domingo, 4 de dezembro de 2016

Qual geringonça, qual carapuça!



"Os políticos e as fraldas devem ser mudados frequentemente e pela mesma razão" é uma máxima de Eça de Queiroz, que esteve na base da gestação da minha crónica “RECEITA PARA FAZER UMA GERINGONÇA”, publicada no jornal E, nº 158, de 28 de Julho passado. Aí divulguei uma receita para fazer uma geringonça que afastasse o MIETZ do poder, visto a sua gestão autárquica ser rejeitada unanimemente pelo PS, pela CDU e pelo BE. A sugestão caiu em saco roto, tudo leva a crer que por determinação dos respectivos cemitérios centrais, a que haverá a acrescentar desconfianças mútuas a nível local, bem como a vontade de afirmação de alguns jovens turcos. Daí que tenha escrito uma carta ao Pai Natal. 

Carta ao Pai Natal
Caro Pai Natal: Esta carta tem a finalidade de te pedir algumas prendas. Não se destinam a mim, mas a um grupo de amigos do Partido Socialista de Estremoz, que te vou explicar o que é. Trata-se de um partido com uma bandeira da cor da tua vestimenta, ainda que mais desmaiada e a dar para o cor-de-rosa. Aliás, a bandeira tem uma rosa no meio, para simbolizar o amor pelo Povo. Dantes tinha um punho fechado que dava a impressão de que queriam dar uma carga de porrada nas pessoas e tiveram que mudar, para dar um aspecto mais manso.
Sabes porque é que peço as prendas para eles? É que eles são meus companheiros de estrada, assim como tu com as renas, pois percorrem o mesmo caminho juntos. Passa-se o mesmo, entre mim e eles. Apesar de tudo, existem algumas diferenças, as quais passo a explicitar:
- PRIMEIRA – Tu e as renas são de espécies diferentes. Eu e eles, somos da mesma espécie.
- SEGUNDA – No teu caso, vais refastelado a andar de trenó e as renas é que puxam. No meu caso, vamos todos a pé e quem puxa sou eu, muitas vezes com fraco resultado em termos de caminhada. É que o PS é um partido plural. Uns usam avental, outros vão à missa dominical e outros nem uma coisa nem outra. Entre eles têm tendência de caminhar cada um para o seu lado, pelo que é difícil caminharem uns com ou outros, quanto mais comigo. Todavia, eu que não sou homem para desistir, insisto em querer caminhar com eles. Daí afirmar que são meus companheiros de estrada. A velocidade de marcha, essa é pequena. Ás vezes mais parece a velocidade dum caracol em marcha-atrás. Mas enfim, tenho esperança na mudança e trabalho para isso.
Caro Pai Natal: Agora que já sabes o que é o Partido Socialista de Estremoz e o que são companheiros de estrada, envio-te em anexo a relação, onde à frente do nome de cada um, indico a prenda que peço lhes entregues neste Natal. É que eles merecem, pois é tudo boa rapaziada. Chamo-te a atenção especial para a prenda que peço ofereças ao Presidente da Comissão Política do PS de Estremoz. Trata-se de um manual de paciência chinesa e uma varinha mágica, daquelas que são usadas pelos ilusionistas. Destina-se a exercer uma tripla missão: a de conduzir com êxito as hostes do PS local, tirar da cartola um candidato forte à Câmara Municipal de Estremoz e zurzir naqueles que se tornaram ou vierem a tornar vira-casacas.
Esta carta já vaio longa, pelo que vou terminar. Recebe uma forte tanganhada do FRANCO-ATIRADOR. 

Ao PS de Estremoz
Caros amigos: Sugiro-vos que à noite, antes de se deitarem, rezem todos, inclusive os do avental, 4 Pais Nossos, muito bem rezadinhos, pois 4 é o número de vereadores que o PS precisa de ter para ganhar as próximas eleições autárquicas para a Câmara Municipal de Estremoz. Estou certo que Deus ou o Supremo Arquitecto do Universo ou lá o que é, não deixará de ouvir as vossas preces. Se não resultar, o que espero não venha a acontecer, para a próxima têm de rezar com mais fervor. Por agora fico por aqui. Para vocês todos, um fraternal abraço laico e republicano do FRANCO-ATIRADOR.

quarta-feira, 30 de novembro de 2016

60 – O aguadeiro -10


Aguadeiro 
Maria Luísa da Conceição (1934-2015).
Colecção particular.

Figurado de Estremoz – 2 (1ª Parte)
Efectuei um estudo comparativo do “Aguadeiro” confeccionado por diferentes barristas, os quais foram identificados pelas siglas habituais. A análise dos diferentes exemplares, permitiu-me tirar conclusões que passo a expor.
Todos os barristas representam a mão esquerda do aguadeiro apoiada no burro. Exceptuam-se QM, que representa o aguadeiro com o braço esquerdo descaído, bem como JM cuja imagem utiliza a mão esquerda para empunhar a vara de condução do animal, tarefa que os outros artesãos reservaram para a mão direita, à excepção do figurado de QM, em que o homem segura as rédeas com esta mão.
O cabelo é sempre castanho-escuro e encobre as orelhas, à excepção do exemplar de LC. Na cabeça, um chapéu negro sem fita, com copa semi-esférica e aba circular, larga e revirada lateralmente (AP, MC, LC, MLC) ou revirada integralmente para baixo (QM) ou para cima, configurando um chapéu aguadeiro (JM, SS, IF). O chapéu do exemplar de IC tem copa semi-esférica e aba circular, larga e revirada lateralmente, é cor-de-rosa, com a aba debruada a preto, com fita preta pintada, tendo duas pontas pendentes para trás.
A figura enverga calças castanhas (AP, MC, LC, MLC, QM), verdes (SS, IF), cinzentas (JM) ou vermelhas (IC). A samarra é de cor castanha (AP, QM), azul (MC, LC, MLC), cor de zarcão (SS, JM), verde (IC) ou amarela (IF). A gola é em relevo e da mesma cor da orla dos punhos e da abertura da frente. Esta é azul (AP, SS, IC, IF), cor-de-rosa (MC), castanha (LC, QM) ou cinzenta (JM, MLC). A abotoadura da frente é amarela (AP, JM, SS, IF, MLC), azul (MC, LC, IC) ou castanha (QM). A abotoadura dos punhos é amarela (AP, IF), cor-de-rosa (MC), azul (LC, SS, IC), cinzenta (JM, MLC) ou castanha (QM). De salientar que na samarra do boneco das IF, aparecem ainda dois botões nas costas, à altura da cintura.
A samarra ostenta à frente dois bolsos laterais, debruados a castanho (AP, QM), cor-de-rosa (MC), cor de zarcão (LC), azul (SS, IC, IF) ou cinzento (MLC). A samarra do modelo de JM não apresenta bolsos à frente.
Por debaixo da samarra, uma camisa branca com colarinho amarelo (MC), cinzenta (LC), amarela (JM, IC, IF), branca (SS), azul (MLC, QM). O espécimen de AP não enverga camisa. Nos restantes, a camisa é fechada em cima por um par de botões amarelos (MC, JM, SS, IC, QM), vermelhos (LC, MLC) ou azuis (IF).
Os botins são castanhos (AP, MC, MLC, IC), pretos (JM, IF, QM) ou pretos com atacadores amarelos (SS) ou castanhos (LC).

sexta-feira, 25 de novembro de 2016

Sentinela do Povo



A minha postura na sociedade, sempre foi a de um guerrilheiro no pensamento, nas palavras e na acção em prol da Comunidade, contra os predadores que lhe dilaceram o ser, independentemente da sua natureza material ou espiritual.
As armas que utilizo são legítimas numa sociedade democrática. São as palavras escritas e as palavras faladas.
Não procuro benesses nem honrarias. Ajo por imperativo de consciência cívica e com espírito de missão laica, em defesa de valores universais, democráticos e plurais. Deles não prescindo, pelo que nunca me renderei. Só a morte me vencerá. Todavia, creio que permanecerei presente na memória colectiva. Outros ocuparão o meu lugar, desempenhando à sua maneira, aquilo que porventura será o meu papel. Trata-se do fluxo inexorável da História, já que não há ninguém insubstituível. Até lá, podem contar comigo, já que estou sempre no meu posto. Como sentinela do Povo, o meu lugar é aqui. Cabe-me a responsabilidade de manter acesa a chama de uma luta que remonta à origem dos tempos e que outros continuarão, quando eu tombar no campo da batalha.
Hernâni Matos   

sexta-feira, 18 de novembro de 2016

Crónica da Casa do Alcaide-Mor de Estremoz


Fachada da Casa do Alcaide-Mor do Castelo de Estremoz (Fotografia SIPA-1995).

Era uma vez uma medieva Casa do Alcaide-Mor de Estremoz, que deixou de o ser, passou a ser residência popular e no século passado albergou mesmo um bordel. 
Apesar de o edifício ter sido classificado como Monumento Nacional em 1924, desde essa data que a CME tem revelado autismo em relação a políticas da sua preservação e valorização. Não é de admirar pois, que a seta do tempo o tenha maltratado inexoravelmente, pelo que abateu primeiramente o telhado, seguindo-se o segundo e o primeiro andar.

A lei de Lavoisier e a seta do tempo
Como corolário de uma política errada em relação ao património e com exclusão da fachada, o edifício é um monte de ruínas. Ainda que a lei de Lavoisier registe: “Na natureza, nada se perde, nada se cria, tudo se transforma”, a seta do tempo tem um sentido único, pelo que o tempo não volta para trás, como no fado de António Mourão. Daí que o imóvel esteja como está.
Desde a adesão à CEE nos anos 80 do século passado, que o Município de Estremoz desperdiçou oportunidades sucessivas de financiamento de projectos, visando a recuperação da edificação. Consequentemente, à boca cheia ou pelos cantos, surgiram tesouradas e alfinetadas à sua olímpica passividade. A edilidade tinha um menino nos braços, do qual se tinha que ver livre. Em alternativa, tinha dois caminhos a seguir: pegar o boi pelos cornos ou delegar noutros, aquilo que era competência sua. Tragicamente para os munícipes, escolheu o caminho mais fácil, olvidando valores identitários locais, numa atitude que ao alienar património, é equiparável à de Esaú, que trocou a progenitura por um prato de lentilhas. Foi assim que deliberou vender aquela Casa em hasta pública.  Nesta e pela importância de 279.000,00 €, o imóvel foi provisoriamente adjudicado a um finório residente no concelho, em representação duma corporação americana, sediada numa caixa de correio dum paraíso fiscal e sucursal num edifício devoluto em Estremoz. Porém, o arrematante efectuou o pagamento inicial com um chegue careca, pelo que a venda não se concretizou e o menino ficou novamente nos braços de quem se queria ver livre dele, ao mesmo tempo que reforçava a provisão dos cofres municipais.

A virgem violada
Entrementes, um grupo de “Cidadãos pela Defesa do Património de Estremoz”, qual virgem violada, decide assumir-se no terreno como travão à venda. Nesse sentido, elabora uma petição à Câmara local, a qual recolhe um número irrisório de subscritores, relativamente ao universo populacional do concelho. Foi a sua primeira fraqueza. A segunda, foi promover uma Sessão Pública com deputados da “geringonça”. Não foi um tiro no pé, mas foi um tiro com pólvora seca. Dali saíram os deputados, transpirando boas intenções e os intervenientes com a alma aliviada pelo desfilar do seu rosário de mágoas. Foi pouco mais que quase coisa nenhuma. Lá diz a gíria popular: “Fica tudo como dantes, quartel-general em Abrantes”. Entretanto, uma pessoa que eu cá sei, terá largado o bitaite: “São os do costume”. O séquito apoiou e todos terão ficado contentes. Nesse meio-tempo, o “Grupo de Cidadãos” promoveu uma vista guiada à cerca medieval de Estremoz, a qual foi bastante participada e teve muita qualidade. O Município agradece, já que alguém está a fazer aquilo que ele não faz.

Ministério da Cultura questionado
O Grupo Parlamentar do BE dirigiu ao Governo, através do Ministério da Cultura, perguntas pertinentes sobre a postura da CME, as quais decorridos que são mais de 3 meses, carecem de respostas, talvez devido à inoportunidade das perguntas. É que o Governo PS, maioritário na “geringonça”, também precisa de reforçar os cofres do Estado, pelo que iniciou em Agosto um “Programa de Valorização do Património”, através do lançamento de 30 concursos de concessão da exploração de edifícios públicos, que são espaços históricos únicos, muitos dos quais abandonados ou em mau estado de conservação. Manuel Caldeira Cabral, ministro da Economia, argumentou a esse propósito ao Expresso que “Isto é a nossa herança histórica, temos a responsabilidade de olhar por este património, que não pode continuar ao abandono e a apodrecer, face ao estado a que chegou”. Por outras palavras, o Governo não tem chavo para fazer obras e precisa daquilo com que se compram os melões, para os utilizar noutras direcções que não as do Património Histórico. Por isso, estou convicto que as respostas do Ministério da Cultura ao BE vão demorar e ser provavelmente inconclusivas. 
De salientar que entre os edifícios que o Governo quer privatizar, se situam edifícios emblemáticos como o Mosteiro de Arouca, o Castelo de Portalegre e o Forte de Peniche. Relativamente a este último está a decorrer uma petição cujos subscritores lutam pela preservação da memória e resistência ao fascismo, pelo que apelam ao Governo para que o Forte permaneça património nacional, símbolo da repressão fascista e da luta pela liberdade.

A subida da parada
Como da primeira vez não houve consumação do acto, a CME decidiu lançar nova hasta pública, subindo agora a parada para uma base de licitação de 250.000 euros. Não apareceram interessados, pelo que a recuperação do imóvel continua em aberto e os cofres do Município ficaram sem o almejado balão de oxigénio.
Regime Jurídico do Património Classificado
A Lei n.º 107/2001 de 8 de Setembro, estabelece as bases da política e do regime de protecção e valorização do património cultural. De acordo com ela, os proprietários de bens classificados estão submetidos a restrições e obrigações no que respeita à sua transmissão, alienação, aquisição, direito de preferência, inscrições e afixações, projectos, obras e intervenções, conservação, deslocamento, demolições ou expropriações, estabelecidas nomeadamente nos artigos 9.º, 21.º, 31.º, 32.º, 34.º, 35º., 36.º, 37.º, 38.º, 41.º, 42.º, 45.º, 46.º, 48.º, 49.º,50º., 60º. e 99º. A transmissão de bens classificados obedece também aos artigos 416.º, 417,º, 418.º e 1410.º do Código Civil. De resto, vigora o Regime Jurídico do Património Imobiliário Público, aprovado pelo Decreto-lei n.º 280/2007, de 7 de Agosto e alterado pelos seguintes diplomas: - Lei N.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro; - Lei N.º 64-B/2011, de 30 De Dezembro; - Lei N.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro; - Decreto-Lei N.º 36/2013, de 11 de Março; - Lei N.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro; - Lei N.º 82-B/2014, de 31 de Dezembro.

Que fazer?
Esta a pergunta sacramental que muitos estarão a formular. Contudo, não me cabe a mim responder. Não sou juiz com capacidade de administrar justiça, Ministério Público com competência de exercer acção penal, nem estou togado para ser advogado de defesa nem de acusação. Como jornalista, apenas me compete despertar consciências, pondo o dedo na ferida. E é nessa qualidade que, correndo o risco de ser acusado de pessimista, sou levado a citar o poeta António Aleixo: “Descreio dos que me apontam / Uma sociedade sã: / Isto é hoje o que foi ontem / E o que há-de ser amanhã.”.
A crónica vai continuar. Todavia, desconhecem-se as cenas dos próximos capítulos.

Telhados da Casa do Alcaide-Mor do Castelo de Estremoz (Fotografia SIPA-1993).

quarta-feira, 16 de novembro de 2016

Salvemos a olaria! - I


OLEIRO DE ESTREMOZ – Fotografia obtida nos anos 40 do séc. XX, pelo fotógrafo
Artur Pastor (1922-1999), natural de Alter do Chão.

A olaria é uma das mais antigas, se não a mais antiga das artes populares. A olaria estremocense é das mais ricas do mundo, pela variedade morfológica das suas peças e pela diversidade e riqueza da sua decoração. É uma das expressões mais elevadas da nossa identidade cultural local.

Referências histórico-literárias
As referências mais antigas à olaria estremocense remontam aos forais de D. Afonso III (1258) e de D. Manuel I (1512). Daqui para diante as referências histórico - literárias aos barros de Estremoz são múltiplas: António Caetano de Sousa (1543), Giovanni Battista Venturini (1571), Francisco de Morais (1572), Inventário de D. Joana (irmã de Filipe II), correspondência de Filipe II, Padre Carvalho (1708), Francisco da Fonseca Henriques (1726), João Baptista de Castro (1745), Duarte Nunes de Leão (1785), D. Francisco Manuel de Melo, Alexandre Brongniart (1854), Carolina Michaëlis de Vasconcellos (1925) e Hernâni Matos (2013).
Os barros de Estremoz têm sido cantados pelos nossos poetas: Camões, Gil Vicente, António de Vilas Boas e Sampaio, António Sardinha, Celestino David, Maria de Santa Isabel, Guilhermina Avelar e António Simões. Mas não só os poetas eruditos têm tomado a olaria como tema de composições. Também ao longo dos anos, os nossos poetas populares têm feito quadras e décimas que integram o valioso cancioneiro popular alentejano.

Uma tragédia cultural
Estremoz chegou a ter dezenas de oleiros. Na década de 60 do séc. XX apenas restavam duas oficinas: - A Olaria Alfacinha fundada em 1868 por Caetano Augusto da Conceição e que esteve na posse da família até 1987, ano em que é vendida, sendo extinta definitivamente em 1995; - A OLARIA REGIONAL, de fundação mais recente, foi propriedade de José Ourelo, que a transmitiu a Mário Lagartinho, o último oleiro de Estremoz, que morreu recentemente sem deixar continuadores, o que constituiu uma tragédia cultural, numa cidade que já foi um dos maiores centros oleiros do Alto Alentejo.

Não à extinção da olaria!
Quase sempre a transmissão de saberes oleiros foram transmitidos de pais para filhos e aprendizes. A interrupção desta cadeia é sempre uma tragédia e a olaria estremocense corre o risco de extinção. A preservação da nossa memória colectiva e dos saberes tradicionais exige da parte da comunidade local, um esforço para que tal não aconteça. Não basta a nossa olaria estar musealizada. É preciso que esteja viva.
Está em curso uma Candidatura do Figurado de Estremoz a Património Cultural da Humanidade, na qual a comunidade local se revê e que tudo indica sairá vencedora. Não faz sentido que paralelamente se deixe extinguir a olaria local, a outra componente da nossa barrística. Temos que dar as mãos e unirmo-nos, para que tal não aconteça.

Que fazer?
Vou sugerir uma estratégia, que eventualmente pode não ser única, mas que me parece ser viável:
1 – Fomento do gosto pela olaria nas escolas, tanto do ensino preparatório como do ensino secundário;
2 – Criação em Estremoz pelo IEFP de um curso de olaria;
3 – Acolhimento desse curso, sem encargos para ninguém, por parte da Escola Secundária da Rainha Santa Isabel;
4 – Apoio material pelo IEFP aos formandos desempregados ou à procura do primeiro emprego, no sentido de constituição de uma empresa, eventualmente do tipo cooperativo; 
5 - Cedência pelo Município de Estremoz de um local para a empresa funcionar, o qual poderia ser o de uma antiga olaria, a ser adquirida pelo Município;
6 - Cedência pelo Município de Estremoz de um espaço no Rossio Marquês de Pombal para instalar um stand para comercialização de peças;
7 – Apoio do Município de Estremoz no marketing da olaria.
O desafio está lançado. Quem dá o pontapé de saída?

POLIDEIRA DE ESTREMOZ – Fotografia obtida nos anos 40 do séc. XX, pelo fotógrafo
Artur Pastor (1922-1999), natural de Alter do Chão.

quarta-feira, 9 de novembro de 2016

59 - O aguadeiro – 9


Aguadeiro (2016).
Ricardo Fonseca (1986-  ).
Colecção particular.
Figurado de Estremoz – 4
O aguadeiro de Ricardo Fonseca (2016) é um conjunto constituído por uma figura antropomórfica masculina (o aguadeiro) e uma figura zoomórfica (o burro).
Representa um aguadeiro da cidade, trajando ao jeito de meados do séc. XX, que nas mãos segura as rédeas para a condução da cavalgadura, representadas por fio castanho-claro. Na cabeça, dois pontos negros interpretam os olhos, encimados por dois traços castanhos de espessura diferente, que figuram as pestanas e as sobrancelhas. No nariz em relevo, estão caracterizadas as narinas. Na boca, os lábios avermelhados igualmente em relevo. O cabelo é castanho-escuro, penteado em relação ao observador, com risca do lado direito e melena que aponta para o lado esquerdo, com patilhas laterais e apresenta também volumetria, tal como as orelhas que estão a descoberto. Em cada uma das faces é visível uma roseta alaranjada. Na cabeça, um chapéu aguadeiro negro e sem fita. A figura enverga calças em relevo, de cor castanha e camisa de manga comprida, com colarinho e punhos, de fundo creme, axadrezada a preto e a castanho, com abertura frontal, sem quaisquer botões visíveis. Por cima da camisa, um colete igualmente em relevo, cinzento atrás e azul à frente, ostentando aqui dois bolsos de relógio apresentados por riscos incisos e uma abotoadura revelada por um alinhamento vertical de cinco cavidades circulares. Os botins são pretos.
Atrás do homem encontra-se um burro de cor acastanhada e cascos castanhos-escuros e em relevo, que estando a marchar para o lado direito do observador, apresenta a cauda negra e comprida, com linhas incisas, viradas para o mesmo lado. O pescoço do animal ostenta crina negra com linhas incisas. Na cabeça, são visíveis duas orelhas, dois olhos pintados, um sulco que aparenta a boca e duas cavidades circulares, num tom de cor diferente, fazendo as vezes de narinas. A cabeça e o focinho da cavalgadura estão cingidos por uma cabeçada em relevo, de cor castanho-escuro. Da cabeçada parte lateralmente fio castanho-claro, simbolizando as rédeas para a condução do jumento, que o homem agarra com qualquer das mãos. No cachaço do animal está assente uma manta em relevo e com riscas em vários tons de castanho. A ela está sobreposto um molim, também em relevo e listado em castanho, azul, amarelo e verde. O molim apresenta sete borlas esféricas, cor de zarcão. O asno está atrelado a uma carro de tracção animal, com dois varais e duas rodas de seis raios, imitando madeira pintada de vermelho. A orla exterior das rodas está pintada de cinzento-escuro, a simular aros de ferro. O estrado do carro é baixo e encontra-se dividido em doze receptáculos de forma quadrada, para transporte de igual número de cântaros de barro, com tampa igualmente de barro e que terminam por uma saliência de forma semiesférica, visando facilitar o seu manuseamento.
O conjunto assenta numa base rectangular de cor verde bandeira, pintada lateralmente a castanho avermelhado.
À semelhança do que já tinha afirmado relativamente ao aguadeiro de Jorge da Conceição (2014), estamos novamente em presença de uma figura de manufactura mais difícil e morosa que o aguadeiro do núcleo base do figurado de Estremoz. Ricardo Fonseca é perfeccionista, o que o leva a dedicar-se aos pormenores, não só na manufactura das figuras, como na sua pintura. Catapulta assim o figurado de Estremoz a um patamar mais elevado, que aqui se assinala e elogia, já que ocorreu aqui uma nova mudança de paradigma.
Hernâni Matos

domingo, 6 de novembro de 2016

Manifesto anti-gralha


Cerca de 1450, Johannes Gutenberg (1400-1468) inventor da Imprensa, examina
uma página impressa. Ilustração do séc. XIX. Com a composição tipográfica e a
 impressão, nasceria a gralha.

A gralha continua a ser aquela ave atrevida que pousa no texto, sem pedir autorização ao seu autor. Daí que eu tenha composto o seguinte:

Manifesto anti-gralha

Quem trabalha
o seu texto,
como em talha,
o arabesco,

sem falha,
quer primor
e batalha
pelo seu amor.

Mas vem a gralha
e sem pretexto,
feita canalha,
deturpa o texto.

Extirpar a gralha
é o contexto
de quem batalha
para elevar o texto.

O Manifesto chegou ao fim.
Morra a gralha! Morra! Pim!

PÓS-TEXTO: No número anterior do jornal E, na entrevista “ANTÓNIO GUTERRES VISTO POR COELHO RIBEIRO”, deveria ter aparecido “O despertar de Coelho Ribeiro” em vez do subtítulo “O despertador de Coelho Ribeiro”, que o entrevistador não subscreve, uma vez que não se reconhece em títulos sensacionalistas. Aqui fica pois, a correcção que se impunha. De resto, o leitor mais atento, decerto terá percebido, que o importante ali é ter acontecido “O despertar de Coelho Ribeiro” para a intervenção cívica e política e não as forças policiais ao serviço do Fascismo, já que embora a acção destas forças tenha funcionado como “O despertador de Coelho Ribeiro”, o que se pretende exaltar é o “O Despertar de Coelho Ribeiro” para a intervenção cívica e política, a qual até poderia ter ocorrido de outra maneira.

Hernâni Matos