Ana Catarina Grilo (1974- ).
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Introdução
No passado dia 16 de Junho publiquei neste blogue,
um texto intitulado “Ganchos de meia e sua recuperação”, no qual equacionei a
problemática suscitada pela execução das pequenas figurinhas em barro.
Posteriormente, em conversa com o barrista Jorge da Conceição, tive
conhecimento que a manufactura dos ganchos de meia em barro, não tinha sido
abordada por ele no Curso de Formação sobre Técnicas de Produção de Bonecos de
Estremoz, que no ano transacto tivera lugar no Palácio dos Marqueses de Praia e
Monforte. Perguntei-lhe então se não via inconveniente em que divulgasse junto
dos seus formandos uns “Apontamentos sobre ganchos de meia” que entretanto
redigira e que viria a editar no meu blogue e dos quais, entretanto, lhe dei
conhecimento. Ele gostou do texto e foi de opinião que era de difundir o mesmo
junto dos seus formandos, visando motivá-los à produção de ganchos de meia.
Neste momento, há novos barristas que já
corresponderam à sugestão de manufacturarem ganchos de meia e outros estão em
vias de o fazer. Na sua criação e para além da diferença nas marcas
identitárias de cada um, foram utilizados três tipos de fixação dos ganchos de
meia ao peito das utilizadoras. São eles:
- Fixação por argola longitudinal
- Fixação por gancho
- Fixação por duas argolas transversais
Vejamos então o trabalho que foi produzido, bem
como as inovações introduzidas por cada barrista.
Fixação por argola longitudinal
Ana Catarina Grilo confeccionou recentemente 3
ganchos de meia (Fig. 1). Todos eles com a particularidade de o arame posterior
de fixação ter a forma de argola cravada no sentido longitudinal da figura,
visando a sua fixação ao peito da utilizadora, através do recurso a um alfinete
de ama minúsculo, cujo comprimento é de cerca de 2 cm .
Os ganchos de meia de Ana Catarina Grilo são
exactamente do tipo daqueles que Luís Chaves (1888-1971) (*) adquiriu em
Estremoz e que integram o acervo do Museu Nacional de Etnologia. Todavia, a
utilização dos ganchos de meia nessa época era feita com recurso a uma fita
enfiada na argola e presa no ombro com um alfinete dobrado em U invertido.
Os ganchos de meia desta barrista medem cerca de 5 cm de comprimento. São eles:
Peralta, Senhora de pezinhos e Nossa Senhora. A sua modelação e pintura foi
muito simples, como é habitual neste tipo de peças. O Peralta e a Senhora de
pezinhos têm as mãos apoiadas na parte frontal superior das coxas. Nossa
Senhora tem as mãos postas em atitude de oração. Apenas uma diferença em
relação aquilo que era prática corrente anterior. Nossa Senhora não apresenta
pezinhos, como se estes estivessem encobertos pelo vestido. Creio que foi uma
opção acertada por parte da barrista, pois se os pezinhos conferem graciosidade
a uma figura feminina, a não visualização de pezinhos na imagem de Nossa
Senhora é mais adequada na representação de uma figura à qual se associa
austeridade, recolhimento e espiritualidade.
Fig. 2 - Frade (gancho de meia). Luísa Batalha (1959- ).
Fixação por gancho
Luís Batalha produziu também recentemente um gancho
de meia com a singularidade de o arame posterior de fixação estar virado para
baixo (Fig. 2), visando ser espetado no vestuário da utilizadora, na zona do
peito. Um tal modo de fixação é exactamente igual ao concebido por José Maria
de Sá Lemos (1892-1971) quando nos anos 30 do séc. XX recuperou a extinta
manufactura dos Bonecos de Estremoz, recorrendo a Ana das Peles (1869-1945)
primeiro e a Mariano da Conceição (1903-1959) depois. São deste tipo e remontam
a 1948 os ganchos de meia pertencentes à colecção do Museu Rural de Estremoz e
executados por Mariano da Conceição. São também deste tipo, os ganchos de meia
executados por Liberdade da Conceição (1913-1990), pertencentes à minha
colecção e à de seu neto Jorge da Conceição. São ainda deste tipo os ganchos de
meia produzidos pelas irmãs Flores (1957, 1958 - ), pertencentes à minha colecção e à colecção de Leonor Bonito.
Ao recuperar a tradição de fabrico de ganchos de
meia, Sá Lemos introduziu uma modificação importante em relação àquilo que
constituía prática anterior, já que concebeu um modo de fixação diferente. Não
sei porquê, mas creio que à inovação não terá sido estranho o facto de ser
menos prático o modo de fixação anteriormente usado e que recorria a uma fita presa
ao ombro com um alfinete dobrado em U invertido.
O gancho de meia de Luísa Batalha mede cerca de 5 cm , representa um frade e
apresenta duas características que o tornam interessante. Por um lado, o frade
não apresenta pezinhos e sustenta-se na posição vertical, apoiado na parte
inferior do hábito. Não tendo pezinhos, que confeririam alguma graciosidade à
figura e à semelhança do que já foi referido relativamente a Nossa Senhora, a
representação assume um cunho mais austero, reservado e espiritual. Por outro
lado e ao contrário daquilo que até agora tinha sido realizado por outros
barristas, a figura não assenta as mãos na parte superior frontal das coxas,
nem apresenta as mãos em postura de oração. A modelação de Luísa Batalha
simulou qualquer das mãos enfiada na manga do lado oposto. Tratou-se de uma
solução técnica notável e inovadora, já que evitou saliências nas quais o fio
se poderia embaraçar e danificar o gancho de meia.
Fig. 3 - Peralta e Senhora de pezinhos (ganchos de meia). Joana Oliveira (1978- ).
Fixação por duas argolas transversais
Joana Oliveira teve à partida a preocupação de vir
a executar ganchos de meia, tal como os anteriores com cerca de 5 cm de comprimento, mas que
para além de cumprirem a sua função habitual, actualmente em desuso, pudessem
igualmente desempenhar outra função que era a de serem utilizados como
pregadeiras ornamentais. Nessa perspectiva e visando a sua utilização no
exterior, havia que substituir a fixação por meio de gancho de arame cravado na
parte posterior da figura, pois com o movimento a pregadeira corria o risco de
se desprender. Trocámos impressões sobre o assunto e eu acarinhei desde logo a
ideia da bifuncionalidade dos ganchos de meia, tanto mais que tenho uma amiga,
Leonor Bonito, que há muito e de vez em quando, utiliza como pregadeiras,
ganchos de meia produzidos pelas Irmãs Flores.
Ana Catarina Grilo já recorrera a fixação por
argola de arame cravada no sentido longitudinal da figura, no qual era enfiado
um alfinete de ama de cerca de 2
cm para fixação ao peito da utilizadora. Joana Oliveira
optou por uma fixação recorrendo a argola de arame embutida no sentido
transversal da figura. Todavia a figura oscilava para um lado e para o
outro da vertical. Observei-lhe que o problema seria facilmente resolvido,
utilizando não uma mas duas argolas, afastadas de cerca de 1 cm (Fig. 3) . Sugeri-lhe ainda que em
vez de argolas usasse dois pedaços de arame em forma de U achatado, à
semelhança de agrafos. Tal ideia foi posta em prática e o resultado foi
gratificante para ambos: um Peralta e uma Senhora de Pezinhos com uma graciosa pintura em pormenor.
Balanço final
À laia de balanço final é de concluir que surgiram
três soluções distintas para o mesmo problema, que é o de assegurar a
continuidade da manufactura dois ganchos de meia em barro, de Estremoz. É caso
para clamar:
- TODOS DIFERENTES, TODOS IGUAIS!
- TODOS DIFERENTES, TODOS IGUAIS!
Bibliografia
(*) - CHAVES, Luís. Arte
popular do Alentejo /Os ganchos de meia de barro d’Estremoz in Separata da
Águia, nº67-68, Porto, 1917.
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