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sábado, 3 de fevereiro de 2024

António Cunhal (1910-1932), artista plástico neo-realista


António Cunhal (1910-1932). Semeador. Desenho a tinta-da-china
sobre cartolina. Assinado e não datado. Colecção particular.


Um Cunhal menos conhecido
ANTÓNIO CUNHAL (1910-1932), natural de Coimbra, faleceu em Lisboa em 1932, vítima de tuberculose e gangrena pulmonar. Filho de Avelino Cunhal (1887-1966) e irmão de Álvaro Cunhal (1913-2005), advogados, políticos, escritores e artistas plásticos neo-realistas.

Artista plástico
Com 21 anos de idade, António Cunhal expôs 26 trabalhos seus no Salão “PINTURAS E DESENHOS DE ANTÓNIO CUNHAL”, patente ao público entre 1 e 15 de Junho de 1931, na prestigiada Papelaria Progresso, situada na Rua do Ouro 151 a 155, em Lisboa.
Nesse salão esteve exposto o desenho aqui reproduzido, pertencente à colecção do Dr. Fernando Abranches Ferrão (1908-1985).
É corrente afirmar-se que o neo-realismo surgiu em Portugal no final dos anos 30. Ora, “O semeador” de António Cunhal é anterior aquela data e eu não tenho dúvida alguma que o conteúdo temático da representação, nos leva a inclui-la no neo-realismo e consequentemente a considerar António Cunhal um artista plástico neo-realista.
António Cunhal está representado no Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian em Lisboa e em colecções particulares.

Cinesta de animação
António Cunhal realizou em 1930 com Raul Faria da Fonseca, o filme de animação “A lenda de Miragaia”. O argumento é da autoria de ambos, inspirado no Romanceiro de Almeida Garrett. Baseia-se numa lenda popular que relata como o rei Ramiro II de Leão raptou a princesa moura Zahara e como o seu irmão Alboazar raptou a esposa de Ramiro, a rainha Gaia.
Trata-se do primeiro filme de animação português, recorrendo à técnica inovadora de animação de silhuetas recortadas, as quis foram fotografadas uma a uma para criar o movimento.
O filme, com 400 metros de extensão, era constituído por 24 800 fotogramas, que representavam outros tantos desenhos e movimentos.
“A Lenda de Miragaia”, produção da Ulyssea Film, estreou-se em Lisboa, no Jardim Cinema, a 1 de Junho de 1931.

Epílogo
Talvez a obra de António Cunhal merecesse uma investigação apurada, visando concluir se é ou não um artista plástico neo-realista, tal como eu aqui o proclamo.

terça-feira, 7 de novembro de 2023

FEIRA DE OUTONO / APA - Arte e Antiguidades





Entre 15 e 19 de Novembro, terá lugar em Lisboa, no edifício da Sociedade Nacional das Belas Artes, em Lisboa, a 4ª edição da “FEIRA DE OUTONO – APA, Arte e Antiguidades”. Trata-se duma iniciativa da Associação Portuguesa dos Antiquários (APA).
Nesta 4.ª edição, a Feira contará com 15 expositores, número que é o maior de sempre.
A Comissão Organizadora realizou uma cuidadosa e criteriosa selecção de expositores e todas as obras foram sujeitas a peritagens realizada por especialistas nas diversas áreas, garantindo assim a sua autenticidade e qualidade.
A realização desta FEIRA DE OUTONO vem colmatar a inexistência de uma feira de referência no centro da capital, com a garantia de qualidade que a APA nos tem vindo a habituar ao longo de mais de 30 anos.
Informação pormenorizada pode ser obtida, clicando na lista de expositores por ordem alfabética
Ilídio Cruz
O horário de funcionamento é o seguinte: Quarta a Sábado, das 13h às 21h e Domingo, das 13h às 19h.

segunda-feira, 26 de junho de 2023

Sessão evocativa de Aníbal Falcato Alves

 

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Aníbal Falcato Alves (1921-1994). Fotografia do cineasta Manuel Costa e Silva (1938-1999).
No próximo dia 2 de Julho, pelas 15 h, terá lugar no Auditório da Biblioteca Municipal de Estremoz, uma sessão evocativa da vida e obra do estremocense Aníbal Falcato Alves. O encontro visa recordar a sua faceta de Homem de Cultura, a sua obra, o seu papel e legado na recolha e preservação das tradições, da gastronomia e dos costumes do Alentejo, assim como o seu papel de resistente antifascista e a sua acção como militante comunista.
O evento é promovido pela Comissão Concelhia de Estremoz do PCP e do programa consta:
- 15 h - Abertura de Portas;
- 15 h 30 min - Momento cultural: “Palavras de Abril” (com Débora Soares, Inês Siquenique e José Lourido);
- 16 h - Intervenções da mesa: NOEL MOREIRA (membro da Comissão Concelhia de Estremoz do PCP e do Executivo da DOREV do PCP), JOSÉ GUERREIRO (sociólogo e ex-Presidente da Câmara Municipal de Estremoz), ABÍLIO FERNANDES (militante do PCP e ex-Presidente da Câmara Municipal de Évora), JOAQUINA BABAU (moderadora, membro da Comissão Concelhia de Estremoz do PCP);
- 16 h 45 min - Intervenções do Público;
- 17 h 30 min - Tinto de honra e mostra das obras de Aníbal Falcato Alves;
- 18 h 30 min - Encerramento da sessão evocativa.
O período destinado a intervenções do público, programado para depois das intervenções da mesa, destina-se a que os presentes que o desejarem, possam intervir, partilhando experiências, estórias ou aprendizagens com Aníbal Falcato Alves, não devendo as intervenções exceder os 5 minutos.

Hernâni Matos

sábado, 27 de maio de 2023

"O Alentejo e a Cultura: que futuro?" - Manifesto contra o desmantelamento da DRCA

 

Direcção Regional de Cultura do Alentejo, Évora. Fotografia de Pedro Roque (2020),
recolhida através do Google e aqui reproduzida com a devida vénia.

Ao anúncio da extinção da Direção Regional de Cultura do Alentejo e da sua integração na Comissão de Desenvolvimento Regional do Alentejo, um grupo de homens e mulheres, com raízes no Alentejo, respondeu com um protesto contra o que consideram um “clamoroso erro”. O resultado é o manifesto que aqui se publica, subscrito por muitas dezenas de cidadãos, entre as quais figuras conhecidas, como os historiadores António Borges Coelho e António Ventura, os músicos Vitorino, Janita Salomé e Francisco Fanhais, autarcas, escritores, atores e de inúmeras outras profissões.

"O Alentejo e a Cultura: que futuro?'

Sendo do conhecimento público que está prevista a integração da(s) Direcção Regional de Cultura na(s) Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional, os subscritores, defensores da sua importância como organismo autónomo, decidem manifestar-se através do presente documento.
Para um país cronicamente preocupado com os elevados índices de pobreza e dos parâmetros de bem-estar e desenvolvimento económico, aquém da média europeia, tudo o que à Cultura respeita é relegado para plano secundário, sem que, da parte dos decisores políticos, exista sensibilidade e percepção do erro em que persistem. Não obstante, e apesar dessa indiferença, ela “move-se” e, mesmo no interior do país, em acelerado ritmo de envelhecimento e de desertificação, são as práticas culturais, tais como a gastronomia, o artesanato, as tradições religiosas e profanas e inúmeras formas de actividades laborais e de transformação tradicionais, da carne, do leite e do vinho, mas, também, do empenho artístico do povo, no que respeita ao teatro, à música, à dança, ao folclore, que, associadas a monumentos de vária ordem e a sítios arqueológicos inseridos em importantes e ricas paisagens, movimentam e, em não poucas situações, sustêm, economicamente, lugares e terras e prendem, ainda, os seus habitantes a lugares cujo sustento de outrora desapareceu, na voragem de outros paradigmas económicos e sociais.
Com cerca de um terço do território nacional, o Alentejo foi palco de passagem e habitat de inúmeros povos, os quais deixaram vestígios abundantes da sua actividade, da sua organização social e das suas práticas “divinas”. O Alentejo e as suas gentes são, hoje, um caldo de Cultura que deriva do convívio e apropriação de técnicas de muitas origens e que resulta numa riqueza ímpar, que há que preservar, estudar e desenvolver.
Com uma economia assente na produção agrícola, ao longo de séculos, e numa divisão do território profundamente desigual e injusta, da qual resultou a concentração da riqueza num reduzido número de famílias e uma pobreza extrema da esmagadora maioria dos Alentejanos, restou a esperança e a luta por melhores condições de vida, mas que, por fim, na década de 50/60 do século XX, gerou o êxodo para o litoral do país e para o estrangeiro.
O Alqueva, que se propunha democratizar a exploração e a posse da terra, foi uma desilusão que o presente e o futuro se encarregam de demonstrar, com a introdução de culturas nocivas para a natureza, o ambiente, o património e a paisagem, parecendo haver ainda uma maior concentração da posse da terra, agravada pela sua venda a pessoas e grupos estrangeiros, numa dimensão nefasta, de cujos proventos nada sobra, nem para o Alentejo, nem para o país.
A aposta parece ser, pois, antes que aconteça o impensável – alienar o património ao capital estrangeiro, tal como à terra se fez –, a de que se defenda esse património único.
Património que, nas suas diferenciadas formas de apresentação e manifestação, é um denominador comum para os Alentejanos, enquanto identidade colectiva e regional.
Defender este legado é manifestar solidariedade institucional e reconhecimento, a todos aqueles que fizeram, e fazem, do seu quotidiano uma luta, sem tréguas, contra a desertificação da memória e do território e que, incompreensivelmente, são esquecidos por quem decide e traça, a régua e esquadro, políticas estranhas à realidade dos seus dias e do seu futuro.
A estratégia de defesa, manutenção e desenvolvimento cultural exige, dos poderes públicos, uma atenção redobrada, com o envolvimento de técnicos e especialistas, empenhados cientificamente na abordagem necessária e nas diferentes fases da sua indispensável intervenção, do mesmo modo que, na sua abordagem técnica, se exige, no campo da deliberação e da gestão, equipas com profundo conhecimento científico e estratégico, para a necessária decisão de prioridades. Acresce a imprescindível apetência para o diálogo, com particulares, autarquias, clero, técnicos e outros intervenientes. No fundo, uma proximidade com grande parte dos decisores, assim como com associações, agentes culturais e público.
Tem mantido estas funções a Direção Regional de Cultura do Alentejo, na qual temos sentido um comportamento sério, altamente responsável e de grande empenho e que, apesar da crónica falta de verbas, tem sabido e procurado manter a causa da Cultura, no Alentejo, um organismo vivo e ao serviço da comunidade e do seu desenvolvimento, assim como da sua história e da defesa de valores considerados da sua identidade e memória.
É, pois, um sinal de alerta e de grande preocupação para os signatários o desmantelamento previsto da Direção Regional de Cultura do Alentejo e a sua integração na Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Alentejo. Não parece avisado politicamente que um organismo desta natureza, que tem cumprido, com rigor e competência, ao longo de décadas, a gestão do património e a promoção das mais diversas iniciativas culturais, dê lugar a uma amálgama de organismos não explicados, até ao momento, mas cuja legislação já está em marcha, nomeadamente, pela Lei n.º 58/2018, de 21 de Agosto, e pela Lei n.º 27/2022, de 17 de Junho.
Tal como os seres humanos, poderíamos dizer que o território, para além do seu aspecto físico, também tem espírito e é necessário zelar pela sua manutenção. Será que, a par da alienação da terra, com monoculturas estranhas à região, exaurindo até ao limite recursos hídricos, vamos assistir, impávidos e serenos, a um retrocesso cultural, devido a políticas mal calculadas ou intencionalmente canhestras, para atingir desígnios ainda não esclarecidos?
É tempo de exigirmos respostas às tutelas políticas sobre o que se pretende, e de exigir a salvaguarda de quanto se fez até aqui, com o esforço e a criatividade de muitas gerações, do nosso tempo e dos que nos precederam. Em sua memória, é imperioso o protesto e a exigência do respeito que a Cultura nos deve merecer.

terça-feira, 9 de maio de 2023

Exposição: "Pr'Além do Tejo" - Pinturas de Fátima Mateus

 


Transcrito com a devida vénia dr
newsletter do Município de Estremoz,
de 04 de Maio de 2023.

“Pr ‘Além do Tejo" é o nome da exposição de pintura de Fátima Mateus, que é inaugurada no dia 12 de maio, pelas 16:00 horas, no Museu Municipal de Estremoz.
A artista, natural de Azeitão, viveu grande parte da sua vida no Alentejo e descreve-o da seguinte forma: "Bastou uma ida à serra d'Ossa para me voltar a apaixonar pelo Alentejo, numa recaída inesperada. Pensei que essa relação, que durara mais de trinta anos, estava arrumada, na minha cabeça, e no meu coração. Devia ter sabido que, com raízes tão profundas, havia de voltar à superfície algum dia. Quando fomos viver juntos era eu criança a entrar na adolescência e já o Alentejo era velho, muito velho! Não foi amor à primeira vista, nem à décima primeira...foi uma relação que fomos construindo, dia a dia, feita de dias bons, maus e assim assim. Mas houve momentos deslumbrantes, de serões frios à braseira em noites longas. Manhãs radiosas e dias abrasadores, luas enormes em céus tão estrelados. As cores do pôr do sol nas planícies sem fim. O cheiro da terra molhada das primeiras chuvas, as hortas férteis e os pomares de fruta madura ... Crescemos juntos. O início foi difícil, mas depois fomo-nos habituando, devagarinho. Algumas vezes fugi, mas voltei, sempre com a sensação de voltar a casa. Só estes últimos anos de separação trouxeram uma distância, e em ocasionais visitas, a estranheza de chegar a uma casa que não a minha, tão perto de mim, mas tão longe... Por isso me surpreendeu este sentimento recente, de querer ficar, de querer fazer o caminho de volta. De volta a casa." Francisca Mateus
A mostra irá estar patente até dia 9 de julho de 2023, numa organização do Município de Estremoz com o apoio da ARTMOZ.

sexta-feira, 28 de abril de 2023

LAAF - LISBON ART AND ANTIQUES FAIR 2023




Entre 5 e 13 do próximo mês de Maio, terá lugar em Lisboa, na Cordoaria Nacional, a LAAF - LISBON ART AND ANTIQUES FAIR 2023.
Trata-se da mais prestigiada Feira de Arte e Antiguidades de Portugal, organizada pela Associação Portuguesa dos Antiquários (APA) desde os anos 90. Em 2019, o evento alterou o seu nome para a actual designação, entrando definitivamente no calendário internacional de Feiras de Arte e Antiguidades.
Nesta 20.ª edição, a Feira contará com 32 expositores nacionais e estrangeiros, entre antiquários e galerias de arte contemporânea, para além de dois Museus: o Museu Nacional de Arte Antiga e a Fundação Arpad Szenes – Vieira da Silva, três editoras e uma programação alargada que inclui espaços de debate sobre arte e coleccionismo - as “Conversas Sobre Arte” - apresentadas por especialistas e abertas ao debate e troca de opiniões, assim como exposições temáticas, visitas guiadas, concertos, lançamentos de livros e revistas, entre outros, que fazem deste evento um espaço único para ver, comprar, aprender e falar sobre Arte e Antiguidades.
A duração do certame é de 9 dias, ao longo dos quais os visitantes poderão apreciar milhares de obras de arte num único local. A Comissão Organizadora realizou uma cuidadosa e criteriosa selecção de expositores e todas as obras foram sujeitas a peritagens realizada por especialistas nas diversas áreas.
Informação pormenorizada pode ser obtida, clicando na lista de expositores por ordem alfabética: ANFORA ASIAN ART, ANTÓNIO COSTA ANTIGUIDADES, BARROS & BERNARD, CARLOS CARVALHO ARTE CONTEMPORÂNEA, D’OREY TILES. ESPADIM 1985, GALERIA BELO-GALSTERER, GALERIA BESSA PEREIRA, FINE ART AND FURNITURE, GALERIA DA ARCADA - ANTÓNIO BOUZA, GALERIA SÃO MAMEDE, GALERIE PHILIPPE MENDES. ILÍDIO CRUZ, ISABEL LOPES DA SILVA, J. BAPTISTA. JOÃO RAMADA - ANTIGUIDADES. JOSÉ SANINA ANTIQUÁRIO , KUKAS BY CASA FORTUNATO, LUÍS ALEGRIA, MANUEL CASTILHO. MANUELA VERDE LÍRIO, MIGUEL ARRUDA ANTIGUIDADES, OBJECTISMO, OITOEMPONTO , PAB / AGUIAR-BRANCO , PEDRO JAIME VASCONCELOS, PORCELANA DA CHINA DE MARIA EDUARDA MOTA , RICARDO HOGAN ANTIGUIDADES, RUI FREIRE - FINE ART, LISBOA , SÃO ROQUE, ANTIGUIDADES E GALERIA DE ARTE, TBF FINE ART - TOMÁS BRANQUINHO DA FONSECA. TREMA ARTE CONTEMPORÂNEA, TRICANA GALLERY.
O horário de funcionamento é o seguinte: - 5 e 6 de Maio, das 15 h às 23 h: - 7 a 13 Maio, das 15 h às 21 h.

terça-feira, 27 de setembro de 2022

Esta é a estória de ser coleccionador



Ando sempre à "coca" de coisas que povoam o meu imaginário. Nessas andanças descubro também, coisas que nunca me passou pela cabeça que pudessem existir e outras que jamais pensei que pudessem vir até mim. Sim, porque por vezes, as coisas vêm até mim, sem as procurar. É como se eu as atraísse e há coisas a que de modo algum consigo resistir..
Tenho o coleccionismo na massa do sangue. Sou geneticamente um coleccionador e cumulativamente um contador de estórias, não só de estórias reais, mas também das estórias que as coisas me contam sobre os segredos que a sua existência encerra. Bom e há ainda também as estórias que eu invento, que me nascem, florescem e frutificam na cabeça. São estórias e mais estórias...

quinta-feira, 15 de setembro de 2022

Falem português, por favor

 



“Minha Pátria é a Língua Portuguesa´´
Fernando Pessoa

Colonização linguística
A função de uma língua é servir como um meio de comunicação claro e eficaz, o que exige que se fale e se escreva de forma clara, de modo a conseguir que as outras pessoas compreendam.
Acontece que em Portugal estamos a ser bombardeados com estrangeirismos e muito em especial por anglicismos, veiculados maioritariamente pelos meios de comunicação social e que dificultam ou bloqueiam a compreensão dos conteúdos.
Estamos perante uma agressiva operação de colonização linguística, tanto mais grave quanto mais desnecessária e descabida é, já que na esmagadora maioria das situações, existem termos ou expressões portuguesas, equivalentes aos anglicismos.
Uma tal operação de colonização não é de modo algum aceitável, nem mesmo em nome da globalização, apregoada por alguns como uma fatalidade irreversível. É que essa colonização promove a dicotomia da sociedade em dois estratos com poderes diferenciados, fruto das suas diferentes permeabilidades linguísticas aos anglicismos.
A preservação da nossa identidade cultural enquanto povo soberano, exige a defesa da língua portuguesa, o que entre outras coisas, passa pela denúncia e pelo combate à utilização abusiva e desnecessária desses anglicismos. É essa a missão que assumo no presente texto, com a profunda convicção de que “A língua de um povo é a sua alma”, tal como nos ensina o filósofo alemão Johann Fichte.

Anglicismos desnecessários
Longe de constituir um inventário exaustivo de anglicismos desnecessários, tarefa assaz ciclópica, dada a extensão do mesmo, a presente listagem corresponde apenas a anglicismos nos quais os meus olhos e ouvidos tropeçaram ultimamente: background (pano-de-fundo), backoffice (retaguarda), backup (cópia de segurança), best seller (o mais vendido), black friday (sexta-feira negra), booking (reserva), boss (chef), briefing (resumo), bug (falha informática), bullying (intimidação sistemática), by pass (variante), call girl (acompanhante), casting (pré-selecção), CEO (director executivo), checklist (lista de controlo), check-out (registo de saída), chek up (exame médico completo), chek-in (registo de entrada), coffee break (pausa para café), cool (fresco), data (dados), database (base de dados), delete (excluir), delivery (entrega a domicílio), DJ (animador musical), download (descarga de dados), e-mail (correio electrónico), entertainer (animador), expert (especialista), fake news (notícias falsas), fast-food (comida rápida), franchising (franquia), front (frente de batalha), full screen (tela cheia), happening (evento), hi-fi (alta fidelidade), hi-tech (alta tecnologia), home page (página principal), hosting (hospedagem), input (entrada), jet set (colunáveis), job (trabalho), keyboard (teclado de computador), keyword (palavra chave), know-how (saber-fazer), lay-off (período de inactividade), leading edge technology (tecnologia de ponta), lifestyle (estilo de vida), light (leve), link (ligação), lobby (ante-sala), log in (início da sessão), log out (fecho da sessão), look (aspecto), low cost (baixo preço), make-up (maquiagem), must (necessidade, obrigação), nickname (apelido), online (ligado á internet), open air (ar livre), open market (mercado aberto), output (saída), part-time (tempo parcial), performance (desempenho), performer (artista), pet (animal de estimação), playboy (libertino), player (jogador(a)), playoff (eliminatória), pocket book (livro de bolso), post (publicação), post it (nota adesiva), rating (avaliação), replay (repetir), resort (estância turística), rooming (alojamento conjunto), running (corrida), sale (liquidação), score (pontuação), screening (triagem), set (parte), show (espectáculo), site (sítio), stand by (espera), stock-off (escoamento de stock), streaming (transmissão), talk (conversa), team (equipe), team leader (capitão da equipe), top model (supermodelo), trash (lixo), truck (camião), update (actualização), upgrade (melhoria), upload (envio), vídeo mapping (projecção de vídeo), vintage (clássico), voucher (vale de desconto), website (sítio web), weekend (fim de semana), wireless (sem fio), workshop (oficina), zoom in (ampliar tamanho da tela), zoom out (reduzir tamanho da tela).

O assassínio da língua
No poema “LAMENTO PARA A LÍNGUA PORTUGUESA”, o poeta Vasco Graça Moura confessa: “não és mais do que as outras, mas és nossa, / e crescemos em ti. nem se imagina / que alguma vez uma outra língua possa / pôr-te incolor, ou inodora, insossa, / ser remédio brutal, mera aspirina, / ou tirar-nos de vez de alguma fossa, / ou dar-nos vida nova e repentina. / mas é o teu país que te destroça, / o teu próprio país quer-te esquecer / e a sua condição te contamina / e no seu dia a dia te assassina.”.

E em Estremoz?
Integrada na Feira Internacional de Desporto de Estremoz - FIDMOZ, decorreu no passado dia 12 de Junho, a “ESTREMOZ FUN RUNNING”, organizada pelo Município de Estremoz e pelas associações desportivas “Sobe e Desce Team” e “Rota D’Ossa”. A iniciativa visava conjugar a actividade física com diversão. A partida teve lugar pelas 17 horas, no Parque de Feiras e Exposições de Estremoz, percorreu diversas ruas da cidade e terminou no local onde começara.
Nos passados dias 7 e 8 de Agosto teve lugar no Parque de Feiras e Exposições de Estremoz, uma exposição de cerca de 80 camiões, que no final do último dia, desfilaram pelas ruas da cidade. O evento, designado por “ESTREMOZ TRUCK FESTIVAL”, foi uma organização conjunta da Câmara Municipal de Estremoz e da Associação Humanitária de Bombeiros Voluntários de Estremoz.
Entre 8 e 20 de Agosto teve lugar o “TORNEIO DE TÉNIS SÃO LOURENÇO OPEN 2022”, que decorreu no campo Polidesportivo de S. Lourenço de Mamporcão e S. Bento de Ana Loura. Tratou-se duma organização conjunta do Município de Estremoz e da Junta de freguesia local.
Apesar do respeito que me merecem tanto os organizadores como os participantes dos três eventos referidos, não posso deixar de considerar que na designação dos mesmos foram utilizados anglicismos desnecessários, já que as respectivas designações podiam ter sido atribuídas na nossa língua-pátria. Com uma tal desejável opção, os eventos teriam sido e muito bem designados por “CORRIDA ALEGRE DE ESTREMOZ”, “FESTIVAL DE CAMIÕES DE ESTREMOZ” e “TORNEIO ABERTO DE TÉNIS DE SÃO LOURENÇO”. Os eventos teriam sido exactamente os mesmos, igualmente dignos de público apreço, apenas com a importante diferença de não ter sido abastardada a língua portuguesa.

Súplica final
Por quê falar mal ou escrever mal, se é possível falar bem e escrever bem. Fazê-lo é “Vender gato por lebre”, como proclama um velho adágio, ao qual acrescento este outro: “Quem mal fala, sua língua suja.”. Daí que vos suplique:
- FALEM PORTUGUÊS, POR FAVOR.

Publicado no jornal E nº 295, de 15 de Setembro de 2022

segunda-feira, 12 de setembro de 2022

Rua do Outeiro, berço de barristas

 

Rua do Outeiro (1944). Roberto Augusto Carmelo Alcaide (1903-1979).


Como é sabido, sou assíduo frequentador do Mercado das Velharias em Estremoz. Ali tenho comprado coisas invulgares, umas pré-existentes na minha mente, outras descobertas por mero acaso. Foi o que aconteceu há cerca de 20 anos com uma pintura que me aqueceu a alma como investigador da barristica popular estremocense. Daí que a tenha utilizado como imagem de abertura do meu livro “Bonecos de Estremoz”, publicado em 2018 pelas edições Afrontamento. Trata-se da Rua do Outeiro (1944), um gouache sobre cartão (27 cm x 19 cm), da autoria de Roberto Augusto Carmelo Alcaide (1903-1979), autodidacta, caricaturista, maquetista, cenógrafo e dramaturgo. Casado com a poetisa Maria Palmira Osório de Castro Sande Meneses e Vasconcellos (1910-1992), que sob o pseudónimo Maria de Santa Isabel, publicou obra poética, a qual inclui: Flor de Esteva (1948), Solidão Maior (1957), Terra Ardente (1961), Fronteira de Bruma (1997), Poesia Inédita (A editar).
Nascido em 1946, tive o privilégio de conhecer em vida, não só a poetisa como o seu esposo, pertencente como eu a ramos distintos da Família Carmelo, ele da 9.º geração e eu da 10.ª.
Da rua do Outeiro, rua de oleiros e bonequeiras, nos fala a “Marcha do Outeiro”, vencedora do concurso de Marchas Populares de Estremoz, em 1948: “O outeiro iluminado / de rubras malvas bordado, / tanta graça Deus lhe pôs!) / que foi berço das primeiras / fantasias das oleiras / nos bonecos de Estremoz!”. A letra da marcha era da autoria de Luís Rui, pseudónimo literário de Joaquim Vermelho (1927-2002), que se tornaria um destacado estudioso da barrística popular estremocense.


Roberto Augusto Carmelo Alcaide (1903-1979).

quinta-feira, 29 de abril de 2021

“Confinamento” de João Reis na Casa de Estremoz

 

João Reis


“Confinamento” é o título da Exposição de Pintura do conhecido médico local João Reis, patente ao público na Casa de Estremoz entre 1 e 30 de Maio do ano em curso. 
João Reis é natural de Abrantes onde nasceu em 1953 e estremocense adoptivo por nesta última cidade se ter fixado nos anos 70 do século passado, passando aqui a desempenhar as funções de Médico de Família.
Remonta a essa época o nosso conhecimento mútuo, já que o Dr. João Reis me concedeu simultaneamente os privilégios da sua amizade e de ser meu Médico de Família, qual deles o mais importante. A amizade surgiu espontaneamente e cimentou-se na sequência de convívio proporcionado pelo coleccionismo de selos de correio. Daqui resultou um espírito de confiança mútua que esteve na origem de o ter escolhido como Médico de Família e de me ter aceite como seu paciente. Para além da amizade, sempre o encarei como um profissional competentíssimo com qualidades humanas que passavam pela capacidade de auscultação dos problemas de cada um e por um diálogo pedagógico subsequente que inspirava confiança e que levava a seguir com êxito as suas prescrições médicas. 
O Dr. João Reis aposentou-se em 2020, tendo terminado a sua carreira como Presidente do Conselho de Administração da Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano, cargo que desempenhava desde 2017. Pelo meio ficou o exercício de uma carreira pautada por uma actividade intensa de valorização profissional e dedicação à Saúde Pública, nas suas múltiplas facetas e aos mais diferentes níveis.
Em termos não profissionais, para além do coleccionismo de selos de correio é melómano, tendo nessa condição sido radialista e mantido uma coluna na imprensa local. Todavia não ficou por aí. A aposentação e a disponibilidade de mais tempo livre, fizeram renascer paixões antigas: o gosto pelo desenho e pela pintura que cultivara na juventude. A esse renascimento não serão estranhos os sucessivos confinamentos causados pela pandemia em curso.
A culminar esse renascimento de paixões antigas, aí está a presente Exposição dos seus trabalhos que incluem desenhos, aguarelas e acrílicos sobre telas.  São registos de observações, de reflexões, de estados de alma, esquemática ou cromaticamente partilhados com o observador para deleite de espírito. A merecer uma visita à Casa de Estremoz.

quinta-feira, 10 de outubro de 2019

Poesia Portuguesa - 094




VÍRGULA
ANTÓNIO MARIA LISBOA (1928-1953)


Eu menino às onze horas e trinta minutos
a procurar o dia em que não te fale
feito de resistências e ameaças — Este mundo
compreende tanto no meio em que vive
tanto no que devemos pensar.

A experiência o contrário da raiz originária aliás
demasiado formal para que se possa acreditar
no mais rigoroso sentido da palavra.

Tanta metafísica eu e tu
que já não acreditamos como antes
diferentes daquilo que entendem os filósofos
— constitui uma realidade
que não consegue dominar (nem ele próprio)
as forças primitivas
quando já se tem pretendido ordens à vida humana
em conflito com outras surge agora
a necessidade dos Oásis Perdidos.

E vistas assim as coisas fragmentariamente é certo
e a custo na imensidão da desordem
a que terão de ser constantemente arrancadas
— são da máxima importância as Velhas Concepções pois
a cada momento corremos grandes riscos
desconcertantes e de sinistra estranheza.

Resulta isto dum olhar rápido sobre a cidade desconhecida.
E abstraindo dos versos que neste poema se referem ao mundo humano
vemos que ninguém até hoje se apossou do homem
como o frágil véu que nos separa vedados e proibidos.

ANTÓNIO MARIA LISBOA (1928-1953)

Hernâni Matos


Homenagem a António Maria Lisboa (1997). Carlos Calvet (1928-2014). Serigrafia
a 30 cores sobre papel fabriano [58x38 cm (Dimensão da Mancha), 70x50 (Dimen-
são do Suporte): 70x50 cm – Tiragem: 200 exemplares].

sexta-feira, 19 de julho de 2019

Poesia Portuguesa - 093


José Régio. Lauro Corado (1908-1977).


TOADA DE PORTALEGRE
JOSÉ RÉGIO (1901-1969)

Em Portalegre, cidade
Do Alto Alentejo, cercada
De serras, ventos, penhascos, oliveiras e sobreiros
Morei numa casa velha,
velha grande tosca e bela
À qual quis como se fora
Feita para eu Morar nela...

Cheia dos maus e bons cheiros
Das casas que têm história,
Cheia da ténue, mas viva, obsidiante memória
De antigas gentes e traças,
Cheia de sol nas vidraças
E de escuro nos recantos,
Cheia de medo e sossego,
De silêncios e de espantos,
- Quis-lhe bem como se fora
Tão feita ao gosto de outrora
Como ao do meu aconchego.

Em Portalegre, cidade
Do Alto Alentejo, cercada
De montes e de oliveiras
Do vento suão queimada
(Lá vem o vento suão!,
Que enche o sono de pavores,
Faz febre, esfarela os ossos,
Dói nos peitos sufocados
E atira aos desesperados
A corda com que se enforcam
Na trave de algum desvão...)
Em Portalegre, dizia,
Cidade onde então sofria
Coisas que terei pudor
De contar seja a quem fôr,
Na tal casa tosca e bela
À qual quis como se fora
Feita para eu morar nela,
Tinha, então,
Por única diversão,
Uma pequena varanda
Diante de uma janela

Toda aberta ao sol que abrasa,
Ao frio que tolhe, gela
E ao vento que anda, desanda,
E sarabanda, e ciranda
Derredor da minha casa,
Em Portalegre, cidade
Do Alto Alentejo, cercada
De serras, ventos, penhascos oliveiras e sobreiros
Era uma bela varanda,
Naquela bela janela!

Serras deitadas nas nuvens,
Vagas e azuis da distância,
Azuis, cinzentas, lilases,
Já roxas quando mais perto,
Campos verdes e Amarelos,
Salpicados de Oliveiras,
E que o frio, ao vir, despia,
Rasava, unia
Num mesmo ar de deserto
Ou de longínquas geleiras,
Céus que lá em cima, estrelados,
Boiando em lua, ou fechados
Nos seus turbilhões de trevas,
Pareciam engolir-me
Quando, fitando-os suspenso
Daquele silêncio imenso,
Eu sentia o chão a fugir-me,
- Se abriam diante dela
Daquela
Bela
Varanda
Daquela
Minha
Janela,
Em Portalegre, cidade
Do Alto Alentejo, cercada
De serras, ventos, penhascos, oliveiras e sobreiros
Na casa em que morei, velha,
Cheia dos maus e bons cheiros
Das casas que têm história,
Cheia da ténue, mas viva, obsidiante memória
De antigas gentes e traças,
Cheia de sol nas vidraças
E de escuro nos recantos,
Cheia de medo e sossego,
De silêncios e de espantos,
À qual quis como se fora
Tão feita ao gosto de outrora
Como ao do meu aconchego...

Ora agora,
Que havia o vento suão
Que enche o sono de pavores,
Faz febre, esfarela os ossos,
Dói nos peitos sufocados,
E atira aos desesperados
A corda com que se enforcam
Na trave de algum desvão,
Que havia o vento suão
De se lembrar de fazer?

Em Portalegre, dizia,
Cidade onde então sofria
Coisas que terei pudor
De contar seja a quem for,
Que havia o vento suão
De fazer,
Senão trazer
Àquela
Minha
Varanda
Daquela
Minha
Janela,
O testemunho maior
De que Deus
É protector
Dos seus
Que mais faz sofrer?

Lá num craveiro, que eu tinha,
Onde uma cepa cansada
Mal dava cravos sem vida,
Poisou qualquer sementinha
Que o vento que anda, desanda,
E sarabanda, e ciranda,
Achara no ar perdida,
Errando entre terra e céus...,
E, louvado seja Deus!,
Eis que uma folha miudinha
Rompeu, cresceu, recortada,
Furando a cepa cansada
Que dava cravos sem vida
Naquela
Bela
Varanda
Daquela
Minha
Janela
Da tal casa tosca e bela
Á qual quis como se fora
Feita para eu morar nela...

Como é que o vento suão
Que enche o sono de pavores,
Faz febre, esfarela os ossos,
Dói nos peitos sufocados,
E atira aos desesperados
A corda com que se enforcam
Na trave de algum desvão,
Me trouxe a mim que, dizia,
Em Portalegre sofria
Coisas que terei pudor
De contar seja a quem for,
Me trouxe a mim essa esmola,
Esse pedido de paz
Dum Deus que fere ... e consola
Com o próprio mal que faz?

Coisas que terei pudor
De contar seja a quem for
Me davam então tal vida
Em Portalegre, cidade
Do Alto Alentejo, cercada
De serras, ventos, penhascos, oliveiras e sobreiros,
Me davam então tal vida

- Não vivida! sim morrida
No tédio e no desespero,
No espanto e na solidão,
Que a corda dos derradeiros
Desejos dos desgraçados
Por noites do vento suão
Já varias vezes tentara
Meus dedos verdes suados...

Senão quando o amor de Deus
Ao vento que anda, desanda,
E sarabanda, e ciranda,
Confia uma sementinha
Perdida entre terra e céus,
E o vento a trás à varanda
Daquela
Minha
Janela
Da tal casa tosca e bela
À qual quis como se fôra
Feita para eu morar nela!

Lá no craveiro que eu tinha,
Onde uma cepa cansada
Mal dava cravos sem vida,
Nasceu essa acàciazinha
Que depois foi transplantada
E cresceu; dom do meu Deus!,
Aos pés lá da estranha casa
Do largo do cemitério,
Frente aos ciprestes que em frente
Mostram os céus,
Como dedos apontados
De gigantes enterrados...
Quem desespera dos homens,
Se a alma lhe não secou,
A tudo transfere a esperança
Que a humanidade frustrou:
E é capaz de amar as plantas,
De esperar nos animais,
De humanizar coisas brutas,
E ter criancices tais,
Tais e tantas!
Que será bom ter pudor
De as contar seja a quem for!

O amor, a amizade, e quantos
Sonhos de cristal sonhara,
Bens deste mundo! que o mundo
Me levara,
De tal maneira me tinham,
Ao fugir-me, Deixando só, nulo, atónito, A mim que tanto esperara
Ser fiel,
E forte,
E firme,
Que não era mais que morte
A vida que então vivia,
Auto-cadáver...

E era então que sucedia
Que em Portalegre, cidade
Do Alto Alentejo, cercada
De serras, ventos, penhascos, oliveiras e sobreiros
Aos pés lá da casa velha
Cheia dos maus e bons cheiros
Das casa que têm história,
Cheia da ténue, mas viva, obsidiante memória
De antigas gentes e traças,
Cheia de sol nas vidraças
E de escuro nos recantos,
Cheia de medo e sossego,
De silêncios e de espantos,
- A minha acácia crescia.

Vento suão! obrigado...
Pela doce companhia
Que em teu hálito empestado
Sem eu sonhar, me chegava!

E a cada raminho novo
Que a tenra acácia deitava,
Será loucura!..., mas era
Uma alegria
Na longa e negra apatia
Daquela miséria extrema
Em que eu vivia,
E vivera,
Como se fizera um poema,
Ou se um filho me nascera.

JOSÉ RÉGIO (1901-1969)
Hernâni Matos


Praça do Príncipe Real. Lauro Corado (1908-1977). Câmara Municipal de Portalegre.