sexta-feira, 29 de julho de 2016

Revista à Portuguesa


Cartaz da revista “Chá de Parreira” de Xavier de Magalhães e estreada no
“Teatro Variedades, em 27 de Julho de 1929. Imagem e texto, reproduzidos
com a devida vénia do blogue “Restos de Colecção”.

Há situações no trânsito citadino que são de se lhe tirar o chapéu. Constituem verdadeiras pérolas de “non sense”, que levadas à cena num teatro de revista, assegurariam decerto um colossal êxito de bilheteira.

1º Quadro
Na rua General Norton de Matos, pintaram no pavimento uma passadeira de peões, mesmo em frente do portão de um stand de automóveis, que neste momento está vazio. Ao voltar a ser utilizado, quando entrarem ou saírem carros, não podem passar peões. Quando estes estiverem a atravessar a passadeira, a saída ou entrada de automóveis no stand, tem de esperar pela sua vez. É caso para dizer:
- E esta, hein?

2º Quadro
 No Largo dos Combatentes da Grande Guerra, mesmo em frente à estátua de Tomás Alcaide, está pintada no pavimento uma passadeira para peões. Todavia a rampa de acesso a deficientes, não se situa no término da passadeira, mas ao lado desta. As opiniões dividem-se. Uns dizem que foi engano do pintor, outros que foi do calceteiro. Agora que não houve fiscalização, isso não houve.

3º Quadro
Junto ao Lago do Gadanha e próximo do edifício Luís Campos, foi instalada mais uma esplanada, nas quais Estremoz está a ser pródiga. A esplanada ocupa metade da via pública, a qual tem dois sentidos de circulação. Pela metade que resta, terão de passar peões e o trânsito nos dois sentidos. Relativamente a esta situação, as opiniões ainda se dividem mais. Uns dizem que a rua vai passar a ter um sentido único. Outros admitem que a Câmara ali venha a implementar sinalização semafórica. Outros são da opinião que o mais fácil ainda, era a Câmara destacar para ali um sinaleiro municipal.

4º Quadro
Na novel avenida da Rainha Santa Isabel, a tal que só tem traseiras, foi implementada à data da sua criação, uma excrescência rodoviária a que eufemisticamente, alguém supostamente iluminado, deliberou baptizar como “ciclovia”. O respectivo projectista, quando a concebeu, deve tê-lo feito com os pés, que não com o conhecimento daquilo que estava a fazer, daí que seja mais utilizada como caminho pedestre, do que como “ciclovia”.
Trata-se de uma faixa de pavimento vermelho, do material supostamente recomendado para esse efeito. Ao longo de todo o seu percurso, essa faixa tem largura variável, tal como o passeio onde foi traçada. Relativamente a ela é de observar o seguinte:
- É uma faixa que vai acompanhando a parede da avenida. Aqui está o primeiro erro, já que uma ciclovia deve confinar com a faixa de circulação rodoviária, visando facilitar a entrada e a saída de ciclistas. Junto a uma parede é que não, na medida em que isso constitui um risco para os ciclistas.
- A chamada “ciclovia” não tem qualquer sinalização vertical, nem à entrada nem à saída, nem tão pouco quando é interrompida. Apenas tem estampado de tantos em tantos metros, o símbolo branco de uma bicicleta, a indicar que aquela faixa está reservada aos amantes do pedal.
- Como não há qualquer sinalização vertical, a informar que aquela banda é uni-direccional, ela pode ser utilizada como pista ciclável bi-direccional, o que se torna bastante interessante, já que aquela faixa é a preferida pelo trânsito pedonal. E é uma faixa de largura ridícula, já que se a circulação num único sentido exige a largura de 1,20 m a 1,50 m, a circulação nos dois sentidos aconselhava a largura de 2 m a 3 m.
- Em localidades onde há planeamento, a ciclovia além de ter a largura adequada, está implementada entre a faixa de trânsito rodoviário e a de trânsito pedonal, subida em relação à primeira e separada da segunda por vegetação delimitadora. Existe sinalização vertical e no caso de a ciclovia ser uma pista ciclável bi-direccional, as duas faixas podem mesmo estar separadas por um traço branco no pavimento.
A quem baptizou de “ciclovia” aquela excrescência rodoviária, recomendo bom senso, que é aquilo que posso recomendar.

Epílogo
Situações como as descritas levam os cidadãos a divergir nas suas orações diárias. Uns agradecem:
- Obrigado Senhor pela graça que nos concedeste, de usufruir do privilégio de tão hilariantes situações, para nosso gáudio e recreação espiritual.
Outros imploram:
- Perdoai-lhes Senhor, porque eles não sabem o que fazem.

Sem tomar posição sobre a atitude religiosa de cada um, julgo ser legítimo concluir, que não é por estas e por outras, que alguns repetidamente proclamam que “ESTREMOZ TEM MAIS ENCANTO!”.
Hernâni Matos

quarta-feira, 27 de julho de 2016

Receita para fazer uma geringonça


Invenções de Leonardo da Vinci: Modelos cinemáticos do Codex Madrid I.
Biblioteca Nacional de Madrid.

A gestão autárquica do MIETZ a nível concelhio é rejeitada unanimemente pelo PS, pela CDU e pelo BE. Daí não ter constituído surpresa, o comunicado de imprensa da Assembleia-geral de Militantes da Secção de Estremoz do Partido Socialista, reunida a 25 de Junho de 2016, na freguesia de Veiros. Nele são tornadas públicas 7 conclusões, das quais me permito destacar duas:
- UMA DE ÂMBITO NACIONAL: “Analisar de forma muito positiva a acção do Governo de Portugal e o empenho de todos os partidos que compõem a solução governativa, cujo trabalho contribuiu para a melhoria da qualidade de vida dos portugueses, para a renovação da esperança aos jovens e desempregados e para a devolução de direitos, salários e pensões aos reformados, idosos e cidadãos em geral.”
- OUTRA DE ÂMBITO LOCAL: “Ao nível local, o PS manifesta disponibilidade para iniciar um período de diálogo democrático, com todos os partidos e movimentos, para numa lógica de futuro, reflectir sobre os problemas e soluções autárquicas.”
No seio da esquerda local, há quem creia que esta última conclusão é para inglês ver. Tal convicção, longe de constituir uma dúvida pirrónica, pode ser apenas consequência do facto de que “gato escaldado, de água fria tem medo”. Todavia, eu não penso assim. Não encontro motivo algum, que me leve a duvidar da seriedade das intenções do PS local, ao qual reconheço respeitabilidade, como de resto reconheço à CDU e ao BE.
Estou certo que o PS local, inspirado pelos bons exemplos que lhe vêm de cima, não deixará de oportunamente e em tempo útil, levar à prática a intenção manifestada de construção duma geringonça local que afaste o MIETZ da gestão autárquica.
Eu não sou político, mas como pensador, escrevo aquilo que penso. Daí que “como treinador de bancada” me permita divulgar uma receita para fazer uma geringonça local. A meu ver, a construção desta, deve ter em conta os seguintes quesitos:
1 – A geringonça é para percorrer caminho comum e este faz-se caminhando. Contudo, o percurso não pode ser feito à toa.
2 – A aceitação do direito à diferença, o debate frontal e fraternal na elaboração de um projecto de gestão autárquica alternativa à do MIETZ e que possa ser sólido, coerente, estável e duradouro. Sempre na convicção de qualquer das partes envolvidas, terá de deixar algumas ideias na gaveta, a fim de possibilitar a negociação.
3 – Sem esquecer os calcanhares de Aquiles que cada um tem, estes não podem inviabilizar a esperança que se pretende construir.
4 – Que cada um, com a convicção da força que tem, tenha a humildade de a reservar para a pôr ao serviço exclusivo da alternativa que se deseja construir.
5 – Primeiro a construção do projecto de gestão autárquica, alternativo ao do MIETZ. Só depois a escolha da equipa para o levar à prática.
6 – A geringonça terá de ser pré-eleitoral, pois claro!
O CONCELHO FICA À ESPERA!
Hernâni Matos

quarta-feira, 20 de julho de 2016

54 – O Aguadeiro - 5


Aguadeiro.
Quirina Marmelo (1922-2009).
Colecção particular.

Literatura de tradição oral 
O (A) aguadeiro (a) tem múltiplos averbamentos na nossa literatura de tradição oral.
No que respeita a ADAGIÁRIO registo: “Janeiro geadeiro, Fevereiro aguadeiro”.
No âmbito da GÍRIA POPULAR são conhecidos os termos: Aguadeira (Capa que não deixa passar a água), Aguadeira (Petisco que abre o apetite), Aguadeiras (Penas que acompanham as asas das aves de rapina até ao rabo), Aguadeiro (Capote de saragoça, próprio para resistir à água - Alentejo), Aguadeiro (Chapéu com a orla da aba voltada para cima e que retém a água quando chove, pelo que é necessário desabá-lo - Alentejo), Aguadeiro (Ciclista que acompanha a equipa), Aguadeiro (Designação pejorativa dada a cocheiro que conduz mal), Aguadeiro (Homem encarregado de introduzir água salgada na salina), Aguadeiro (Feixe de linho pronto para demolhar).
No domínio das ALCUNHAS ALENTEJANAS, conheço apenas uma: Aguadeiro – Alcunha outorgada a homem ou mulher que vendia água, antes de existir água canalizada (Aljustrel, Casto Verde e Ourique).
Em termos de ANTROPONÍMIA e de acordo com o site http://forebears.io que dá acesso a bases de dados genealógicas, o apelido Aguadeiro será comum a 37 pessoas em Portugal e terá resultado da transformação da alcunha em sobrenome, pelo que sendo aguadeiro uma antiga profissão de âmbito nacional, é normal que a distribuição geográfica seja bastante vasta.
Quanto a PREGÕES ALENTEJANOS, Eurico Gama, em “Os Pregões de  Elvas” (1954), refere os seguintes: - “Á-gua-dê-ro!; - Á-gua fres-qui-nha!”; - “A tos-tão a bar-ri-gada!”; - “S’tá aqui o home da água!”; - “É um céu aberto a água da Fonte Nova!”; - “A água da Fonte Nova percorre as veias de toda a criatura!”.
Na área da TOPONÍMIA, tenho conhecimento da existência da Rua dos Aguadeiros (Peniche, Faro, Portimão e Quarteira) e do Beco dos Aguadeiros (Lisboa).
No que concerne a CANCIONEIRO POPULAR, apenas refiro que Lopes da Areosa no Romance  do  Senhor  da  Serra (d’Arga), nos diz que: “…(Os meus passos de romeiro /   todos os anos lá vão) / e nesta peregrinação / não encontro o aguadeiro / dos tempos que já lá vão /…”.
A nível de LENDAS, há a referir a “Lenda da Bilha de S. Jorge”. De acordo com ela, no dia da Batalha de Aljubarrota, os exércitos português e castelhano encontravam-se frente a frente, sob um sol escaldante. Nuno Álvares Pereira temeu mais a sede que o exército inimigo, pelo que incumbiu Antão Vasques de procurar água, tarefa ingrata, dado a secura dos ribeiros. Desesperado porque não conseguia encontrar água, Antão Vasques apeou-se do cavalo, ajoelhou-se e orou a S. Jorge, a quem implorou que o auxiliasse. Surgiu então uma camponesa com uma bilha de água, que se enchia quando dela se bebia, saciando a sede e recompondo as forças e o espírito. Quando os castelhanos atacaram, convictos de encontrar os portugueses debilitados pela espera e pela sede, estes resistiram com firmeza e, para grande espanto dos castelhanos, venceram a batalha. 
No círculo das ANEDOTAS POPULARES, apenas registo uma: VALORIZAÇÃO INSTANTÂNEA - Um aguadeiro percorria as ruas de uma praça-forte sitiada, carregando dois cântaros de água, a qual apregoava: - “A pataco o cântaro, a pataco…”. Quando um estilhaço de granada rebenta um dos cântaros, o homem não se atrapalhou, modificando apenas o pregão: - “A dois patacos o cântaro, a dois patacos…”.
Hernâni Matos

quinta-feira, 14 de julho de 2016

Auto do Arraial de Santo António


Santo António. Imagem seiscentista em lenho dourado,
do altar homónimo do Convento de São Francisco em
Estremoz,  situado no lado esquerdo da Capela Maior
e referenciada nas Memórias Paroquiais de 1758.

A acção decorre há duzentos anos atrás e os personagens são bem conhecidas.
Foi do agrado geral, o arraial de Santo António, que na respectiva noite animou a rua da Paróquia e a Praça Luís de Gamões, frente à Casa das Leis. A iniciativa coube à Comissão Fabriqueira, visando obter fundos para as obras sociais da Paróquia.
No arraial chamaram a atenção algumas mesas, as quais passamos a referir:
- MESA DA PARÓQUIA – Presidida por Dona Maria das Dores, grande devota de Santo António. Nela tiveram lugar a sua afilhada Maria da Fé e os doutores Cruz, Martim e Cariz, estes últimos, organizadores do arraial, sob os auspícios de Dona Maria das Dores. Foi uma mesa onde só foi servida groselha, visto que D. Maria das Dores é abstémia. Todavia, no copo dos homens, a groselha aparentava ter um tom bastante mais carregado.
 - MESA DA CULTURA - Nela tiveram assento Vasco, Sargento-Mor Francisco Trás, Fernão, Carmelo Alturas e o poeta António Limões. Esta mesa além de honrar as sardinhas e o resto, contribuiu para animação cultural do arraial desde a abertura. É que Dona Maria das Dores que os conhecia a todos como pessoas bem falantes e muito educadas, os convidou para, cada um à sua maneira, se dirigir em breves palavras aos presentes, solicitação a que corresponderam com natural agrado e por esta ordem: - VASCO: No Convento de São Francisco em Estremoz, venera-se a imagem seiscentista de Santo António em lenho dourado, existente no altar homónimo, situado no lado esquerdo da Capela Maior e já referenciada nas Memórias Paroquiais de 1758. – SARGENTO-MOR FRANCISCO TRÁS: Santo António teve uma brilhante carreira militar póstuma. Começou no 2º Regimento de Infantaria de Lagos, onde foi alistado em 1668, por alvará de D. Pedro II, que em 1863 o promoveu a capitão. Em 1777 foi promovido a major por D. Maria I. Em 1807, por decisão de Junot, foi promovido a tenente-coronel. Com a extinção do seu Regimento, apareceu em 1810 ao serviço do Regimento de Infantaria nº 19 de Cascais no decurso de toda a Guerra Peninsular, o que lhe valeu uma cruz de oiro e a promoção a tenente-coronel por alvará do príncipe regente D. João. A uma brilhante folha de serviço prestado na metrópole, junta-se ainda uma larga participação em guerras nas colónias, pelo que é considerado um militar de carreira. - FERNÃO: Santo António foi um dos intelectuais mais notáveis de Portugal antes de existir Universidade, tendo-se distinguido como asceta, místico, taumaturgo,  teólogo exímio e grande pregador. Um ano após a sua morte foi canonizado pelo papa Gregório IX e é venerado pela Igreja Católica que lhe atribui um extraordinário número de milagres. - CARMELO ALTURAS: A circunstância de o dia de Santo António coincidir com as festas do Solstício de Verão, faz com que seja celebrado em Portugal como um dos santos mais populares, com presença honrosa e permanente na literatura, na pintura, na escultura, na música, na toponímia, no folclore, na arte popular, especialmente na barrística, assim como na literatura oral. – POETA ANTÓNIO LIMÕES: Vou-vos dizer algumas quadras populares alentejanas relativas a Santo António casamenteiro. Eis uma:  “Santo António de Lisboa, / Guardador dos olivais, / Guardai o meu lindo amor, / Que cada vez foge mais.“ / E mais esta: “O sol bate de chapa, / Faz a maçã coradinha; / Tenho fé em Santo António / Que inda hás-de vir a ser minha.“. 
- MESA DAS MULHERES: Liderada por Libertária, ali se encontravam Mofina, Valentina, Maria Machadão e Firmina Tautau. Comeram e beberam moderadamente, mas falaram muito entre si, tendo Libertária proclamado que o amanhã é das mulheres, pelo que para a frente é que é caminho. Todas concordaram e Maria Machadão em sinal de assentamento, pregou tal murro na mesa que entornou os copos todos. Valentina concluiu que não fazia mal, já que o que é preciso é alegria.
- MESA DAS AUTORIDADES: Chefiada por SandeAoCão, o qual se encontrava acompanhado de Vascão e de Patilhas. Com grande desgosto de Vascão, ali teve que se beber com moderação, já que como advertiu SandeAoCão, as autoridades devem ser as primeiras a dar o exemplo.
 - MESA DOS DEVOTOS DE SÃO MARTINHO: Nela se sentaram o sargento Patacão, Chico Pinguinhas, Zé Tretas e Lérias. Por ali a festa foi rija, já que eram como o Jacinto, tanto gostavam do branco como do tinto, além que eram como os da Amareleja, que também gostam de cerveja.
No arraial foram notadas algumas ausências: - O REGEDOR: Que por dever do cargo que tão bem desempenha, se viu mais uma vez forçado a testar a qualidade dos serviços na rota das tabernas do concelho, missão espinhosa em que foi acompanhado por outros destacados elementos da Regedoria; - CARLOS TUNA: Por se encontrar ausente num seminário sobre questões transfronteiriças, numa cidade do outro lado da raia; - LELO: Por ter alergia ao cheiro das sardinhas; - DONA MAGNIFICÊNCIA: Por achar que a rua da Paróquia não é rua que se recomende.
Foi Carmelo Alturas quem lançou o balão de Santo António, no que foi aplaudido por todos. Aproveitou para fazer um improviso sobre a passarola voadora do Padre Bartolomeu de Gusmão e a sua experiência aerostática no Pátio da Casa da Índia em 1709, perante a corte de D. João V. Pilérias, bastante descontraído pelos copos que emborcara, quando ouve falar em passarola, pensou noutra coisa e começou a rir a bandeiras despregadas. Até parecia que lhe faltava o ar. Firmina Tautau viu-se então forçada a levantar-se do lugar onde se encontrava e assestou-lhe um monumental par de tabefes que lhe restituíram a respiração normal.
Já no final do arraial teve lugar o leilão de fogaças. Como habitualmente o leilão foi dirigido pelo Dr. Cruz. Merecem especial destaque quatro caixas de garrafas de vinho, oferecidas por adegas do concelho: - Uma caixa de Vila Tanta Trincadeira da Adega de Portugal Damos, que foi arrematada pelo Xico Pinguinhas, para consumo próprio; - Uma caixa de Quinta do Touro Cabernet Sauvignon da Adega da Quinta do Touro, que foi adjudicada pelo sargento Patacão, para gasto pessoal; - Uma caixa de Herdade das Trevas, Colheita Seleccionada Branco da Adega do Monte das Trevas. Foi arrematada pelo Sargento-Mor Francisco Trás com o pedido expresso de o Dr. Cruz a entregar no Retiro dos Combatentes, numa das suas habituais visitas de conforto espiritual; - Uma caixa de Dona Bia Grande Reserva da Adega de Júlio Castos, licitada por Fernão, que a foi entregar pessoalmente a D. Maria das Dores, a fim de ser leiloada no próximo arraial, o que muito sensibilizou a piedosa senhora, que aproveitou para pedir a Fernão para dar eco de todos os brados do arraial, no jornal onde cronista é.
Hernâni Matos

terça-feira, 12 de julho de 2016

Euro 2016 - Humor

A vitória de Portugal no Euro 2016 deu origem à criação de múltiplos cartoons. Apresentamos aqui e sem comentários, uma selecção de alguns desses cartoons recolhidos na internet. 














































Hernâni Matos

quarta-feira, 6 de julho de 2016

53 – O Aguadeiro - 4


Aguadeiro.
Jorge da Conceição (1963-  ).
Colecção particular.

Literatura Alentejana
Como é sabido o(a) aguadeiro(a) era o homem ou mulher que acarretava água, que vendia nos domicílios ou na rua. Para além disso, no Alentejo também era designado por aguadeiro(a), o homem ou mulher que no decurso das ceifas, distribuía água para o pessoal se dessedentar. Iremos apontar aqui algumas referências literárias a nível de prosa.
No século XIX surgem-nos: - José da Silva Picão - ATRAVÉS DOS CAMPOS (1883): “Lá aliviam a miúde, para dizerem coisas ou para emborcarem golos de água fresca que a aguadeira lhes oferece,…”. - Fialho de Almeida - O AGUADEIRO ALENTEJANO in ÁLBUM DE COSTUMES PORTUGUESES (1888): “- E desta reclusão proposital da mulherinha que se fez dama, e acha que ir à fonte é ocupação imprópria de uma sécia nasceu o aguadeiro da vilota alentejana, o mariola válido e bistrado … e que em vez de cavar nas vinhas, ou de revolver a ferro de arado o esboroento salão dos sobreirais, anda de cachimbinho na boca, o grande relaxado, a apregoar – quem merca a água! – pelas ruelas sonolentas do povo, onde os porcos fossam nas estrumeiras, cigarras chiam, e um velho sino bate as horas, com uma plangência sinistra de tam-tam.”. - Conto O MENINO JESUS DO PARAÍSO in O PAÍS DAS UVAS (1893): “Com o camelo e o árabe, seria uma paisagem tangerina. Substituindo porém o dromedário por um cónego, e o árabe por um aguadeiro vestido de Saragoça, gritando “quem merca água!” adiante dum burro com cântaros de cobre, numas cangalhas de azinho, inesperadamente a feição muda, e não há Alentejo mais típico, nem gravura eborense mais “avant la lettre”. Entretanto o Paraíso de Évora é principalmente notável por três coisas: pelo seu aspecto exterior, pelo seu refeitório e pelos doces.”.
No século XX surgem-nos sucessivamente:
- Fialho de Almeida - Conto AVES MIGRADORAS in AVES MIGRADORAS (1914): “Lembra a rainha Dobrada, esposa de S. M. Termo tinto, dando beija-mão aos aguadeiros.”. - Júlio Dantas - ESPADAS E ROSAS  (1919): “Mas, para Alberto Sousa, como para o inglês Watts, “le paysage seul ne prouve rien”; é precisa a figura humana, o animal, o pormenor etnográfico a comunicar-lhe vida, intenção, movimento, —e assim, nas suas interpretações da écloga alentejana há sempre, ou uma mancha negra e confusa de gado, bezoando, cabritando, tilintando os chocalhos de cobre das Alcáçovas sob a guarda dos alfeireiros e dos rabadões, como no admirável trecho da Feira de S. Lourenço; ou o burro de um aguadeiro, como no Poço de Aljustrel;”. - J.A. Capela e Silva - GANHARIAS (1939): “Começa o martírio da sêde. E os homens pedem em grita a água que chega mórna, e que é ingerida em quantidades inverosimeis, continuamente distribuida pelo aguadeiro.”. - Manuel da Fonseca - CERROMAIOR (1943): - ”A maior parte dos camponeses já havia feito as compras e enchera as vendas do largo. De quando em quando, atraídos pelas gargalhadas dos que estavam de fora, chegavam às portas. O motivo do riso era a loucura mansa do aguadeiro, já bêbado, de fralda de camisa fora das calças, ajoelhado diante do burro. O meu burro é um santo!”. - Virgílio Ferreira - APARIÇÃO (1959): "A feira abriu com grande excitação. Todo o Rossio se iluminou de festa com … solitários vendedores de água com uma bilha e um copo ao lado,…”. - Mário Cláudio - AS BATALHAS DO CAIA (1995): “E impingiam-lhes os talhantes as carnes velhas e nervosas, abasteciam-nos as fruteiras das mais amargas laranjas, forneciam-lhes os aguadeiros a vaza das nascentes dos cemitérios, se não aquela em que haviam malevolamente mijado.”.
Hernâni Matos