A Escrita como Instrumento de Libertação do Homem
[1]
“Gandaia” é um termo pertencente à gíria popular, cujo significado é: “Acto de remexer o lixo à procura do que nele se pode aproveitar”.
[2] Sinopse recolhida em https://tradestories.pt/carlos-lopes/livro/gandaia .
Há alguns anos atrás, em conversa amiga e habitual com o artesão oradense João Catarino, foi-me dito por este que estava à venda num antiquário de Borba, uma colher antiga em madeira, bordada com a imagem de Nossa Senhora [1]. Disse-me ainda, mais ou menos isto: “O professor é coleccionador, mas se não a comprar, compro-a eu, que aquilo é coisa antiga, feita por alguém da minha terra”. Como não deixo os meus créditos por mãos alheias, lá fui ao antiquário para “abrir os cordões à bolsa” e comprar a linda colher, cuja descrição passo de imediato a fazer.
Colher de madeira com 17 cm de comprimento, em cujo cabo encimado por uma cruz, figura a imagem lavrada de Nossa Senhora da Orada. Junto
à base do manto, as iniciais "JT" do artesão Joaquim
Teodoro da Cruz [2],
inscritas num coração, o que decerto simbolizará a devoção do artista popular
por aquela imagem de Nossa Senhora.
Próximo da zona de ligação do
cabo à concha, as inscrições "ORADA" e "1940", distribuídas por duas linhas.
1940 foi o ano da "Exposição
do Mundo Português", que teve lugar de 23 de Junho a 2 de Dezembro de
1940. Foi um evento realizado em Lisboa durante o regime do Estado Novo, com o
propósito de comemorar simultaneamente as datas da Fundação do Estado Português
(1140) e da Restauração da Independência (1640).
ORADA é a aldeia da naturalidade
de Joaquim Teodoro da Cruz, que terá participado na Exposição na qualidade de
artesão.
A vila de Orada participou em 30
de Junho desse ano no “Cortejo Histórico do Mundo Português” (https://www.youtube.com/watch?v=yZg3f-4NXac),
o qual teve lugar no recinto da Exposição e foi criado e encenado por Henrique
Galvão.
A vila da Orada ficara, de resto, classificada em 2.º lugar no concurso "A aldeia mais portuguesa de Portugal"(https://books.openedition.org/etnograficapress/569), organizado em 1938 pelo Secretariado de Propaganda Nacional (SPN). A apresentação da vila da Orada ao júri do concurso, decorreu a 2 de Outubro de 1938 e pode ser visualizada no extracto do filme "A Aldeia mais Portuguesa de Portugal" (https://www.facebook.com/watch/?v=1103185636453994), realizado por António de Menezes, em 1938.
[1] Nossa Senhora
da Orada é Padroeira da Freguesia da Orada no concelho de Borba e é venerada na
Igreja de Nossa Senhora da Orada, que segundo a tradição terá sido fundada pelo
Condestável D. Nuno Álvares Pereira, o qual no local terá orado antes de partir
para a Batalha dos Atoleiros, da qual o exército português saiu vitorioso. De
salientar que o condestável era o donatário daquelas terras e a Igreja já aparece
referenciada no século XVI.
[2] A
identificação do autor a partir das iniciais foi feita após conhecimento de
outra colher, identificada por Vitor Tavares Santos
(https://www.facebook.com/photo/?fbid=10212487299973993&set=g.1505900599500258),
o qual conheceu o artesão quando vivia em Cacilhas no andar superior do antigo
Quartel de Bombeiros. A Vitor Tavares Santos os meus agradecimentos.
Guardador de memórias de arte pastoril alentejana, sob a
epígrafe QUANDO A CORTIÇA SE TRANSFORMA EM ARTE, publiquei recentemente no Facebook,
as imagens de 3 quadros em cortiça, pertencentes ao meu acervo de arte pastoril
alentejana, os quais mereceram o apreço generalizado de amigos e seguidores.
Uma dessas pessoas foi a minha estimada amiga Manuela Mendes,
que há muito assumiu o Compromisso de Salvaguarda da Memória da Fábrica Robinson
de Portalegre, que muito justamente considera a verdadeira JOIA da COROA de
Portalegre. Como comentário à terceira publicação que eu fiz dos meus quadros
de cortiça, perguntou:
- “E este Prof? Um dos muitos exemplares de grande
formato feito em Portalegre na primeira metade do séc. XX.”
Referia-se a uma folha de calendário para os meses de Maio e
Junho de 1963, impresso em aglomerado de cortiça e editado pela Fábrica
Robinson de Portalegre (Fig. 2).
A minha resposta foi a seguinte:
Manuela:
Este quadro (Fig. 1)
é de tal maneira extraordinário, que se situa num patamar superior a tudo
aquilo que me é dado conhecer.
A moldura é em cortiça.
A orla que ladeia
interiormente a moldura é um autêntico filigrana do mesmo nobre material.
O tema do quadro é o registo etnográfico do “Ciclo
da cortiça” nas suas diferentes fases em tempos de antanho, com a particularidade de os
intervenientes no ciclo estarem representados por figurinhas esculpidas em
madeira.
Onde parará esta jóia da arte pastoril alentejana? Quem terá sido o seu
criador? São duas perguntas (im)pertinentes, que ficam à espera de resposta.
Se me autorizar a
reproduzir a imagem e se não se importar, após adaptação publicarei o presente
texto no meu blogue.
Bem-haja. Um forte abraço
deste caminheiro e guardador de memórias da arte pastoril alentejana, que
admira todo o seu trabalho em prol da preservação da Memória da Fábrica Robinson
de Portalegre.
E a autorização chegou.