- O meu amigo desculpe. Você
tem estudos. Se não é Doutor tem de ser Engenheiro.
Eu bem lhe dizia que era só Professor
e mais coisa nenhuma, mas não havia maneira de sairmos dali e eu já estava pelos
ajustes. Um dia, disse-lhe:
- “Está o caldo entornado” e “Temos
a burra nas couves”.
Parece que foi remédio santo. A
partir daí, passou a tratar-me por amigo Hernâni e o nosso relacionamento
passou a ser mais natural e saudável.
Fazemos negócio sempre que calha ter
alguma peça que me encha as medidas. Ele já sabe o que me interessa e começa a cantar
alto como se estivesse no Orfeão e eu, naturalmente, faço ouvidos de
mercador. Por outras palavras, esgrimimos. É manha contra artimanha. E lá
fazemos negócio, normalmente pouco silencioso, mas tudo acaba em bem ou em mal.
Depende do ponto de vista. Umas vezes engana-me ele, outras vezes engano-o eu. E já ouvi da boca dele,
aquilo que para mim é encarado como um elogio:
- Amigo Hernâni: Você é mais cigano do que eu.
Ao longo dos tempos, o meu amigo José
Lacerda tem-me vendido arte pastoril, Bonecos de Estremoz, louça de barro
vermelho de Estremoz e louça vidrada de Redondo, tendo com isso contribuído para
a edificação das minhas colecções. É claro que nem sempre compro, pois mesmo
que me interesse, nem sempre é oportuno abrir os cordões à bolsa. É
nessas alturas que ele me diz:
- O meu amigo não se preocupe.
Não precisa de pagar agora. Paga depois.
O que vale é que eu estou
imunizado contra a lábia dele.
José Lacerda é uma figura muito
popular e uma referência no Mercado das Velharias em Estremoz. No terrado que
semanalmente ocupa no Rossio de Estremoz, destaca-se a sua banca bem provida de
chocalhos. Foi esse pormenor, o tema escolhido pelo seu filho Tói Lacerda, para
encomendar um Boneco de Estremoz que representasse o pai no Mercado da Velharias.
A criação da figura deve-se ao barrista José Carlos Rodrigues, a quem felicito
pelo bem conseguido trabalho. Através dele, o cigano José Lacerda ficou
perpetuado na barrística popular estremocense. Basta olhar para o Boneco que se
é levado a dizer:
- Olha o Lacerda!
Bom dia
ResponderEliminarBom dia S. Professor Hernâni gostei do texto, da vossa coversa. Temos o caldo entornado temos o burro nas couves. É sempre um olho nu burro outro no sigano.
A última frase idiomática que está a usar neste comentário, não foi por mim usada no texto.
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