segunda-feira, 6 de julho de 2020

A Primavera de Joana Oliveira


Primavera de arco (2020) - Parte da frente. Joana Oliveira (1978-  ).
A Primavera constitui há muito um tema transversal a toda a poesia portuguesa. Camões, numa “Elegia” confessa: “Vi já que a Primavera, de contente, / De mil cores alegres, revestia / O monte, o rio, o campo, alegremente.”. Por sua vez, Florbela Espanca, no soneto “Amar” proclama: “Há uma Primavera em cada vida: / É preciso cantá-la assim florida, / Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!”. Já o cancioneiro popular considera que: “Primavera, linda flor / Como ela não há iguais: / Primavera volta sempre, / Mocidade não vem mais!”.
A Primavera dos pintores
A Primavera é o tema central de obras de grandes mestres da pintura universal, com destaque pessoal para Sandro Botticelli, Jacob Grimmer, Tintoretto, Christian Bernhard Rode, János Rombauer, Caude Monet, Alfons Mucha, Veloso Salgado e José Malhoa.
Os seus quadros representam a natureza, verdejante e florida, com a presença alegórica de graciosas figuras femininas, enquadradas por flores, em ramos, grinaldas ou arcos.
A Primavera dos barristas
Na barrística popular de Estremoz existem figuras designadas genericamente por “Primaveras”, que para além de constituírem uma alegoria à estação do mesmo nome, são também figuras de Entrudo e registos dos primitivos rituais vegetalistas de celebração e exaltação do desabrochar da natureza.
Como figuras emblemáticas que são, as Primaveras constituem um tema inescapável à modelação por qualquer barrista. Nela são variados os caminhos que se lhe deparam. Em primeiro lugar, a modelação, a qual pode ser executada na linha de continuidade dos barristas precedentes ou alternativamente num rumo que de certo modo constitui uma ruptura com aquela prática. Trata-se de uma ruptura que sem fugir aos cânones da modelação tradicional, proclama as suas próprias marcas identidárias, notórias na estética da figura criada. Em segundo lugar, a decoração desta. Aqui pode haver uma inovação na cromática tradicional que reforce a mensagem que é intrínseca ao tema, bem como a introdução de elementos de composição que reforcem a contextualização temática.         
A Primavera de Joana Oliveira
A barrista Joana Oliveira recriou recentemente a chamada “Primavera de arco”. Na sua construção seguiu o segundo dos caminhos anteriormente apontados: o da inovação. E fê-lo para dar conta do modo como vê as coisas e com a força anímica que é seu timbre.              
A Primavera nasceu-lhe das mãos e tomou forma. Cresceu como figura, emancipou-se e autonomizou-se para fazer companhia a um apaixonado incorrigível da barrística popular de Estremoz. Permitam-me que vos apresente a “Primavera” que é e será sempre de Joana Oliveira. 
É uma figura de corpo elegante, aspecto juvenil e delicado, com ar jovial, da qual irradia luminosidade e frescura.
A postura das mãos parece antecipar o levantamento dos braços para o corpo rodopiar sobre si mesmo. E aqui reside aquilo que me parece ser uma das características mais importantes da modelação de Joana Oliveira: a capacidade mágica de através de uma representação estática, sugerir uma representação cinemática. E só este pormenor, revela-nos de imediato, Joana Oliveira como uma barrista de primeira água. 
Na decoração da figura, predominam o verde e o amarelo. O primeiro é a cor da natureza viva, associada ao crescimento e à renovação. O segundo traduz a alegria e o calor humano que lhe está associado. O azul do chapéu transmite serenidade, tranquilidade e harmonia a todo o conjunto.
Gratidão
Eu queria agradecer-lhe Joana, a beleza da figura que criou.
Bem haja! 
Publicado inicialmente a 6 de Julho de 2020

Primavera de arco (2020) - Parte de trás. Joana Oliveira (1978-  ).

2 comentários:

  1. Também gostei muito mas pensei que fugir às cores fortes poderia prejudicar, ainda bem que não.

    ResponderEliminar
  2. Parabéns aos "Bonecos de Estremoz" por terem ganho mais uma criadora nata.
    Parabéns à barrista Joana Oliveira pelo amor e arte que dedica a cada figura que cria, traduzidos na sensibilidade e minúcia de cada pormenor.
    Parabéns também para o Sr. Hernâni Matos pelo papel que desempenha no cumprimento deste objectivo.
    Enquanto este amor se mantiver através das mãos e coração dos nossos artistas, teremos a garantia que o nosso passado cultural não acabará.
    Felicidades.
    Isabel Figueira

    ResponderEliminar