Fig. 2
terça-feira, 23 de janeiro de 2024
Uma jóia da História Postal de Estremoz
quinta-feira, 18 de janeiro de 2024
Entrevista sobre o 25 de Abril, concedida ao jornal E, de Estremoz
Hernâni Matos: “Foi assim até ao fim do dia, sempre com a sensação de até respirar melhor”
No ano em que se cumprem 50 anos sobre o 25 de Abril de 1974, o E’ associa-se às comemorações desta que é uma data tão importante da história do país. As memórias da Revolução dos Cravos também são feitas das memórias individuais daqueles que viveram essa experiência única. Registamos hoje a voz de Hernâni Matos, numa primeira entrevista com que assinalamos os 50 anos do 25 de Abril.
Quais as memórias mais fortes que tem do Estado Novo?
A NÍVEL
DE INFÂNCIA: - O aglomerado de pobres a pedir esmola à porta da Igreja de São
Francisco, à saída da missa de domingo; - Os pobres que nas segundas-feiras
percorriam os estabelecimentos comerciais a pedir esmola; - A constatação de que havia crianças que iam descalças
para a escola, porque os pais não tinham dinheiro para lhes comprar sapatos; -
A existência de um ensino repressivo que a nível da instrução primária permitia
que um professor desse reguadas nas mãos, canadas na cabeça ou puxões de
orelhas numa criança, só porque estava desatenta, era irrequieta ou porque não
sabia a lição; A NÍVEL DE JUVENTUDE: - Um indigente que nos anos 50 foi a
enterrar para o cemitério de Estremoz, transportado na carroça do lixo; - O
ambiente carregado das cerimónias do 10 de Junho em Lisboa, onde as mulheres e
as mães dos mortos em combate na Guerra Colonial iam receber condecorações a
título póstumo. DE ÂMBITO PESSOAL: - O aviso telefónico que foi feito ao meu
pai em 1958, no dia das eleições para a Presidência da República, para não se
dirigir para a assembleia de voto de S. Lourenço, na qualidade de delegado da
candidatura do General Humberto Delgado, uma vez que estava lá a PIDE para o
prender; - Uma carga da PIDE em 1968, na qual me vi envolvido, após a proibição
da exibição do filme Marcha sobre Washington e um debate subordinado ao tema Quem matou Martin Luther King?, na Paróquia de Santa Isabel, em Lisboa; - A proximidade
diária de gorilas, que eram ex-militares
das tropas especiais (comandos ou pára-quedistas), contratados como polícias
internos das faculdades e cuja função era identificar, vigiar, perseguir,
impedir ajuntamentos e espancar estudantes; - O cuidado e as precauções que
tinha com aquilo que dizia, ao falar publicamente com alguém, não se fosse dar
o caso de haver bufos (informadores) na
vizinhança, que me fossem denunciar à polícia política, a PIDE/DGS; - O meu
ingresso na carreira docente em 1972, o qual envolveu a chamada ao gabinete do
Chefe da Secretaria da Escola, onde tive que jurar e de subscrever com a minha
assinatura, a declaração formal exigida pelo famigerado Decreto-lei 27003, de
14 de Setembro de 1936 e cujo teor era o seguinte: “Declaro
por minha honra que estou integrado na ordem social estabelecida pela
Constituição Política de 1933, com activo repúdio do comunismo e de todas as
ideias subversivas.” Lá tive que mentir, pois embora não fosse
comunista era democrata, o que correspondia a perfilhar ideias subversivas no
Estado Novo, regime de partido único: a UN - União
Nacional.
Esteve
na Universidade ainda nos tempos da ditadura? Sentiu ou viveu a luta
estudantil? Tinha, ao tempo, alguma intervenção ou acção política?
Ingressei
na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa em 1965, pelo que não me vi
já envolvido na Crise Académica de 1962, mas não escaparia à Crise Académica de
1969. Era um jovem de espírito aberto, generoso e humanista, ávido de
liberdades civis que me eram negadas pelo regime, o que me levava a questionar
o sistema e a resistir. Foi assim que ingressei naturalmente no Movimento Associativo da Faculdade de Ciências de Lisboa,
o qual contestava o autoritarismo do Estado Novo e reivindicava direitos civis.
Lutávamos pela liberdade de expressão e de associação, pela autonomia
universitária e a democratização do ensino, pelo fim da repressão e da guerra
colonial. Como activista de base do Movimento Associativo da FCUL, integrei a IMPROP – Secção de Imprensa e Propaganda,
participei nalgumas RIA – Reunião Inter-Associações,
greves às aulas e ocupações da Cantina da Faculdade. Fui uma entre muitas
outras formiguinhas que anonimamente e em contexto universitário, deram o seu modesto,
mas indispensável contributo a nível civil para que no dia 25 de Abril de 1974
pudesse ocorrer uma mudança de paradigma.
Nas
eleições legislativas de 1969, na qualidade de activista da CDE – Comissão Democrática Eleitoral, fui delegado
da candidatura desta Comissão junto de uma das mesas da assembleia de voto que
funcionou na Faculdade de Ciências de Lisboa. As eleições viriam a ser ganhas
pela UN - União Nacional, liderada por
Marcelo Caetano. Era um desfecho previsível, já que a campanha e o acto
eleitoral ficaram assinalados, pela fraude, pela perseguição e intimidação da
Oposição.
Sentiu,
na altura que a ditadura tinha os dias contados?
Apesar da
repressão que há muito se vinha abatendo e intensificando sobre as lutas
operárias, camponesas, estudantis e dos trabalhadores de serviços, estas também
se vinham intensificando. Por outro lado, o Levantamento
Militar das Caldas da Rainha de 16 de
Março de 1974, apesar de gorado, deu a sensação de que era o prenúncio de uma
futura insurreição militar vitoriosa. Parece que havia um “cheirinho no ar” a
indiciar que tal viria a acontecer. De facto, lá diz o rifão “Agua mole em pedra dura, tanto dá até que fura” e
foi assim que os militares aperfeiçoaram o plano e a organização de um novo
levantamento, com a devida articulação entre as unidades envolvidas. À segunda
foi de vez. Em 25 de Abril de 1974, os militares não falharam. Bem hajam por isso!
Onde estava no dia 25 de Abril de 1974? Como soube da Revolução? Lembra-se do que fez nesse dia?
Estava adoentado e encontrava-me em casa. Só ao final da manhã tive conhecimento do que se passara em Lisboa e da participação do RC3. Saí imediatamente para a rua, ávido de notícias. A maioria das pessoas estava eufórica. Todavia também encontrei pessoas apreensivas, com temor daquilo que poderia vir a acontecer. Eu também fiquei eufórico e sempre que me cruzava com alguém com quem tinha mais confiança, lá proferia um “Porra! Até que enfim!”, invariavelmente acompanhado dum aperto de mão ou um abraço ou ainda uma pancada nas costas. O “V” da vitória e o punho erguido só surgiriam mais tarde. E foi assim até ao fim do dia, sempre com a sensação de até respirar melhor. Eram os ares da liberdade que nos tinha sido restituída pelo Movimento dos Capitães. Como reconhecimento e sinal de gratidão, nasceu-nos espontaneamente nos lábios, a palavra de ordem “O povo está com o MFA!” e assim seria durante muito tempo.
Olhando
para trás, que avaliação faz do processo de transição da ditadura para a
democracia que tivemos em Portugal?
A
avaliação dessa transição, obriga-me a falar dos responsáveis por essa
transição: as Forças Armadas Portuguesas.
O derrube da ditadura mais velha da Europa – o
regime de Salazar e de Caetano - foi conseguido em 25 de Abril de 1974, graças
à acção militar coordenada do MFA - Movimento das
Forças Armadas, cuja origem remonta ao clima de instabilidade no
interior das próprias Forças Armadas, particularmente do Exército,
instabilidade essa que se manifestou em meados de 1973, com o surgimento do
denominado Movimento dos Capitães, o qual
aglutinava oficiais de média patente, insatisfeitos com as suas remunerações e
com a perda de prestígio da oficialidade do quadro permanente, bem como com a
Guerra Colonial que, desde 1961, ou seja, há 13 anos, se arrastava em 3
frentes, sem se antever uma solução política para a mesma, bem como pela
previsibilidade de uma derrota militar iminente.
No seu poema “As portas
que Abril abriu!”, o saudoso poeta José Carlos Ary dos Santos,
diz-nos quem fez o 25 de Abril de 1974: “Quem o fez
era soldado /homem novo Capitão /mas também tinha a seu lado /muitos homens na
prisão.” E mais adiante: “Foi então que
Abril abriu / as portas da claridade /e a nossa gente invadiu / a sua própria
cidade.”
A chamada Revolução dos
cravos desencadeada pelo MFA, teve o apoio massivo da população e o regime foi
derrubado praticamente sem derramamento de sangue. A transição pacífica de
Portugal de uma ditadura para uma democracia teve repercussões a nível
internacional, pois foi vista como um exemplo positivo, influenciando assim
sucessivos processos de democratização que se desenvolveram por esse mundo
fora.
Que
impacto teve a Revolução dos Cravos na sua vida?
Em 1º
lugar senti uma grande alegria por sentir que tinham sido quebrados os grilhões
que me aprisionavam e que impediam de me sentir um cidadão de corpo inteiro. Em
2º lugar tive a percepção de que era imperativo que o movimento revolucionário
do 25 de Abril nos permitisse usufruir de direitos e liberdades que até então
nos tinham sido negadas, para o que haveria decerto que lutar, tal como veio a
acontecer. Em 3º lugar, intuí que o usufruto desses direitos e liberdades,
teria que ser temperado através da assunção de deveres que regulassem o
exercício da cidadania.
Um pouco
por toda a parte, assumimos o direito à liberdade, à informação e à greve.
Arrogámos o direito de reunião, de manifestação, de participação na vida
pública e de voto. Reclamámos e conquistámos entre outras, múltiplas formas de
liberdade: de expressão e informação, de imprensa, de criação cultural, de
aprender e ensinar, de associação, sindical, que mais tarde viriam a ser
consignadas na Constituição da República Portuguesa.
O 25 de
Abril não me trouxe só alegria pelos motivos apontados, mas também por
melhorias nas condições de vida dos portugueses que então ocorreram: aumento
dos rendimentos, das oportunidades de aprendizagem, da liberdade e dos direitos
das mulheres, bem como melhoria do acesso aos cuidados de saúde e uma mudança
de valores que tornaram a sociedade mais aberta, o que teve reflexos a nível da
cultura (literatura, artes plásticas, música, teatro, cinema, televisão).
Como
foi para si o período que se seguiu à Revolução?
O período
pós-25 de Abril, conhecido por PREC - Processo
Revolucionário em Curso foi marcado
por lutas por melhores de condições de vida de operários, assalariados
agrícolas e trabalhadores de serviços, assim como de moradores pelo direito à
habitação. Foi um período em que ocorreram nacionalizações, inúmeras
manifestações, assim como ocupações de fábricas, herdades e casas. Tratou-se de
uma época de grande agitação social, política e militar, caracterizada por
intensos debates de âmbito político, económico, social e cultural, bem como
confrontos militares entre sectores das Forças Armadas com visões distintas de
modelos de sociedade a seguir. Os maiores desses confrontos ocorreram a 11 de
Março e a 25 de Novembro de 1975. Nesse período há a assinalar a existência de
6 Governos Provisórios até à constituição do 1º Governo Constitucional liderado
por Mário Soares (PS), com base nos resultados das eleições de 25 de Abril de
1976, realizadas após a aprovação da Constituição da República Portuguesa, a 2
do mesmo mês. É com a constituição do 1º Governo Constitucional que se completa
a devolução do poder pelos militares aos representantes da sociedade civil,
legitimados pelo sufrágio, conforme estava previsto no Programa do MFA
Teve,
nessa altura, alguma militância ou intervenção política?
Logo a
seguir ao 25 de Abril e em termos cívicos integrei comissões had hoc que iam
surgindo, fruto da dinâmica social que se ia gerando: Comissão de vigilância de preços, Comissão de moradores da
zona centro, Comissão coordenadora das comissões de moradores, Comissão
pró-construção do parque infantil, Comissão Cultural de Estremoz, Comissão de
Base de Saúde. A nível sindical fui delegado sindical dos
professores na Escola Secundária de Estremoz.
A nível
político, desde 1969 e ainda estudante universitário em Lisboa, que me
identificava com a CDE - Comissão Democrática
Eleitoral, liderada por Francisco Pereira de Moura, pelo que após o
25 de Abril passei a frequentar a sede desde Movimento em Estremoz,
participando aí nos debates internos e nas dinâmicas então em curso. Fui um
entre muitos outros. Por ali passaram activistas que mais tarde se iriam
integrar em partidos: PCP, UDP, MES, PS e PSD. Quando em 1975 a CDE se
transformou em MDP/CDE – Movimento Democrático Português
/ Comissão Democrática Eleitoral e se
registou como partido, eu não me filiei, uma vez que me já me filiara no PCP – Partido Comunista Português, ainda em 1974,
se bem me lembro por influência do meu grande amigo, Aníbal Falcato Alves.
Acontece que a certa altura tive consciência de que não reunia condições
pessoais para ser militante daquele partido, cujo passado de luta e de resistência
me merecia o maior respeito, pelo que saí nos primeiros meses de 1975. Passei
então à condição de independente, condição que mantive até integrar a UDP – União Democrática Popular em meados de 1975, desta feita por influência do meu
colega e amigo, Albano Martins. Deste partido fui militante enquanto a
estrutura organizativa local esteve activa. Em 1993 e a convite do futuro
Presidente da Câmara Municipal de Estremoz, o independente e meu amigo José
Dias Sena, integrei como independente as listas da CDU
– Coligação Democrática Unitária, sendo eleito como deputado
municipal, cargo que desempenhei empenhada e activamente durante 3 mandatos,
até que senti que era chegada a altura de passar o testemunho, para ter uma
maior disponibilidade de intervenção na frente cultural, a qual desde sempre
foi e continua a ser a minha grande motivação.
E que
avaliação faz da democracia que temos na actualidade?
A
democracia portuguesa é uma democracia estável cuja arquitectura tem por base a
Constituição da República Portuguesa, lei suprema do país, aprovada em 1976 e
revista 7 vezes desde então. Os órgãos de soberania são eleitos, existindo
separação e interdependência dos seus poderes. Formalmente está tudo bem. Na
prática não é bem assim.
Qual o
estado da democracia em Portugal?
A
democracia portuguesa sofre de problemas graves que urge resolver em múltiplos
domínios: social, económico, financeiro, etc. Deles destaco: elevada abstenção
nos actos eleitorais, corrupção, demora na aplicação da Justiça, desemprego,
trabalho precário, fraca qualificação da mão de obra, baixa produtividade,
salários e pensões muito baixos, falta de oferta pública de habitação,
especulação imobiliária, elevada emigração jovem, baixa taxa de natalidade,
envelhecimento da população, insuficiência de cuidados dignos na velhice,
Serviço Nacional de Saúde com enormes carências, problemas graves a nível da
Educação e do Ensino, falta de coesão social e territorial. Estes são os
principais problemas que de uma forma ou de outra, atormentam diariamente a
esmagadora maioria das pessoas.
50 anos
depois do 25 de Abril, apesar da melhoria das condições de vida dos
portugueses, ainda se nos deparam desafios a enfrentar para que possa ser
assegurada a igualdade de género e a justiça social. Em democracia, isto só se
consegues através do aperfeiçoamento da própria democracia. É uma tarefa e um repto
que estão em aberto e que exigem o maior empenhamento de todos os cidadãos.
Hernâni Matos
Temporada Tauromáquica de 1886 (Setembro a Dezembro)
Temporada Tauromáquica de 1886
(Meses de Setembro a Dezembro)
Luís Brito da Luz
Iniciou-se o mês de Setembro com uma corrida
noctuma, que esteve quase cheia, em Lisboa, no Campo de Sant'Anna, a qual estava agendada
para o mês de Agosto no dia 26 e foi primeiramente transferida para o dia 2 em virtude do espada Guerrita e seus bandarilheiros irem tourear a Cáceres só podendo estar em Lisboa nesse dia. Acabou esta corrida por ser antecipada
para o dia 1 em consequência do espada
e sua quadrilha irem tourear a Aranjuez no sábado dia quatro. Sendo considerado por muitos entendedores o melhor bandarilheiro á altura, foi propositadamente o empresário
António da Costa Guerra a Cáceres para fechar contrato com
esta primeira figura. O curro escolhido e apartado de há muito era pertença
de D. Marcos de Noronha
(Vagos). Guerrita, rapaz elegante
bem-parecido , mostrou que os elogios nos jornais espanhóis
eram mais que justos , sendo extraordinário no trabalho de capa e muleta que demostrou no décimo touro que lhe coube picar a sós, tendo-o enfeitado primeiro
com alguns pares de
bandarilhas postas com toda a perícia, mostrando ser um artista consumado nos passes de muleta e de capote.
A maneira elegante
como se colocava na frente do touro e o garbo como tirou quatro passes de peito valeram-lhe a maior das ovações
que ultimamente tinha havido naquela
praça. O sétimo touro também lhe pertenceu
quebrando a espinha
quando saltava á trincheira falsa sendo
arrastado para dentro quase morto. O cavaleiro José Bento de Araújo
picou bem, embora por vezes fosse um pouco precipitado. O outro cavaleiro Manuel Mourisca Júnior picou
o primeiro touro da lide com bastante mestria não sendo tão feliz no touro que lhe coube na segunda parte.
Torerito, Manene e Molina bandarilheiros da quadrilha de Guerrita trabalharam com bas tante distinção. Roberto
Peixinho e Minuto
bandarilharam bem e com correcção. Chamada de atenção para o divertimento dos chapéus na praça, demonstração de agrado que devia ser refreada pois era altamente
cansativa para os artistas e maçadora para os espectadores por dar lugar a um intervalo imenso. A direcção
da corrida esteve muito longe de ser boa porque o inteligente, andando a reboque da voz do público, muitas vezes não percebeu
os touros mandando-os recolher quando os artistas os estavam a aproveitar no trabalho
de capote.
Dia 5 no Campo de Sant'Anna
teve lugar a festa artística, benefício do banda rilheiro João Calabaça, toureiro arrojado
e diligente, e de Joaquim
Gaiato. Treze touros, todos puros, da
afamada raça de gado bravo de A. Luiz da Veiga e, á altura, pertencentes a Manuel da Silva Victorino , os quais cumpriram. O cavaleiro José Bento de Araújo foi arrojado
como sempre. O distinto
cavaleiro amador D. Luiz do Rego picou um touro mantendo os seus créditos.
Dos bandarilheiros portugueses só Peixinho esteve muito bem e a par de El Minuto.
O novel toureiro Silvestre Calabaça, filho do beneficiado , lidou um touro mostrando disposição para o tou reio. O beneficiado
fez uma brilhantíssima figura mantendo
os seus créditos de bom artista.
No geral, foi uma boa corrida.
Em Montemor-o-Novo , por ocasião da grande feira anual, nos dias 5 e 6 pelas quatro horas da tarde estavam anunciadas duas corridas de dez touros cada uma, das acreditadas manadas
dos herdeiros do Conde de Atalaia. Tomaram
parte os cavaleiros amadores D. António
de Portugal e Castro, Joaquim
Fiuza Guião e Aires Saturnino assim como o insigne espada espanhol Vicente
Mendes, El Pescadero
e os bandarilheiros João do Rio Sancho,
J. Maria da Costa, J. dos Santos, A. Gonçalves e A. Xavier Delgado.
Na segunda corrida,
tomou parte Filipe
Aragon, El Minuto. Finalmente um grupo de homens de forcado, dos campos de Montemor, fizeram lindas e valentes pegas.
Voltando ao Campo de Sant'Anna,
agora no dia 9, aconteceu
uma corrida nocturna,
que devia ter sido realizada
a vinte e nove do mês de Agosto,
de treze bons touros, oito deles para pé e pertencentes a Paulino da Cunha e Silva, descendentes da afamada raça de gado bravo de Rafael José da
Cunha e os restantes, para cavalo,
de extraordinária bravura
pertencentes a Emílio Infante da Câmara, Carlos
Marques, Jacinto Freire e Roberto & Irmão que os ofereceram, alguns célebres pela sua
ferocidade como o Foguete, o Desertor e o Carvoeiro. Os cavaleiros foram António Maria Monteiro que diligenciou agradar
e José Bento de Araújo que lidou um dos touros a pé, bandarilhando e trasteando á muleta, tal como já tinha executado
no dia vinte e dois de Agosto
em Vila Franca, trajando o elegante costume
andaluz. Terminou a fazer uma excelente pega de costas por se ver perseguido pelo touro, sendo muito ovacionado. Dos bandarilheiros portugueses Calabaça
e José da Costa obtiveram aplausos assim como os espanhóis Pescadero
e Minuto. Houve uma lide a ferros de palmo por Minuto e Calabaça.
A praça estava iluminada com três mil luzes, cujo ensaio de iluminação ocorreu
dia sete.
No domingo dia 12 de Setembro, estava
anunciado um torneio
tauromáquico promovido por uma comissão de aficionados em beneficio de uma família desvalida na praça de touros do Campo de Sant'Anna em Lisboa. Os touros em número de treze, todos puros,
eram pertencentes a D. Marcos
da Silva Noronha (Vagos), iguais aos que foram corridos
na última nocturna
do dia um de Setembro. Reapareceu o afamado
J. M. Casimiro Monteiro que estava há muito afastado
desta primeira arena.
Também a afamada
e notável matadora
de touros, que tinha obtido calorosos aplausos
nas praças de Sevilha, Cádis e Jerez,
considerada em toda a Espanha a non plus ultra da arte e do arrojo, a sra. D. Carmen Lucena, La Garbancesa
e sua quadrilha (dois bandarilheiros) marcaram presença no cartaz.
Anunciados estavam também os nossos melhores bandarilheiros.
Projectava o deputado
Jaime da Costa Pinto dar na praça de
Almada uma tourada cuja receita
seria em favor das obras da igreja
desta vila convidando para o efeito o cavaleiro
José Bento de Araújo a participar no evento.
Na vila
da Moita do Ribatejo,
por ocasião das festas em honra de Nossa Senhora da Boa Viagem, tiveram lugar duas corridas
nos dias 13 e 14. Os vinte e dois touros puros apresentados eram pertença de dois lavradores
de Benavente que, pela primeira
vez alugaram para esta praça, sendo doze para a primeira corrida
de João Vicente de Almeida
e os outros dez para a corrida do dia catorze de João Sabino Fernandes. Tomaram parte nestas corridas o cavaleiro José Maria Casimiro
Monteiro e os bandarilheiros Robertos, João Calabaça, José Maria da Costa e Augusto
Monteiro. O gado só entrou
na praça depois da chegada
do comboio da manhã. Os bilhetes estiveram
á venda na loja do sr. José Maria da Purificação Gaspar, na vila da Moita. Os preços
dos comboios de ida e volta (Lisboa-Setúbal) tinham preços
reduzidos no valor de trezentos
réis.
Organizada pelo antigo
aficionado, nesta altura empresário, António da Costa Guerra, teve lugar no dia 19 em Lisboa, na praça do Campo
de Sant'Anna uma corrida de doze touros bravos e de boa estampa comprados
a D. Caetano de Bragança
(Lafões), alguns dos quais muito saltadores que prejudicaram bastante
o trabalho dos artistas. Os cavaleiros da corrida foram
Manuel Mourisca Júnior e José Bento de Araújo que toureou com o costumado
arranjo, mostrando o primeiro ser o cavaleiro
correcto que se conhecia aproveitando os touros que lhe couberam e
sabendo vencer o seu soberbo
cavalo de combate
que pretendia negar-se, e que diligenciou em grandes upas deitar fora da sela o cavaleiro. O distinto matador Punteret bandarilhou com arte o sétimo touro acabando por passa-lo de muleta com tanto
garbo e destreza que obteve uma ovação. El Minuto e Calabaça
foram muito aplaudidos.
Pescadero esteve infeliz, não fazendo nada com as bandarilhas , apanhando um grande boléu por ter sido colhido
em cheio no quinto touro. Estavam anunciados
também Vicente Roberto e
Roberto da Fonseca assim como seu sobrinho João Roberto, os quais não tivemos
notícias da sua actuação. A praça apresentou
a grandiosa decoração
que tinha na corrida por amadores que se verificou
por ocasião do casamento
de Suas Altezas Reais o Príncipe D. Carlos e a Rainha D. Amélia.
Também no dia 19 estava anunciada para a praça de touros
de Torres Novas uma
corrida de dez vacas bravas pertencentes a Viúva Sirgado
& Filhos. Noticiados
estavam também o cavaleiro amador Victor Carlos
Martins acompanhado por um simpático grupo de conhecidos
artistas. A corrida compunha-se por dois chistosos
intervalos pelo Pae Paulino & Companhia.
Para as tardes de 21 e 22 de Setembro, durante as festas do Senhor da Piedade, em Elvas preparavam-se duas corridas de touros tendo sido a praça tomada
de arrendamento pelo sr. Lobão Rasquilha.
Para dia 26 anunciou-se para o Cartaxo uma corrida de touros pertencentes aos lavradores e criadores Irmãos Robertos com o cavaleiro
José Bento de Araújo, e os bandarilheiros Vicente Roberto, Roberto da Fonseca, João Roberto, José dos Santos e António
Augusto. Os camarotes
estiveram à venda no estabelecimento do sr. Joaquim Mendonça.
Também no mesmo dia em Almada teve lugar uma corrida com doze touros de José Maria dos Santos para os cavaleiros D. António de Portugal que foi substituído por Alfredo Tinoco, Joaquim Fiuza Guião e José Gabriel
Holbeche Júnior que penso ser a corrida projectada pelo deputado Jaime da Costa Pinto anunciada no periódico a 12 de Setembro. Os touros não se prestaram
ao torneio tendo farpeado Tinoco
o primeiro e o sétimo touro da corrida, este último a ferros curtos, tendo-os aproveitado bem. A Guião coube-lhe o terceiro e o nono procurando-os
com muito sangue frio metendo
alguns ferros com arte. Já Gabriel Holbeche
farpeou bem o quinto e foi muito feliz no décimo primeiro.
Todos os três cavaleiros foram ovacionados e brindados com pastilhas, ramos de flores e coroas com fitas de seda. Quanto aos bandarilheiros trabalharam bem João Calabaça e Sancho que
bandarilharam o segundo
da tarde. O quarto coube a José da Costa
e João Laureano e o sexto outra vez a João Calabaça agora
a par com Augusto Monteiro. Sancho, Costa e Silvestre
bandarilham o oitavo
e João Laureano e Neves o décimo. Fecharam João Calabaça, Sancho e Silvestre
o décimo segundo. O festejado
Sol e dó da Sobreda
tocou muito bem alguns trechos de
música e a filarmónica Incrível Almadense executou muito bem ao intervalo
uma peça de música muito aplaudida. Corrida
que gerou muita celeuma empregando os progressistas de Almada todos os meios lícitos e ilícitos para que esta festa de caridade não de realizasse. Após esgotadas todas as desculpas desde a pouca solidez da praça até à pouca competência dos cavaleiros, lembraram-se de empalmar a música que estava comprometida a tocar durante o evento.
Para intentá-lo vieram a Lisboa pedir um vapor que ficasse à disposição destes almadenses progressistas para irem esperar El-Rei. A ideia era desviar a música da corrida obrigando
a banda a ir tocar a bordo, gorando-se
as expectativas com a recusa da filarmónica Almadense. Não foram enviados polícias
para a praça e exigiram
do administrador que o regedor
substituto presidisse à corrida. O Dr. Juzarte,
administrador do concelho,
para obedecer às exigências dos mandões teve de sujeitar-se ao triste papel
de ver a corrida da trincheira. E para não haver dúvidas de que toda a guerra partiu destes falsos progressistas, pois os verdadeiros estavam indignados, de conveniência e com o consentimento das autoridades mandaram
distribuir um manifesto
insensato contra o deputado Costa Pinto.
Igualmente a 26 estava uma corrida de touros anunciada para Setúbal em beneficio
dos corpos da Associação Setubalense das Classes Laboriosas e da Associação dos Bombeiros Voluntários
da cidade. O gado foi cedido por José Maria
dos Santos a quem tanto a cidade
deve. Foi cavaleiro
Manuel Mourisca e bandarilheiros Minuto, Pescadero, Calabaça
entre outros.
A nocturna no Campo de Sant'Anna que estava anunciada
para 23 de Setembro foi transferida, por causa do mau tempo, para dia 2 de Outubro com doze touros do lavrador
D. Marcos da Silva de Noronha (Vagos)
iguais aos que tanto entusiasmo causaram na nocturna de um de Setembro. O campino
Joaquim Estalagem, conhecido
em todo o Ribatejo e criado deste notável
lavrador, farpeou um touro a cavalo. Os cavaleiros
foram António Monteiro e José Bento que foi substituído por Mourisca. Bandarilharam Roberto, João Roberto,
João Calabaça e os
espanhóis Pescadero Minuto e Silverio.
Nos dias 3 e 4 em Vila Franca, por ocasião da grande feira anual, anunciaram-se duas corridas de touros.
A 5 de Outubro anuncia-se pela última vez na praça de touros em Belém, as touradas burlescas
aos domingos, segundas,
quintas e sábados.
A 17 de Outubro teve lugar em Setúbal uma corrida de touros em beneficio do conhecido bandarilheiro Ajú. Esta corrida deveria ter sido realizada no dia 10, mas o curro de touros puros, apartados
a capricho para esta corrida,
pertencentes ao lavrador J. Costa Freire, apesar
de vir acompanhado de bastantes criados,
tresmalhou-se na condução, impedindo a corrida
de se realizar naquele dia. Foi uma boa tourada
apesar de só se conseguirem trazer à praça sete touros. João Pedro realizou um salto à vara e uma sorte de gaiola magníficos, dois touros foram farpeados
a cavalo e trabalharam muito bem os bandarilheiros dos quais tomou parte Minuto. Houve intervalo
de pretos (toureiros
africanos) e anunciaram-se fantoches
diabólicos e outros
atractivos. No sexto
touro teve uma chamada entusiástica o lavrador, inteiramente justa , com os touros fugidos
há doze dias não seria fácil encontra-los mais bravos.
A última corrida
da época no Campo de Sant'Anna aconteceu
a 24 de Outubro com doze touros corpulentos e bravos de Carlos Marques
para o cavaleiro Manuel Mourisca e os melhores bandarilheiros portugueses ,
tais como Roberto, Peixinho entre outros. Também actuou
o espanhol Minuto, que se despediu nessa tarde partindo depois para Montevideu assim como o insigne espada Rafael Guerra
(Guerrita) e seus destros bandarilheiros Juan Molina e Manuel Roiz (El Manene), artistas de apreço, os quais actuaram pela primeira vez na noctuma
do dia um de Setembro.
Só dois touros falharam, um para o cavaleiro
e outro para a lide a pé. O primeiro cavaleiro tauromáquico português, à altura, esteve correcto
com um touro mau e
o seu cavalo russo a intimidar-se com ele, negando-se à lide. Pena foi a ignorância de alguns espectadores, castigados severamente pelo público com uma apupada
que não perceberam que outro qualquer
cavaleiro nas mesmas
condições não fazia sequer metade do que Mourisca fez. Guerrita
esteve primoroso com o capote
e com a muleta alcançando uma grande ovação.
Lamentando os espadas
espanhóis de executarem
o trabalho dos bandarilheiros , sabendo apenas quando aqui chegavam
que tinham de bandarilhar e em condições muito piores que em Espanha, obrigados a fazer um trabalho
forçado, desvantajoso para o artista e para o público, pedia-se que trabalhassem mais de capote e muleta e não fossem obrigados a bandarilhar. Roberto da Fonseca esteve esplêndido, Minuto, Peixinho e Rafael distinguiram-se. José da Costa colocou muito bem dois pares de ferros. Uma salva ao empresário
Guerra que sobrepôs a qualquer
interesse mesquinho o interesse da arte. Boa tourada com casa bem composta.
A última notícia
da época dizia respeito a uma corrida
em Almada, marcada para o dia 19 de Dezembro e promovida por uma comissão
de ilustres almadenses, corrida essa que não chegou a realizar-se em virtude do gado se ter tresmalhado , chegando um dos touros
a descer até Cacilhas. O animal
próximo da cortina
do cais investiu com um catraeiro, o qual lhe furtou
o corpo, indo o bicho parar à água, tendo sido posteriormente laçado a muito custo e atado a uma carroça.
Agradecimentos
O autor agradece a minúcia e o detalhe manifestado na pronta ajuda de João Baptista Malta, seu primo e muito próximo , interessado e apaixonado aficionado tauromáquico.
BIBLIOGRAFIA
ALMEIDA, Jayme Duarte de - Enciclopédia Tauromáquica ilustrada. - Lisboa: Editorial Estampa, 1962.
ALMEIDA, Jayme Duarte de
- História da Tauromaquia técnica e evolução
artística do toureio. - Lisboa Artis Lda, 1951-1953. - 2 vol.
Publicações em série
DIARIO ILLUSTRADO / Fund. Pedro Correia da Silva. - Lisboa Impr. de Souza
Neves, 1872-1911 - Publicação diária referente
aos n.os 4 556, 1 de Janeiro
até 4 917, 31 de Dezembro
de 1886.