quinta-feira, 29 de novembro de 2018

JORGE BRANCO - Um Amigo que partiu


 Jorge Branco, no decurso da 2ª Feira de Coleccionismo de Estremoz,
em 21 de Junho de 1997.

Na passada 3ª feira, dia 20 de Novembro e no seguimento de um tombo na sua residência, faleceu no Hospital do Espírito Santo de Évora, Jorge Andrade da Silva Branco, natural de Lisboa e morador no Monte da Maia de Cima, em Estremoz.
Jorge Branco que perfaria 88 anos no próximo dia 23 de Dezembro, era geofísico de formação e figura muito prezada pela comunidade local. Jornalista, escritor, artista plástico, destacado coleccionador, activista cultural e pessoa muito interveniente em causas cívicas, foi Presidente da Assembleia Municipal de Estremoz, em representação da CDU. Era casado com D. Aida Branco e pai do Senhor Eduardo Branco e da D. Alexandra Branco.
O funeral decorreu na passada 4ª feira pelas 11 horas, no Cemitério de Estremoz. Nas exéquias, além de familiares e amigos, esteve presente uma delegação da CDU, tendo a Câmara Municipal de Estremoz feito representar-se pelo Presidente Luís Mourinha e pela Vereadora Sílvia Dias.
Antes do corpo baixar à terra, dois amigos prestaram ao defunto o seu último preito. O Poeta António Simões declamou o seu poema “Fado do não morrer” e o Professor Hernâni Matos fez o elogio fúnebre do finado.
O “E” que esteve representado pelo seu colaborador Hernâni Matos, apresenta à família pesarosa, os seus sentidos pêsames.

Esboço Biográfico
O nosso amigo Jorge Branco nasceu no Natal de 1930, dois dias antes de Jesus, ainda que 1930 anos depois.
Em Maio de 1940 acompanhou a família até Moçambique, onde residiu até 1942. Nos anos 50 ingressou na Faculdade de Ciências de Lisboa e por ali andou até 1956. Nesta data, o Jorge era já um Geofísico encartado e estava creditado para observar, registar e estudar calamidades públicas, tais como tremores de terra e vulcões no Serviço Meteorológico Nacional. Aí ingressou em 1956 e concluído o Estágio, passou a integrar aquele Serviço em 1957.
Como alguém pensou que o Jorge precisava de mudar de ares, teve de seguir até Luanda com a incumbência de aí instalar uma estação sismográfica. Todavia não se deu muito bem com aquelas paragens, pelo que regressou a Lisboa em 1959, continuando a integrar o Serviço Meteorológico Nacional até 1965.
Em 1966 ingressou no Centro de Cálculo Científico do Instituto Gulbenkian de Ciência, no qual trabalhou até Abril de 1986, data em que passou à situação de pré-reforma, por extinção daquele Centro.
Este é o esboço resumido do currículo profissional, não oficial e não autorizado pelo Jorge. Todavia, há outro Jorge mais conhecido de todos nós. O Jorge multifacetado, integral, divergente e Cidadão do Mundo com uma alma do tamanho do raio de curvatura do universo elevado a infinito. E é desse Jorge que passo de imediato a falar.
Em 1946, durante umas férias em Sintra, ficou apaixonado por aquele contexto romântico que já fascinara Lord Byron e D. Fernando de Sax Goburgo Gota, real esposo de sua Majestade Sereníssima a Senhora D. Maria II, grande coleccionador, protector das artes, designer dos primeiro selos portugueses emitidos em 1853 com a efígie de sua Augusta Esposa e um dos homens mais cultos da sua época.
Pois o Jorge, depois de ter ficado enamorado por Sintra, a que não será porventura estranho o facto de esta ser servida por comboios, já caloiro na Rua da Escola Politécnica, apeia-se um dia no Museu de Arte Contemporânea, em Lisboa, onde foi a uma visita guiada, organizada pela Associação de Estudantes. E então mais encantado ficou, desta feita pelas Artes Plásticas, muito em especial pela Pintura.
Mas o Jorge não ficaria por aqui, pois o seu ADN tornara-o terreno fértil para muitas outras coisas. Um dia, uma colega emprestou-lhe um livro de Camilo Castelo Branco, o nosso grande romancista de S. Miguel de Seide. Pois o Jorge tornou-se camiliano e passou a devorar a prosa primeiro e a poesia depois, à velocidade da luz, sendo mais fácil alimentar um burro a pão-de-ló, que arranjar livros que o deixassem saciado. Daí que ele fosse possuidor duma Senhora Biblioteca. Além, de camiliano, era queirosiano, fialhiano e muitas coisas mais.
Anteriormente, o pai Branco Sénior, enfiara-lhe nos pés, um par de patins, o que embora não chegasse para o pôr a jogar na equipa do Paço de Arcos, lhe despertou o real interesse pela patinagem artística. E com piruetas, curvas e contracurvas, lá se sentiu atraído pelo Bailado primeiro e pela Música depois, artes que igualmente o seduziram e lhe deixaram marcas. Mas o Jorge era terreno fértil para muitas sementes, daí que tivesse uma costela de espeleólogo, bem como de ecologista e naturista. Contudo, uma boa parte das costelas do Jorge eram costelas de coleccionador. Falo desta parte da sua anatomia cultural, porque a conheço bem: selos, postais, livros, mas sobretudo, tudo o que tivesse a ver com comboios.
Em 1980, no pino do Verão, o Jorge veio dar uma volta pelas terras de Aquém Tejo. Foi então que o apaixonado por Sintra se decidiu por outra paixão, o Alentejo. E a partir dai, o Jorge passou a ter dois amores, Sintra e o Alentejo e, não se sabia de qual gostava mais. O que é verdade é que o Jorge assentou arraiais no Alentejo e em particular em Estremoz, o que foi para nós uma grande honra, já que o Jorge era um Cidadão do Mundo, como são todos os Homens com a sua largueza e fineza de espírito, com a sua grandeza de alma, com a firmeza do seu carácter, com a fidelidade da sua amizade. Por isso o Jorge era há muito património nosso, como o azul límpido do céu, as claridades do sul, o ondular duma seara, as migas, o vinho tinto, a arte pastoril, o cancioneiro popular ou os Bonecos de Estremoz.
O Jorge além de escritor e conferencista, colaborou na imprensa local e após algumas experiências com óleo, aguarela, tinta-da-china e gravura, participou em exposições de desenho e pirogravura organizadas pelo Museu Municipal de Estremoz e pela Associação Filatélica Alentejana, à qual desde a primeira hora aderiu, foi dirigente e ajudou a dar corpo e alma, com a sua maneira própria de ser, estar e fazer.
Obrigado Jorge pela qualidade da tua intervenção cultural e cívica, multifacetada e pluridisciplinar e sobretudo pelo privilégio da tua amizade e esse é um dos bens maiores entre todos os bens que temos.
O Jorge, amigo de peito e do coração, partiu mas ocupará sempre um lugar muito especial nos nossos corações.

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