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sábado, 1 de novembro de 2025

Adagiário do Dia de Todos-os-Santos


OS PRECURSORES DE CRISTO COM SANTOS E MÁRTIRES (c.1423-24). Fra Angélico
(c. 1395 - 1455). Têmpera sobre madeira (31,9 x 63,5 cm). National Gallery, London.

A 1 de Novembro, a Igreja Católica celebra o Dia de Todos-os-Santos, como uma festa em honra de todos os Santos e Mártires, conhecidos e desconhecidos. Relativamente a esta efeméride, a literatura de tradição oral regista a presença dos seguintes adágios:
- De Santos a Santo André, um mês é; de Santo André ao Natal, três semanas.
- De Santos ao Natal, ou bom chover ou bem nevar.
- De Todos os Santos ao Advento, nem muita chuva nem muito vento.
- De Todos os Santos ao Natal, bom é chover e melhor nevar.
- De Todos os Santos ao Natal, perde a padeira o capital.
- De Todos os Santos ao Natal, perde a padeira o natural.
- De Todos os Santos até ao Natal, perde a padeira o cabedal.
- Depois dos Santos, neve nos campos.
- Dos Santos ao Advento, nem muita chuva nem muito vento.
- Dos Santos ao Natal, bico de pardal.
- Dos Santos ao Natal é bom chover e melhor nevar.
- Dos Santos ao Natal é Inverno natural.
- Dos Santos ao Natal perde a padeira o cabedal.
- Dos Santos ao Natal vai um salto de pardal.
- Dos Santos ao Natal, Inverno geral.
- Dos Santos ao Natal, perde o marinheiro o cabedal.
- O Verão de São Martinho, a vareja de São Simão e a cheia de Santos são três coisas que nunca faltaram nem faltarão.
- Pelos Santos, favas por todos os cantos.
- Pelos Santos, neve nos campos.
- Por Santos semeia trigo e colhe cardos.
- Por Todos os Santos, neve nos campos; por dia de São Nicolau, neve no chão.
- Por Todos os Santos, semeia trigo e colhe cardos.
- Por Todos os Santos, semeia trigo, colhe castanhas.

Publicado inicialmente a 1 de Novembro de 2022

sexta-feira, 31 de outubro de 2025

Dia de Todos-os-Santos


Regresso do "Pão por Deus" (1-11-1930).
Fotografia de autor desconhecido, recolhida "on line".


DIA DE TODOS-OS-SANTOS
O dia de Todos-os-Santos é celebrado pela Igreja Católica como uma festa em honra de todos os santos e mártires, conhecidos e desconhecidos.
No Alentejo, no dia de Todos-os-Santos, era ainda tradição nos anos sessenta-setenta do século passado, as crianças juntarem-se em pequenos grupos e andarem pelas ruas, de porta em porta, para “Pedir os Santinhos”. Naturalmente que só batiam às portas das casas mais abastadas ou julgadas como tal. Quando eram bem sucedidos e eram-no em geral, recebiam pão, bolos, maçãs, romãs, castanhas, nozes, amêndoas, etc. Eram oferendas que guardavam religiosamente nos seus talegos, nos quais as transportavam para as suas casas, onde ajudavam a mãe e o pai a fazer frente às duras condições de vida da esmagadora maioria dos intervenientes. Alguns desempregados, outros com empregos de miséria e outros ainda sujeitos à sazonalidade dos ciclos agrícolas de produção. Quanto aos ofertantes alguns eram-no por espírito de caridade cristã. Todavia, alguns imbuídos de espírito mais laico, faziam-no por espírito de solidariedade.
Uma tal tradição remonta a Lisboa no ano de 1756, um ano após o devastador terramoto que destruiu Lisboa no dia 1 de Novembro de 1755 e em que morreram milhares de pessoas, pelo que a população na sua maioria pobre, mais pobre ficou ainda.
A coincidência da data do terramoto com a data de 1 de Novembro, com significado religioso, conduziu a que sectores da população, aproveitando a solenidade do dia, tenham desencadeado, por toda a cidade, um peditório, visando atenuar a situação miserável em que se encontravam. Para tal, percorriam a cidade, batiam às portas e pediam esmola, mesmo que fosse pão, visto reinar a fome pela cidade. Pediam então: "Pão por Deus". Tal tradição perpetuou-se no tempo e propagou-se a todo o país, assumindo cambiantes em cada local. Todavia, a tradição está praticamente extinta desde os anos oitenta do século passado. Actualmente, os média, pressionados e distorcidos pelo peso globalizante da cultura anglo saxónica, ignoram completamente tradições como “Pedir os santinhos” e enfiam-nos pela casa dentro e pelas cachimónia abaixo, tradições como o “Halloween”, que nada têm a ver com a nossa identidade cultural.

A TRADIÇÃO ORAL
O dia de Todos-os-Santos está registado no adagiário português, onde são conhecidas máximas como as seguintes:

- “De Todos os Santos até ao Natal, perde a padeira o cabedal.” [4]
- “Pelos Santos, novos esquecem velho.” [4]
- “Por Todos os Santos semeia trigo, colhe cardos.” [1]
- “Por Todos os Santos, a neve nos campos.” [1]

A nível de cancioneiro popular, o dia de Todos-os-Santos é uma data grata para alguns:

“Dia de Todos os Santos
É que eu comecei a mar:
Quem com Santos principia
Com Santos deve acabar.” [3]

O Peditório do “Pão por Deus” está igualmente assinalado no cancioneiro popular:

“Bolinhos, Bolinhós,
Para mim e para vós,
Pelos vossos finados
Que estão enterrados
Ao pé da vera cruz
Para sempre. Amem, Jesus.
Truz; truz; truz.” (Coimbra) [2]

LONGE VÁ O AGOIRO
Faço votos para que nas condições duras que o país atravessa, não tenham muitos que recorrer ao Peditório do “Pão por Deus”, para conseguir fazer face às dificuldades diárias numa sociedade madrasta que alguns teimam em fazer retroceder no tempo.

BIBLIOGRAFIA
[1] – DELICADO, António. Adagios portuguezes reduzidos a lugares communs / pello lecenciado Antonio Delicado, Prior da Parrochial Igreja de Nossa Senhora da charidade, termo da cidade de Euora. Officina de Domingos Lopes Rosa. Lisboa, 1651.
[2] – LEITE DE VASCONCELLOS, J. Cancioneiro Popular Português. Volume III. Acta Universitatis Conimbrigensis. Coimbra,1983.
[3] – THOMAZ PIRES, A. Cantos Populares Portugueses, vol. I. Typographia Progresso. Elvas, 1902.
[4] - ROLAND, Francisco. ADAGIOS, PROVERBIOS, RIFÃOS E ANEXINS DA LINGUA PORTUGUEZA. Tirados dos melhores Autores Nacionais, e recopilados por ordem Alfabética por F.R.I.L.E.L. Typographia Rollandiana. Lisboa, 1841.

ROSSIO E HOSPITAL REAL DE TODOS-OS-SANTOS
Painel de azulejos de oficina de Lisboa, da 1ª metade do século XVIII (114 cm x 348 cm) existente no Museu da Cidade, Lisboa. No primeiro plano, tipos populares comercializam bens de consumo. No lado esquerdo é representado o Chafariz de Neptuno, equiparado ao dedicado a Apolo, existente no Terreiro do Paço.
O Hospital Real de Todos-os-Santos tinha fachada virada para o Rossio. Mandado erigir por D. João II em 1492, a sua construção só terminou no reinado de D. Manuel I, nos primeiros anos do século seguinte. Edifício de vanguarda na época, acolheu os primeiros internamentos em 1502 e o número de enfermarias foi crescendo ao longo do tempo: 3 (1504), 16 (1520) e 25 (1715).
O Hospital Real de Todos-os-Santos foi desactivado na sequência do Terramoto de 1755, ocorrido a 1 de Novembro desse ano, o qual foi responsável pela destruição quase completa da cidade de Lisboa.

Publicado inicialmente a 2 de Novembro de 2011

segunda-feira, 5 de maio de 2025

Dia Nacional do Azulejo - 2025


Batalha do Ameixial em 1663 (séc. XVIII). Painel de azulejos de uma das salas do Palácio Tocha,
construído no início do século XVIII para residência do capitão Barnabé Henriques e sua família.
No interior sobressaem azulejos que representam cenas campestres, mitológicas ou de batalhas
da História Regional. No edifício funciona actualmente o Museu Berardo Estremoz, inaugurado em
25 de Julho de 2020 e que está dotado de um extraordinário e grandioso acervo azulejar.


Azulejos e Identidade Cultural Nacional
Ao longo de mais de cinco séculos, o azulejo tem sido usado em Portugal, como elemento associado à arquitectura, não só como revestimento de superfícies, mas também como elemento decorativo.
Pela sua riqueza cromática e pelo seu poder descritivo, o azulejo ilustra bem a mentalidade, o gosto e a História de cada época, sendo muito justamente considerado como uma das criações mais singulares da Cultura Portuguesa e um paradigma da nossa Identidade Cultural Nacional.

Dia Nacional do Azulejo
A 6 de Maio assinala-se o Dia Nacional do Azulejo, criado por proposta do Projecto ”SOS Azulejo”’ datada de 2016 e aprovada por unanimidade pela Assembleia da República, em 24 de Março de 2017.
O Dia Nacional do Azulejo é um evento anual que tem como objectivo reconhecer esta tradição e património nacional, projectando a sua importância, constituindo-se, igualmente, numa ocasião de evocação da sua protecção e preservação.
O Projecto SOS Azulejo criado em 28 de Fevereiro de 2007, é de iniciativa e coordenação do Museu de Polícia Judiciária (MPJ), na dependência do Instituto de Polícia Judiciária e Ciências Criminais (IPJCC), e nasceu da necessidade imperiosa de combater a grave delapidação do património azulejar português que se verificou recentemente, de modo crescente e alarmante, por furto, vandalismo e incúria.

Património Azulejar de Estremoz
O património azulejar da cidade de Estremoz é riquíssimo e está maioritariamente distribuído pelos seguintes edifícios: Convento dos Congregados do Oratório de São Filipe de Néri, Ermida de Santo Cristo, Convento das Maltesas, Convento de São Francisco, Palácio Tocha, Igreja do Anjo da Guarda, Antigo Hospital da Misericórdia, Convento de Nossa Senhora da Consolação, Passos da Irmandade do Senhor Jesus dos Paços, Armaria de D. João V (Pousada da Rainha Santa Isabel), Igreja de Santa Maria, Capela da Rainha Santa Isabel, Igreja de São Tiago, Estação da CP de Estremoz, Quinta de Nossa Senhora do Carmo, Ermida de Nossa Senhora da Conceição e Ermida de Nossa Senhora dos Mártires.
Para além do revestimento interior destes edifícios, há que destacar ainda o extraordinário e grandioso acervo azulejar do Museu Berardo Estremoz, instalado no Palácio Tocha e inaugurado em 25 de Julho de 2020.

Publicado inicialmente a 6 de Maio de 2024

O Milagre das Rosas. Painel de azulejos (126x173,5 cm) de meados do séc. XVIII,
da autoria de Policarpo de Oliveira Bernardes (1695-1778), pintor e azulejista alentejano,
pertencente ao chamado ciclo dos mestres, período em que se produziram as melhores peças
azulejares, do barroco português. Sacristia da Igreja do Convento de S. Francisco, Estremoz. 

Cena de caça (séc. XVIII). Painel de azulejos do Convento dos Congregados de S. Filipe Nery,
actual edifício dos Paços do Concelho de Estremoz. 

Dar de beber a quem tem sede (séc. XVIII). Um dos painéis de azulejos com as
virtudes Cardeais e Teologais, existentes na antiga Igreja da Misericórdia de Estremoz.

Adão e Eva no Paraíso (Séc. XVIII). Painel existente na Capela dos Passos
situada  no alçado exterior direito da Igreja do Convento de São Francisco. 

Milagre da criança salva das águas (c. 1725). Teotónio dos Santos (?). Painel de
azulejos  (2,60 m x 2,40 m). Capela da Rainha Santa Isabel do Castelo de Estremoz.

 Painel de azulejos (séc. XVIII) da Real Fábrica de Cerâmica de Estremoz.
Museu Municipal de Estremoz.

Painel de azulejos policromos de temática mariana (c. 1669).
Ermida de Nossa Senhora da Conceição, templo maneirista
situado nos arredores de Estremoz, edificado no último quartel
do século XVI. 

Painéis de azulejos (meados do século XVIII), saídos de uma grande
oficina lisboeta, cuja temática iconográfica é inteiramente dedicada
a cenas da vida da Virgem e da Infância de Jesus. Ermida de Nossa
Senhora dos Mártires, cuja origem remonta ao reinado de D. Fernando
e terminada pelo Condestável Dom Nuno Álvares Pereira, Senhor
da Vila de Estremoz.

 Estremoz – Mercado de Sábado (1940). Painel azulejar policromático da autoria
de Alves de Sá (1878-1972), fabricado na Fábrica de Cerâmica da Viúva Lamego,
em Lisboa. Estação da CP em Estremoz.

sábado, 7 de dezembro de 2024

Aconteceu há 7 anos: Inscrição da Produção de Figurado em Barro de Estremoz na Lista Representativa do Património Cultural Imaterial da Humanidade

Parte da delegação portuguesa que se deslocou à República da Coreia. Da esquerda
para a direita: Luís Mourinha (Presidente da Câmara Municipal de Estremoz), Manuel
António Gonçalves de Jesus (Embaixador de Portugal na República da Coreia), António
Ceia da Silva (Presidente do Turismo do Alentejo) e Hugo Guerreiro (Director do Museu
Municipal de Estremoz e Responsável Técnico da Candidatura). Fotografia reproduzida
com a devida vénia, a partir do Facebook de António Ceia da Silva.


Importa aqui e mais uma vez, salientar o mérito daqueles a quem se deve o êxito de uma candidatura que se viria a tornar vitoriosa:
1º) Hugo Guerreiro, Director do Museu Municipal de Estremoz, que despoletou e argumentou a candidatura, a qual veio a ter êxito e que corresponde ao primeiro figurado do mundo a merecer a distinção de Património Cultural Imaterial da Humanidade.
2º) Os barristas do passado e do presente, que com o labor e criatividade das suas mãos mágicas e desde as bonequeiras de setecentos, transmitiram de geração em geração e até à actualidade, uma produção sui generis de Bonecos em barro, dita ao “modo de Estremoz”.
3.º) O escultor José Maria de Sá Lemos, que nos anos 30 do séc. XX e recorrendo à velha bonequeira Ana das Peles primeiro e ao Mestre oleiro Mariano da Conceição depois, deu um contributo decisivo para a revitalização da produção de Bonecos de Estremoz, considerada extinta desde 1921.
4º) Os estudiosos, investigadores, escritores e publicistas que com o seu esforço não deixaram morrer a memória dos Bonecos de Estremoz: Luís Chaves, D. Sebastião Pessanha, Virgílio Correia, Azinhal Abelho, Solange Parvaux, Joaquim Vermelho e outros.
5.º) Os coleccionadores, dos quais o mais destacado é Júlio dos Reis Pereira, que ao longo de décadas foram reunindo, catalogando, estudando, comparando e interpretando espécimes que viabilizaram a apresentação de uma candidatura pelo Município de Estremoz.
- BEM HAJAM!

domingo, 19 de maio de 2024

Em Memória de Catarina Eufémia

 

Fig. 1 - Morte de Catarina Eufémia (1954-1961). José Dias Coelho (1923-1961).
Linoleogravura  em papel (24,5 x 35,1/ 39,7 x 51,4 cm). Colecção Museu do
Neo-Realismo. Espólio artístico de José Dias Coelho (doado em 1997
por Margarida Tengarrinha e filhas).


Em Baleizão há 70 anos
A 19 de Maio de 1954, na sequência de uma greve de assalariadas rurais alentejanas, em luta por melhores salários, a ceifeira Catarina Eufémia (1928-1954) foi assassinada a sangue frio com 3 tiros à queima-roupa, pelo tenente Carrajola da Guarda Nacional Republicana. O mais novo dos seus três filhos, com oito meses, estava ao seu colo quando foi baleada.
Este triste acontecimento transformou Catarina Eufémia numa mártir e ícone da resistência dos trabalhadores alentejanos contra o regime ditatorial e fascista imposto por Salazar, o qual proibia e reprimia qualquer tipo de manifestação por melhores condições de vida.
Desde o seu assassinato em 1954, que a memória de Catarina Eufémia tem sido perpetuada por artistas plásticos e poetas portugueses.

Catarina Eufémia nas artes e nas letras
Permito-me destacar duas das que considero as mais expressivas homenagens de artistas plásticos portugueses a Catarina Eufémia.
A primeira é a linoleogravura (Fig. 1) “Morte de Catarina Eufémia”, feita na época pelo escultor José Dias Colho (1923-1961), na clandestinidade à data do assassinato de Catarina Eufémia e ele próprio assassinado pela PIDE, em 19 de Dezembro de 1961, na Rua da Creche, em Lisboa.
A segunda é o “Memorial à Mulher alentejana” (Fig. 2) da autoria do artista plástico estremocense Rogério Ribeiro (1930-2008). Está situado no relvado do Parque da cidade de Beja e consiste numa estrutura prismática e de base triangular, em betão, com cinco metros de altura. Nela assentam três painéis de azulejos retratando trezentos e setenta e cinco rostos femininos. O memorial visa homenagear a mulher alentejana e entre elas Catarina Eufémia.
Catarina Eufémia é um tema recorrente da poesia portuguesa contemporânea, abordado por inúmeros poetas: Álvaro Magalhães, António Ramos Rosa, António Vicente Campinas, Armando Silva Carvalho, Carlos Aboim Inglês, Eduardo Valente da Fonseca, Egito Gonçalves, Francisco Miguel Duarte, José Afonso, José Carlos Ary dos Santos, José Gomes Ferreira, Manuel Alberto Valente, Maria Luísa Vilão Palma, Maria Teresa Horta, Marta Cristina de Araújo, Papiniano Carlos e Sophia de Mello Breyner Andresen. Desta última, transcrevo o poema

Catarina Eufémia

O primeiro tema da reflexão grega é a justiça

E eu penso nesse instante em que ficaste exposta
Estavas grávida porém não recuaste
Porque a tua lição é esta: fazer frente

Pois não deste homem por ti
E não ficaste em casa a cozinhar intrigas
Segundo o antiquíssimo método obíquo das mulheres
Nem usaste de manobra ou de calúnia

E não serviste apenas para chorar os mortos

Tinha chegado o tempo
Em que era preciso que alguém não recuasse
E a terra bebeu um sangue duas vezes puro
Porque eras a mulher e não somente a fêmea
Eras a inocência frontal que não recua
Antígona poisou a sua mão sobre o teu ombro no instante em que morreste

O poeta António Vicente Campinas (1910-1998) viu o seu poema “Cantar alentejano”, musicado por José Afonso (1929-1987) no álbum "Cantigas de Maio", editado no Natal de 1971, o qual pode ser ouvido aqui.
Carlos Paredes (1925-2004), o mestre da guitarra portuguesa dedicou-lhe a composição “Em memória de uma camponesa assassinada”, a qual pode ser ouvida aqui.
O cineasta José Manuel Portugal realizou o documentário Seara Vermelha - A Ceifeira de Baleizão (2024), o qual pode ser visionado aqui.

70 anos depois
Em 25 de Abril de 1974, graças à acção militar coordenada do Movimento das Forças Armadas – MFA, foi conseguido o derrube da ditadura mais velha da Europa – o regime totalitário e fascista de Salazar e de Caetano.
50 anos depois do 25 de Abril e 70 anos depois do assassinato de Catarina Eufémia, há quem procure branquear o passado e fazer crer que o fascismo nunca existiu. Mas existiu, oprimiu, reprimiu, torturou e matou.
É preciso não esquecer o que se passou. Há uma missão histórica, pedagógica e ética que compete aos democratas. É a salvaguarda das memórias desses tempos negros e a sua transmissão aos mais novos, para que estes não se deixem iludir face às investidas demagógicas daqueles que em nome da superação de dificuldades presentes, mais não querem que um retorno ao passado. Daí que eu seja levado a clamar:
- 25 DE ABRIL SEMPRE! FASCISMO NUNCA MAIS!

Hernâni Matos
Estremoz, 19 de Maio de 2024


Fig. 2 - Memorial à mulher alentejana (2008) - excerto. Rogério Ribeiro (1930-2008). 
Parque da cidade, Beja.

domingo, 21 de abril de 2024

A participação do RC3 nos acontecimentos do 25 de Abril de 1974

 


O presente relato tem por base a cronologia dos acontecimentos, sustentada por documentos do MFA, muito em especial o Relatório da Operação “25 de Abril de 74”, subscrito pelo Capitão Andrade Moura, Comandante do Esquadrão do RC3 que interveio nas operações militares do 25 de Abril, bem como pelo Coronel Caldas Duarte, Comandante do RC3.


A origem do Movimento das Forças Armadas
O derrube da ditadura mais velha da Europa – o regime de Salazar e de Caetano - foi conseguido em 25 de Abril de 1974, graças à acção militar coordenada do Movimento das Forças Armadas – MFA, cuja origem remonta ao clima de instabilidade no interior das próprias forças armadas, particularmente do Exército, instabilidade essa que se manifestou em meados de 1973, com o surgimento do denominado Movimento dos Capitães, o qual aglutinava oficiais de média patente, insatisfeitos com as suas remunerações e com a perda de prestígio da oficialidade do quadro permanente, bem como com a Guerra Colonial que, desde 1961, ou seja, há 13 anos, se arrastava em 3 frentes, sem se antever uma solução política para a mesma, bem como pela previsibilidade de uma derrota militar iminente.
No seu poema “As portas que Abril abriu!”, o saudoso poeta José Carlos Ary dos Santos, diz-nos quem fez o de Abril de 1974:

Quem o fez era soldado
homem novo Capitão
mas também tinha a seu lado
muits homens na prisão.”

E mais adiante:

Foi então que Abril abriu
as portas da claridade
e a nossa gente invadiu
a sua própria cidade.”

A Missão atribuída ao RC3 à data do 25 de Abril de 1974
O RC3 de Estremoz tinha, à data dos acontecimentos do 25 de Abril, quadros que haviam regressado da Guiné, nos finais do ano anterior. A Unidade era uma das mais bem apetrechadas do sul do país. Era, sem sombra de dúvida, a mais forte em termos de material blindado, pelo que o comando do MFA contava com ela para assegurar o êxito da acção.
A Missão do RC3 era marchar o mais rapidamente possível sobre Lisboa, na madrugada de 25 de Abril de 1974, com uma coluna de auto-metralhadoras e estacionar na zona da portagem da ponte sobre o Tejo, ficando a constituir reserva às ordens do Posto de Comando do MFA. Para tal, havia que deslocar um Esquadrão constituído por dois pelotões de reconhecimento e um terceiro de Atiradores.
Dia 24 de Abril, pelas 3 horas, o Capitão Alberto Ferreira desloca-se à Aldeia da Serra onde recebe um aparelho de transmissões E/R TR28 e a Ordem de Operações, que entrega nesse dia de manhã ao Capitão Andrade Moura, que pôs ao corrente da situação o Major Fernandes Tomás, tendo ambos analisado a situação da Unidade em face de certos factores negativos que lhes apresentavam e eram:
- Presença do Director da Arma de Cavalaria, General Bessa, que se encontrava na Unidade desde 23 de Abril e que pernoitaria em 24 na cidade, em casa do Comandante.
- Intensificação da vigilância sobre os Oficiais do MFA da Unidade e sobre os capitães Miquelina Simões e Gastão da Silva, ambos de Lanceiros 1.
- A presença de Companhias recentemente apresentadas para instrução de Especialidades.
Após essa análise foi decidido não tomar qualquer atitude antes duma hora que pudesse provocar a quebra do segredo do que estava planeado. Esta decisão tinha como consequência a Impossibilidade da saída do Esquadrão à hora prevista, pois este não estava municiado e as munições encontravam-se em local afastado das viaturas. Dia 24 de Abril, pelas 10 horas, o Capitão Andrade Moura envia a Portalegre o Aspirante Matos de Sousa, para entregar a Ordem de Operações ao Capitão Gomes Pereira.
Dia 25 de Abril, pela 1 h 30 min da madrugada, o Capitão Andrade Moura solicita ao Major Machado Faria, que tinha acabado de chegar dum jantar oferecido ao General 8essa, a comparência em sua casa. Posto ao corrente do assunto, logo adere ao MFA.
Dia 25 de Abril, pelas 2 h da madrugada, os Capitães Andrade e Moura e Alberto Ferreira consideram problemática a saída da Unidade pois têm poucos apoios internos. A única possibilidade será conquistar o apoio do Comandante Coronel Caldas Duarte. Abordam-no então no sentido da sua adesão ao MFA. Este mostra-se indeciso e pede tempo para reflectir.
Dia 25 de Abril, pelas 4 h 30 min da madrugada, após cerca de duas horas de reflexão, o Comandante Coronel Caldas Duarte adere ao Movimento, colocando-se inteiramente ao lado dos seus oficiais. Iniciam-se então, de imediato os preparativos para a saída da coluna.
Chegados ao Quartel, o Capitão Andrade Moura ocupa a Central Telefónica e é posto em execução o plano de recolha de Oficiais e Sargentos, iniciando-se a preparação do Esquadrão. Colocado o pessoal ao corrente dos factos, logo aderem em bloco, mostrando todos desejos de marchar sobre Lisboa.

Composição do Esquadrão do RC3
A composição do Esquadrão era a seguinte:
Comandante do Esquadrão – Capitão Andrade Moura, coadjuvado pelo Capitão Alberto Ferreira. Acompanhou a força até à Ponte Salazar o Coronel Caldas Duarte. Integraram-se ainda na força os Capitães Miquelina Simões e Gastão da Silva, ambos do Regimento de Lanceiros 1 de Elvas, onde estavam colocados na sequência do frustrado golpe das Caldas, em 16 de Março.
1.º Pelotão de Reconhecimento: - Comandante 1.º Sargento Silva Brás; Comandantes de Secção: Furriel Miliciano. Correia, 1º Cabo Miliciano Caldeira, 1.º Cabo Miliciano Correia. Praças: 40.
2.° Pelotão de Reconhecimento: Comandante Aspirante Oficial Miliciano Matos de Sousa; Comandantes de Secção: 1.º Cabo Miliciano Martins; Praças 30.
3.° Pelotão Atiradores: Comandante Aspirante Oficial Miliciano Montalvão Machado; Comandantes de Secção: Furrieis Milicianos Barata e Maçôas; Praças: 30. O Oficial de ligação do Esquadrão era o Aspirante Miliciano Coelho Cordeiro.

A partida para Lisboa
De acordo com o “Plano Geral das Operações”, o início do cumprimento das missões militares estava previsto para as 3 horas da madrugada do dia 25 de Abril, sendo que só às 7 h, depois de armado e municiado e com bastante atraso em relação ao horário previsto, o Esquadrão do RC3 segue pela estrada Estremoz-Pegões-Setúbal.
No final da coluna seguem viaturas Berlier com munições, água, combustível e óleo.
A cerca de 4 km de Estremoz, uma viatura Unimog avaria. Verificando-se a Impossibilidade da sua reparação, O Capitão Andrade Moura ordena que a mesma seja abandonada. À passagem por Arraiolos nova viatura avaria e é também abandonada. Após uma paragem causada pelo aquecimento das viaturas blindadas, a marcha continua. Em Vendas Novas foi decidido atestar as viaturas, pois receava-se que, ao atingir a Ponte Salazar, a autonomia das mesmas fosse limitada, o que poderia impedir o cumprimento das missões que fossem atribuídas ao Esquadrão. Até Palmela não se regista qualquer incidente mas, junto da estação, avaria outra viatura, que não sendo possível reparar, foi abandonada no local.
Em Mortiça, o Esquadrão deriva em direcção a Palmela, a fim de evitar qualquer tentativa de intercepção por parte das tropas estacionadas em Setúbal.

A chegada à Ponte Salazar
Finalmente, cerca das 13 h 15 min do dia 25 de Abril, o Esquadrão do RC3 chega à Ponte Salazar, comunicando ao Posto de Comando do MFA que tomara posições. O Posto de Comando determina que o Esquadrão marche sobre a Casa de Reclusão da Trafaria para libertar os militares presos. O Comandante da Unidade, Coronel Caldas Duarte permanece na Ponte Salazar, seguindo posteriormente para Lisboa com os Capitães Miquelina Simões e Gastão da Silva que, em carro civil e como batedores, tinham acompanhado o Esquadrão desde Estremoz, trabalho que muito facilitou a sua marcha.
Pelas 13 h 30 min começam a chegar ao Posto de Comando do MFA notícias da tentativa de cerco às forças da Escola Prática de Cavalaria, de Santarém, comandadas pelo Capitão Salgueiro da Maia e que estão a cercar o Quartel do Carmo.

A Missão em Lisboa
Pelas 13 h 45 min, face à gravidade da situação, o Posto de Comando dá uma contra-ordem às forças do RC3 que se dirigiam ao presídio da Trafaria, para, o mais rapidamente possível, inverterem o sentido e dirigirem-se à zona do Quartel do Carmo, para dar apoio à retaguarda das forças da Escola Prática de Cavalaria que já ocupavam o Largo, a fim de aliviar a pressão que estava a ser exercida sobre elas por duas Companhias da G.N.R., uma Companhia de Polícia de Choque e quatro blindados do R. C. 7, que não tinham ainda aderido ao Movimento.
Invertida a marcha, o Esquadrão do RC3 atravessa a Ponte Salazar, atinge o Largo do Rato, dirigindo-se para o Carmo pela Rua da Escola Politécnica. Junto da Imprensa Nacional recebe as primeiras manifestações de apoio da população civil, que se dirige ao Capitão Andrade Moura, prestando Informações sobre as posições ocupadas pelas forças da G.N.R.
O Esquadrão chega em tempo record à zona do Largo do Carmo. Aí, os Capitães Andrade Moura e Alberto Ferreira dispõem as forças na Rua Nova da Trindade, na Rua da Misericórdia e no Largo de Camões, colocando-se em posição de bater os carros de Cavalaria 7 que se encontravam no alto do Chiado. Fazem então ver aos oficiais da G. N. R. que a situação era insustentável para eles e intimam-nos a renderem-se ou a abandonarem o local, dirigindo-se aos quartéis.
Cerca de 10 minutos após a entrada em cena do RC3, as forças leais ao regime, que tentavam o cerco à Escola Prática de Cavalaria no Largo do Carmo, desmobilizam. Pelas 14 horas, o Brigadeiro Junqueira dos Reis, do RC7, abandona o local e o restante pessoal do RC7 retira-se das posições no Largo de Camões e apresenta-se ao Capitão Andrade Moura, aderindo ao MFA.
Perante a intimidação do RC3, o comandante das forças da GNR contacta o Comando-Geral e após 30 minutos concentram-se no Largo da Misericórdia, seguindo depois para os quartéis. De salientar que os oficiais da G.N.R., desde o primeiro momento, tentaram resolver a situação de molde a evitar uma confrontação. O Esquadrão do RC3 manteve as suas posições até cerca das 19 h 30 min, tendo seguidamente ocupado o Largo do Carmo, pois tinha recebido ordens para tomar conta do Quartel da G. N. R.
Pelas 14 h 30 min, é lido um comunicado, pela voz da estremocense, Clarisse Guerra, locutora do Rádio Clube Português, no qual se noticiavam os objectivos já conquistados pelo MFA e era ainda divulgado o cerco ao Professor Marcelo Caetano e membros do Governo no quartel do Carmo.
Às 18 horas, o estremocense General António de Spínola, mandatado pelo Posto de Comando do MFA recebe no Quartel do Carmo, a rendição do 1º ministro, Professor Marcelo Caetano, a quem informa que ele e os restantes dirigentes do regime serão conduzidos ao Funchal por um DC6 da Força Aérea.
Do Quartel do Carmo saem, às 19 h 35 min, numa Auto-Metralhadora Chaimite, sob escolta da Escola Prática de Cavalaria, dirigindo-se ao Posto de Comando do MFA no Regimento de Engenharia 1, na Pontinha, onde chegam às 20 h 30 min. Com eles segue o General António de Spínola, que informa que acabara de assumir o poder no Quartel do Carmo.
Pelas 20 h 30 min, o povo de Lisboa que, desde manhã, segue as movimentações militares, começa a engrossar pelas ruas da Baixa, à medida que as Forças do MFA iam conquistando objectivos. A população começa depois a dirigir-se massivamente para a sede da PIDE/DGS, na Rua António Maria Cardoso.
Pelas 21 h, os agentes da PIDE vendo a sua sede cercada pela população, abrem fogo indiscriminado, tendo feito 4 mortos e 45 feridos que serão socorridos pela Cruz Vermelha e encaminhados para o Hospital de S. José e para o Hospital Militar.
O Capitão Andrade Moura, estacionado no Largo do Carmo, ouve os disparos e é informado por populares do que se passa na sede da PIDE. Dirige-se então para a Rua António Maria Cardoso, a fim de evitar mais derramamento de sangue. Há grande dificuldades para que um veículo blindado de reconhecimento - PANHARD e dois jeeps atinjam o local, visto que a população deseja vingança e, completamente fora de si, impede qualquer manobra. Atingida aquela rua, a Panhard estaciona junto ao Teatro de S. Luís. A população pede vingança e que se ataque o edifício, em cujas janelas se viam alguns membros da PIDE/DGS.
Como a força era pequena para iniciar o cerco, o Capitão Andrade Moura ordena a comparência de reforços que estavam junto do Quartel do Carmo. Chegados estes, coloca vários atiradores naquela rua, enquanto outra Panhard e atiradores tomam posição na Rua Duques de Bragança e mais tarde na Rua Vítor Cordon.
O Capitão Andrade Moura, com prudência, a fim de mais uma vez evitar derramamento de sangue na tentativa da tomada da sede da PIDE de assalto, exige a sua rendição, o que não se processa logo. Como as forças eram insuficientes, o Capitão Andrade Moura pede instruções ao Comando do MFA, bem como reforços para completar o cerco à sede da PIDE, onde, conforme se soube posteriormente, estavam cerca de 250 agentes barricados, oferecendo resistência às forças do Exército.
Como não foram recebidas quaisquer ordens para um ataque que continuava a ser exigido pela população, este não foi executado. O Capitão Andrade Moura tenta então explicar à população a atitude do RC3. Após bastantes esforços, foi compreendido. Contudo, os populares não arredam pé, mas não Interferem, pedindo unicamente para os militares não deixarem fugir os Pides.

A madrugada do dia 26 de Abril
Os reforços, constituídos por dois destacamentos da Marinha, comandados pelo Capitão Tenente Costa Correia, chegam cerca das 2 h do dia de 26 de Abril. Foi então acordado que a força do RC3 se encarregaria do controlo das traseiras da sede da PIDE e que a Marinha controlaria o resto do edifício. Entretanto, já o RC3 capturara doze agentes da PIDE/D.G.S. e tinha abatido um que fugira, ao ser-lhe dada ordem de se entregar.
Pelas 3 h do dia 26, o Capitão Tenente Costa Correia, não conhecendo as intenções no interior da sede da PIDE, tenta acalmar os ânimos dos populares que se encontravam nas imediações e aguarda pelo nascer do dia. É ainda decidido utilizar um dos agentes capturados para servir de medianeiro entre a força e a Direcção da PIDE.

O dia 26 de Abril
Pelas 8 h 30 min da manhã, este vem a informar que o director da PIDE, Major Silva Pais e os seus agentes estavam dispostos a render-se, se as Forças Armadas garantissem a protecção aos agentes.
Às 9 h, o Capitão Tenente Costa Correia, o Capitão Andrade Moura e o Major Campos Andrada entram na sede da PIDE, onde aceitam a rendição desta.
Às 9 h 30 min, os militares do RC3 desarmam os agentes da PIDE e passam revista às instalações. No exterior, as forças de Marinha tentam conter a multidão, a qual grita, exigindo "justiça popular". São de seguida tomadas medidas destinadas a garantir a segurança das instalações e manter em funcionamento o Serviço de Estrangeiros e a Interpol. É também pedido ao Capitão Tenente Almada Contreiras que tome medidas para evacuar os agentes da PIDE, uma vez que a animosidade dos populares era crescente.
De salientar que a rendição da PIDE se dá após 12 horas de espera, ao longo das quais foi necessária a intervenção junto dos populares, recomendando prudência e civismo, a fim de evitar uma chacina de grandes proporções, que teria ocorrido se os populares tivessem concretizado um pretendido ataque às instalações onde os Pides estavam barricados.
Pelas 13 horas do dia 26 de Abril, iniciar-se-ia a libertação dos presos políticos nas cadeias de Caxias e Peniche.

A noite de 26 de Abril
Durante toda a noite do dia 26 de Abril, o esquadrão do R.C.3. manteve-se em duas posições: Largo do Carmo e Sede da PIDE. O dispositivo manteve-se até às 18 h, hora a que o Esquadrão recebe ordem de recolher ao Regimento de Cavalaria 7. Atingido este Regimento, o Esquadrão recebe ordens de seguir para Évora, a fim de escoltar o novo Comandante da Região Militar Sul, Coronel de Cavalaria Fontes Pereira de Melo. Porém, em virtude do cansaço dos homens, que há duas noites não dormiam, o Capitão Andrade Moura solicita ao Comando do MFA que a missão só seja cumprida ao amanhecer do dia 27. Tendo sido atendido, ficou o Esquadrão instalado no R.C.7.

O regresso a Estremoz
Dia 27 de Abril, pelas 6 h 30 min da madrugada, o Esquadrão do RC3 inicia o regresso a Estremoz, com a missão de escoltar até Évora o novo comandante da Região Militar Sul, Coronel Fontes Pereira de Melo. Évora é atingida cerca das 13h 45 min. O regresso do Esquadrão dá-se por Évora Monte. Durante todo o percurso, os militares do RC3 são alvo de significativas manifestações de regozijo, tanto dos automobilistas com que se cruzam na estrada, como pelos populares das povoações por onde a coluna passa.

A chegada a Estremoz
A entrada dá-se pelas portas de Santo António até ao quartel do Regimento, onde o Esquadrão do RC3, cumprida a missão que o levara a Lisboa, é alvo de grandiosa recepção popular, sendo aclamado pela multidão entusiasmada e recebendo honras militares.
Estremoz estivera presente na hora da libertação através do papel determinante desempenhado pelo RC3 no desenrolar dos acontecimentos. É caso para parafrasear o poeta José Carlos Ary dos Santos, dizendo:

“Foi esta força viril
de antes quebrar que torcer
que em vinte e cinco de Abril
fez Portugal renascer.”

Hernâni Matos
Publicado no jornal E, nº 332, de 11 de Abril de 2024
Publicado inicialmente em 21 de Abril de 2024

À frente da coluna militar, o Comandante do Esquadrão,
Capitão Andrade Moura.

A alegria da vitória, que o cansaço não conseguiu abater.
De pé, o 1º Sargento Francisco Brás.

O capitão Alberto Ferreira e os seus homens,
com um sorriso de satisfação.

À vista de Estremoz, a coluna militar em movimento.
Sempre presente, o “V” da Vitória.

Aspecto parcial da coluna militar no seu regresso e com a missão cumprida.


O Comandante do Esquadrão, Capitão Andrade Moura,
entra na cidade pelas Portas de Santo António.

Um aspecto da coluna militar a atravessar as Portas de Santo António.

À chegada, frente ao edifício do RC3: Honras Militares e Aclamação Popular.

Como era Portugal antes do 25 de Abril de 1974

 

Embarque de militares no navio Niassa para a guerra colonial em 1971.

COMO ERA PORTUGAL ANTES DO 25 DE ABRIL DE 1974


- As mulheres tinham menos direitos que os homens;
- As mulheres precisavam de autorização do marido para poderem ser comerciantes, para arrendarem uma casa e para viajar para o estrangeiro;
- As professoras primárias tinham de pedir autorização para casar, que só era concedido se o pretendido tivesse um ordenado igual ou superior ao da mulher;
- Os ordenados eram de miséria, sem direito a subsídios de férias e de Natal;
- O despedimento de trabalhadores estava facilitado;
- Os sindicatos corporativos eram fortemente controlados pelo regime;
- As greves estavam proibidas e eram consideradas crime;
- Reuniões só com autorização do Governo;
- Os partidos e movimentos políticos estavam proibidos;
- Partidos políticos só havia um, a União Nacional – o partido do Governo;
- Nas eleições só podiam votar os chefes de família, com um grau de instrução mínima e rendimentos. Assim ficavam de fora as mulheres, os analfabetos e os pobres. E tudo isto numa farsa de eleições onde, no recenseamento, eram logo excluídos dos cadernos eleitorais os opositores ao regime e depois, nas próprias eleições, se manipulavam e falsificavam os resultados;
- Os líderes oposicionistas como Mário Soares, Manuel Alegre ou Álvaro Cunhal, encontravam-se exilados;
- O serviço militar obrigatório durava 4 anos;
- Rara era a família que não tinha alguém a combater em África;
- Com 10 milhões de habitantes, Portugal fizera um esforço de guerra em África cerca de 9 vezes superior ao dos EUA, no Vietname, com os seus 250 milhões de habitantes;
- Portugal mobilizara para a guerra colonial mais de 800 mil jovens. Teve 8 mil mortos, 112.205 feridos e doentes, 4 mil deficientes físicos e estima-se que cerca de 100 mil doentes de stress de guerra;
- 40% do Orçamento de Estado destinava-se à Defesa;
- Um milhão e meio de emigrantes tinha saído para os países ricos da Europa, entre 1960 e 1974;
- Havia 21% de analfabetos e a vida cultural era apertadamente vigiada;
- A expressão pública de opiniões contra o regime e contra a guerra era severamente reprimida pela Censura e pela polícia política, a PIDE que gozava de plenos poderes;
- A censura e a PIDE controlavam os jornais, a rádio e a televisão e impediam-nos de ler, de ouvir ou ver tudo aquilo que pusesse em causa o regime ou que era considerado por eles, os bons costumes;
- A PIDE, responsável por 80 assassinatos, prendeu, entre 1960 e 1974, cerca de 50 mil pessoas;
- As prisões políticas estavam cheias;
- Muitos dos presos políticos eram torturados e condenados com as chamadas medidas de segurança, isto é, terminada a pena de prisão, a PIDE podia mantê-los na prisão, sem novo julgamento, por períodos prorrogáveis até 3 anos, o que podia equivaler a prisão perpétua. Para ajudar a condenar estas pessoas existiam os tribunais plenários que só julgavam, sem efectivas garantias de defesa, os presos políticos;
- Trabalhar na função pública, só com declaração de fidelidade ao regime vigente e a aprovação da PIDE. 

Hernâni Matos
Publicado no jornal E, nº 332, de 11 de abril de 2024
Publicado inicialmente em 21 de Abril de 2024


Emigração portuguesa nos anos 60.