sexta-feira, 15 de julho de 2011

O vasilhame de água no Alentejo

Cântaro de barro de Estremoz (altura: 40 cm; diâmetro máximo:68 cm) com cerca de 5 litros de capacidade. Fabrico da Olaria Alfacinha (Anos 40 do séc. X). Decoração com folhas, bolotas e ramos de sobreiro moldados em barro e colados à superfície, conjugados com algum polimento daquela. A própria asa é uma pernada de sobreiro. No lado oposto, o brasão de armas de Estremoz. Colecção do autor.

O Alentejo teve importantes centros oleiros, dos quais se destacam: Flor da Rosa, Nisa, São Pedro do Corval, Viana do Alentejo, Redondo e Estremoz. Aqui se produziu ou ainda se produz, todo o tipo de vasilhame destinado a uso doméstico, nomeadamente o destinado a conter água.
Dantes, todas as casas tinham na cozinha, um poial dos cântaros, onde os tamanhos mais correntes eram “a terceira” (15 litros) e a quarta (10 litros). Aí se ia buscar à fonte ou ao poço, a água destinada ao consumo doméstico. Nos poiais, lá estavam gravados muitas vezes, a cruz e o signo-saimão, símbolos mágicos de protecção contra o mau-olhado e o quebranto. Estes símbolos podiam aparecer igualmente gravados nos cântaros ou nas suas tampas de cortiça.
Para além dos cântaros, existiam ainda recipientes para água de menores dimensões, como as bilhas, os moringues, as garrafas de água e os barris.
As bilhas (de 1 a 2 litros) e os moringues (1 a 3 litros) permitiam levar água à mesa da refeição. Já as garrafas de água (1 a 2 litros) eram mais destinadas a ter na mesinha de cabeceira, para uso nocturno. Quantos aos barris (1 a 2 litros), destinavam-se a ser usados em viagem ou levados para o local de trabalho, usando um cordel que os permitia transportar ao ombro ou a tiracolo. Eram também usados nos carros de tracção animal, protegidos por um invólucro tecido com esparto, num receptáculo existente no exterior do carro.
Em Nisa, o vasilhame sempre foi decorado com minúsculos seixos de quartzo, embutidos no barro, formando arabescos que lhe conferem o ar de fino bordado. Já em Estremoz, sempre houve três tipos de decoração do vasilhame para água:
- o riscado, de aspecto mais rústico, tendo colado meniscos convexos de argila, decorados com minúsculos seixos de quartzo;
- o polido, com uma decoração mais fina e requintada, que joga com o contraste entre a superfície baça e os motivos que foram polidos;
- folhas, bolotas e ramos de sobreiro, moldados em barro e colados à superfície, conjugados com algum polimento daquela.
Antes da vulgarização dos frigoríficos, o vasilhame de barro era a garantia de se ter em casa, água fresca que nos permitisse dessedentar nos dias de Verão. O barro é poroso, pelo que a água contida no interior do recipiente, chega à superfície por capilaridade. Daqui se evapora por acção do calor, o que consumindo energia, faz baixar a temperatura no interior do recipiente. Este abaixamento de temperatura é directamente proporcional à massa de água evaporada e inversamente proporcional à massa de água contida na vasilha. Os cálculos revelam que ao evaporar-se 1 decilitro de água de um recipiente, que passe então a ficar com 1 litro dela, a temperatura desta baixa 5,4 º C. É a magia da natureza. E como é saborosa a água contida em recipientes de barro, sobretudo de barro novo, que se desfaz em fino pó.
A vulgarização dos frigoríficos deu uma facada de morte nos oleiros, que já tinham levado outra com a implementação dos recipientes de alumínio, a substituir a loiça vidrada. Por isso, os oleiros que resistem, vivem hoje, em parte, da louça decorativa que, por vezes, lá vão vendendo.

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Matar a sede no Alentejo


A ceifa. Dordio Gomes (1890-1976). Óleo sobre tela (154 x 194 cm).


                                                                                   À minha filha Catarina

INTRODUÇÃO
O corpo humano de um adulto é composto por 60% de água, a qual está presente em todos os tecidos e desempenha múltiplos papéis: dissolve todos os nutrientes e transporta-os a todas as células, assim como às toxinas que o organismo necessita de eliminar. A água regula ainda a temperatura corporal através da produção de suor.
Através da transpiração, respiração, urina e fezes, perdemos diariamente cerca de 2,5 litros de água ou mesmo mais, se a temperatura for muito elevada e/ou o esforço físico for intenso. Esta perda deve ser reposta.
As necessidades de água do ser humano dependem das perdas e o bom funcionamento do nosso organismo passa pela água que consumimos. Através dos alimentos obtemos cerca de metade da água necessária, o resto deve ser ingerido, bebendo pelo menos, 1,5 litros de água por dia.

SEDES DE OUTRORA
Noutros tempos, nos campos do Alentejo, bebia-se água de algumas ribeiras, assim como de nascentes e poços. Quem andava nas fainas agro-pastoris, bebia normalmente água por um coxo, feito de cortiça.
Fainas violentas como as ceifas, exigiam que houvesse distribuição regular de água, o que era feito, geralmente por uma aguadeira da ceifa, transportando um cântaro de barro e um coxo, por onde se bebia à vez.
Os pastores na sua vida de nómadas conheciam bem a localização das nascentes e poços, onde matar a sede.
Dos poços a água era tirada com caldeiros de zinco, embora em sua substituição se vissem muitas vezes, à beira dos poços, grandes chocalhos com a mesma função. Lá diz o cancioneiro:

“O' lá Cabeço de Vide,
Toda coberta de neve,
Terra do neto da bruxa,
Quem não traz chocalho não bebe.” [1]

Nas aldeias e vilas, as mulheres iam às fontes, encher os cântaros de barro, que transportavam depois à cabeça, equilibrados miraculosamente pela sogra, que a maioria das vezes não passaria duma rodilha enrolada em forma de anel.
Nas cidades, existiam aguadeiros, proprietários de carro com grade para transporte de cântaros, puxados por muar ou burro. Igualmente os havia com recursos mais elementares. Havia quem transportasse os cântaros em cangalhas de madeira assentes no lombo das bestas. Havia também aqueles que nem besta tinham e efectuavam o transporte dos cântaros em carros de mão, que eles próprios empurravam. Os cântaros usados, eram geralmente em zinco, com tampa, não só para não partirem, como para não entornarem. Cada aguadeiro tinha, de resto, a sua própria rede de clientes certos, que eram abastecidos a partir da fonte que frequentava.

SEDES DE HOJE
Hoje é impensável e desaconselhável beber água de ribeiros e de poços, já que os aquíferos estão contaminados por adubos químicos e pesticidas, quando não por águas residuais, domésticas ou industriais. O mesmo relativamente à água das fontes das nossas vilas e aldeias.
Hoje temos que beber água da rede, muitas vezes com sabor a cloro ou então, água engarrafada. Esse o preço do progresso. Um preço que poderia ter sido evitado, praticando uma agricultura biológica, em equilíbrio com os agroecossistemas, assim como um tratamento e convenientemente encaminhamento das águas residuais, que em muitos casos ainda não é feito. Até quando?

BIBLIOGRAFIA
[1] - THOMAZ PIRES, A. Tradições Populares Transtaganas. Tipographia Moderna. Elvas, 1927.

Hernâni Matos
Publicado inicialmente em 13 de Julho de de 2011

domingo, 10 de julho de 2011

Cancioneiro popular do pão


Mário Costa (n. 1902?), ilustração para a capa do relatório
comemorativo do XX Aniversário da Campanha do Trigo,
1929-1949, da Federação Nacional dos Produtores de
Trigo (F.N.P.T.). 1949.

Nós alentejanos somos pãezeiros, já que gostamos de comer tudo com pão. Daí que seja natural que no cancioneiro popular alentejano, existam múltiplas alusões ao pão. Seleccionámos, sistematizámos e estudámos algumas dessas referências.
Antes da integração na Comunidade Económica Europeia em 1986, o Alentejo estava coberto de extensas searas de trigo, as quais, quando amadurecidas, lembravam mares de ouro:

“Não há coisa mais bonita
que o torrão alentejano,
onde a seara bendita
dá pão para todo o ano.“ [5]

O Alentejo era admirado por ser produtor de trigo:

“Ai Alentejo, que amuo
o meu por não ser capaz
de ser rico como tu:
para dar o pão que tu dás.“ [5]

O Alentejo foi considerado o celeiro de Portugal e havia quem defendesse que o pão devia ser repartido com equidade:

“Pão nosso de cada dia,
repartido por igual.
Bendito o meu Alentejo,
celeiro de Portugal.“ [5]

Outros advogavam que o pão devia ser repartido pelos pobres:

“Pão nosso de cada dia
pelos pobres repartido…
Bendito o meu Alentejo
que é celeiro bem provido!“ [5]

O reconhecimento de que a terra dava pão, aconselhava a não semear em terra alheia:

“A terra é nossa mãe
pois a terra nos dá pão,
não semeies terra alheia
em busca de produção.“ [5]

Persiste ainda a ideia generalizada de que não há pão, como o pão alentejano:

“Não há coisa mais bonita
que do Alentejo o torrão,
nem há graça infinita
que se iguale à do seu pão.“ [5]

Por ali se colher o trigo, o Alentejo era considerado terra abençoada:

“Alentejo, mouro de antanho,
que um português fez cristão,
és a terra abençoada
de onde o País colhe o pão.“ [5]

Numa perspectiva religiosa, relativa ao pão, o Alentejo era o altar de uma igreja, que era Portugal:

“Ó pão que o corpo deseja,
e a alma quando a rezar,
tens a pátria por igreja
e o Alentejo por altar.“ [5]

Ainda numa óptica religiosa, as espigas das searas eram equiparadas a mãos em atitude de prece:

“Alentejo, terra rasa,
toda coberta de pão;
as tuas espigas douradas
lembram mãos em oração.“ [5]

Igualmente sob um ponto de vista religioso, o pão era abençoado por Jesus:

“Esse pequenino grão
em espiga transformado,
depois de sofrer é pão
por Jesus abençoado.“ [5]

Reconhecia-se ainda que o pão era utilizado no sacramento da Eucaristia:

“Tens Alentejo a missão
de frutos de oiro gerar,
- Corpo de Deus – feito pão
e Hóstia Santa no Altar.“ [5]

No cancioneiro popular alentejano existem referências específicas ao consumo do pão:

“Com um pão de munição
Que el-rei de Hespanha me dá,
Aqui ‘stou eu toda a noite:
Sentinela alerta está!“ [4]

“Os almocreves d’Abrantes,
Quando andam no caminho:
Bôa carne, bom pão alvo,
Melhor borracha de vinho.“ [4]

“Dae-me pinguinhas de vinho
Com bocadinhos de pão,
Dae-me mais alguma coisa
Para fazear caldeação.
Tu ateimas, eu ateimo,
Verás se assim é ou não.“ [4]

“Já comêmu pão de trigu
Cê mihtura dê cêbáda
Já não há rêclamaçõi
Ehtá toda a gênti calada.“ (Barrancos) [1]

Como é corrente noutros temas, existe algum cancioneiro de natureza humorística, relativo ao pão:

“Minha mãe é padeirinha,
Quando coze faz um bolo,
Quando se zanga comigo,
Bate-me com a pá do forno.“ (Alcáçovas) [2]

“Minha avó era padeira,
Vendia o pão a vintém,
Agora vende uma asneira,
Nem pão, nem dinheiro tem.“ [4]

“Ó meu amor, vae e vem,
Não te delates na praça,
Quem conversa com padeiras
Mollete come de graça.“ [4]

“Minha mãe casou-me em Maio
Minha sogra não tem pão,
Doe-me a barriga com fome,
“Oh! que dor do coração! [4]

O meu amor pequenino,
pequenino, resoluto,
é como o pão do padeiro
que se come sem conduto.“ [5]

“Não há pão como o pão alvo,
Nem carne com o toucinho,
Nem rapaz que valha um frasco
Cheio d’aguardente ou vinho.“ [4]

O ganha-pão de alguns pode até ser divertido:

“A cantar e a bailar
É que o meu bem ganha pão,
De viola a tiracolle
E panderêta na mão.“ [4]

O forno de cozer pão, pode metaforicamente ser usado para lá meter cantigas:

“As cantigas que cantaste,
Meto-as no forno frio;
Tu já não sabes cantar,
Oh! comigo ao desafio.“

“As cantigas que cantaste,
Meto-as no forno quente,
Tu já não sabes cantar,
Diante de tanta gente.” (Tolosa) [3]

Persiste a tradição de na Quinta-Feira de Ascensão (Dia da Espiga), se cumprir o ritual cíclico de recolha de um ramo com valor simbólico, o qual se guarda até ao ano seguinte:

“Tudo vai colher ao campo
Quinta-feira d'Ascensão,
trigo, papoila, oliveira.
p'ra que Deus dê paz e pão.“ [5]

BIBLIOGRAFIA
[1] – DELGADO, Manuel Joaquim Delgado. Subsídio para o Cancioneiro Popular do Baixo Alentejo. Vol. I. Instituto Nacional de Investigação Científica. Lisboa, 1980.
[2] - LEITE DE VASCONCELLOS, J. Cancioneiro Popular Português, vol. I, Acta Universitatis Conimbrigensis, Coimbra, 1975.
[3] – LEITE DE VASCONCELLOS, J. Etnografia Portuguesa, Vol. VI. Imprensa Nacional-Casa da Moeda. Lisboa, 1975.
[4] - PIRES, A. Tomaz. Cantos Populares Portuguezes. Vol. IV. Typographia e Stereotipía Progresso. Elvas, 1912.
[5] - SANTOS, Victor. Cancioneiro Alentejano. Livraria Portugal. Lisboa, 1959.

Publicado inicialmente em 10 de Julho de 2011

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Adagiário português do pão

FORNEIRA
Peça da barrística popular estremocense da autoria das Irmãs Flores

Sistematizámos o adagiário português do pão em dois grandes grupos:

AMASSADURA E COZEDURA DO PÃO
- A quem coze e amassa não furtes a massa.
- A quem tem seu pão no forno, podemos dar do nosso.
- Ano caro, padeira em todo o cabo.
- Ano caro, padeira em todo o caso.
- Coze-se o pão, enquanto o forno está quente.
- Descansai mulheres que caiu o forno.
- Fazer a broa maior que a boca do forno.
- Forno chorado, pão queimado.
- Forno de padeira, com qualquer molho de lenha se aquece.
- Forno feito, vintém no corucho.
- Muitos padeiros não fazem bom pão.
- Nam sejais forneira, se tendes a cabeça de manteiga.
- Em casa do sisudo, faz-se o pão miúdo.
- Enquanto ladra o cão, coze-se o pão.
- Não te ponhas a soalhar com quem tem forno e pé de altar
- Nem sempre o forno faz rosquilhas.
- No fogo se ganha, no fogo se perde.
- No forno e no moinho vai quem quer cochicho.
- No forno se ganha o pão, no forno se perde.
- No Inverno forneira, no Verão taberneira.
- O velho e o forno, pela boca se aguentam.
- Para forno quente, três molhos de ramasca ou um torgo somente.
- Para forno quente, uma torga somente.
- Pela boca se aquenta o forno.
- Quem mói no seu moinho e coze no seu forno, come o seu pão todo.
- Se toda a gente fosse padeiro, ninguém comprava pão.
- Uns aquecem o forno, outros amassam o pão.
- Ninguém morre sem ter primeiro amassado pão sem sal.

CONSUMO DO PÃO
- A boa fome não há mau pão.
- À gana de comer não há mau pão.
- À míngua de pão, boas são as tortas.
- A pão duro, dente agudo.
- Abril frio, pão e vinho.
- Agora dá pão e mel, depois, dará pão e fel.
- Água de S. João, tira o vinho e não dá pão.
- Água e pão, de corrida te vão.
- Água fria e pão quente, nunca fizeram bom ventre.
- Ainda agora comem pão da boda.
- Ainda que entres na vinha, e voltes o gibão, se não trabalhares, não te darão pão.
- Amigos que se desavêm por um pão de centeio, ou a fome é muita, ou o amor pequeno.
- Antes pão com amor do que galinha com dor.
- Antes pão do que fortuna.
- Antes pão duro que figo maduro.
- Antes pão seco com amor do que galinha com dor.
- Antes quero pão enxuto que tal conduto.
- Aonde lhes cabe o pão lhes não cabe o mais.
- Bem estou com o meu amigo, quando come seu pão comigo.
- Bem haja o pão que presta e a moça que o come.
- Bem haja o pão que presta.
- Bem haja o pão que resta e a moça que o come.
- Bem sei o que digo, quando pão pido.
- Boca que erra, não merece pena, nem pão que lhe falte.
- Bocado de mau pão, não o comas, nem o dês a teu irmão.
- Bocado de mau pão, nem para ti, nem para o teu cão.
- Bom é o pão que com honra se come.
- Bom é saber, que pão te há-de manter.
- Bom é um pão em dois pedaços.
- Bom grão fará bom pão.
- Caldo com pão, bom patrão.
- Caldo sem pão, mau patrão; caldo com vinho, já vai servindo.
- Caldo sem pão, só no Inferno o dão.
- Carne que baste; vinho que farte; pão que sobre.
- Cartas, mulheres e carradas de pão, para onde pendem, para aí vão.
- Casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão.
- Chama vinho ao vinho e pão ao pão e todos te entenderão.
- Com pão e vinho se anda caminho.
- Com unto e pão de milho, o caldo faz bom trilho.
- Come pão e bebe água e viverás sem mágoa.
- Comer pão que o diabo amassou.
- De mau grão, nunca bom pão.
- Dos cheiros o pão, do sabor o sal.
- É bom o pão duro, quando não há nenhum.
- É melhor pão duro que figo maduro.
- Em Abril, dá a velha a filha por pão, a quem lha pedir.
- Em broa encetada, todos querem tirar uma côdea.
- Em toda a parte se come pão.
- Estar a pão e água.
- Ficar a pão e laranja.
- Fidalgo sem pão é vilão.
- Guarda pão para Maio e lenha para Abril.
- Haja pão e satisfação.
- Já come pão com côdea.
- Meia vida é a candeia, pão e vinho a outra meia.
- Mesa sem pão é mesa de vilão.
- Mesa sem pão, mesa de galego.
- Muito pão e má colheita.
- Na casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão.
- Na fome não há pão duro.
- Não há amor como o primeiro, nem pão como o alvo, nem carne como o carneiro.
- Nem mesa sem pão, nem exército sem capitão.
- Nem pão quente, nem vinho que salte ao dente.
- Neste mundo mesquinho, quando há para pão, não há para vinho.
- Nozes com pão sabe a casar.
- Nozes e trigo é merenda de amigo.
- O menino e o pão de trigo no Verão têm frio.
- O mesmo canivete me corta o pão e o dedo.
- O pão pela cor, o vinho pelo sabor.
- Onde há cães há pulgas, onde há pães há raios, onde há mulheres há diabos.
- Ovo de uma hora, pão de um dia, vinho de um ano, mulher de vinte, amigo de trinta e deitarás boa conta.
- Pão a uns e pau a outros.
- Pão achado não tem dono.
- Pão afatiado, não farta rapaz esfaimado.
- Pão alheio tem bom gosto.
- Pão alheio, caro custa.
- Pão bolorento, abre-me a boca e põe-mo dentro.
- Pão com bolor e sardinha assada, descansa corpo, trabalha enxada.
- Pão com olhos, queijo sem olhos e vinho que salte aos olhos.
- Pão com pão e serra na mão.
- Pão comeste, companhia desfeita.
- Pão comido, pão esquecido.
- Pão comido, sequaz despedido.
- Pão comprado não enche barriga.
- Pão da Ilha, arca cheia, barriga vazia.
- Pão de amanhã, pertence a Deus.
- Pão de caldo, filhos de manteiga.
- Pão de centeio só é bom quando é alheio.
- Pão de centeio, melhor é no ventre que no seio.
- Pão de hoje, carne de ontem e vinho do outro Verão, fazem um homem são.
- Pão de padeira, não farta nem governa.
- Pão de trigo tremês, não o comas nem o dês.
- Pão de vizinho, tira o fastio.
- Pão do vizinho sabe mais um bocadinho.
- Pão durázio, caldo de uvas, salada de carne e deixar a medicina.
- Pão duro é melhor que figo maduro.
- Pão duro, caldo de uvas, salada de carne, e deixar as medicinas.
- Pão e queijo, é mesa posta.
- Pão e queijo, mesa posta é.
- Pão e roupa nunca carregou ninguém.
- Pão e roupa, uma semana melhor que outra.
- Pão e vinho anda caminho, que não o moço garrido.
- Pão e vinho e parte no Paraíso.
- Pão e vinho, para andar caminho.
- Pão e vinho, um ano meu e outro do vizinho.
- Pão grande não acha freguês.
- Pão mexido é pão crescido.
- Pão mole e uvas, às moças põe mudas, e às velhas tira as rugas.
- Pão mole, a rir se engole.
- Pão mole, depressa se engole.
- Pão nascido, nunca perdido.
- Pão numa mão e pau na outra.
- Pão ou pães, é questão de opiniões.
- Pão pela cor, vinho pelo sabor.
- Pão proibido abre o apetite.
- Pão que sobre, carne que baste, vinho que falte.
- Pão que veja, vinho que salte, queijo que chore.
- Pão quente faz mal ao ventre.
- Pão quente, fome mete.
- Pão quente, muito na arca e pouco no dente.
- Pão quente, muito na despensa, pouco no ventre.
- Pão quente, nem a são nem a doente.
- Pão tremês, não o comas nem o dês.
- Pão, carne e vinho, andam caminho.
- Pão, roupa e vintém, não carrega ninguém.
- Papas sem pão, abaixo se vão.
- Para boa fome, não há pão duro.
- Para quem tem fome, não há pão duro.
- Por carne, vinho e pão, deixo quantos manjares são.
- Prova teu caldo, não prometerás teu pão.
- Putas, cartas e carradas de pão, para onde pendem, para onde vão.
- Quando há fome, não há ruim pão.
- Quando o carpinteiro tem madeira que lavrar, e a mulher pão que amassar, não lhes falta pão que comer, nem lenha que queimar.
- Queijo com pão, comida de vilão.
- Queijo com pão, faz o homem são.
- Queijo, pão e pêro, comer de cavaleiro.
- Queijo, pão e pêro, comer de cavaleiro; queijo, pêro e pão, comer de vilão.
- Queijo, pêro e pão, comer de vilão.
- Quem compra pão na praça e vinho na taberna, filhos alheios governa.
- Quem dá o pão, dá o pau.
- Quem guerreia por pão de centeio, ou a fome é muita ou a vergonha é pouca.
- Quem não tem pão alvo, come do ralo.
- Quem pão e vinho compra, mostra a bolsa.
- Quem quer pão, tenha pão.
- Quem terá as mãos quedas, com pão fresco e beringelas?
- Quem tiver muitos filhos e pouco pão, tome-os da mão, e cante-lhes uma canção.
- Ração de pão, o que a perde há mau grado.
- Rente como pão quente.
- Se em tua casa me não quiseres tratar mal, não me faltes com o pão e com o sal.
- Se hei-de dar de comer, mister hei de pão no caldo.
- Se queres que te siga o cão, dá-lhe pão.
- Se vier o Deus te salve, antes pelo pão que pela carne.
- Seja o marido cão, mas tenha pão.
- Tal é o pão, tal a sopa.
- Tal terra andar, tal pão manjar.
- Também os ameaçados comem pão.
- Tanto pão como o polegar, leva a alma ao seu lugar.
- Tanto pão como um polegar, toma a alma a seu lugar.
- Tudo com pão, faz o homem são.
- Um dia de jejum e três de cruenta guerra ao pão.
- Um dia de jejum, três dias maus para o pão.
- Um pão não enche celeiro, mas ajuda seu companheiro.
- Um pão no mato dá para quatro.
- Uvas, pão e queijo, sabem a beijo.
- Vinho pela cor, pão pelo sabor.
- Vinho que baste, carne que farte, pão que sobre, e seja eu pobre.
- Vinho que chegue, carne que baste e pão que sobre.
- Vinho turvo e pão quente, são inimigos da gente.
- Vinho turvo, madeira verde e pão quente, são três inimigos da gente.
- Quando há pão em casa, até as aranhas balham!
- Casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão.

Publicado a 8 de julho de 2011




quinta-feira, 7 de julho de 2011

Os pombos vadios



Esta coluna vai falar hoje de “pombos vadios” ou “pombos de cidade”, que são aves distintas dos “pombos-correios” e dos “pombos bravos”.
Danos causados pelos pombos vadios
Os pombos vadios desalojados maioritariamente da Torre dos Congregados e do Edifício da Câmara Municipal, acoitaram-se em edifícios com telhados abatidos e janelas partidas, como é o caso, entre outros, dos edifícios da antiga firma Luís de Sousa Duarte Campos, do CDCR, do Círculo Estremocense, do Palace Hotel e do Museu da Alfaia Agrícola. Dali partem à conquista de comida e mais território, conspurcando tudo com fezes.
Cada pombo produz cerca de 12 quilos de fezes por ano, contendo 17% de ácido fosfórico e 3,3% de ácido sulfúrico. Alguma dessas fezes são expulsas nos locais abandonados onde se asilam, vivendo aí no meio da porcaria. Essas fezes causam incómodos de ordem sanitária e higiénica e estão na origem de doenças que podem ser transmitidas ao homem.
As fezes podem cair em cima dos transeuntes, sujam a roupa nos estendais e espaços públicos, como a rua, os bancos de jardim, etc.
As fezes, de natureza ácida, corroem metais, descoram pedras e pinturas de edifícios, apodrecem madeira, danificam coberturas, provocando infiltrações, assim como as pinturas dos automóveis de forma irreversível.
As penas, sós ou conjuntamente com as fezes, entopem algerozes, caleiras e ralos. Se são diminutos os riscos de saúde pública, o mesmo não se poderá dizer da “saúde” dos telhados habitados pelos pombos da cidade, que não pediram para ser adubados e vêem a sua capacidade de escoamento diminuída.
Os pombos nidificam e reproduzem-se com muita rapidez. Podem fazer ninhos por detrás de aparelhos de ar condicionado, contaminando a qualidade do ar. Ou então em algerozes, provocando o seu entupimento e subsequentes infiltrações no interior dos edifícios.
Os pombos podem também transmitir doenças ao homem. De facto:
- a inalação de partículas de poeiras provenientes de excrementos secos, causa infecções agudas no sistema respiratório.
- a ingestão de alimentos crus ou mal cozinhados, contaminados com fezes de pombos, causa gastroenterites graves.
- a inalação de aerossóis das fezes provoca tuberculose aviária.
Pombos-correios
Nada temos contra os pombos-correios, que são atletas de competição, devidamente alimentados e tratados pelos seus proprietários, que têm os seus próprios pombais, sendo a columbofilia uma actividade desportiva devidamente regulamentada por lei. De facto, a Federação Portuguesa de Columbofilia impõe aos columbófilos que vacinem os pombos-correios contra a “doença de Newcastle”, uma patologia altamente contagiosa que afecta as aves em geral e em particular os pombos vadios, os pombos bravos e os pombos-correios. Contudo, só estes últimos são vacinados, tendo os columbófilos que fazer obrigatoriamente prova dessas vacinas junto da respectiva Federação. Facultativamente, há ainda columbófilos que vacinam os pombos contra a “sarna”.
Os pombais dos columbófilos são frequentemente limpos e desinfectados com produtos químicos, pois quando não há largada, os pombos-correios estão fechados no pombal, aí deixando os excrementos. A vagabundagem nos telhados ou nos campos é contrária à prática columbófila uma vez que os pombos-correios podem contrair doenças ou ser mesmo envenenados. Do exposto se conclui que os pombos-correios não nos causam problemas. Os nossos problemas são causados pelos pombos vadios.
Medidas a tomar
A nosso ver, o actual Executivo Municipal, deveria fazer o seguinte:
1 – Fazer um levantamento exacto da situação;
2 – Intimidar pelos meios legais, os proprietários de edifícios degradados onde se alojam os pombos vadios, para que visando medidas sanitárias e higiénicas, entaipem os buracos dos respectivos edifícios, para obrigar os pombos a regredir para os campos;
3 – Assumir a Câmara essa tarefa, no caso dos proprietários não responderam à intimidação, cobrando-lhes coercivamente essas despesas “à posteriori”;
4 – Dissuadir a população de dar de comer aos pombos vadios, o que para alguns, como os frequentadores do quiosque frente à Câmara, é um passatempo;
5 – Encarregar alguém de capturar os pombos vadios com armadilhas, como foi feito pela Câmara Municipal de Évora;
6 – Distribuir aos pombos vadios comida tratada quimicamente, que sem os matar, impeça a sua procriação, fazendo-os regredir em número. Assim procedeu com êxito a Câmara Municipal de Lisboa.
Um caso particular
Um caso gritante é o Palácio da Justiça de Estremoz, onde é farta a provisão de andorinhas nos beirais e nichos do edifício e onde se instalaram também os pombos vadios.
É desejável que a entidade que gere o Palácio da Justiça, possa reunir condições que lhe permitam concluir a necessidade de aplicação de rede em polietileno transparente e espigões em aço com base em PVC, aplicáveis com silicone. Isto tem sido feito em muitos edifícios públicos. A nível de edifícios ligados à Justiça temos conhecimento dos Tribunais Judiciais de Abrantes, Aveiro e de Figueira de Castelo Rodrigo. É de realçar que existindo aves como as andorinhas, que são espécies protegidas, a aplicação de sistemas dissuasores como os referidos não provoca qualquer tipo de dano às aves, limitando-se a impedir que as aves pousem e nidifiquem nos locais protegidos. Para tal, os sistemas são aplicados fora do período de nidificação e cumprindo integralmente as leis do Instituto de Conservação da Natureza.
Julgamos que pedir isto a quem tem poder para o resolver, não é pedir demais. E não digam que o país está em crise. A crise não pode servir de pretexto para um deixa andar. A sanidade, a higiene e o bem-estar dos cidadãos, não podem ser deixados para trás numa escala de prioridades.

Publicado no Jornal ECOS (edição nº 88, de 1 de Julho de 2010)
(Coluna: O FRANCO ATIRADOR)

terça-feira, 5 de julho de 2011

O pão nas alcunhas alentejanas

HOMENS NO PETISCO
Peça da barrística popular estremocense da autoria das Irmãs Flores.

O pão está vastamente representado no domínio das alcunhas alentejanas, o que mais uma vez é revelador da riqueza da língua portuguesa. Destacamos as seguintes alcunhas alentejanas:

- PÃO À RODA – Alcunha outorgada a um indivíduo que corta fatias de pão redondas (Santiago do Cacém).
- PÃO COM CHOURIÇÃO - O receptor gostava muito de comer pão com chouriço (Monforte).
- PÃO COM MANTEIGA E AÇUCRE - O visado adquiriu esta alcunha porque em criança, gostava muito de comer pão com manteiga e açúcar.(Castro Verde).
- PÃO COM OVO - Alcunha atribuída a indivíduo que gostava de combinar estes alimentos. (Nisa).
- PÃO COM PÃO NÃO SABE A NADA – O alcunhado, em jovem, não arranjava par nos bailes, por ser feio e desajeitado. Dançava então com a irmã e resmungava: "Pão com pão não sabe a nada!" (Santiago do Cacém).
- PÃO DE LEITE - Alcunha atribuída a um homem que gosta muito de comer pão de leite (Santiago do Cacém).
- PÃO DE LÓ - Designação atribuída a um sujeito que numa festa, comeu um pão-de-ló inteiro (Arraiolos).
- PÃO DE MEL – O receptor, em criança, andava sempre a chorar e a pedir pão com mel (Serpa).
- PÃO DE MILHO - Alcunha atribuída a uma família que por necessidade comia muito pão de milho para matar a fome (Nisa); o receptor tem este nome porque gosta muito de comer pão com milho (Avis).
- PÃO DE QUILO - Denominação aplicada um homem gordo (Moura).
- PÃO DURO – Alcunha atribuída a uma família numerosa e pobre, que comprava o pão e o deixava endurecer, para durar mais (Castelo de Vide).
- PÃO E AZEITE – Alcunha outorgada a um indivíduo muito rico, que como esmola só dava aos pobres, pão e azeite. (Moura).
- PÃO E CHICHA - O receptor adquiriu este nome porque, em criança, dizia à mãe que queria pão e carne (Arraiolos).
- PÃO E QUEIJO – O visado quando bebia vinho, acompanhava-o sempre com pão e queijo (Alandroal); o receptor tinha o hábito de dizer que com ele era "Pão, Pão, Queijo, Queijo!" (Moura).
- PÃO MOLE - Epíteto atribuído a um indivíduo considerado pessoa muito lenta (Cuba e Santiago do Cacem); o visado recebeu esta alcunha porque só come pão mole (Moura); o receptor, em criança, gostava muito de comer pão mole (Portel e Campo Maior).
- PÃO SECO - O receptor herdou esta alcunha do seu bisavô porque este, sendo muito pobre, comia pão seco (Cuba); o alcunhado, em criança, pedia pão à mãe, que como eram muito pobres, apenas lhe dava pão seco (Viana do Alentejo); sujeito que gosta muito de comer pão sem acompanhamento (Monforte).
- PÃO SEM SAL - Alcunha outorgada a uma mulher pouco activa (Redondo).



BIBLIOGRAFIA
RAMOS, Francisco Martins; SILVA, Carlos Alberto da. Tratado das Alcunhas Alentejanas. 2ª edição. Edições Colibri. Lisboa, 2003.



Publicado em 5 de Julho de 2011

sábado, 2 de julho de 2011

Adivinhário português do pão



A presente colectânea de adivinhas sobre o pão, é o resultado da nossa pesquisa em quatro fontes bibliográficas distintas, cujos autores as recolheram da tradição oral:

“Feminina como sou,
milhões de bocas sustento,
mas é tal o meu tormento,
que sempre ralada estou.
Dão-me murros e eu não dou
um só ai nem mostro medo,
de água e fogo não me arredo.
Tudo sofro com prudência,
mas se me falta a paciência,
só comigo é que me azedo.” [2]

SOLUÇÃO: “A massa do pão.”

“Chego a minha barriga à sua e meto-lhe um palmo de carne crua.” [3]

SOLUÇÃO: “A masseira, a mulher que a amassa e os braços desta.”

“Devendo aos quatro elementos
O vir a ser o que sou,
Sempre recebo mau pago
Da gente com quem me dou;

Sou abafado, e depois
Num cárcere me vão pôr,
Onde não mudo a figura,
Mas do rosto mudo a cor;

O povo todo me busca,
Pois necessita de mim;
Tive criação aos murros,
Levo facadas por fim.” [1]

SOLUÇÃO: “O pão: a amassadura, a cozedura, o corte com a faca. Os quatro elementos são: terra,água, ar e fogo.”

“O que é que tem bosta na boca e pão no cú?” [3]

SOLUÇÃO: “O forno.”

“Verde esverdinhado, entre as pernas apertado.” [3]

SOLUÇÃO: “Vassoura para varrer o forno.”

“Verde, verde-gaio,
Antre as pernas apertai-o;
Vou com a mão,
Meto-o no buracão.” (Tolosa) [4]

SOLUÇÃO: “Vassoura verde que se mete pela boca do forno para o varrer.”

“O que é que quanto mais quente está, mais fresco é?” [3]

SOLUÇÃO: “O pão.”

E com adivinhas como estas, que excitavam o imaginário popular, se passavam os serões em família. Eram tempos de convívio e de partilha, mas sobretudo tempos da transmissão de saberes, através da oralidade. Tempos que se perderam…

BIBLIOGRAFIA
[1] – LEITE DE CASTRO. “Adivinhas” in Revista de Guimarães, vol. I, nº 3 (1884).
[2] - MOUTINHO, José Viale. Adivinhas Populares Portuguesas.6ª edição. Editorial Notícias. Lisboa, 2000.
[3] - VIEIRA BRAGA, Alberto. “Folclore” in Revista de Guimarães, vol. XXXIII (1933); vol. XXXIV (1934).
[4] – LEITE DE VASCONCELLOS, J. Etnografia Portuguesa. Vol. VI. Imprensa Nacional – Casa da Moeda. Lisboa, 1975.

Publicado em 2 de Julho de 2011