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quinta-feira, 10 de julho de 2025

O amor é cego



O Amor é cego. Jorge da Conceição (1963 - ). Colecção Hernâni Matos.

“O Amor é cego” é um Boneco de Estremoz cuja origem remonta ao séc. XIX. É considerado uma figura de Carnaval e uma alegoria à cegueira do amor e ao Cupido de olhos vendados. Trata-se de um tema recorrente na pintura universal, onde conheço os seguintes quadros: - Cupido com os olhos vendados (1452-1466) - Piero Della Francesca; - Primavera (c. 1482) - Sandro Botticelli (1445-1510); - Cupido, o pequeno amor com os olhos vendados perfura o peito de um jovem (séc. XVI) – Clément Marot; - O julgamento de Páris (1517-1518) – Niklaus Manuel; - Vénus e Cupido (c. 1520) – Lucas Cranach, o Velho; - Vénus a vendar Cupido (c. 1565) - Vecellio Tiziano; - Cupido castigado (séc. XVII-XVII) - Ignaz Stern; - Vénus a punir o amor profano (c. 1790) – Escola alemã.
 “O amor é cego” é um provérbio que traduz a cegueira do amor (falta de objectividade), relativamente à qual são conhecidos outros provérbios: “A amizade deve ser vidente e o amor, cego”, “O amor é cego e a Justiça também”, “O amor é cego, a amizade fecha os olhos”, “O amor é cego, mas vê muito longe”, “O amor não enxerga as cores das pessoas”, “O amor vem da cegueira, a amizade do conhecimento”, “Quem anda cego de amores não vê senão flores”, “Quem o feio ama, bonito lhe parece”.
O provérbio “O amor é cego” é muitas vezes atribuído ao filósofo grego Platão (427-348 aC), porque em “As Leis” escreveu “Aquele que ama é cego para o que ama”. No entanto, é errado, atribuir às palavras de Platão o significado que o provérbio tomou, porque naquele texto, o filósofo fala de amor-próprio como fonte de erro.
 “Amor é cego” é o título do soneto 137 de William Shakespeare (1564-1614) cuja primeira quadra traduzida pelo poeta António Simões nos diz que: “Tolo e cego Amor, a meus olhos que fazes agora, / Que eles olham e não vêem o que a ver estão? / Conhecem a beleza e onde ela se demora, / Mas, o que é pior, por melhor tomarão.”
A cegueira do amor está também retratada no cancioneiro popular alentejano (2): “O Cupido anda às cegas, / Cahe aqui, cahe acolá; / Em má hora eu te amei. / Em má hora, hora má.”
 “O amor é cego e vê” é o título de uma ária cantada por Tomás Alcaide (1901-1967) no filme “Bocage” a qual teve música de Afonso Correia Leite / Armando Rodrigues e letra de Matos Sequeira / Pereira Coelho. Roberto Alcaide (1903-1979), irmão de Tomás Alcaide tinha o hábito de afirmar que o boneco “O Amor é cego” tinha sido criado por Mariano da Conceição em homenagem ao irmão [Entrevista à barrista Maria Luísa da Conceição (1)]). Tal afirmação não tinha fundamento algum, já que a figura remonta ao séc. XIX e Mariano da Conceição nunca modelou “O Amor é cego”.

BIBLIOGRAFIA
(1) - MATOS, Hernâni. Entrevista a Maria Luísa da Conceição. Estremoz, 7 de Fevereiro de 2013. Arquivo de Hernâni Matos.
(2) - THOMAZ PIRES, A. Cantos Populares Portugueses. 4 vol. Typographia e Stereotypia Progresso. Elvas, 1902 (vol. I), 1905 (vol. II), 1909 (vol. III), 1012 (vol. IV).
Publicado inicialmente a 10 de Maio de 2019
Este texto integra o meu livro "BONECOS DE ESTREMOZ" publicado em 2018

quarta-feira, 21 de maio de 2025

Assobios de se lhes tirar o chapéu


Pucarinho enfeitado (assobio)

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Desde 2019 que venho acompanhando o trabalho da barrista Inocência Lopes e a ele me tenho referido nos meus escritos. Daí que possa afirmar que o mesmo se pauta por um estrito respeito pela técnica de produção e pela estética do Boneco de Estremoz. É, de resto, um trabalho revelador duma busca incessante de perfeição e de um caminho muito próprio.

A barrista, dotada de forte personalidade artística, tem-se afirmado através de um estilo pessoal, caracterizado por marcas identitárias diferenciadoras que a distinguem dos demais barristas.

A minha colecção integrava até agora apenas três trabalhos seus, correspondentes a temas que me são gratos: “Ceifeira”, “Primavera” e “Amor é cego”.  A eles se vieram juntar recentemente quatros assobios: “Pucarinho enfeitado”, “Candelabro enfeitado”, “Terrina enfeitada” e “Arco enfeitado”, encomendados há um ano atrás, no acto inaugural da sua exposição no Centro Interpretativo do Boneco de Estremoz. Tal facto é revelador de que a barrista “não tem mãos a medir”, o que muito me congratula, por confirmar o reconhecimento público do trabalho da barrista.

Os assobios criados por Inocência Lopes, constituem uma verdadeira mudança de paradigma. Na verdade, os assobios de barro vermelho de Estremoz integravam até então na sua decoração uma figura zoomórfica, antropomórfica ou mista. Com Inocência Lopes, os assobios passam também a incorporar espécimes de olaria enfeitada como elementos decorativos. Trata-se de uma inovação visualmente harmoniosa, que eu aplaudi e subscrevi, assim que se tornou conhecida.

Com tais criações a barrística de Estremoz ficou mais rica e a barrista prestou uma singela homenagem às bonequeiras de setecentos que estiveram na criação das peças de olaria enfeitada.

Bem-haja, Inocência Lopes. Estamos todos de parabéns.

Hernâni Matos


Candelabro enfeitado (assobio)

Terrina enfeitada (assobio)

Arco enfeitado (assobio)

domingo, 19 de janeiro de 2025

Isabel Pires e o velho camponês alentejano


Velho camponês alentejano (2020). Isabel Pires (1955- ).


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Quem é a barrista
Isabel Catarrilhas Pires (1955-  ) é uma consagrada barrista da velha guarda. Começou a modelar o barro em 1986 por auto-aprendizagem e com alguma orientação de Quirina Marmelo. Inspirou-se nos modelos expostos no Museu Municipal de Estremoz, mas desde sempre conferiu ao seu trabalho um cunho muito pessoal.
Está certificada como artesã de Bonecos de Estremoz pela ADERE-CERTIFICA, ”entidade promotora da certificação de produções artesanais tradicionais, sinónimo da garantia da qualidade e autenticidade da produção.”
É uma barrista com uma produção diversificada que se espraia pelas diferentes tipologias de Bonecos de Estremoz. Nas suas criações enfatiza a identidade regional alentejana e é-lhe grata a temática da terceira idade.
A análise de uma figura reunindo os dois requisitos anteriores é objecto do presente texto.

Retrato de velho
Trata-se de uma figura antropomórfica masculina, envergando calças e capote, calçando botas e com a cabeça coberta por um chapéu.
Do capote emergem dois braços descaídos cobertos por mangas e com as mãos abertas, das quais a direita se apoia numa bengala.
A imagem assenta numa base cilíndrica de cor verde com pintas alternadamente amarelas e vermelhas a circundar a orla do topo superior.
O capote alentejano tem aba larga, gola forrada a pele de borrego e três romeiras. A abotoadura frontal do capote é assegurada por 3 botões. Duas patilhas fixas com botões na banda esquerda da romeira superior asseguram a abotoadura em dois botões pregados na banda direita.
O chapéu sem fita, tem copa cilíndrica com topo abaulado convexamente e aba circular virada para baixo.
As calças e as mangas do casaco são singelas, não merecendo nenhuma referência especial.
O capote, a bengala e a gola do capote são de cor castanha, de diversas tonalidades, sendo a última matizada. As calças são de cor azul. O chapéu, as botas, as mangas do casaco e os botões são de cor negra.

Simbólica da figura
Importa descobrir e relevar todas as mensagens encerradas na figura. Em primeiro lugar, o SIMBOLISMO DAS CORES: - Castanho, cor neutra ligada à terra, à natureza e aos agricultores; - Azul, cor fria associada ao céu e que veicula as ideias de tranquilidade, serenidade e harmonia. - Negro, cor neutra associada ao luto, ao respeito, ao isolamento e à solidão.
Em segundo lugar, o SIMBOLISMO DO CAPOTE, peça de vestuário que tem a ver com a identidade regional alentejana, porque simboliza a protecção conferida aos camponeses na sua labuta à chuva, ao frio e ao vento das mais rigorosas invernias.
Em terceiro lugar, o SIMBOLISMO DA BENGALA, acessório que entre outras funções é um auxiliador da locomoção de pessoas idosas, doentes ou com traumatismos.
A tipologia do capote, a singeleza das calças, a fisionomia do rosto e o recurso à bengala, permitem concluir estarmos em presença de um velho camponês alentejano.

Análise
Ao contrário do que acontece noutros criadores, nenhum componente da figura foi unicamente pintado, já que todos eles foram modelados e apresentam volumetria.
A modelação foi apurada e revela um rosto bem delineado. Os olhos têm profundidade com as órbitas brancas delimitadas por duas pestanas negras e nas quais se inserem meninas do olho igualmente negras, encimadas por espessas sobrancelhas grisalhas. Igualmente o nariz, a boca, o queixo, as orelhas e o cabelo grisalho estão bem definidos. O nariz apresenta narinas e é observável a morfologia das orelhas. O rosto apresenta rugas. As mãos estão bem definidas e nelas os dedos ostentam unhas, como se de mãos reais se tratasse. As calças amachucadas revelam uso. No capote é perceptível a textura da lã na gola, os botões apresentam orifícios por onde passa a linha e a romeira superior arqueada sugere que o idoso caminha contra o vento. Tudo isto integra as marcas identitárias da barrista e é revelador do tratamento naturalista das suas figuras, fruto da importância que concede aos pormenores na execução das mesmas. Nesse sentido distancia-se do estilo mais popular doutros barristas do presente e do passado. As suas criações tais como as de Jorge da Conceição, cada um à sua maneira, têm um cunho mais erudito que as restantes, sem contudo deixarem de ser Bonecos de Estremoz. Com efeito, de acordo com o CADERNO DE ESPECIFICAÇÕES PARA A CERTIFICAÇÃO DOS BONECOS DE ESTREMOZ, “… a inovação estética não constitui um problema per si pois é garante da renovação de tipologias e temáticas dos Bonecos de Estremoz.”
De salientar que na decoração da figura, a barrista utilizou sabiamente uma harmoniosa tricromia com recurso a duas cores neutras (castanho e preto) e uma cor fria (azul). Às primeiras está associada pouca energia e à segunda está associado o frio. Creio que sob o ponto de vista cromático, foram as cores mais adequadas para associar à terceira idade, considerada o Inverno da vida.
Como é sabido, valorizo muito os barristas possuidores de marcas identitárias muito próprias e cujo estilo os distingue de outros barristas. Por isso, pela qualidade e riqueza da modelação, pela harmonia cromática da decoração e pela original conjugação da identidade regional alentejana com a temática da terceira idade, a barrista é merecedora das minhas felicitações:
- Parabéns, Isabel Pires!
Publicado inicialmente a 26 de Outubro de 2020

Isabel Pires (2015) a modelar o barro no seu atelier. 
Fotografia recolhida
com a devida vénia no Facebook do Município de Estremoz. 

domingo, 28 de julho de 2024

Sara Sapateiro, uma barrista de Estremoz na Feira de Artesanato de Vila do Conde

 



Sara Sapateiro participou entre 20 e 27 de Julho na 46ª Feira Nacional de Artesanato de Vila do Conde, em stand partilhado com a barrista Maria Isabel Catarrilhas Pires. Fê-lo como artesã produtora de Figurado de Estremoz, na condição de barrista independente, que se inscreveu por sua própria iniciativa e se deslocou pelos seus próprios meios.

À Feira levou trabalhos como “Sagrada Família”, “Nossa Senhora da Conceição”, “Amor é cego”, “Primavera” e “Presépio de altar”, dentro do âmbito do Figurado de Estremoz. Fora deste apresentou ainda um “Busto de pastor alentejano”.

O “Presépio de altar” participou na 2ª edição do “Concurso Jovem Artesão”, que teve lugar durante a Feira, sem todavia ser distinguido pelo Júri.

Sara Sapateiro (1995-  ), sobre a qual já elaborei o texto Sara Sapateiro e o aristocrata rural (ler aqui), é discípula da barrista Maria Isabel Isabel Catarrilhas Pires, com a qual começou a trabalhar em 2018. No ano seguinte frequentou o Curso de Formação sobre Técnicas de Produção de Bonecos de Estremoz, que teve lugar no Centro Interpretativo do Boneco de Estremoz, no Palácio dos Marqueses de Praia e Monforte. O Curso foi promovido pelo CEARTE - Centro de Formação Profissional para o Artesanato e Património, em parceria com o Município de Estremoz. No Curso aprofundou os conhecimentos de Barrística de Estremoz, com Mestre Jorge da Conceição.

De então para cá tem modelado e criado de uma forma fluida, imagens que umas vezes se integram no Figurado de Estremoz e outras vezes não, mas que têm o seu público, já que são apelativas, não só pela modelação como pelo cromatismo.

Desde 28 de Maio do ano em curso que é portadora de Carta de Artesão e de Unidade Produtiva Artesanal na área da Cerâmica Figurativa, emitida pelo CEARTE.

Creio que em devido tempo, que só a ela cabe decidir, submeterá a sua produção a processo de certificação como artesã produtora de Bonecos de Estremoz, junto da Adere-Certifica, organismo nacional de acreditação a quem compete a certificação de produções artesanais tradicionais, com garantia da qualidade e autenticidade da produção.

Hernâni Matos



sábado, 27 de julho de 2024

Maria Isabel Catarrilhas Pires, uma barrista de Estremoz na Feira de Artesanato de Vila do Conde

 


Há já algum tempo que venho acompanhando o trabalho da barrista Maria Isabel Catarrilhas Pires, sobre a qual comecei por escrever uma pequena nota biográfica no meu livro BONECOS DE ESTREMOZ, publicado em 2018, a qual pode ser lida aqui.

Desde 2018 que a barrista tem a sua produção certificada pela ADERE-CERTIFICA, único organismo de certificação acreditado pelo IPAC - Instituto Português de Acreditação. Significa isto que os Bonecos de Estremoz produzidos por Maria Isabel Catarrilhas Pires, estão de acordo com o MANUAL DE CERTIFICAÇÃO “BONECOS DE ESTREMOZ”, publicado pela ADERE-CERTIFICA em 2018. De acordo com aquele manual, os Bonecos de Estremoz de Maria Isabel Catarrilhas Pires, obedecem à TÉCNICA DE PRODUÇÃO e à ESTÉTICA DO BONECO DE ESTREMOZ.

O acompanhamento do trabalho desta barrista tem-me levado a elaborar textos sobre algumas das suas criações: Isabel Pires e o velho camponês alentejano – 2020 (ler aqui), Isabel Pires e a Alegoria do Outono – 2020 (ler aqui) e "O Amor é cego" com a "Sagrada Família" no coração – 2021 (ler aqui). Esta última criação, assim como as alegorias das 4 estações, estão entre os exemplares em que é mais notória a criatividade da barrista. No caso de "O Amor é cego" com a "Sagrada Família" no coração teve a genialidade de conceber uma figura composta tematicamente bivalente, uma vez que é simultaneamente um Presépio e uma figura de Carnaval. No caso das alegorias das quatro estações, porque teve a ousadia de abordar a criação de alegorias das outras estações para além da Primavera. Fê-lo duma forma coerente com a representação da Primavera. São exemplos paradigmáticos das suas criações que me apraz registar e que integram a sua participação entre 20 e 27 de Julho, em stand partilhado com a barrista Sara Sapateiro, na 46ª Feira Nacional de Artesanato de Vila do Conde. Fá-lo na condição de barrista independente, que se inscreveu por sua própria iniciativa e se deslocou pelos seus próprios meios.
A barrista, como já tive oportunidade de observar, tem um estilo acentuamente personalizado, assente numa profunda interpretação naturalista e num cromatismo muito vivo, que tornam apelativas as figuras que cria. Como tal é merecedora dos meus melhores encómios.

quinta-feira, 12 de outubro de 2023

Poesia Portuguesa - 103

 


SÃO BONECOS DE ESTREMOZ
Poema de Hernâni Matos
 (1946 -  )


Modelar é uma arte,
solta do coração
e que dali a reparte,
guiada a cada mão.

É com mãos e com barro,
água, teques e jeito,
um encontro bizarro:
modelar a preceito.

Tem bola, rolo, placa.
Com eles vai fazer,
tudo o que se destaca.
É lindo de se ver.

O rolo dá um braço
e dá a perna então,
com um gesto do traço
que nasce com a mão.

A bola dá cabeça
e dá olhar, razão
para que lá mereça
ter lugar a visão.

Placa dá avental,
vestidos e safões.
É roupa sem igual
em várias ocasiões.

Após modelação,
é cozer e pintar.
Envernizar então,
e sua obra acabar.

Secar para cozer,
com o tempo a passar,
para não acontecer,
a figura estalar.

Cozer tem a sua arte,
nunca é de repente,
que a figura se parte.
Disso estou bem ciente.

Pigmentos são zarcão
e azul dito Ultramar.
Como ocre e vermelhão,
dão tintas p'ra pintar.

As cores são reais,
são representação
desses dados visuais,
fruto da observação.

O verniz dá beleza,
concede protecção,
previne da rudeza
de feia alteração.

Há Presépios e Santos,
desfilam procissões
e há muitos recantos
das humanas paixões.

Tem a mulher no lar,
com o chá a servir,
com a roupa a lavar
e o que mais há de vir.

Da cidade o aguadeiro,
a mulher dos chouriços,
o peralta e leiteiro,
como outros aqui omissos.

Do campo uma ceifeira,
um pastor e um ganhão,
mais uma azeitoneira,
todos os que ali estão.

Galeria dos Santos:
onde vai São João,
a Virgem aos prantos
e António folião.

Também a procissão,
mostra solenidade,
com padre, sacristão,
povo mais irmandade.

O Natal é chegado
e logo nos seduz
o presépio montado.
Ali nasceu Jesus.

Lá vem o Carnaval
com o seu “Amor é Cego”
e Primavera tal,
que nenhuma renego.

E por fim os apitos.
Que bela brincadeira,
gozo de pequenitos,
bem à sua maneira.

O púcaro enfeitado,
cantarinha também.
Recipiente ornado
que beleza que tem.

Bonecos que cantamos
e só nos dão alegria.
Amigos quase humanos
no nosso dia a dia.

Assim, da Humanidade
tornaram-se Património,
orgulho da cidade
e do povo campónio.

Cá, os nossos barristas
brilharam bem então,
já que foram artistas
da classificação.

Barristas do presente,
barristas do passado
que a memória consente,
todo aqui é louvado.

Hernâni Matos (1946 - )

quinta-feira, 28 de setembro de 2023

Bonecos de Estremoz de Vera Magalhães

 

Vera Magalhães no seu espaço de trabalho.


"TRADIÇÃO E CULTURA“ é o título da exposição de Bonecos de Estremoz da barrista Vera Magalhães, inaugurada no Centro Interpretativo do Boneco de Estremoz, no passado sábado, dia 9 de Setembro, pelas 11 horas e que ali ficará patente ao público até ao próximo dia 26 de Novembro.
A exposição visa dar-nos uma ideia da actividade da artesã ao longo do seu percurso entre 2020 e 2023, para o que recorre a cerca de 40 figuras, repartidas por distintas tipologias
; - IMAGENS DEVOCIONAIS: Andor do Senhor dos Passos, Fuga para o Egipto, Nossa Senhora da Conceição, Rainha Santa Isabel; - PRESÉPIOS: Presépio de 9 figuras; - FIGURAS DA FAINA AGRO-PASTORIL NAS HERDADES ALENTEJANAS: Ceifeira, Mulher a dobar, Mulher das galinhas, Mulher dos enchidos, Mulher dos perus, Pastor das migas, Pastor de tarro e manta, Pastor debaixo da árvore, Queijeira; - FIGURAS QUE TÊM A VER COM A REALIDADE LOCAL: Aguadeiro, Homem do harmónio, Lanceiro com bandeira, Leiteiro, Mulher a vender chouriços, Mulher das castanhas; - FIGURAS INTIMISTAS QUE TÊM A VER COM O QUOTIDIANO DOMÉSTICO: Mulher a lavar a roupa, Senhora a servir o chá, Senhora à varanda, Senhora ao toucador; - FIGURAS DE NEGROS: Reis negros (3); - FIGURAS ALEGÓRICAS: Amor é cego, Primavera (3); - ASSOBIOS: Galinha no cesto com flores, Galo na cadeira, Galo no pinheiro, Galo no poleiro (2); - GANCHOS DE MEIA: Bispo, Palhaço, Sacristão; - OLARIA ENFEITADA: Cantarinha enfeitada (2), Castiçal (2), Pucarinho enfeitado (1);

“TRADIÇÃO” E CULTURA” é a primeira exposição individual de Vera Magalhães, que com ela se sente realizada pessoalmente, uma vez que o convite para expor é um corolário natural da sua certificação como barrista produtora de Bonecos de Estremoz, reconhecimento que lhe foi conferido pela Adere-Certifica em 2023. Anteriormente à presente exposição, a artesã já participara em exposições colectivas temáticas, promovidas pelo Museu Municipal de Estremoz e pelo Centro Interpretativo do Boneco de Estremoz.


Publicado inicialmente a 27 de Setembro de 2023
Fotografias de Vera Magalhães


Presépio de 9 figuras.

Fuga para o Egipto. 

Senhor dos Passos.

Rainha Santa Isabel.

Ceifeira.

Pastor de tarro e manta.

Pastor das migas.

Pastor debaixo da árvore.

Mulher das galinhas.

Mulher dos perus.

Queijeira.

Mulher a dobar.

Aguadeiro.

Leiteiro.

Mulher das castanhas.

Mulher a vender chouriços.

Homem do harmónio.

Mulher a lavar a roupa.

Senhora a servir o chá.

Senhora no toucador.

Senhora à varanda.

Reis negros.

Amor é cego.

Primavera.

Primavera.

Primavera.

Assobios.

Cantarinha.

Pucarinho

quarta-feira, 27 de setembro de 2023

TRADIÇÃO E CULTURA - Bonecos de Estremoz de Vera Magalhães

 

Isabel Borda d'Água, directora do Museu Municipal de Estremoz, faz a apresentação
 da barrista Vera Magalhães (ao centro). À direita, a Vice-presidente da Câmara Municipal
de Estremoz, Sónia Caldeira. 

APRECIE AQUI EM PORMENOR

Este o título da exposição de Bonecos de Estremoz da barrista Vera Magalhães, inaugurada no Centro Interpretativo do Boneco de Estremoz, no passado sábado, dia 9 de Setembro, pelas 11 horas e que ali ficará patente ao público até ao próximo dia 26 de Novembro.


Acto inaugural
Ao acto inaugural compareceram cerca de 3 dezenas de pessoas, entre elas entidades oficiais, familiares, amigos e admiradores, que ali foram testemunhar a admiração que têm pela barrista e pelo seu labor.
A cerimónia foi iniciada por Isabel Borda d’Água, directora do Museu Municipal de Estremoz, a qual historiou o processo formativo da artesã e teceu os melhores encómios sobre o seu trabalho. Seguidamente, a Vice-presidente da Câmara, Sónia Caldeira, afirmou que entre os objectivos do Município se insere a divulgação dos trabalhos dos barristas certificados na sequência da frequência do Curso de Formação sobre Técnicas de Produção de Bonecos de Estremoz, ocorrido em 2019. Seguidamente, louvou o trabalho da artífice, a quem felicitou pela presente exposição. Finalmente, usou da palavra a expositora Vera Magalhães, a qual começou por justificar a designação ”Tradição e Cultura”, atribuída à exposição, já que a mesma é de Bonecos de Estremoz, cuja produção faz parte integrante da identidade cultural e das tradições de Estremoz, as quais queremos salvaguardar. Agradeceu seguidamente a presença de todos os que ali foram testemunhar apreço pelo seu trabalho, bem como ao Município de Estremoz, ao CEARTE e à Adere-certifica, que asseguraram o enquadramento institucional do Curso de Formação sobre Técnicas de Produção de Bonecos de Estremoz que frequentou em 2019.

Infância e Juventude
A barrista, de seu nome completo, Vera Maria de Sousa Lara Cruz Gomes Ramos de Magalhães, nasceu e foi baptizada em 1966 na Freguesia de Nossa Senhora de Fátima, em Lisboa. Tem 4 irmãos (Ana Madalena, Filipa, Mafalda e Luís).
Logo na infância manifestou grande interesse pelo desenho e pela pintura. Houve mesmo uma época em que pintava móveis de madeira para quartos de crianças.
Iniciou os estudos numa prestigiada escola internacional britânica privada, a St Julian's School, em Carcavelos, seguindo-se o Liceu de São João do Estoril. Posteriormente ingressou no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas, em Lisboa, onde tirou uma Licenciatura em Comunicação Social e Marketing. Enquanto estudava e durante um ano fez um Curso de Desenho na Sociedade Nacional das Belas Artes, em Lisboa. Mais tarde, efectuou uma Pós-Graduação em Gestão Agro-Industrial.
Na juventude, a ocupação de tempos livres era preenchida com prática desportiva, leituras e convívio com os amigos.

Vida familiar
Conheceu o marido, Bernardo Magalhães, agrónomo, quando tinha 16 anos, pois tinham o mesmo grupo de amigos. Casaram no Estoril em 1993, tinha ela 27 anos e ele 26. É mãe de 3 filhos: Sebastião, de 26 anos, Engenheiro Mecânico; Bernardo, de 22 anos, que acabou recentemente o Curso de Gestão Desportiva e está a trabalhar em Inglaterra; José, de 22 anos, estudante de Engenharia Naval.

Entrada na vida activa
Começou a trabalhar logo que acabou o Curso, tendo sucessivas ocupações. Viveu em Sevilha e trabalhou no Pavilhão de Portugal na Expo 92, em Sevilha. Trabalhou depois no Ministério da Cultura, no Ministério da Administração Interna, numa Agência de Publicidade em Évora, numa adega em Estremoz e há 14 anos que trabalha na adega J. Portugal Ramos Vinhos.

Formação como barrista
O seu interesse pelos Bonecos de Estremoz manifestou-se há 30 anos, quando foi viver para Veiros, onde reside na herdade da Torrinha.
Na casa dos seus sogros teve o primeiro contacto com os Bonecos de Estremoz, que desde logo a apaixonaram, levando-a a acalentar a esperança de um dia também os saber produzir.
Vera Magalhães já tivera uma primeira experiência com barro na St Julian's School, em Carcavelos, a que se seguiu em 2019, uma pequena formação nas Oficinas do Convento, em Montemor-o-Novo.
Em 2019 frequentou o Curso de Formação sobre Técnicas de Produção de Bonecos de Estremoz, que teve lugar no Centro Interpretativo do Boneco de Estremoz, no Palácio dos Marqueses de Praia e Monforte. O Curso foi promovido pelo CEARTE - Centro de Formação Profissional para o Artesanato e Património, em parceria com o Município de Estremoz. O Curso com a duração de 150 horas e de Nível QNQ 2, teve formação técnica a cargo do barrista Mestre Jorge da Conceição.
Vera Magalhães considera um privilégio ter tido Jorge da Conceição como formador, não só por ser um excelente profissional, mas também pelas qualidades humanas como pessoa.
Concluído o Curso, sentiu-se motivada a dar continuidade à produção de Bonecos de Estremoz, pelo que na sua casa, criou um espaço de oficina, onde tem parte da colecção de Bonecos de Estremoz dos seus sogros, os quais estiveram na origem da sua paixão por esta arte popular e que constituem uma das suas fontes de inspiração. É aí que modela, coze e pinta a suas criações, o que faz à noite e nos fins de semana, pois há que conciliar a actividade como barrista com a actividade profissional que lhe é anterior.
Em 2022 recebeu Carta de Artesão e de Unidade Produtiva Artesanal na área da Cerâmica Figurativa, emitida pelo CEARTE. Também em 2023 foi reconhecida como artesã produtora de Bonecos de Estremoz. O reconhecimento consta de um certificado atribuído pela Adere-Certifica, organismo nacional de acreditação a quem compete a certificação de produções artesanais tradicionais, com garantia da qualidade e autenticidade da produção.
O ano de 2023 é um ano marcante na vida de Vera Magalhães, pois passa a produzir e a comercializar Bonecos de Estremoz, como artesã certificada. A barrista encara a sua certificação pela Adere-Certifica como uma benesse, fruto do seu empenho e trabalho, que desta forma foi reconhecido e ficou valorizado.
Vera Magalhães frequentou também o Curso de Olaria que por módulos teve lugar a partir de 2021, no Centro Interpretativo do Boneco de Estremoz. Considera um privilégio ter tido Mestre Xico Tarefa como formador, visto ser um Mestre oleiro prestigiado, com longa experiência e sempre pronto a ajudar os formandos.
A sua inscrição no Curso de Olaria foi fruto da convicção dele constituir um complemento ao Curso de Formação sobre Técnicas de Produção de Bonecos de Estremoz, que frequentou em 2019. De resto, a essa inscrição não foi estranha a vontade de contribuir para a revitalização da olaria, extinta em Estremoz.
A frequência deste Curso teve naturalmente os seus frutos e é Vera Magalhães que na roda de oleiro, modela as cantarinhas, pucarinhos e castiçais que posteriormente irá enfeitar.

Sinopse da exposição
A exposição visa dar-nos uma ideia da actividade da barrista ao longo do seu percurso entre 2020 e 2023, para o que recorre a cerca de 40 figuras, repartidas por distintas tipologias; - IMAGENS DEVOCIONAIS: Andor do Senhor dos Passos, Fuga para o Egipto, Nossa Senhora da Conceição, Rainha Santa Isabel; - PRESÉPIOS: Presépio de 9 figuras; - FIGURAS DA FAINA AGRO-PASTORIL NAS HERDADES ALENTEJANAS: Ceifeira, Mulher a dobar, Mulher das galinhas, Mulher dos enchidos, Mulher dos perus, Pastor das migas, Pastor de tarro e manta, Pastor debaixo da árvore, Queijeira; - FIGURAS QUE TÊM A VER COM A REALIDADE LOCAL: Aguadeiro, Homem do harmónio, Lanceiro com bandeira, Leiteiro, Mulher a vender chouriços, Mulher das castanhas; - FIGURAS INTIMISTAS QUE TÊM A VER COM O QUOTIDIANO DOMÉSTICO: Mulher a lavar a roupa, Senhora a servir o chá, Senhora à varanda, Senhora ao toucador; - FIGURAS DE NEGROS: Reis negros (3); - FIGURAS ALEGÓRICAS: Amor é cego, Primavera (3); - ASSOBIOS: Galinha no cesto com flores, Galo na cadeira, Galo no pinheiro, Galo no poleiro (2); - GANCHOS DE MEIA: Bispo, Palhaço, Sacristão; - OLARIA ENFEITADA: Cantarinha enfeitada (2), Castiçal (2), Pucarinho enfeitado (1);
O conjunto dos trabalhos agora apresentados por Vera Magalhães incorpora exclusivamente o núcleo central dos Bonecos de Estremoz, habitualmente designado por “Bonecos da Tradição”. As figuras expostas inspiram-se em exemplares existentes na casa dos sogros, bem como em exemplares dos acervos do Museu Municipal e do Centro Interpretativo do Boneco de Estremoz.
“TRADIÇÃO E CULTURA” (2023) é a primeira exposição individual de Vera Magalhães, que com ela se sente realizada pessoalmente, uma vez que o convite para expor é um corolário natural da sua certificação como barrista produtora de Bonecos de Estremoz, reconhecimento que lhe foi conferido pela Adere-Certifica em 2023. Anteriormente à presente exposição, a artesã já participara em exposições colectivas temáticas, promovidas pelo Museu Municipal de Estremoz e pelo Centro Interpretativo do Boneco de Estremoz.

Características do trabalho da barrista
Desde o início da sua formação como barrista que Vera Magalhães tem revelado um estrito respeito pela técnica de produção e pela estética do Boneco de Estremoz. A comparação de figuras produzidas em momentos diferentes, revela que a artesã tem procurado o seu próprio caminho. Tal é notório na representação do olhar e na decoração dos assobios. Os Bonecos de Vera Magalhães apresentam marcas identitárias muito próprias que os distingue dos demais, o que é revelador de que é dotada de forte personalidade artística e de um estilo muito próprio, factos que me apraz registar e enaltecer. Daí que a felicite por toda a sua motivação e dedicação à produção de Bonecos de Estremoz, indissociavelmente ligada à identidade cultural local e classificada em 2017 pela UNESCO como Património Cultural Imaterial da Humanidade.

Texto publicado no jornal E nº 318, de 28-09-2023)
Publicado inicialmente a 27 de Setembro de 2023
Fotografias de Luís Mendeiros - CME


Vera Magalhães, fazendo uma visita guiada à exposição.

Vera Magalhães falando com a Vice-presidente da Câmara, Sónia Caldeira.

Vera Magalhães com o Mestre Jorge da Conceição.

Vera Magalhães com o marido e filhos.

quinta-feira, 25 de maio de 2023

CURIOSIDADES - Figurado de Estremoz de Inocência Lopes

 

Inocência Lopes na Casa do Alentejo, em Lisboa. Fotografia de Luís Mendeiros . CME.

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Esta a designação da exposição inaugurada no Centro Interpretativo do Boneco de Estremoz, na passada 5ª feira, dia 18 de Maio, pelas 11 horas e que ali ficará patente ao público até ao próximo dia 3 de Setembro.
Ao acto inaugural compareceram cerca de 2 dezenas de pessoas, entre familiares, amigos e admiradores da barrista Inocência Lopes, que ali foram testemunhar a estima que nutrem por ela e pelo seu trabalho.
O evento foi iniciado por Isabel Borda d’Água, directora do Museu Municipal de Estremoz, que historiou o percurso formativo da barrista e elogiou o seu trabalho. Seguidamente usou da palavra a artesã, que justificou o título da Exposição e que emocionada agradeceu o apreço manifestado pelos presentes, assim como o trabalho de mestria dos seus formadores, bem como o enquadramento proporcionado pelo Município, pelo CEARTE e pela ADERE-CERTIFICA.

Infância e juventude
A barrista, de seu nome completo, Inocência Isabel Gonçalves Saias Lopes, nasceu em 1973 no Monte do Redondinho, na Freguesia de Évora Monte e foi a terceira de quatro irmãos (2 rapazes e 2 raparigas). Foi baptizada na Igreja de S. Pedro em Évora Monte, vila e freguesia onde completou o 1º e o 2º ciclo do Ensino Básico. Desse tempo, lembra-se das brincadeiras de infância com outras crianças suas vizinhas, de ser muito reservada na escola e tem boas recordações das férias de Verão.
Começou a trabalhar muito jovem, revelando interesse e até mesmo paixão pelo artesanato, de tal modo que aos 15 anos já dizia que um dia havia de ter uma loja de artesanato no Castelo de Évora Monte. Com 15/16 anos frequentou um curso de tecelagem e de tinturaria vegetal, a que se seguiu uma formação em tapetes de Arraiolos. Dos 18 aos 20 anos foi baby-sitter e mais tarde foi viver para Quarteira durante um ano, entre 1994 e 1995, aí trabalhando em Hotelaria.
Aos 16 anos começou a namorar com um jovem de 19, José Manuel da Silva Lopes, que conhecia desde a escola primária e com quem casou em 1993, em cerimónia realizada na Igreja de São Pedro, em Évora Monte. Do casamento nasceria um filho, José Manuel Gonçalves Lopes, actualmente com 25 anos de idade e designer gráfico, interessado por tudo que é arte e que já revelou potencialidades de poder dar continuidade ao trabalho da mãe, como barrista de bonecos de Estremoz.
Em 2003/2004, Inocência Lopes frequentou um Curso de Formação Profissional do IEFP, com equivalência ao 9º ano de escolaridade. Em 2005 concretizou o antigo sonho de abrir uma loja de artesanato dentro do Castelo de Évora Monte, o que veio a acontecer no nº 11 da Rua da Convenção, local onde até 1915 tinha funcionado o Celeiro Comum, fundado por alvará de D. João IV, em 1642. Devido à sua localização, a loja passaria a ser designada por Loja de Artesanato Celeiro Comum e entre outras coisas eram ali comercializadas cadeiras alentejanas, louça regional, artefactos em cortiça e pantufas de pele. Em 2010, frequentou algumas aulas de Técnicas de Modelação de Bonecos de Estremoz, ministradas por Isabel Borda d´Água no Museu Municipal de Estremoz, as quais não puderam ter continuidade, por motivos de natureza pessoal. Entretanto, frequentou várias formações em pintura e técnicas de artes decorativas, visando comercializar os seus trabalhos. Todavia, a atracção exercida pelos Bonecos de Estremoz, revelar-se-ia crucial.

O nascimento da barrista
Em 2019 frequentou o Curso de Formação sobre Técnicas de Produção de Bonecos de Estremoz, que teve lugar no Centro Interpretativo do Boneco de Estremoz, no Palácio dos Marqueses de Praia e Monforte. O Curso foi promovido pelo CEARTE - Centro de Formação Profissional para o Artesanato e Património, em parceria com o Município de Estremoz. O Curso com a duração de 150 horas e de Nível QNQ 2, teve formação técnica a cargo do barrista Mestre Jorge da Conceição. Em 2022 recebeu Carta de Artesão e de Unidade Produtiva Artesanal na área da Cerâmica Figurativa, emitida pelo CEARTE.
Também em 2022 foi reconhecida como artesã produtora de Bonecos de Estremoz. O reconhecimento consta de um certificado atribuído pela Adere-Certifica, organismo nacional de acreditação a quem compete a certificação de produções artesanais tradicionais, com garantia da qualidade e autenticidade da produção.
O ano de 2022 é um ano relevante na vida de Inocência Lopes, que passa a produzir e a comercializar Bonecos de Estremoz, como artesã certificada. Trata-se de uma condição que para além de constituir uma mais valia na salvaguarda do Boneco de Estremoz, a enche de orgulho por constituir o reconhecimento da qualidade e do mérito do seu trabalho como barrista.

A exposição em si
A exposição intenta dar-nos uma ideia do que é o trabalho da barrista na actualidade, para o que recorre a cerca de 40 trabalhos, distribuídos por diferentes tipologias; - IMAGENS DEVOCIONAIS: Menino Jesus do Missal, Nossa Senhora da Conceição, Pão de Santo António, Rainha Santa Isabel (Milagre das Rosas), Santo António com o Menino ao colo; - PRESÉPIOS: Presépio de 3 figuras, Presépio da manta alentejana; - FIGURAS DA FAINA AGRO-PASTORIL NAS HERDADES ALENTEJANAS: Dia da espiga, Mulher dos carneiros, Mulher dos enchidos, Mulher dos perus, Par do Rancho Convenção de Évora Monte; - FIGURAS QUE TÊM A VER COM A REALIDADE LOCAL: Dama, Mulher a vender chouriços, Peralta; - FIGURAS INTIMISTAS QUE TÊM A VER COM O QUOTIDIANO DOMÉSTICO: Mulher a lavar a roupa, Senhora a servir o chá, Senhora ao espelho; - FIGURAS DE NEGROS: Preta florista, Rei negro (par); - FIGURAS ALEGÓRICAS: Amor é cego (par), Vitória de Estremoz, Primavera (duas), Primaveras de arco (três); - ASSOBIOS: Arco enfeitado, Candelabro enfeitado, Pucarinho enfeitado, Terrina enfeitada;
O conjunto dos trabalhos agora expostos integra na sua maioria, o núcleo central dos Bonecos de Estremoz, habitualmente designado por “Bonecos da Tradição”. Em particular, algumas das figuras expostas inspiram-se em exemplares da colecção Júlio dos Reis Pereira, pertencente ao acervo do Museu Municipal de Estremoz. Todavia e para além disso, no conjunto agora exposto figuram exemplares englobáveis naquilo que se convencionou designar por “Bonecos da Inovação”. Trata-se de modelos que ainda não tinham sido criados por outros barristas. Tal é o caso de composições como “Dia da espiga”, “Par do Rancho Convenção de Évora Monte” e “Presépio da manta alentejana”, que ostentam em comum, marcas identitárias da cultura alentejana, nomeadamente a nível do traje. Tal é ainda o caso dos assobios designados por “Arco enfeitado”, “Candelabro enfeitado”, “Pucarinho enfeitado”, “Terrina enfeitada”. Neste caso, a inovação foi acompanhada de uma verdadeira mudança de paradigma. Com efeito e até ao presente, os assobios de barro vermelho de Estremoz, apresentavam como padrão comum, o facto de a sua decoração integrar uma ave, uma figura antropomórfica (Senhora de pezinhos, Peralta, Sargento) ou uma figura mista (Amazona, Peralta a cavalo, Sargento a cavalo). A partir de agora e com Inocência Lopes, os assobios passam também a integrar espécimes de olaria enfeitada como elementos decorativos. Trata-se de uma inovação visualmente harmoniosa, que eu aplaudo e subscrevo.
“CURIOSIDADES” (2023) é a primeira exposição individual de Inocência Lopes, que a encara como um misto de realização pessoal e de reconhecimento e valorização do seu trabalho. Anteriormente e em termos colectivos, a barrista já participara em certames como a Feira Nacional de Artesanato de Vila do Conde (2022) e a FIA - Feira Internacional de Artesanato, em Lisboa (2022).

Características do trabalho da barrista
Na execução dos seus trabalhos, Inocência Lopes respeita os cânones da técnica de produção e da estética dos Bonecos de Estremoz, o que vem fazendo desde o início da sua formação como barrista. É um trabalho que vem aprofundando, na procura incessante da perfeição e do seu próprio caminho, através da afirmação de um estilo caracterizado por marcas identitárias diferenciadoras que a vão distinguindo dos outros barristas.
A representação do olhar e das maçãs do rosto é inconfundível e o cromatismo das suas figuras, vivo ou suave, é sempre harmonioso.
Congratulo-me com a qualidade dos trabalhos agora expostos por Inocência Lopes, que nos revelam a existência de uma nova estrela no firmamento da barrística popular de Estremoz. Mais uma vez se constata a importância e a relevância que teve o Curso de Formação sobre Técnicas de Produção de Bonecos de Estremoz, promovido em 2019 pelo CEARTE, em parceria com o Município de Estremoz.

Contactos
Visando facilitar o contacto com a barrista, disponibilizo aqui os vários modos de o fazer: INOCÊNCIA LOPES / Artesanato - Celeiro Comum de Évora Monte / Rua da Convenção 11, 7100-314 Évora Monte / TELEFONE: 966 759 534 / EMAIL: celeirodocomum@hotmail.com

Publicado no jornal E, nº 215, de 25 de Maio de  2023

Isabel Borda d'Água apresentando Inocência Lopes e a sua exposição. 
Fotografia de Miguel Belfo -  CME.

Uma visão geral da exposição de Inocência Lopes. 
Fotografia de Miguel Belfo -  CME.

 Inocência Lopes com o marido, filho e nora. 
Fotografia de Miguel Belfo -  CME.