cedidas
pela Bibloteca Municipal de Estremoz /
Arquivo Municipal
Faleceu na passada 6ª feira, dia 30 de Junho, na Residência de São Nuno de Santa Maria (Lar dos Combatentes), em Estremoz, com a idade de 88 anos, Joaquim Martins Carriço (Rolo), notável artesão de arte pastoril alentejana.
Era natural da Aldeia de Cima, freguesia da Glória, concelho de Estremoz, onde nasceu em 1935 e onde residiu até 2017, ano em que após a morte da esposa, Maria Augusta Lopes Anjinho e por vontade própria, resolveu ingressar naquela Estrutura Residencial para Pessoas Idosas.
Cerimónias fúnebres
O velatório do falecido teve lugar na Casa Mortuária da Glória, dali saindo o corpo às 16 h 30 min de sábado, dia 1 de Julho, para a Igreja da Glória, onde decorreram as cerimónias fúnebres, presididas pelo diácono João Prates. Terminadas estas, cerca das 17 horas teve lugar o funeral para o Cemitério da Glória, nele se integrando familiares, amigos e admiradores, que apesar do calor que fazia, não quiseram deixar de lhe prestar uma última homenagem.
Nota de pesar do Município
Em nota divulgada pela Autarquia, a Câmara Municipal de Estremoz, une-se no pesar de todos aqueles que tiveram a felicidade de conhecer e usufruir dos conhecimentos e amizade de um verdadeiro Tesouro Vivo desta região.
Como conheci o “Rolo”
Conheci o “Rolo” no decurso da I FEIRA DE ARTE POPULAR E ARTESANATO DO CONCELHO DE ESTREMOZ, que por iniciativa do Município, decorreu entre 15 e 17 de Julho de 1983, no Rossio Marquês de Pombal, frente às esplanadas dos cafés. Nessa Feira participaram 5 dezenas de artesãos do concelho, distribuídos por 32 stands, tendo em conta as diferentes matérias-primas e tipologias de artesanato (barro, bunho, chifre, cortiça, couro, peles, madeira, mármores, metais, palhinha, papel, têxteis e vidro). Foi uma Feira primordial. Como ela nunca mais haverá nenhuma, a começar pela diversidade e elevada qualidade das criações dos artesãos do concelho, dos quais poucos restam vivos. Foi um Feira que teve uma Comissão Organizadora liderada pelo professor Joaquim Vermelho, um visionário no bom sentido do termo e para o qual a Feira foi sempre a “menina dos seus olhos”. Naturalmente que para o êxito da mesma, contribuiu o auspício do Município, liderado por José Guerreiro, o qual no catálogo, a assumiu como o resultado do trabalho colectivo de um grupo de pessoas que ainda acreditam na importância da cultura popular, como forma de desenvolvimento de toda uma sociedade.
Foi neste contexto pioneiro que conheci o “Rolo”, descoberto pelo professor Joaquim Vermelho e posteriormente por ele estudado e divulgado através do seu Núcleo de Dinamização Cultural. Entre eles era conhecido por “Rolo”, referência que eu adoptei, já que sou um apaixonado por alcunhas alentejanas e aquela era aceite pelo visado, o qual lidava bem com ela. Mais tarde, quando ele me concedeu o privilégio da sua amizade, a forma de tratamento fraternal e respeitosa usada com quem era 11 anos mais velho do que eu, foi, naturalmente, a de “Amigo Rolo”.
O fascínio do “Rolo”
Decorridos 40 anos, posso asseverar que foi “amor à primeira vista”. Para além de amigo, dele fiquei cliente até deixar de produzir, marcando presença anual no seu stand, enquanto participou na Feira.
O “Rolo” exercia sobre mim um fascínio incomensurável. Em primeiro lugar, não só pela diversidade das tipologias dos artefactos de arte pastoril que lhe nasciam das suas mãos mágicas, como pela riqueza dos baixos relevos, lavrados em chifres e paus sabiamente escolhidos e nos quais projectava toda a imaginária popular que transportada pela massa do sangue, lhe aquecia a alma. Em segundo lugar, pela oralidade. O “Rolo” era, todo ele, oralidade transbordante: a sua estória de vida, a estória de vida das suas criações e as estórias que estas lhe contavam, como se adquirissem vida autónoma, após o acto de criação.
Visitei-o algumas vezes com a minha mulher, na Aldeia de Cima, ainda a sua esposa era viva. Foram momentos inesquecíveis de fraternal conversa, onde eu ávido da sua oralidade transbordante e rendido à beleza dos frutos mágicos das suas mãos, quase que não falava, porque o que era importante não era o meu falar, o que era importante era o falar dele e que eu ouvia sofregamente, como se fosse um faminto, ávido de pão.
“Rolo” e o Museu Municipal de Estremoz
Pertence ao Museu Municipal de Estremoz, o conjunto mais importante de obras do artífice, reunidas pelo professor Joaquim Vermelho, amigo e estudioso da sua obra, às quais se foram juntar 22 espécimes doados pelo autor, para memória futura. Encontram-se em exposição permanente no Museu e foram objecto da Exposição “MESTRE ROLO - TESOURO DA ARTE POPULAR DE ESTREMOZ", que em 2018 esteve patente ao público na Galeria Municipal Dom Dinis, em Estremoz. Nela esteve presente o artesão, que posteriormente, em 2020, participou numa "CONVERSA À VOLTA DA ARTE PASTORIL", na qual também intervieram António Carmelo Aires (coleccionador) e Hugo Guerreiro, (director do Museu Municipal de Estremoz).
A Arte Popular Portuguesa ficou mais pobre
Com o seu passamento, a Arte Popular Portuguesa ficou mais pobre, pois ele era um dos seus mais prestigiados e afamados intérpretes.
Resta-nos a consolação do deleite da visualização e fruição da sua obra, a qual além de integrar colecções particulares, como é o caso da minha, integra colecções museológicas, como é o caso da mais importante delas todas, que é a do Museu Municipal de Estremoz, no qual se encontra em exposição permanente.
O “Rolo” partiu, mas a memória da sua oralidade e dos frutos mágicos das suas mãos, permanecerão vivos nos nossos corações, o que me leva a proclamar:
- O AMIGO “ROLO” ESTARÁ SEMPRE PRESENTE ENTRE NÓS!
Hernâni Matos
Publicado no jornal E, nº 316, de 7 de Julho de 2023
Bela e comovente homenagem a um Artesão..profissão cada vez mais em perigo de extinção.
ResponderEliminarNa próxima ida a Estremoz tentarei ir ao Museu..já estive no dos Brinquedos e no da Colecção Berardo.
In illo tempore visitei o Rural(?) no Rossio.
Muito obrigado pelo seu comentário.
EliminarVisite o Museu Municipal no Castelo de Estremoz . Aí está patente ao público uma exposição permanente de Joaquim Rolo. Visite que ficará fascinado. De resto, tem os Bonecos de Estremoz, a olaria de barro vermelho e muito mais, que justificará plenamente a sua visita
Descanse na Paz do Senhor.
ResponderEliminarAssim seja.
EliminarUm excelente tributo. Que esteja em paz!
ResponderEliminarMuito obrigado pelo seu comentário.
EliminarAssim seja.