO MAMEDE
GALERIA ULTRAMAR
ILIDIO CRUZ
ISABEL LOPES DA SILVA
J. BAPTISTA
JOANA ARANHA – ARQUITECTURA E DESIGN DE INTERIORES
JOSÉ SANINA ANTIQUÁRIO
LUÍS ALEGRIA
MANUEL CASTILHO
MANUELA VERDE LÍRIO
MIGUEL ARRUDA ANTIGUIDADES
OBJECTISMO - NUNO LOPES CARDOSO
PAB / AGUIAR-BRANCO
PJV – ART PEDRO JAIME VASCONCELOS
RICARDO HOGAN ANTIGUIDADES
ROTA DO TEMPO – JOÃO RAMADA
RUI FREIRE
SÃO ROQUE, ANTIGUIDADES E GALERIA DE ARTE
TOMÁS BRANQUINHO DA FONSECA – TBF FINE ART
TREMA
TRICANA GALERIA