quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

Bonecos de Estremoz


Armando Alves. Pintor.
A existência dos Bonecos de Estremoz é conhecida há mais de trezentos anos e hoje são muitas as mãos de artistas populares que continuam a dar vida a estas figuras. A temática é, de uma maneira geral, baseada nas tarefas do dia a dia mas também em figuras religiosas, onde se destacam os presépios.
Foi por volta de 1945 que o escultor Sá Lemos, então director da Escola Industrial António Augusto Gonçalves, desafiou e incentivou a “Ti Ana das Peles” a trabalhar na recuperação de uma tradição adormecida que, a partir daí, se veio afirmando como uma actividade relevante na criação dos nossos artistas do barro, para o desenvolvimento do turismo local, para a economia da região, e para a afirmação do nome de Estremoz.
Muitos foram os artesãos que, depois da Ti Ana das Peles se foram afirmando e criando à sua maneira os Bonecos de Estremoz.
Sem querer ser injusto para ninguém quero referir apenas aqueles com quem tive mais proximidade. Desde logo, e porque ainda felizmente estão em actividade, “As Irmãs Flores”, a Maria Inácia Fonseca e a Perpétua Sousa Fonseca, que têm sabido dar continuidade ao que de melhor se tem feito para preservar o bom nome dos Bonecos de Estremoz sendo ainda de realçar o sentido pedagógico que manifestaram ao lançar nestes caminhos da arte do barro, o seu sobrinho Ricardo Fonseca, um jovem com talento que nos dá confiança para o futuro.
Antes tinha conhecido o José Moreira, ainda como empregado na Olaria Alfacinha, com quem privei bastante. Tinha no quintal uns tanques onde transformava a terra em barro para poder ser moldado e, depois de cozido, ser pintado pelas mãos sensíveis de sua mulher Josefina Augusta Ferreira.
Conheci ainda a Maria Luísa da Conceição que tinha uma forte ligação a esta actividade, muito influenciada pela família, tendo conseguido afirmar a sua marca pessoal no fabrico dos seus bonecos.
Por último, sendo o primeiro, o Mestre Mariano Alfacinha. Professor de olaria na Escola Industrial de Estremoz, que frequentei quando tinha treze anos e onde aprendi com ele a arte de trabalhar o barro. Estou a vê-lo com aquelas mãos grossas e sapudas, enormes e ao mesmo tempo delicadas, a mexer no barro e tratá-lo por tu porque o conhecia como ninguém. Foi com ele que aprendi também a fazer Bonecos de Estremoz. Não fiz muitos, talvez uma centena que vendia a vinte e cinco tostões na Papelaria Ruivo, da minha tia Joana Ruivo em Estremoz.
Ainda hoje guardo o último exemplar desses bonecos, “O Homem do Harmónio”, a quem um dia destes ouvi tocar uma modinha a propósito da proclamação dos Bonecos de Estremoz a Património Cultural Imaterial da Humanidade.
Armando Alves
Pintor
(Texto publicado no jornal E nº 190, de 28-12-2017)

Hernâni Matos

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