quinta-feira, 25 de maio de 2023

CURIOSIDADES - Figurado de Estremoz de Inocência Lopes

 

Inocência Lopes na Casa do Alentejo, em Lisboa. Fotografia de Luís Mendeiros . CME.

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Esta a designação da exposição inaugurada no Centro Interpretativo do Boneco de Estremoz, na passada 5ª feira, dia 18 de Maio, pelas 11 horas e que ali ficará patente ao público até ao próximo dia 3 de Setembro.
Ao acto inaugural compareceram cerca de 2 dezenas de pessoas, entre familiares, amigos e admiradores da barrista Inocência Lopes, que ali foram testemunhar a estima que nutrem por ela e pelo seu trabalho.
O evento foi iniciado por Isabel Borda d’Água, directora do Museu Municipal de Estremoz, que historiou o percurso formativo da barrista e elogiou o seu trabalho. Seguidamente usou da palavra a artesã, que justificou o título da Exposição e que emocionada agradeceu o apreço manifestado pelos presentes, assim como o trabalho de mestria dos seus formadores, bem como o enquadramento proporcionado pelo Município, pelo CEARTE e pela ADERE-CERTIFICA.

Infância e juventude
A barrista, de seu nome completo, Inocência Isabel Gonçalves Saias Lopes, nasceu em 1973 no Monte do Redondinho, na Freguesia de Évora Monte e foi a terceira de quatro irmãos (2 rapazes e 2 raparigas). Foi baptizada na Igreja de S. Pedro em Évora Monte, vila e freguesia onde completou o 1º e o 2º ciclo do Ensino Básico. Desse tempo, lembra-se das brincadeiras de infância com outras crianças suas vizinhas, de ser muito reservada na escola e tem boas recordações das férias de Verão.
Começou a trabalhar muito jovem, revelando interesse e até mesmo paixão pelo artesanato, de tal modo que aos 15 anos já dizia que um dia havia de ter uma loja de artesanato no Castelo de Évora Monte. Com 15/16 anos frequentou um curso de tecelagem e de tinturaria vegetal, a que se seguiu uma formação em tapetes de Arraiolos. Dos 18 aos 20 anos foi baby-sitter e mais tarde foi viver para Quarteira durante um ano, entre 1994 e 1995, aí trabalhando em Hotelaria.
Aos 16 anos começou a namorar com um jovem de 19, José Manuel da Silva Lopes, que conhecia desde a escola primária e com quem casou em 1993, em cerimónia realizada na Igreja de São Pedro, em Évora Monte. Do casamento nasceria um filho, José Manuel Gonçalves Lopes, actualmente com 25 anos de idade e designer gráfico, interessado por tudo que é arte e que já revelou potencialidades de poder dar continuidade ao trabalho da mãe, como barrista de bonecos de Estremoz.
Em 2003/2004, Inocência Lopes frequentou um Curso de Formação Profissional do IEFP, com equivalência ao 9º ano de escolaridade. Em 2005 concretizou o antigo sonho de abrir uma loja de artesanato dentro do Castelo de Évora Monte, o que veio a acontecer no nº 11 da Rua da Convenção, local onde até 1915 tinha funcionado o Celeiro Comum, fundado por alvará de D. João IV, em 1642. Devido à sua localização, a loja passaria a ser designada por Loja de Artesanato Celeiro Comum e entre outras coisas eram ali comercializadas cadeiras alentejanas, louça regional, artefactos em cortiça e pantufas de pele. Em 2010, frequentou algumas aulas de Técnicas de Modelação de Bonecos de Estremoz, ministradas por Isabel Borda d´Água no Museu Municipal de Estremoz, as quais não puderam ter continuidade, por motivos de natureza pessoal. Entretanto, frequentou várias formações em pintura e técnicas de artes decorativas, visando comercializar os seus trabalhos. Todavia, a atracção exercida pelos Bonecos de Estremoz, revelar-se-ia crucial.

O nascimento da barrista
Em 2019 frequentou o Curso de Formação sobre Técnicas de Produção de Bonecos de Estremoz, que teve lugar no Centro Interpretativo do Boneco de Estremoz, no Palácio dos Marqueses de Praia e Monforte. O Curso foi promovido pelo CEARTE - Centro de Formação Profissional para o Artesanato e Património, em parceria com o Município de Estremoz. O Curso com a duração de 150 horas e de Nível QNQ 2, teve formação técnica a cargo do barrista Mestre Jorge da Conceição. Em 2022 recebeu Carta de Artesão e de Unidade Produtiva Artesanal na área da Cerâmica Figurativa, emitida pelo CEARTE.
Também em 2022 foi reconhecida como artesã produtora de Bonecos de Estremoz. O reconhecimento consta de um certificado atribuído pela Adere-Certifica, organismo nacional de acreditação a quem compete a certificação de produções artesanais tradicionais, com garantia da qualidade e autenticidade da produção.
O ano de 2022 é um ano relevante na vida de Inocência Lopes, que passa a produzir e a comercializar Bonecos de Estremoz, como artesã certificada. Trata-se de uma condição que para além de constituir uma mais valia na salvaguarda do Boneco de Estremoz, a enche de orgulho por constituir o reconhecimento da qualidade e do mérito do seu trabalho como barrista.

A exposição em si
A exposição intenta dar-nos uma ideia do que é o trabalho da barrista na actualidade, para o que recorre a cerca de 40 trabalhos, distribuídos por diferentes tipologias; - IMAGENS DEVOCIONAIS: Menino Jesus do Missal, Nossa Senhora da Conceição, Pão de Santo António, Rainha Santa Isabel (Milagre das Rosas), Santo António com o Menino ao colo; - PRESÉPIOS: Presépio de 3 figuras, Presépio da manta alentejana; - FIGURAS DA FAINA AGRO-PASTORIL NAS HERDADES ALENTEJANAS: Dia da espiga, Mulher dos carneiros, Mulher dos enchidos, Mulher dos perus, Par do Rancho Convenção de Évora Monte; - FIGURAS QUE TÊM A VER COM A REALIDADE LOCAL: Dama, Mulher a vender chouriços, Peralta; - FIGURAS INTIMISTAS QUE TÊM A VER COM O QUOTIDIANO DOMÉSTICO: Mulher a lavar a roupa, Senhora a servir o chá, Senhora ao espelho; - FIGURAS DE NEGROS: Preta florista, Rei negro (par); - FIGURAS ALEGÓRICAS: Amor é cego (par), Vitória de Estremoz, Primavera (duas), Primaveras de arco (três); - ASSOBIOS: Arco enfeitado, Candelabro enfeitado, Pucarinho enfeitado, Terrina enfeitada;
O conjunto dos trabalhos agora expostos integra na sua maioria, o núcleo central dos Bonecos de Estremoz, habitualmente designado por “Bonecos da Tradição”. Em particular, algumas das figuras expostas inspiram-se em exemplares da colecção Júlio dos Reis Pereira, pertencente ao acervo do Museu Municipal de Estremoz. Todavia e para além disso, no conjunto agora exposto figuram exemplares englobáveis naquilo que se convencionou designar por “Bonecos da Inovação”. Trata-se de modelos que ainda não tinham sido criados por outros barristas. Tal é o caso de composições como “Dia da espiga”, “Par do Rancho Convenção de Évora Monte” e “Presépio da manta alentejana”, que ostentam em comum, marcas identitárias da cultura alentejana, nomeadamente a nível do traje. Tal é ainda o caso dos assobios designados por “Arco enfeitado”, “Candelabro enfeitado”, “Pucarinho enfeitado”, “Terrina enfeitada”. Neste caso, a inovação foi acompanhada de uma verdadeira mudança de paradigma. Com efeito e até ao presente, os assobios de barro vermelho de Estremoz, apresentavam como padrão comum, o facto de a sua decoração integrar uma ave, uma figura antropomórfica (Senhora de pezinhos, Peralta, Sargento) ou uma figura mista (Amazona, Peralta a cavalo, Sargento a cavalo). A partir de agora e com Inocência Lopes, os assobios passam também a integrar espécimes de olaria enfeitada como elementos decorativos. Trata-se de uma inovação visualmente harmoniosa, que eu aplaudo e subscrevo.
“CURIOSIDADES” (2023) é a primeira exposição individual de Inocência Lopes, que a encara como um misto de realização pessoal e de reconhecimento e valorização do seu trabalho. Anteriormente e em termos colectivos, a barrista já participara em certames como a Feira Nacional de Artesanato de Vila do Conde (2022) e a FIA - Feira Internacional de Artesanato, em Lisboa (2022).

Características do trabalho da barrista
Na execução dos seus trabalhos, Inocência Lopes respeita os cânones da técnica de produção e da estética dos Bonecos de Estremoz, o que vem fazendo desde o início da sua formação como barrista. É um trabalho que vem aprofundando, na procura incessante da perfeição e do seu próprio caminho, através da afirmação de um estilo caracterizado por marcas identitárias diferenciadoras que a vão distinguindo dos outros barristas.
A representação do olhar e das maçãs do rosto é inconfundível e o cromatismo das suas figuras, vivo ou suave, é sempre harmonioso.
Congratulo-me com a qualidade dos trabalhos agora expostos por Inocência Lopes, que nos revelam a existência de uma nova estrela no firmamento da barrística popular de Estremoz. Mais uma vez se constata a importância e a relevância que teve o Curso de Formação sobre Técnicas de Produção de Bonecos de Estremoz, promovido em 2019 pelo CEARTE, em parceria com o Município de Estremoz.

Contactos
Visando facilitar o contacto com a barrista, disponibilizo aqui os vários modos de o fazer: INOCÊNCIA LOPES / Artesanato - Celeiro Comum de Évora Monte / Rua da Convenção 11, 7100-314 Évora Monte / TELEFONE: 966 759 534 / EMAIL: celeirodocomum@hotmail.com

Publicado no jornal E, nº 215, de 25 de Maio de  2023

Isabel Borda d'Água apresentando Inocência Lopes e a sua exposição. 
Fotografia de Miguel Belfo -  CME.

Uma visão geral da exposição de Inocência Lopes. 
Fotografia de Miguel Belfo -  CME.

 Inocência Lopes com o marido, filho e nora. 
Fotografia de Miguel Belfo -  CME.


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