Manuel
Xarepe (Antropólogo)
Pede-me o amigo Hernâni
para dizer também algo sobre os Bonecos de Estremoz. Que poderei dizer
para além do que ele enfaticamente tem dito? Como disse o Armando Alves e
outros ainda…
Dizer que fiquei muito
contente com o objetivo alcançado? Quem não terá ficado? Posso dizer milhentas
palavras de louvor: isso será, como dizem os brasileiros, chover no molhado.
Praticamente já tudo ou quase tudo foi dito. E não só de agora. De há muito
que Marques Crespo, Sá Lemos, Azinhal Abelho, Joaquim Vermelho e Hernâni Matos
se esforçaram para pôr em evidência a massa bruta (passe a expressão), a massa
barrenta que mãos hábeis com amor e devoção transformam em contextos
antropológicos sociais e religiosos (parafraseando o Hernâni), na doçura
encantadora de estética colorida que é o nosso encanto.
Tal como o Matos e o
Armando Alves, também fui atraído muito cedo pelos bonecos. Conheci o Professor
Sá Lemos mas não a Ti Ana das Peles, muito embora o seu neto Florimundo Estrela
(pintor) me tenha falado bastas vezes dela e dos seus bonecos. Conheci muito
bem o Mestre Mariano Alfacinha: estou a vê-lo na sua mesa de
trabalho na Escola Industrial com uma agilidade impressionante a fazer bonecos
sobre bonecos. Depois a pintá-los, mas, com tintas feitas por ele. Eram terras
de várias cores e aditivos que eu não entendia. Que maravilha aquelas cores não
brilhantes. O tempo passava e eu ali perdido, ganhando o espetáculo que me
ficou na retina e na saudade.
Fui para longe e Mestre
Mariano para mais longe ainda após estúpido desastre. Vim encontrar a sua
esposa, a Liberdade, e sua irmã (dele) Sabina, trabalhando os bonecos e pouco
depois a filha do Mestre Mariano e minha colega e amiga de escola, a Maria
Luísa, de quem guardo orgulhosamente, entre outos, um Cristo Alentejano.
Tudo na vida evolui. O que
foi ontem será diferente amanhã. Até há quem afirme que a tradição não existe!
Quando o Armando Alves evoca o mestre José Moreira dizendo que ele tinha no
quintal uns tanques onde transformava a terra em barro, remoí de novo um
desgosto que tenho há muito. Se outrora tínhamos as bilhas (outro desgosto), as
célebres bilhas, os barros de Estremoz… que em todo o lado eram
falados: - O barro de Estremoz, faz a água fresca…
Infelizmente foram-se as
bilhas. Salvaram-se os bonecos. Mas com barro importado. Que pena!
Manuel Xarepe
Antropólogo
(Texto publicado no jornal
E nº 193, de 08-02-2018)
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