José Saramago a receber o Prémio Nobel entregue por Carlos Gustavo da Suécia.
Foto "FLT-PICA".
Segundo a Academia Sueca, responsável pela
atribuição do Prémio, Saramago recebe-o por uma obra "…cujas parábolas,
respaldadas por imaginação, piedade e ironia, nos permitem apreender de forma
contínua uma realidade ilusória.".
Sobre a atribuição do Nobel a Saramago muito foi
dito. Destacamos apenas: ”Por tudo quanto escreveu e como escreveu, a justiça
do Prémio Nobel a José Saramago é devida e justificada. Afora a regularidade da
sua produção, a maneira singular de transformar o comum em essencial, no que
tange ao mais profundo, dramático e impronunciável do ser humano; a provocadora
e instigante forma de repensar a história e de projectar o futuro, fazem-no
merecedor do Prémio - o primeiro concedido a um escritor de Língua Portuguesa.”
(Maria de Lourdes Simões, ensaio publicado em “A Tarde Cultural”. Salvador, 5
de Dezembro de 1998).
Antes de ter sido agraciado com o Prémio Nobel da
Literatura, José Saramago já ganhara em 1991 o Grande Prémio da Associação
Portuguesa de Escritores com o romance “O Evangelho Segundo Jesus Cristo” e em
1986, o Prémio Camões por toda a sua obra.
A obra de Saramago é vasta e diversificada,
distribuindo-se por múltiplos géneros literários: ROMANCES - Terra do Pecado
(1947), Manual de Pintura e Caligrafia (1977), Levantado do Chão (1980),
Memorial do Convento (1982), O Ano da Morte de Ricardo Reis (1984), A Jangada
de Pedra (1986), História do Cerco de Lisboa (1989), O Evangelho Segundo Jesus
Cristo (1991), Ensaio Sobre a Cegueira (1995), Todos os Nomes (1997), A Caverna
(2000), O Homem Duplicado (2002), Ensaio Sobre a Lucidez (2004), As
Intermitências da Morte (2005), A Viagem do Elefante (2008), Caim (2009),
Clarabóia (2011). POESIA – Os Poemas Possíveis (1966), Provavelmente Alegria
(1970), O Ano de 1993 (1975). VIAGENS – Viagem a Portugal (1983). PEÇAS
TEATRAIS – A Noite (1979), Que Farei com Este Livro? (1980), A Segunda Vida de
Francisco de Assis (1987), In Nomine Dei (1993), Don Giovanni ou O Dissoluto
Absolvido (2005). CONTOS – Objecto Quase (1978), Poética dos Cinco Sentidos - O
Ouvido (1979), O Conto da Ilha Desconhecida (1997). CRÓNICAS – Deste Mundo e do
Outro (1971), A Bagagem do Viajante (1973), As Opiniões que o DL Teve (1974),
Os Apontamentos (1977). LITERATURA INFANTIL - A Maior Flor do Mundo (2002).
DIÁRIO E MEMÓRIAS – Cadernos de Lanzarote (I-V) (1994), As Pequenas Memórias
(2006).
Sobre o estilo inconfundível de José Saramago
afirmaram: “José Saramago foi conhecido por utilizar um estilo oral, coevo dos
contos de tradição oral populares em que a vivacidade da comunicação é mais
importante do que a correcção ortográfica de uma linguagem escrita. Todas as
características de uma linguagem oral, predominantemente usada na oratória, na
dialéctica, na retórica e que servem sobremaneira o seu estilo interventivo e
persuasivo estão presentes. Assim, utiliza frases e períodos compridos, usando
a pontuação de uma maneira não convencional; os diálogos das personagens são
inseridos nos próprios parágrafos que os antecedem, de forma que não existem
travessões nos seus livros. Este tipo de marcação das falas propicia uma forte
sensação de fluxo de consciência, a ponto do leitor chegar a confundir-se se um
certo diálogo foi real ou apenas um pensamento. Muitas das suas frases (i.e.
orações) ocupam mais de uma página, usando vírgulas onde a maioria dos
escritores usaria pontos finais. Da mesma forma, muitos dos seus parágrafos
ocupariam capítulos inteiros de outros autores.” (Revista “Entre livros, nº 23.
Editora Duetto, São Paulo (2007), citada pela Wikipédia).
Passemos em revista algumas opiniões sobre as obras
essenciais de Saramago: LEVANTADO DO CHÃO - “A epopeia dos trabalhadores
alentejanos, a elucidação da reforma agrária, a narrativa dos casos, conhecidos
ou não, que fizeram do Alentejo um mar seco de carências, privações, torturas,
sangue e uma impossibilidade de viver.” (Alzira Seixo em "O Essencial
sobre Saramago.”. “Um comunista escrever sobre o Alentejo é tão óbvio com um
“tio” escrever sobre os gelados Santini. Saramago encontrou a sua voz neste
romance sobre trabalhadores rurais mas poderia ter escrito sobre operários da
Lisnave.” (Bruno Amaral – Crítico literário do diário “i”.). MEMORIAL DO
CONVENTO - “Certamente o mais celebrado, estudado e discutido dos romances de
Saramago” (Carlos Reis). “Um romance histórico inovador no contexto da
literatura mundial” (José Luís Peixoto no “JORNAL DE LETRAS”). “Não diga a
ninguém que nunca leu. Há um Baltazar, uma Blimunda e um Bartolomeu, um rei
megalómano com um interesse pouco cristão por freiras e um fascínio por
edifícios faraónicos e um tanto inúteis” (Bruno Amaral – Crítico literário do
diário “i”.). "O ANO DA MORTE DE RICARDO REIS" (1984) - “Cada vez
mais o meu romance preferido, do conjunto da obra saramaguiana” (Carlos Reis).
“Um labirinto construído sobre outro labirinto, a forma brilhante, brilhante
como a ficção se aproxima de um tempo real” (José Luís Peixoto no “JORNAL DE
LETRAS”). “Um romance onde Saramago elabora conjecturas fecundas para a
compreensão de uma época ou de uma figura” (Alzira Seixo). “Quatro anos antes do
centenário do nascimento de Fernando Pessoa, Saramago “matou” o heterónimo
Ricardo Reis, aquele rapaz que preferia ficar de mãos dadas com Lídia em vez de
trocar carícias” (Bruno Amaral – Crítico literário do diário “i”.).
"HISTÓRIA DO CERCO DE LISBOA" (1989) - “Um dos enredos mais bem
imaginados da literatura portuguesa” (José Luís Peixoto no “JORNAL DE LETRAS”).
"O EVANGELHO SEGUNDO JESUS CRISTO" (1991) - “O Evangelho segundo
Jesus Cristo contém uma história que todos conhecemos. E contém cenas e afirmações
que há alguns anos atrás teriam lançado o autor na fogueira, sem direito a
sepulcro. O escritor toma para si liberdades que são a substância da criação, e
comporta-se, na invenção do seu mundo, como Deus. Este é o evangelho segundo
Saramago...” (Clara Ferreira Alves, no “Expresso”). “Um Jesus Cristo humano,
demasiado humano, um diabo simpático e um Deus insuportável. Com este romance,
Saramago despertou a fúria dos católicos e ofereceu ao país um personagem
inesquecível: Sousa Lara.” (Bruno Amaral
– Crítico literário do diário “i”.). "ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA" (1995)
- “Quase em ritmo e registo de ficção científica, Ensaio sobre a Cegueira
mantém, na escrita de José Saramago e na sua aventura romanesca, uma dimensão
rara e singular na actual literatura portuguesa: a constante demanda de um laço
que prenda o romance à arte de questionar e que, daí, exija o lugar de uma
ética mais profunda que a própria arte de pensar. Como se o romance fosse, e
nunca tivesse deixado de ser, uma interrogação sobre o mundo como ele é e como
ele devia ser.” (Francisco José Viegas na “Visão”) “Ensaio sobre a Cegueira, de
alguma forma representou o início de uma nova fase na obra de Saramago. E,
decerto não por acaso, foi depois dele que se passou a falar ainda mais da
grande possibilidade de, com inteira justiça, lhe ser atribuído o Nobel.” (José
Carlos de Vasconcelos no “JORNAL DE LETRAS”). “A cegueira como metáfora e como
factor que desencadeia o mais primitivo e brutal que a Humanidade carrega. A
única personagem que resiste à epidemia é a mulher de um médico: a burguesia é
sempre privilegiada.” (Bruno Amaral –
Crítico literário do diário “i”.). AS INTERMITÊNCIAS DA MORTE - “São livros
como este que nos tocam fundo, nos desarmam e nos deixam sem resposta. Apenas
sabemos que na morte e no seu compromisso para com a humanidade reside o medo
atávico do desconhecido, do vazio, algures numa hora e num lugar dentro de
nós.” (Luísa Mellid-Franco no Expresso). POESIA COMPLETA – “Uma edição bilingue
saída em Espanha, essencial na sua obra. Quem a ler perceberá porquê.” (José
Manuel Mendes, da Associação Portuguesa de Escritores).
Sobre o conjunto da obra de Saramago também muito
foi escrito. Destacamos apenas algiumas opiniões:
“Com José Saramago a Língua Portuguesa jorrou de
potencialidades incomensuráveis, de rebeldia, de fascínio e emoção. A obra de
Saramago expulsa as certezas, questiona o país e o mundo na procura de quem
somos e porque estamos aqui. A obra de Saramago rejeita as verdades únicas,
desafia as fronteiras das convenções sociais e artísticas. Por tudo isto,
quando soou a hora da despedida, emergiram nas mãos dos leitores e leitoras
anónimas, os livros, as histórias, as personagens que ficam mais sós, porque… …
…”Um dia vou deixar de estar aqui”, Saramago.” (Luísa Mesquita, autora da
primeira tese académica sobre a obra de Saramago).
“A sua obra, apesar de controversa, é uma
referência do exercício mais pleno de liberdade. Destaco o carácter
insubordinado e insurrecto de José Saramago, embora tenha discordado de algumas
atitudes de maior intolerância. Saramago morreu depois de uma vida cheia, pode
dizer “confesso que vivi” como o livro de Pablo Neruda. Só os escrivães
recolhem unanimismo. Fica-me na memória o “Memorial do Convento”, um livro que
só nos acontece uma vez na vida.” (Moita Flores no “Jornal do Ribatejo”).
“… é quase sempre admirável a maneira como Saramago
desenvolve uma linguagem literária que, logo à partida, pretenderia
aproximar-se de uma oralidade ideal e primordial, a partir da qual todos os
planos da narrativa se diferenciam e na qual todos voltam depois a convergir.
Esta técnica singular ter-se-á por vezes tornado num dos seus maneirismos, mas
é extremamente eficaz em muitos casos.” (Vasco da Graça Moura no DIÁRIO DE
NOTÍCIAS).
José Saramago é um dos escritores portugueses mais
lidos e traduzidos no estrangeiro. A sua obra foi publicada em 75 países: Albânia, Alemanha, Argentina, Áustria, Bangladesh, Bósnia-Herzegovina, Brasil,
Bulgária, Canadá, China (mandarim, cantonês), Colômbia, Coreia do Sul, Croácia,
Cuba, Dinamarca, Emiratos Árabes Unidos, Eslováquia, Eslovénia, Espanha
(castelhano, catalão, valenciano, euskera), Estados Unidos da América, Estónia,
Finlândia, França, Grécia, Guatemala, Hungria, Índia (índi, malayam, bengalí),
Irão (farsi), Iraque, Islândia, Israel, Itália (italiano, sardo), Japão,
Letónia, Lituânia, Macedónia, México, Montenegro, Noruega, Países Baixos, Perú,
Polónia, Reino Unido, República Checa (checo, eslovaco), República Dominicana,
Roménia, Rússia, Sérvia, Síria, Suécia, Suíça, Tailândia, Taiwan, Turquia,
Uruguai, Qatar, Egipto, Vietnam, Holanda.
Os livros de José Saramago foram traduzidos para 48 idiomas: Albanês, alemão, árabe,
azerbaijano, bengali, búlgaro, cantonês, castelhano, catalão, checo, coreano,
croata (alfabeto latino), dinamarquês, eslovaco, esloveno, esperanto, euskera,
farsi, finlandês (suomi), francês, georgiano, grego, hebraico, hindi, holandês,
húngaro, inglês, islandês, italiano, japonês, letão, lituano, malabar, malaio,
mandarim, norueguês, polaco, romeno, russo, sardo, sérvio (alfabeto cirílico),
sueco, tailandês, tamil, turco, ucraniano, valenciano e vietnamita.
Foi há 25 anos que Saramago recebeu o Prémio Nobel
da Literatura. Parece que foi ontem.
BIBLIOGRAFIA
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