Pastor debaixo da árvore
(1948).
Mariano da Conceição
(1903-1959).
Museu Rural de Estremoz.
Em crónica anterior (18 – Pastor das migas)
referi-me a uma peça que mostra um pastor a comer debaixo de uma árvore.
Trata-se de uma imagem do figurado de Estremoz que já era produzida pelos
barristas locais no séc. XIX, como o documenta a existência de exemplares do
Museu Municipal de Estremoz, do Museu Nacional de Etnologia e do Museu de Arte
Popular, bem como em colecções particulares.
A bonequeira que confeccionou a figura que
ilustrava aquela crónica foi Sabina Santos, que em “Tabela de Preços dos
Bonecos de Estremoz”, mandada imprimir em 1976 pela Olaria Alfacinha, que comercializava
os seus bonecos, designa aquele modelo por “PASTOR A COMER”. Segundo as Irmãs
Flores, discípulas de Sabina Santos, de acordo com a concepção da Mestra,
trata-se de um pastor a comer migas conservadas num tarro de cortiça. Daí que
eu tenha utilizado a designação simplificadora “PASTOR DAS MIGAS”, denominação
reservada por Sabina Santos para a figura de pastor que está a confeccionar
migas.
A artesã Maria Luísa da Conceição, filha dos
barristas Mariano da Conceição e Liberdade da Conceição, disse-me que, primeiro
o pai e depois a mãe e ela própria, sempre designaram aquela figura por “PASTOR
DEBAIXO DA ÁRVORE”. Segundo a concepção de seu pai e por elas partilhada, a
imagem representa um pastor a comer grão conservado num tarro, argumentando que
nas peças homólogas por eles manufacturadas, a superfície irregular do conteúdo
do tarro simular grão e não migas, como no exemplar produzido por Sabina
Santos.
É legítimo concluir que “PASTOR A COMER” e “PASTOR
DEBAIXO DA ÁRVORE”, são uma e a mesma figura, à qual eu chamei “PASTOR DAS
MIGAS”. Trata-se de nomenclaturas diferentes usadas por pessoas distintas. Como
a barrística estremocense não é uma religião, nenhum dos nomes de baptismo
constitui sacrilégio. Lá diz o rifão “O seu, a seu dono”. Mariano deu-lhe um
nome e Sabina, que começou a trabalhar logo depois da morte do irmão, deu-lhe
outro. E daí não advém mal nenhum, pois nenhum deles foi criador duma peça executada
por barristas que os precederam desde o século XIX.
Quanto ao facto de o pastor de Mariano estar a
comer grão e o de Sabina estar a comer migas, é natural que assim seja, pois
como dissemos em crónica anterior (3 – Marcas de identidade), cada barrista tem
o seu próprio modo de observar o mundo que o cerca e de o interpretar, legando
traços de identidade pessoal nas peças que manufactura e que são marcas
indeléveis que permitem identificar o seu autor. Aqui fica o esclarecimento que
se impunha.
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