sexta-feira, 26 de abril de 2024

25 DE ABRIL DE 2024: Presente!



Em 1994, na sequência do falecimento do então Presidente da Câmara Municipal de Estremoz. José Dias Sena, exerci interinamente as funções de Presidente da Assembleia Municipal de Estremoz.

Daí a minha presença ontem na Sessão Solene da Assembleia Municipal de Estremoz, incluída nas Comemorações do 50º Aniversário da Revolução de Abril.

Na sessão foi prestada homenagem a todos os Presidentes da Câmara Municipal e da Assembleia Municipal que exerceram/exercem este cargo desde a primeira eleição livre e democrática, após a Revolução de Abril de 1974 até ao presente. A homenagem foi acompanhada da atribuição de uma medalha evocativa da efeméride que foi entregue àqueles que quiseram e puderam estar presentes ou se fizeram representar.

Eu estive presente com muito gosto e tive o grato prazer de receber a medalha das mãos do Senhor Vereador Luís Pardal, o que muito me congratulou.



quarta-feira, 24 de abril de 2024

POESIA E ARTE NEO-REALISTA / A luta contra o regime


Gadanheiro. Júlio Pomar (1926-2018). Óleo sobre aglomerado de madeira. 122 × 83 cm.
 Museu Nacional de Arte Contemporânea, Lisboa.

Foi em 25 de Abril de 1974, graças à acção militar coordenada do Movimento das Forças Armadas – MFA, que foi conseguido o derrube da ditadura mais velha da Europa – o regime totalitário e fascista de Salazar e de Caetano.

O 25 de Abril foi antecedido de muitas lutas contra o regime por parte de múltiplos sectores da sociedade portuguesa. Entre eles a frente cultural de escritores e artistas plásticos, descontentes com a política cultural do regime e que integrou o chamado “Movimento Neo-realista Português”. Este surge em finais dos anos 30 e identifica-se com a oposição ao regime, afirmando-se como representante e porta-voz dos anseios das classes trabalhadoras, retratando a realidade social e económica do país e empenhando-se na transformação das condições sociais do mesmo. Nesse sentido, foca-se no homem comum, procurando saber como vivem operários e camponeses. Aborda e aprofunda temas como as desigualdades sociais e a exploração do homem pelo homem. Escrutina as injustiças e analisa o modelo social vigente. Pugna pela elevação moral dos oprimidos e deposita esperança no futuro do Homem.

Na passagem dos 50 anos do 25 de Abril de 74, tomei a liberdade, de fazer uma selecção de poemas e obras plásticas de autores neo-realistas, para divulgara aqui nas páginas do jornal E. Tal é possível, porque Abril nos restituiu a liberdade e este jornal é assumidamente um espaço de liberdade.

É a maneira encontrada de reconhecer e louvar o papel daqueles que na frente cultural antifascista lutarem e bem, com as armas que tinham na mão: as canetas e os pinceis.

Bem hajam, companheiros de estrada.

25 DE ABRIL, SEMPRE! FASCISMO NUNCA MAIS!

Hernâni Matos

Publicado no jornal E, nº 333, de 26 de Abril de 2024

 

Sem título. Manuel Ribeiro de Pavia (1907-1957). Litografia sobre papel. 1948.

Plantadoras de arroz. Cipriano Dourado (1921-1981). Serigrafia sobre papel. s/d.

Vendedeiras de Lisboa. Alice Jorge (1924-2008). Xilogravura sobre papel não numerada.
 52,5 x 41 cm. 1957. Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa.

Família. Rogério Ribeiro (1930-2008). Óleo sobre cartão. 70 x 89,5 cm. 1951.
Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa.

Apanha da azeitona. Espiga Pinto (1940-2014). Aguarela sobre papel. 41 x 26 cm.
1962. Colecção particular.

Poesia portuguesa - 127

 


 

Poema Único
Para a C...[i]

Soeiro Pereira Gomes (1909 – 1949)


Menina dos olhos grandes,
Tão grandes que neles vejo
A minha imagem e o mundo
Com que sonho e que porfio...

Menina do riso ingénuo
À porta dos lábios mudos
Como fio de água fresca
Entre o musgo duma rocha...

Menina de tez morena
Que o sol beija e mais ninguém
E de corpo tamanino
E de rosto tão bonito...

- Porque usas carrapito?
P'ra realçar teus encantos
Que são tantos, tantos, tantos
Como estrelas há no céu?...

Menina do meu enleio
Menina doutras meninas
Que tenho nos olhos tristes:
- Solta as tranças, vai cortar
(Não dói nada... e é mais bonito)
Vai cortar o carrapito!

Soeiro Pereira Gomes (1909 – 1949)

Hernâni Matos



[i] Poema datado de 20/07/1949, dedicado a Cândida Ventura (1918 – 2015), que então usava o pseudónimo “Carlota”.


terça-feira, 23 de abril de 2024

Poesia Portuguesa - 126

 



Ser
Luís Veiga Leitão (1912-1987)

Vir à luz em partos duros
- ser erva rasgando a pele
granítica dos muros

Viver em grades desterros
e ser um raio de sol
por entre os ferros

E quando tudo se for
morrer pela madrugada
com a raiz de uma flor
na mão cerrada

Luís Veiga Leitão (1912-1987)

Poesia Portuguesa - 125

 




Cigarra
Luís Veiga Leitão (1912-1987)

Esta não é a filha do sol
com pernas e pés de marinheiros
subindo às árvores das herdades.
Esta é preciso ouvi-la dias inteiros
aquém das grades.

Esta
não chama para os campos doirados
onde o canto é livre e aquece, morno.
Mas para silêncios hirtos e cerrados
com fardas e armas em torno.

Desde o sinal das auroras
até à noite que plange
amortalhando as horas,
seu canto não canta, range…

Ó cigarra das torvas claridades!

Seus cantos só pode cantá-los
a boca de pedra e dentes ralos
do ferro nas grades.

Luís Veiga Leitão (1912-1987)

Poesia portuguesa - 124


 

Vestidos de pedra
Luís Veiga Leitão (1912-1987)

Saber que estão vestidos de pedra
botões de ferro casas de sombra
áspero forro do silêncio

Não basta saber que estão encerrados
num punho de pedra esmagando o sol

Não basta saber É preciso ver
aquém dos olhos adentro da voz
e retratá-lo no sangue
– entre a manhã e a janela
              o pão e a boca
              a parede e a rua
              a mão e a ferramenta

Retratá-los no sangue
é despir-lhes a roupa de pedra
é desabotoá-los da sombra

e livres e verdadeiros
respirá-los no ar nos rios
e tê-los por companheiros

(Não basta saber que estão encerrados
num punho de pedra esmagando o sol)

Luís Veiga Leitão (1912-1987)

Poesia Portuguesa - 123

 




A uma bicicleta desenhada na cela

Luís Veiga Leitão (1912-1987)

Nesta parede que me veste
Da cabeça aos pés, inteira,
Bem hajas, companheira,
As viagens que me deste.

Aqui,
Onde o dia é mal nascido,
Jamais me cansou
O rumo que deixou
O lápis proibido…
Bem-haja a mão que te criou!
Olhos montados no selim
Pedalei, atravessei
E viajei
Para além de mim.

Luís Veiga Leitão (1912-1987)