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sexta-feira, 8 de dezembro de 2023

Vera Magalhães recebeu o Certificado de Artesã Produtora de Bonecos de Estremoz

 

A barrista Vera Magalhães ladeada pelo  Presidente do Município, José Daniel Sadio
pelo Presidente da Assembléia Municipal, Ricardo Catarino.
 Fotografia de Município de Estremoz.

Teve lugar ontem no Salão Nobre dos Paços do Concelho de Estremoz, uma Sessão Comemorativa do 6.º aniversárioda Inscrição da Produção de Figurado em Barro de Estremoz na ListaRepresentativa de Património Cultural Imaterial da UNESCO.

No decurso da cerimónia foi entregue à barrista Vera Magalhães, o Certificado de Artesã Produtora de Bonecos deEstremoz, que lhe foi outorgado pela Adere-CERTIFICA, entidade credenciada para conceder aquela certificação.

Anteriormente, a barrista Vera Magalhães frequentou um “Curso de Formação sobre Técnicas de Produção de Bonecos de Estremoz”, que entre 20 de Setembro a 6 de Dezembro de 2019, teve lugar no Palácio dos Marqueses de Praia e Monforte, em Estremoz. O Curso foi promovido pelo CEARTE – Centro de Formação Profissional para o Artesanato e Património, em parceria com o Município de Estremoz. O Curso com a duração de 150 horas e de Nível QNQ 2, teve formação técnica a cargo do barrista Jorge da Conceição. Foi frequentado por 16 formandos, dos quais até à presente data, 4 foram certificados pela Adere – CERTIFICA, como artesãos produtores de Bonecos em Barro de Estremoz.

Mais recentemente, a barrista teve a Exposição “TRADIÇÃO E CULTURA - Bonecos de Estremoz de Vera Magalhães” patente ao público no Centro Interpretativo do Boneco de Estremoz, entre os dias 9 de Setembro e 26 de Novembro.



quinta-feira, 7 de dezembro de 2023

Aconteceu há 6 anos: Inscrição da Produção de Figurado em Barro de Estremoz na Lista Representativa do Património Cultural Imaterial da Humanidade

Parte da delegação portuguesa que se deslocou à República da Coreia. Da esquerda
para a direita: Luís Mourinha (Presidente da Câmara Municipal de Estremoz), Manuel
António Gonçalves de Jesus (Embaixador de Portugal na República da Coreia), António
Ceia da Silva (Presidente do Turismo do Alentejo) e Hugo Guerreiro (Director do Museu
Municipal de Estremoz e Responsável Técnico da Candidatura). Fotografia reproduzida
com a devida vénia, a partir do Facebook de António Ceia da Silva.


Importa aqui e mais uma vez, salientar o mérito daqueles a quem se deve o êxito de uma candidatura que se viria a tornar vitoriosa:
1º) Hugo Guerreiro, Director do Museu Municipal de Estremoz, que despoletou e argumentou a candidatura, a qual veio a ter êxito e que corresponde ao primeiro figurado do mundo a merecer a distinção de Património Cultural Imaterial da Humanidade.
2º) Os barristas do passado e do presente, que com o labor e criatividade das suas mãos mágicas e desde as bonequeiras de setecentos, transmitiram de geração em geração e até à actualidade, uma produção sui generis de Bonecos em barro, dita ao “modo de Estremoz”.
3.º) O escultor José Maria de Sá Lemos, que nos anos 30 do séc. XX e recorrendo à velha bonequeira Ana das Peles primeiro e ao Mestre oleiro Mariano da Conceição depois, deu um contributo decisivo para a revitalização da produção de Bonecos de Estremoz, considerada extinta desde 1921.
4º) Os estudiosos, investigadores, escritores e publicistas que com o seu esforço não deixaram morrer a memória dos Bonecos de Estremoz: Luís Chaves, D. Sebastião Pessanha, Virgílio Correia, Azinhal Abelho, Solange Parvaux, Joaquim Vermelho e outros.
5.º) Os coleccionadores, dos quais o mais destacado é Júlio dos Reis Pereira, que ao longo de décadas foram reunindo, catalogando, estudando, comparando e interpretando espécimes que viabilizaram a apresentação de uma candidatura pelo Município de Estremoz.
- BEM HAJAM!

quarta-feira, 6 de dezembro de 2023

Exposição "Menino Jesus no Berço"



Transcrito com a devida vénia de
newsletter do Município de Estremoz,
de 6 de Dezembro de 2023

O Centro Interpretativo para a Valorização e Salvaguarda do Boneco de Estremoz apresenta, a partir de 9 de dezembro, na sua Sala de Exposições Temporárias, a Exposição “Menino Jesus no Berço” – Figurado de Estremoz.
Esta exposição surge a partir do desafio lançado aos barristas, atualmente a produzirem figurado de Estremoz, para que fizessem, nesta época em que se celebra o nascimento de Jesus, a figura do Menino Jesus deitado no Berço.
Nesta mostra contamos com a participação dos Barristas Afonso e Matilde Ginja, Ana Catarina Grilo, Carlos Alberto Alves, Fátima Estróia, Inocência Lopes, Irmãs Flores, Isabel Pires, Jorge da Conceição, José Carlos Rodrigues, Luís Parente, Luísa Batalha, Madalena Bilro, Manuel Broa, Ricardo Fonseca e Vera Magalhães.
A exposição poderá ser visitada até 28 de janeiro de 2024.
Venha visitar!


quarta-feira, 29 de novembro de 2023

XVII Exposição de Presépios de Artesãos de Estremoz



Transcrito com a devida vénia de
newsletter do Município de Estremoz,
de 29 de Novembro de 2023

A Galeria D. Dinis vai receber a XVII Exposição de Presépios de Artesãos de Estremoz, de 1 de dezembro a 7 de janeiro de 2024.Esta mostra, que é já uma referência no Alentejo, contará com mais de 20 Presépios, produzidos em diversos materiais: Cerâmica, tecido, pedra, madeira, cortiça, vidro e metal.

Os artesãos participantes são: Afonso Ginja, Ana Catarina Grilo, António Moreira, Carlos Alberto Alves, Carlos Pereira, Conceição Perdigão, Duarte Catela, Fátima Lopes, Inocência Lopes, Irmãs Flores, Isabel Pires, Jorge Carrapiço, Jorge da Conceição, José Carlos Rodrigues, Luís Parente, Luísa Batalha, Madalena Bilro, Manuel Broa, Maria José Camões, Perfeito Neves, Ricardo Fonseca, Sara Sapateiro, Sofia Luna e Vera Magalhães.

Visite e sinta, através dos presépios, o espírito de um Natal Feliz.








terça-feira, 21 de novembro de 2023

6.º aniversário da inscrição da Produção de Figurado em Barro de Estremoz na Lista Representativa de Património Cultural Imaterial da UNESCO

 



Transcrito com a devida vénia de
newsletter do Município de Estremoz,
de 21 de Novembro de 2023.

O Município de Estremoz irá comemorar o 6.º aniversário da inscrição da Produçãode Figurado em Barro de Estremoz na Lista Representativa de Património CulturalImaterial da UNESCO", no dia 7 de dezembro de 2023, com o seguinte programa:

SALÃO NOBRE (CÂMARA MUNICIPAL DE ESTREMOZ)

- 18:00 horas - Cerimónia de Celebração do 6.º aniversário da inscrição da Produção de Figurado em Barro de Estremoz na Lista Representativa de Património Cultural Imaterial da UNESCO"

Hugo Alexandre Nunes Guerreiro, coordenador da candidatura e responsável pelo Plano de Salvaguarda;

José Daniel Pena Sádio, Presidente da Câmara Municipal de Estremoz.

- 18:20 horas - Entrega de Certificado de Produtor de Bonecos de Estremoz a Vera Magalhães.

- 18:25 horas - Conferências:

Ana Fonseca (CME) e Mathilda L. Coutinho (Centro Hercules da Universidade de Évora): Bonecos de Estremoz - à descoberta do imaterial;

Ana Cristina Mendes (Diretora adjunta do CEARE): Indicações Geográficas Europeias.

TEATRO BERNARDIM RIBEIRO

- 22:00 horas - Dezalinhados Filarmónica Rock Show com a Banda Sociedade Filarmónica Artística Estremocense e a Banda Filarmónica do Grupo União e Recreio Azarujense.

Entrada livre que carece de levantamento de bilhete no Teatro Bernardim Ribeiro ou Posto de Turismo.

Venha celebrar connosco!


Hernâni Matos

terça-feira, 24 de outubro de 2023

Uma Primavera de Mestre Jorge da Conceição

 

Fig. 1 - Primavera (aspecto frontal). Mestre Jorge da Conceição (1963 - ).


É sabido que colecciono Bonecos de Estremoz produzidos por todos os barristas, independentemente da época e do tema. E faço-o, por entender que não há uma maneira única de os produzir, já que cada barrista tem o seu próprio estilo e as suas próprias marcas identitárias, fruto de circunstâncias diversas, as quais me dispenso de analisar aqui. No acto de criação, apenas é exigido ao barrista que respeite a técnica de produção e a estética do Boneco em barro vermelho de Estremoz.
A minha colecção, apesar de invejada por muitos, apresenta alguns “calcanhares de Aquiles”. Um deles é não integrar como eu gostaria, um número julgado apropriado e representativo da produção de Mestre Jorge da Conceição. Daí que eu tenha resolvido tratar este calcanhar, o que me levou tempos atrás a encomendar-lhe algumas figuras. A primeira a ser-me entregue foi uma Primavera (Fig. 1 e Fig. 2), que de imediato, despertou em mim uma emoção que iria desembocar na redondilha maior que então compus:

Aquece-me o coração
Esta linda Primavera
De Jorge da Conceição,
Cuja posse era quimera.

A beleza da figura resulta de uma modelação perfeita, fortemente naturalista, conjugada com um cromatismo harmonioso. Para além disso, uma observação mais minuciosa do exemplar, torna possível deduzir que, no decurso da sua manufactura, ocorreu uma mudança de paradigma relativamente à produção de barristas que antecederam Mestre Jorge da Conceição.
Em primeiro lugar, as flores do arco deixaram de estar representadas por discos cilíndricos coloridos e pintalgados, para serem mostradas, ainda que de uma maneira generalista, por flores com tridimensionalidade, ostentando uma parte frontal e uma parte posterior, distintas.
Em segundo lugar, o vestido deixa de apresentar folhos apenas no fundo, para os apresentar também nos punhos e no amplo decote que vai de ombro a ombro.
Em terceiro lugar, a fita do chapéu deixa de ser uma mera pintura e adquire ela própria, tridimensionalidade.
Em quarto lugar, o topo da base deixa de ser sarapintado, pompeando aquilo que configura ser um chão atapetado de flores.
Tudo isto é de se lhe “tirar o chapéu” e dai que, apesar de ser paisano, me ponha duplamente em sentido. Em primeiro lugar, pelo trabalho de excelência de Mestre Jorge da Conceição. Em segundo lugar, pelo facto de a Primavera envergar um vestido com as cores da nossa bandeira nacional, que de imediato despertam em mim um sentimento patriótico.
Obrigado Mestre Jorge da Conceição por me ter enchido as medidas com esta criação germinada a partir da sua grande alma de artista e à qual a magia das suas mãos conferiu forma e cor, transmitindo-lhe harmonia, perfeição, beleza e elegância. Bem-haja!


Fig. 2 - Primavera (aspecto posterior). Mestre Jorge da Conceição (1963 - ).

sexta-feira, 13 de outubro de 2023

ANA DAS PELES na toponímia estremocense

 

Sá Lemos trocando impressões com Ana das Peles numa sala de aulas da Escola Industrial
 António Augusto Gonçalves. Fotografia de Rogério de Carvalho (1915-1988),  publicada
no semanário estremocense “Brados do Alentejo” nº 250, de 10 de Novembro de 1935. 


Novos topónimos concelhios
Em reunião do Município realizada no passado dia 28 de Junho, foi aprovada uma proposta da Comissão de Toponímia do Concelho de Estremoz, a qual integra a acta da sua reunião de 24 de Maio do ano em curso, no sentido de serem atribuídos novos topónimos, assim distribuídos: Estremoz (12), Veiros (10), Arcos (4).
Entre os 12 novos topónimos aprovados para Estremoz, figura o nome da barrista ANA DAS PELES (1869-1945), que assim viu a sua memória perpetuada através da atribuição do seu nome à rua que se inicia na Avenida Tomaz Alcaide e termina na Avenida Condessa da Cuba, junto à Associação Cultural e Recreativa dos Marinheiros de Estremoz, instalada no local do antigo Dispensário de Assistência aos Tuberculosos.

Ana das Peles, o novo topónimo
A proposta de inclusão do antropónimo “Ana das Peles” na toponímia local, teve origem numa proposta do Presidente da União das Freguesias (Santa Maria e Santo André), aprovada por unanimidade na reunião ordinária da Junta de Freguesia, de 14 de Fevereiro passado. O teor da proposta aprovada é o seguinte:
A 19 de Fevereiro de 2023 completam-se 78 anos sobre a morte da bonequeira Ana das Peles (1869-1945), velha barrista que foi o instrumento primordial da recuperação da extinta tradição de manufactura dos Bonecos de Estremoz, empreendida pelo escultor José Maria de Sá Lemos (1892-1971) nos anos 30 do séc. XX.
Em 1935 os Bonecos de Ana das Peles participaram na “Quinzena de Arte Popular Portuguesa” realizada na Galeria Moos, em Genebra. Em 1936 estiveram presentes na Secção VI (Escultura) da Exposição de Arte Popular Portuguesa ocorrida em Lisboa, em 1937 na Exposição Internacional de Paris e em 1940 na Exposição do Mundo Português, promovida em Lisboa.
Os Bonecos de Ana das Peles, foram nestas exposições, um ex-líbris de excelência da cidade de Estremoz. Eles foram os melhores embaixadores da nossa Arte Popular e da nossa identidade cultural local e regional. Eles foram, simultaneamente, a primeira declaração e a primeira prova insofismável de que na nossa terra existiam criadores populares de grande qualidade. Os Bonecos de Estremoz, até então relativamente pouco conhecidos, adquiriram por mérito próprio e muito justamente grande notoriedade pública.
Ana das Peles partiu, mas os seus Bonecos muito apreciados e procurados, povoam vitrinas de coleccionadores e de museus para deleite de espírito. Com eles a imagem de marca da nossa identidade cultural local e transtagana, testemunho e herança de uma época.
78 anos volvidos sobre a morte de Ana das Peles, os seus gestos de modeladora de sonhos, continuam a ser repetidos, ainda que recriados pelos barristas de hoje. Por isso Ana das Peles é imortal e os Bonecos de Estremoz serão eternos.
Ana das Peles é uma figura que pela sua acção desempenhou um papel de relevo na construção da Memória de Estremoz, pelo que não pode ser olvidada nas páginas da História local.
Desde 7 de Dezembro de 2017 que a manufactura de Bonecos de Estremoz está inscrita na Lista Representativa do Património Cultural Imaterial da Humanidade.
Como reconhecimento do papel desempenhado por Ana das Peles na recuperação duma tradição que corria o risco de se extinguir e que hoje é motivo de orgulho para todos os estremocenses, a Junta de Freguesia de Estremoz (Santa Maria e Santo André) propõe à Câmara Municipal de Estremoz, a perpetuação da Memória daquela barrista, incluindo o seu nome na toponímia local, usando a fórmula: “ANA DAS PELES / BARRISTA”.”

Quem se segue?
Até agora a toponímia estremocense já perpetuou o nome dos seguintes barristas: Mariano da Conceição (1903-1959), Sabina da Conceição Santos (1921-2005), Liberdade da Conceição (1913-1990), Maria Luísa da Conceição (1934-2015), Quirina Marmelo (1922-2009) e Ana das Peles (1869-1945). Todavia, para além deles há outros barristas falecidos que até agora foram esquecidos. São eles:
- António Lino de Sousa (1918-1982), oleiro da Olaria Alfacinha e discípulo de Mestre Mariano da Conceição, com quem aprendeu a manufacturar Bonecos de Estremoz, a cuja confecção se dedicou em exclusivo entre 1976 e a data do seu falecimento.
- José Moreira (1926-1991), discípulo de Ana das Peles e que foi o barrista que mais contribuiu para a divulgação dos Bonecos de Estremoz. Percorreu o país de lés a lés e não houve feira ou exposição de artesanato a que ele não fosse.
- Aclénia Pereira (1927-2012), que nos anos 40 do séc. XX foi discípula de Mestre Mariano da Conceição na Escola Industrial António Gonçalves e que foi barrista até ao fim da vida, mesmo depois de se ter transferido para Santarém, em cujo distrito foi uma grande embaixadora dos Bonecos de Estremoz.
- Isabel Carona (1949-2006), que foi uma das primeiras discípulas de Mestra Sabina da Conceição e que depois de trabalhar com ela durante dez anos, se fixou em Sarilhos Grandes, Montijo, onde continuou a arte bonequeira.
- Mário Lagartinho (1935-2016), o último oleiro de Estremoz, que como barrista confeccionou Bonecos de Estremoz nos anos 70-90 do século passado e que pela sua acção continuou a cadeia de transmissão de saberes.
- Arlindo Ginja (1938-2018), discípulo de Mário Lagartinho, que conjuntamente com seu irmão Afonso exerceu o mester durante 32 anos, até se aposentar em 2011.
Estes barristas, cada um à sua maneira, contribuiu para que a manufactura de Bonecos de Estremoz esteja actualmente inscrita na Lista Representativa do Património Cultural Imaterial da Humanidade. Daí ser da mais elementar justiça que o seu nome seja igualmente perpetuado na toponímia estremocense. Ficamos à espera.


Estremoz, 27 de Julho de 2023
Publicado no jornal E nº 319, de 13 de Outubro de 2023

Ana das Peles a modelar uma figura. Fotografia de Albert t’Serstevens (1886-1974)

Ana das Peles a pintar Bonecos na sua oficina na Rua Brito Capelo nº 21 em Estremoz,
local onde também residia na época. Fotografia de Rogério de Carvalho (1915-1988). 

A entrada da Rua Ana das Peles pelo lado da Avenida Condessa da Cuba.

Placa toponímica da RUA ANA DAS PELES / BARRISTA

quinta-feira, 12 de outubro de 2023

Poesia Portuguesa - 103

 


SÃO BONECOS DE ESTREMOZ
Poema de Hernâni Matos
 (1946 -  )


Modelar é uma arte,
solta do coração
e que dali a reparte,
guiada a cada mão.

É com mãos e com barro,
água, teques e jeito,
um encontro bizarro:
modelar a preceito.

Tem bola, rolo, placa.
Com eles vai fazer,
tudo o que se destaca.
É lindo de se ver.

O rolo dá um braço
e dá a perna então,
com um gesto do traço
que nasce com a mão.

A bola dá cabeça
e dá olhar, razão
para que lá mereça
ter lugar a visão.

Placa dá avental,
vestidos e safões.
É roupa sem igual
em várias ocasiões.

Após modelação,
é cozer e pintar.
Envernizar então,
e sua obra acabar.

Secar para cozer,
com o tempo a passar,
para não acontecer,
a figura estalar.

Cozer tem a sua arte,
nunca é de repente,
que a figura se parte.
Disso estou bem ciente.

Pigmentos são zarcão
e azul dito Ultramar.
Como ocre e vermelhão,
dão tintas p'ra pintar.

As cores são reais,
são representação
desses dados visuais,
fruto da observação.

O verniz dá beleza,
concede protecção,
previne da rudeza
de feia alteração.

Há Presépios e Santos,
desfilam procissões
e há muitos recantos
das humanas paixões.

Tem a mulher no lar,
com o chá a servir,
com a roupa a lavar
e o que mais há de vir.

Da cidade o aguadeiro,
a mulher dos chouriços,
o peralta e leiteiro,
como outros aqui omissos.

Do campo uma ceifeira,
um pastor e um ganhão,
mais uma azeitoneira,
todos os que ali estão.

Galeria dos Santos:
onde vai São João,
a Virgem aos prantos
e António folião.

Também a procissão,
mostra solenidade,
com padre, sacristão,
povo mais irmandade.

O Natal é chegado
e logo nos seduz
o presépio montado.
Ali nasceu Jesus.

Lá vem o Carnaval
com o seu “Amor é Cego”
e Primavera tal,
que nenhuma renego.

E por fim os apitos.
Que bela brincadeira,
gozo de pequenitos,
bem à sua maneira.

O púcaro enfeitado,
cantarinha também.
Recipiente ornado
que beleza que tem.

Bonecos que cantamos
e só nos dão alegria.
Amigos quase humanos
no nosso dia a dia.

Assim, da Humanidade
tornaram-se Património,
orgulho da cidade
e do povo campónio.

Cá, os nossos barristas
brilharam bem então,
já que foram artistas
da classificação.

Barristas do presente,
barristas do passado
que a memória consente,
todo aqui é louvado.

Hernâni Matos (1946 - )

Bonecos de Estremoz em Exposição na Assembleia da República


Mestre Jorge da Conceição tendo à sua direita, sucessivamente, o Presidente da
 Assembleia da República, Augusto Santos Silva e os Presidente e Vice-Presidente
 da Câmara Municipal de Estremoz, José Daniel Sádio e Sónia Caldeira.


Transcrito com a devida vénia de
newsletter do Município de Estremoz,
de 11 de Outubro de 2023.
Fotografias do Município de Estremoz


Foi inaugurada hoje, dia 11 de outubro, no Palácio de São Bento, uma exposição de Produtos Tradicionais Certificados, da qual fazem parte os Bonecos de Estremoz, o único produto certificado do Alentejo.

A iniciativa é promovida pelo Deputado Carlos Brás e pela A. Certifica (organismo de certificação de produções artesanais tradicionais) e estará patente até dia 13 de outubro.

Estremoz e os Bonecos de Estremoz são uma referência na Assembleia da República!

O Município de Estremoz agradece ao Mestre Jorge da Conceição a sua presença ao longo dos três dias de Exposição, enquanto representante desta arte!

Hernâni Matos


Mestre Jorge da Conceição tendo à sua esquerda, o Presidente da Câmara Municipal de
Estremoz, José Daniel Sádio e à sua direita, sucessivamente, a Vice-Presidente da Câmara
Municipal de Estremoz, Sónia Caldeira e os deputados pelo Círculo Eleitoral de Évora, Norberto
Patinho e Capoulas Santos.

Um aspecto parcial da exposição. 

quarta-feira, 2 de agosto de 2023

Carlos Alberto Alves na 45ª Feira Nacional de Artesanato de Vila do Conde


Clique na fotografia para ver o vídeo

Desde o passado domingo, dia 30 de Junho e até ao próximo domingo, dia 6 de Agosto, que o barrista Carlos Alberto Alves de Estremoz, estará presente na 45ª Feira Nacional de Artesanato de Vila do Conde, por convite da Organização da Feira.
Trata-se do único bonequeiro de Estremoz presente na Feira, uma vez que a prevista participação colectiva do Município de Estremoz, a convite da Organização da Feira, foi cancelada por aquele Município e não se concretizou, ao contrário do que aconteceu no ano anterior.
Segundo consta, alguns barristas terão revelado indisponibilidade para estar presentes, o que terá levado o Município de Estremoz a cancelar a sua participação.
Carlos Alberto Alves arcou sobre os seus ombros a pesada tarefa e responsabilidade de representar na Feira a produção dos Bonecos de Estremoz, classificados em 2017 pela UNESCO como Património Cultural Imaterial da Humanidade.
A excelência da participação de Carlos Alberto Alves, visualizável num breve vídeo do seu stand, o qual divulgou no Facebook, permitem-me desde já concluir que a missão a que se propôs, será necessariamente coroada de êxito. É caso para dizer:
- PARABÉNS CARLOS!








domingo, 23 de julho de 2023

Costurar é preciso!

 

Mulher a cozer à máquina. José Carlos Rodrigues (1970- ). 
Bonequeiro de Estremoz certificado pela Adere-Certifica.

A máquina de costura é um objecto primordial que povoa o universo de memórias da minha infância.
Nasci no número 14 do Largo do Espírito Santo em Estremoz, no dia 19 de Agosto de 1946. Ali se situava a primeira oficina de alfaiate do meu pai. Daí que algumas das memórias de infância sejam de natureza acústica e tenham a ver com o regime de funcionamento da máquina, entre um arranca e um pára, ao sabor do tamanho da costura. Familiarizei-me, de resto, com diferenças de sonoridade associadas a costuras lineares, em ziguezague e pespontadas. Todavia, também há outras que fui registando desde muito cedo, até porque menos agradáveis. Entre elas, o partir da linha, o enfiar da agulha, a mudança de bobine e até mesmo o partir da agulha. Tudo contratempos que perturbavam o ritmo do ganha pão diário lá de casa.
Lá fui crescendo no meio de costureiras que tratavam o meu pai respeitosamente por Mestre e aí pelos 15 anos fui recrutado como aprendiz no decurso das férias escolares. Com uma cajadada, o meu pai matou dois coelhos: para o que desse e viesse, pôs-me a aprender os rudimentos do ofício, ao mesmo que me subtraía à rua, onde entre a rapaziada já havia quem gostasse de “Rock'n and Roll” e sem ele o saber, eu era um deles.
Parece que tinha o destino marcado e lá comecei a desempenhar as tarefas mais simples destinadas a um aprendiz, o que incluía não só cozer à mão, como também à máquina. E era aqui que eu renascia sempre que ao cozer entretelas, descarregava as tensões acumuladas ao ritmo do pedal da máquina. Era um indício bastante forte de que a minha vida não iria ser aquela.
Por isso, quando o meu pai equacionou o meu ingresso no Ensino Secundário, eu acarinhei a ideia com o compromisso solene de me empenhar mais que até aí, acordo que sempre cumpri.
A partir daí passei a encarar a máquina de costura com outros olhos.
Como estudante de Física vim a perceber que o movimento de vaivém do pedal da máquina, é transformado pelo sistema biela-manivela, em movimento de rotação da roda grande inferior, o qual através duma correia se transmite à roda pequena superior, que assim atinge uma velocidade muito superior, indispensável ao funcionamento eficaz da máquina de costura. Percebi também que é graças à inércia de rotação, que a máquina continua a trabalhar, mesmo após termos deixado de dar ao pedal.
Como membro responsável desta aldeia global que é o mundo, reconheço o contributo da máquina de costura caseira para a sustentabilidade do planeta. Com ela se podem reparar rasgões ou tapar buracos, reconverter modelos ou ajustá-los ao tamanho dum novo utilizador. Tudo isto numa prática de economia circular, a qual combate o desperdício da Sociedade do Descartável, que inescapavelmente conduz ao ecocídio.
Não é de estranhar que a máquina de costura ocupe um lugar privilegiado cá em casa, não como mero adorno decorativo, mas como instrumento de economia circular ao serviço da sustentabilidade do planeta. Trata-se de uma máquina SINGER centenária, que me foi oferecida pela minha mãe há cerca de 50 anos, após a sua aquisição aos herdeiros de uma velha senhora, acompanhada do catálogo do modelo e do respectivo recibo de compra.
Como coleccionador, investigador e publicista de Bonecos de Estremoz, não podia deixar de me encantar com uma criação do barrista José Carlos Rodrigues, representando a “Mulher a cozer à máquina”, em contexto de inícios do séc. XX com matriz alentejana (chão de tijoleira e cadeira pintada com flores).
Felicito vivamente o bonequeiro por este seu trabalho, não só pelo trabalho em si, mas porque nele estão interligados dois conceitos que me são gratos: a economia circular ao serviço da sustentabilidade do planeta e o Património Cultural Imaterial da Humanidade cuja salvaguarda é imperativa.

quinta-feira, 20 de julho de 2023

Mestres Bonequeiros de Estremoz

 
Mariano da Conceição (1903-1959). Fotografia de Rogério de Carvalho (1915-1988).
Arquivo fotográfico do autor.

Prólogo
A língua portuguesa é rica em múltiplos aspectos. Um deles resulta do facto de um mesmo termo ser susceptível de várias interpretações. É o que se passa com o termo “Mestre”, substantivo masculino, cuja etimologia provém do latim “magistru”, “o que comanda, que conduz, que dirige, que ensina”.
O termo “Mestre” no verdadeiro sentido do termo, é usado no contexto de múltiplas actividades profissionais, designando alguém que tem aprendizes numa oficina. Por outro lado, a nível das artes, pelo menos desde a Idade Média que a designação atribuída a Mestres que pela excelência do seu trabalho se destacam dos outros Mestres, é a de Grandes Mestres. Todavia, o termo “Mestre” tem sido banalizado e é usado paralelamente e muitas vezes com carácter subjectivo, para designar quem domina muito bem uma actividade profissional, ainda que não tenha aprendizes.
A utilização do termo “Mestre” é comum a múltiplas actividades, entre elas a de barristas ou bonequeiro(a)s. Daí que me proponha suscitar uma reflexão em torno da correcta utilização do mesmo, retrocedendo no tempo em termos de dados históricos relativos a Bonecos de Estremoz.

Mestres bonequeiros no século XIX
Entre as referências mais antigas a figuras em barro de Estremoz, destacam-se as das actas de sessões da Câmara Municipal de Estremoz, de 31 de Outubro e de 10 de Dezembro de 1770, que referem a existência de mulheres chamadas “boniqueiras”, que fazem figuras e “brincos”. Fica-se a saber que nessa época a produção de figuras em barro era efectuada exclusivamente por mulheres, situação que se altera em data que não é possível apurar. Na verdade, o Mapa das Fábricas existentes no Distrito de Évora em 1837 (Fundo do Governo Civil de Évora - Arquivo Distrital de Évora), mostra que em 1 de Janeiro de 1837, no concelho de Estremoz e na freguesia de Santo André, existem 26 oficinas de figuras, com 26 proprietários, 26 mestres e 36 operários (7 homens, 18 mulheres e 11 rapazes). Naquela data, a produção de figuras em barro encontrava-se já em decadência, deixara de ser efectuada exclusivamente por mulheres e cada oficina era dirigida por um mestre que era também o proprietário.

Mariano Augusto da Conceição (1903-1959)
O escultor José Maria Sá Lemos (1892-1971), director da Escola Industrial António Augusto Gonçalves conseguiu, entre 1933 e 1935, a recuperação da tradição de manufactura dos Bonecos de Estremoz, considerada extinta com a morte de Gertrudes Rosa Marques (1840-1921). O instrumento primordial dessa recuperação foi a velha bonequeira Ana das Peles (1859-1945) e Mariano Augusto da Conceição (1903-1959), oleiro, foi o instrumento de continuidade dessa recuperação.
Mariano Augusto da Conceição era neto de Caetano Augusto da Conceição, fundador da Olaria Alfacinha e filho primogénito de Narciso Augusto da Conceição, que orientou aquela oficina até 1933. Ingressou como Mestre provisório da Oficina de Olaria na Escola Industrial António Augusto Gonçalves, em 3 de Dezembro de 1930, passando à situação de Mestre contratado em 29 de Abril de 1931 e de Mestre efectivo em 19 de Março de 1936, cargo que desempenhou ininterruptamente até à sua morte prematura em 30 de Setembro de 1959. Na escola e em contexto de ensino-aprendizagem foi para além de Mestre oleiro, Mestre bonequeiro que ensinou gerações de alunos a produzir Bonecos de Estremoz. Destaco desses alunos, o pintor Armando Alves (1935 - ) e as barristas Aclénia Pereira (1927-2012) e Maria Luísa da Conceição (1934-2015), sua filha. De salientar que os Bonecos produzidos na escola eram comercializados pela própria escola, funcionando assim como receita da mesma e os alunos recebiam por isso um salário.

Sabina da Conceição Santos (1921-2005)
Em 1960, depois da morte do seu irmão Mariano da Conceição, Sabina da Conceição Santos tomou a atitude corajosa de prosseguir com estilo muito próprio, a manufactura de Bonecos de Estremoz, impedindo assim que a arte se perdesse. Sabina nunca tinha confeccionado Bonecos, apenas vira o irmão fazê-los. Formou-se a ela própria, usando como modelos os Bonecos do seu irmão. Dentre as discípulas que até à aposentação em 1988, passaram pela sua oficina e das quais foi Mestra, ressaltam aquelas que se estabeleceram por conta própria: Fátima Estróia (1948- ), Isabel Carona Bento (1949-2006) e Irmãs Flores [Maria Inácia (1957- ) e Perpétua (1958- )]. Estas últimas completaram recentemente 50 anos de carreira, o que levou o Município a distingui-las com um louvor, para “expressar-lhes reconhecimento e gratidão pelos seus 50 anos de dedicação efetiva ao Boneco de Estremoz, pelo apuro técnico e estético do seu trabalho e pela disponibilidade que sempre demonstraram na salvaguarda e valorização desta arte multisecular.”

Sabina da Conceição Santos (1921-2005) nos anos 70 do séc. XX, tendo à sua direita
 as discípulas Maria Inácia Fonseca (1957- ) e Perpétua Sousa (1958- ). Fotografia
de Xenia V. Bahder. Arquivo fotográfico do autor.

Jorge da Conceição (1963 - )
Entre 20 de Setembro a 6 de Dezembro de 2019, teve lugar um “Curso de Formação sobre Técnicas de Produção de Bonecos de Estremoz”, que decorreu no Palácio dos Marqueses de Praia e Monforte, em Estremoz. O Curso foi promovido pelo CEARTE - Centro de Formação Profissional para o Artesanato e Património, em parceria com o Município de Estremoz. O Curso com a duração de 150 horas e de Nível QNQ 2, teve formação técnica a cargo do barrista Jorge da Conceição, que contou com o apoio inestimável de Isabel Água e de Luís Parente. Foi frequentado por 16 formandos e ali se formou um grupo de barristas, dos quais 6 se encontram presentemente a produzir. São eles: Ana Catarina Grilo, Inocência Lopes, José Carlos Rodrigues, Madalena Bilro, Manuel J. Broa e Vera Magalhães. Desses 6 e até à presente data, 4 foram certificados pela Adere - CERTIFICA, como artesãos produtores de Bonecos em Barro de Estremoz.
Todos eles o reconhecem como uma referência de topo da nossa barrística e praticamente todos o tratam carinhosamente por Mestre, já que foi com ele que aprenderam.
As criações de Jorge da Conceição ostentam marcas identitárias singulares e por isso notáveis. Em primeiro lugar, o rigor e a perfeição na modelação, com integral respeito pelas proporções, pela morfologia, pelas texturas, bem como a representação do movimento. Em segundo lugar, um cromatismo harmonioso que resulta de uma sábia combinação de cores. Em qualquer dos casos, no mais rigoroso respeito pelo modo de produção e pela estética do Boneco de Estremoz. Tudo isso contribui para que os trabalhos de Jorge da Conceição sejam reveladores da sua incomensurável mestria. Trata-se de facetas do seu trabalho, que ultrapassam o âmbito restrito dos seus formandos e catapultam o barrista a uma nova dimensão de Mestre. Daí dever ser considerado um Grande Mestre, dada a dualidade da sua mestria. Mestre enquanto formador de barristas e Mestre pelo esmero, rigor, beleza e excelência na plenitude do seu trabalho, que fazem guindar a sua obra do patamar da arte popular para o degrau da arte erudita.

Jorge da Conceição (1963 - ), rodeado de discípulos numa sessão do Curso de Formação
sobre Técnicas de Produção de Bonecos de Estremoz, ocorrido em 2019. Fotografia de
Luís Parente, recolhida no Facebook.

Epílogo
Já vimos que no verdadeiro sentido do termo, Mestre é “o que comanda, que conduz, que dirige, que ensina”. No conjunto de todos os barristas dos séculos XX-XXI houve apenas três que em contexto oficinal e não familiar, ensinaram discípulos, pelo que podem ser considerados Mestres Bonequeiros de Estremoz. Foram eles: Mariano da Conceição (em contexto oficinal escolar), Sabina da Conceição Santos (em contexto oficinal privado) e Jorge da Conceição (em contexto oficinal formativo).

Publicado no jornal E, nº 317, de 21 de Julho de 2023

quarta-feira, 12 de julho de 2023

NATIVIDADE - uma tipologia de cantarinha enfeitada, criada pelas Irmãs Flores


Cantarinha enfeitada com Natividade. Irmãs Flores

A chamada "olaria enfeitada" não integra aquilo que se convencionou chamar o “Figurado de Estremoz”. Trata-se de objectos oláricos produzidos na roda pelos oleiros e enfeitados “à maneira de Estremoz” e na qual predominam cores como o zarcão, o azul, o verde e o vermelho. São peças com dupla autoria, que ostentam por vezes na base, as marcas dessa dupla autoria.
A cantarinha enfeitada aqui designada por "Natividade" é uma criação das Irmãs Flores.
Com a cantarinha ainda em cru, foi-lhe extraída a parte frontal superior do bojo e colada ao nível do corte, uma placa de barro que encaixa perfeitamente na concavidade aberta da cantarinha.
Com uma tal opção, essa concavidade configura a gruta na qual segundo uma das tradições bíblicas, terá nascido o Menino Jesus.
No interior da gruta e nas posições usuais, encontram-se: o berço do Menino Jesus, Nossa Senhora, São José, o burro e a vaca.
A “gruta” encontra-se protegida por uma sacada com arcos floridos, inspirada na protecção lateral do berço dos anjinhos (um dos tipos de berço do Menino Jesus).
Esta última opção visou embelezar ainda mais a decoração do conjunto, bem como impedir que as figuras da Natividade possam cair quando se desloca a cantarinha.
Com esta criação, as Irmãs Flores ampliaram e reforçaram o conceito de olaria enfeitada, criando uma peça composta, bivalente, que pertence simultaneamente a dois mundos: o da olaria enfeitada e o dos presépios.

Publicado inicialmente a 12 de Julho de 2023

quinta-feira, 6 de julho de 2023

MORREU O “ROLO” - A Arte Popular Portuguesa ficou mais pobre



CRÉDITOS FOTOGRÁFICOS 
Fotografias de Joaquim Vermelho (1927-2002),
 cedidas pela Bibloteca Municipal de Estremoz / 
Arquivo Municipal

Faleceu na passada 6ª feira, dia 30 de Junho, na Residência de São Nuno de Santa Maria (Lar dos Combatentes), em Estremoz, com a idade de 88 anos, Joaquim Martins Carriço (Rolo), notável artesão de arte pastoril alentejana.
Era natural da Aldeia de Cima, freguesia da Glória, concelho de Estremoz, onde nasceu em 1935 e onde residiu até 2017, ano em que após a morte da esposa, Maria Augusta Lopes Anjinho e por vontade própria, resolveu ingressar naquela Estrutura Residencial para Pessoas Idosas.

Cerimónias fúnebres
O velatório do falecido teve lugar na Casa Mortuária da Glória, dali saindo o corpo às 16 h 30 min de sábado, dia 1 de Julho, para a Igreja da Glória, onde decorreram as cerimónias fúnebres, presididas pelo diácono João Prates. Terminadas estas, cerca das 17 horas teve lugar o funeral para o Cemitério da Glória, nele se integrando familiares, amigos e admiradores, que apesar do calor que fazia, não quiseram deixar de lhe prestar uma última homenagem.

Nota de pesar do Município
Em nota divulgada pela Autarquia, a Câmara Municipal de Estremoz, une-se no pesar de todos aqueles que tiveram a felicidade de conhecer e usufruir dos conhecimentos e amizade de um verdadeiro Tesouro Vivo desta região.

Como conheci o “Rolo”
Conheci o “Rolo” no decurso da I FEIRA DE ARTE POPULAR E ARTESANATO DO CONCELHO DE ESTREMOZ, que por iniciativa do Município, decorreu entre 15 e 17 de Julho de 1983, no Rossio Marquês de Pombal, frente às esplanadas dos cafés. Nessa Feira participaram 5 dezenas de artesãos do concelho, distribuídos por 32 stands, tendo em conta as diferentes matérias-primas e tipologias de artesanato (barro, bunho, chifre, cortiça, couro, peles, madeira, mármores, metais, palhinha, papel, têxteis e vidro). Foi uma Feira primordial. Como ela nunca mais haverá nenhuma, a começar pela diversidade e elevada qualidade das criações dos artesãos do concelho, dos quais poucos restam vivos. Foi um Feira que teve uma Comissão Organizadora liderada pelo professor Joaquim Vermelho, um visionário no bom sentido do termo e para o qual a Feira foi sempre a “menina dos seus olhos”. Naturalmente que para o êxito da mesma, contribuiu o auspício do Município, liderado por José Guerreiro, o qual no catálogo, a assumiu como o resultado do trabalho colectivo de um grupo de pessoas que ainda acreditam na importância da cultura popular, como forma de desenvolvimento de toda uma sociedade.
Foi neste contexto pioneiro que conheci o “Rolo”, descoberto pelo professor Joaquim Vermelho e posteriormente por ele estudado e divulgado através do seu Núcleo de Dinamização Cultural. Entre eles era conhecido por “Rolo”, referência que eu adoptei, já que sou um apaixonado por alcunhas alentejanas e aquela era aceite pelo visado, o qual lidava bem com ela. Mais tarde, quando ele me concedeu o privilégio da sua amizade, a forma de tratamento fraternal e respeitosa usada com quem era 11 anos mais velho do que eu, foi, naturalmente, a de “Amigo Rolo”.

O fascínio do “Rolo”
Decorridos 40 anos, posso asseverar que foi “amor à primeira vista”. Para além de amigo, dele fiquei cliente até deixar de produzir, marcando presença anual no seu stand, enquanto participou na Feira.
O “Rolo” exercia sobre mim um fascínio incomensurável. Em primeiro lugar, não só pela diversidade das tipologias dos artefactos de arte pastoril que lhe nasciam das suas mãos mágicas, como pela riqueza dos baixos relevos, lavrados em chifres e paus sabiamente escolhidos e nos quais projectava toda a imaginária popular que transportada pela massa do sangue, lhe aquecia a alma. Em segundo lugar, pela oralidade. O “Rolo” era, todo ele, oralidade transbordante: a sua estória de vida, a estória de vida das suas criações e as estórias que estas lhe contavam, como se adquirissem vida autónoma, após o acto de criação.
Visitei-o algumas vezes com a minha mulher, na Aldeia de Cima, ainda a sua esposa era viva. Foram momentos inesquecíveis de fraternal conversa, onde eu ávido da sua oralidade transbordante e rendido à beleza dos frutos mágicos das suas mãos, quase que não falava, porque o que era importante não era o meu falar, o que era importante era o falar dele e que eu ouvia sofregamente, como se fosse um faminto, ávido de pão.

“Rolo” e o Museu Municipal de Estremoz
Pertence ao Museu Municipal de Estremoz, o conjunto mais importante de obras do artífice, reunidas pelo professor Joaquim Vermelho, amigo e estudioso da sua obra, às quais se foram juntar 22 espécimes doados pelo autor, para memória futura. Encontram-se em exposição permanente no Museu e foram objecto da Exposição “MESTRE ROLO - TESOURO DA ARTE POPULAR DE ESTREMOZ", que em 2018 esteve patente ao público na Galeria Municipal Dom Dinis, em Estremoz. Nela esteve presente o artesão, que posteriormente, em 2020, participou numa "CONVERSA À VOLTA DA ARTE PASTORIL", na qual também intervieram António Carmelo Aires (coleccionador) e Hugo Guerreiro, (director do Museu Municipal de Estremoz).

A Arte Popular Portuguesa ficou mais pobre
Com o seu passamento, a Arte Popular Portuguesa ficou mais pobre, pois ele era um dos seus mais prestigiados e afamados intérpretes.
Resta-nos a consolação do deleite da visualização e fruição da sua obra, a qual além de integrar colecções particulares, como é o caso da minha, integra colecções museológicas, como é o caso da mais importante delas todas, que é a do Museu Municipal de Estremoz, no qual se encontra em exposição permanente.
O “Rolo” partiu, mas a memória da sua oralidade e dos frutos mágicos das suas mãos, permanecerão vivos nos nossos corações, o que me leva a proclamar:
- O AMIGO “ROLO” ESTARÁ SEMPRE PRESENTE ENTRE NÓS!

Hernâni Matos
Publicado no jornal E, nº 316, de 7 de Julho de 2023




quinta-feira, 22 de junho de 2023

EXPOSIÇÃO "IRMÃS FLORES, 50 ANOS EM 50 BONECOS"

 

Irmãs Flores. Fotografia cedida por cortesia de Sul Ibérico.

Clique nas imagens para
 aumentar o "zoom" das mesmas.

Foi inaugurada no passado sábado, dia 17 de Junho, na Galeria Municipal Dom Dinis, a exposição "Irmãs Flores, 50 anos em 50 Bonecos", que ali ficará patente ao público até ao próximo dia 2 de Setembro. O certame, organizado pelo Museu Municipal de Estremoz, visa proporcionar uma visão retrospectiva de 50 anos de carreira daquelas barristas, ilustrada através de 50 Bonecos de sua produção.


Acto inaugural
Ao acto inaugural compareceram cerca de 4 dezenas de pessoas, entre familiares, amigos e admiradores, que com a sua presença quiseram testemunhar o elevado apreço que nutrem pelas Irmãs Flores e pelo trabalho por elas desenvolvido ao longo da sua carreira.
A cerimónia foi presidida pelo Presidente do Município, José Sadio, que se encontrava acompanhado da Vice-Presidente, Sónia Caldeira. Na oportunidade, elogiou o trabalho desenvolvido pelas Irmãs Flores e o contributo dado ao longo destes anos todos, visando a divulgação, valorização e salvaguarda do Boneco de Estremoz e que permitiu que a sua produção fosse proclamada pela UNESCO em 2017, como Património Cultural Imaterial da Humanidade. Anteriormente usara da palavra, Isabel Borda d’Água, Directora do Museu Municipal de Estremoz. No final, usaram da palavra, Perpétua e Maria Inácia Fonseca, que agradeceram, relembrando esta última todo o apoio e incentivo recebidos de Mestra Sabina Santos e do Professor Joaquim Vermelho, cuja evocação fez com saudade e aos quais foi dedicada a exposição. Seguiu-se uma visita guiada à mesma. Ali foi possível apreciar e ouvir comentar pelas Irmãs Flores, trabalhos de toda uma vida dedicada com paixão e emoção aos Boneco de Estremoz. Ali havia Bonecos de todas as tipologias: Presépios, imagens devocionais, figuras da faina agro-pastoril, figuras da realidade local, figuras do quotidiano doméstico, figuras de negros, figuras alegóricas e figuras de assobio. Presentes também exemplares de olaria enfeitada.
Na exposição chamavam especialmente a atenção duas peças. Uma delas, uma espectacular cantarinha enfeitada com 2 sargentos no jardim e arcos com flores, foi trabalho realizado a 8 mãos. Ilídio Fonseca, irmãos das Irmãs flores, modelou a cantarinha na roda de oleiro, Maria Inácia Fonseca modelou os folhos e os Bonecos, Perpétua Fonseca pintou tudo e Mestra Sabina Santos fez a decoração. A outra peça, é uma magnífica imagem de Nossa Senhora da Conceição, feita a 6 mãos, pelas Irmãs Flores e seu sobrinho, Ricardo Fonseca, igualmente prestigiado barrista.

A consagração de uma carreira
Os 50 anos de carreira das Irmãs Flores ocorreram em Novembro passado, tendo a Câmara Municipal de Estremoz, na sessão ordinária de 16 de Novembro, aprovado por unanimidade um louvor, no qual expressa “reconhecimento e gratidão pelos seus 50 anos de dedicação efetiva ao Boneco de Estremoz, pelo apuro técnico e estético do seu trabalho e pela disponibilidade que sempre demonstraram na salvaguarda e valorização desta arte multisecular.” O louvor foi completado pela entrega de uma placa a assinalar os seus 50 anos de carreira, com que foram distinguidas pelo Município de Estremoz, cerimónia que em Abril passado, marcou o acto inaugural da FIAPE 2023.

Exposições recentes
É notável a actividade exposicional suscitada pelo trabalho das Irmãs Flores. Só no séc. XXI e em Estremoz, anteriormente à presente exposição "IRMÃS FLORES, 50 ANOS EM 50 BONECOS"(2023), participaram nas seguintes exposições individuais: - O TRAJE POPULAR PORTUGUÊS (2007), Centro Cultural Dr. Marques Crespo, organização da Associação Filatélica Alentejana; - BONECOS DA GASTRONOMIA (2009), XVII Cozinha dos Ganhões, organização da Associação Filatélica Alentejana; - ALENTEJO DO PASSADO (2011), Centro Cultural Dr. Marques Crespo, organização da Associação Filatélica Alentejana; - FIGURADO DE IRMÃS FLORES NA COLEÇÃO DE ANTÓNIO GRANGER RODRIGUES (2022), Galeria Municipal Dom Dinis, organização do Museu Municipal de Estremoz.

Notas finais
Maria Inácia e Perpétua são discípulas de Mestra Sabina Santos (1921-2005), com quem começaram a trabalhar a Maria Inácia em 1972 e a Perpétua em 1975.
Após a aposentação de Mestra Sabina Santos em 1988, criaram então a sua própria oficina-ateliê, primeiro na Rua das Meiras, 8 e daí transitaram, em 1999, para o Largo da República, 16. Aqui se mantiveram até 2010, ano em que se fixaram no Largo da República, 31-32, sempre na procura de melhores condições de trabalho e de atendimento do público.
Ao longo da sua carreira, o trabalho das Irmãs Flores desenvolveu-se em dois planos distintos, mas necessariamente convergentes. Por um lado, a produção daquilo que se convencionou chamar “Bonecos da tradição”, que são aquelas figuras das várias tipologias que são geralmente manufacturadas por todos os barristas. Por outro lado, a produção de “Bonecos da Inovação”, que são figuras que até então não existiam nas diversas tipologias de Bonecos de Estremoz e que tornam a barrística popular estremocense mais vasta e rica. Nalguns casos, a execução de figuras mais complexas e morosas, levou mesmo a que tenha existido uma autêntica mudança de paradigma. Em qualquer dos casos, o trabalho das Irmãs Flores tem-se pautado sempre por uma estrita fidelidade ao modo de produção e à estética do Boneco de Estremoz, naturalmente que com um estilo e um cromatismo muito próprios.
A comunidade estremocense revê-se na elevada qualidade artística do trabalho das Irmãs Flores, as quais pela já sua longa carreira, são muito justamente consideradas embaixatrizes da nossa barrística. Daí estar em consonância e aplaudir o voto de louvor que lhes foi atribuído pelo Município.
Publicado no jornal E nº 315, de 22 de Junho de 2023

O acto inaugural da exposição. Fotografia de Miguel Belfo -  CME.

Um aspecto parcial da exposição. Fotografia de Miguel Belfo -  CME.

Cantarinha enfeitada, uma das peças em destaque na exposição.

Nossa Senhora da Conceição. Outra das peças em destaque na exposição.

Selecção de recortes de imprensa alusivos ao trabalho das irmãs Flores.