sábado, 12 de novembro de 2011

Tomaz Alcaide homenageado em Estremoz


Tomaz Alcaide (1901-1967)
Aqui retratado por Max, em 1936, em Bruxelas.


TOMAZ ALCAIDE HOMENAGEADO EM ESTREMOZ
Teve lugar hoje em Estremoz uma Homenagem a Tomaz Alcaide (1901-1967), cantor lírico português de projecção internacional, que teve como berço natal a cidade de Estremoz e cuja fama projectou o nome da sua terra para além do âmbito restrito das suas fronteiras, pelas quatro partidas do Mundo.
A iniciativa pertenceu a sua viúva Asta-Rose Alcaide, à qual se associou o Município de Estremoz. A Homenagem a Tomaz Alcaide teve início pelas 15 horas na Igreja dos Congregados, tendo assumido a seguinte forma:
- Leitura de um texto de Santo Agostinho, pelo Dr. Fernando Carvalho, com acompanhamento musical executado pela Banda da Sociedade Filarmónica Artística Estremocense;
- Actuação do Orfeão de Estremoz "Tomaz Alcaide";
- Actuação do Orfeão do Colégio Militar;
- Breve biografia de Tomaz Alcaide, pelo Dr. Mário Moreau;
- Actuação da Banda da Sociedade Filarmónica Artística Estremocense;
- Palavras do senhor Presidente da Assembleia Municipal de Estremoz, Martinho Torrinha;
- Entrega da Medalha de Ouro de Mérito Municipal atribuída postumamente a Tomaz Alcaide, a sua viúva senhora Dona Asta-Rose Alcaide. A entrega foi feita pele senhor Presidente da Câmara Municipal de Estremoz, Luís Mourinha.
- Palavras de Dona Asta-Rose Alcaide.
Encerrada a cerimónia na Igreja dos Congregados, a urna com as cinzas de Tomaz Alcaide foi transportada pela Guarda de Honra do colégio Militar, em cortejo, desde a Igreja dos Congregados até ao Monumento a Tomaz Alcaide, local onde a Banda da Sociedade Filarmónica Artística Estremocense tocou o Hino Nacional, acompanhada pelo público e entidades presentes. As cinzas de Tomaz Alcaide foram então depositadas na base do monumento erigido em sua honra, frente à casa onde nasceu.

Publicado inicialmente em 12 de Novembro de 2011









HOMENAGENS ANTERIORES
Estremoz, já tivera oportunidade de mostrar o seu reconhecimento e gratidão pela vida e pela obra do seu filho ilustre: atribuição do seu nome ao Orfeão local de que é patrono, atribuição do seu nome a uma Avenida, construção de um Monumento em sua memória, criação de um Festival de Canto com o seu nome. Mas o reconhecimento nunca é de mais, quando o exemplo de vida e obra são gigantes, quando os estremocenses se revêem na projecção telúrica que teve o seu conterrâneo, há muito cidadão do Mundo e que por isso mesmo tem na Catedral de Washington uma pedra com o seu nome, a perpetuar a sua memória de grande intérprete e cantor, homenagem de admiradores americanos ao saberem da sua morte.

A HOMENAGEM DE 2001
De salientar que a distinção agora entregue à senhora Dona Asta-Rose Alcaide foi fruto de uma decisão da Assembleia Municipal de Estremoz, que reunida em sessão plenária no dia 23 de Fevereiro de 2001, deliberou que em cerimónia pública e ao abrigo do Regulamento de Distinções Honoríficas, fosse atribuído postumamente ao cantor lírico estremocense Tomaz Alcaide, o título de cidadão honorário de Estremoz e a medalha de ouro da cidade. Deliberou ainda que no Foyer do Teatro Bernardim Ribeiro, fosse descerrada uma placa comemorativa do 1º Centenário do Nascimento do cantor. O descerramento da placa decorreu no dia 27 de Abril de 2001, mas o resto da decisão da Assembleia Municipal estava por executar, o que agora foi feito.
Sob a égide do cantor decorreram também em Estremoz, de 27 de Abril a 1 de Maio de 2001, a Exposição Filatélica Inter-Regional "ESTREMOZ 2001" e a Exposição Filatélica Luso-Espanhola "FILAMOZ 2001" de Filatelia Tradicional e de Filatelia Temática", que tiveram lugar nos ginásios da Escola Secundária da Rainha Santa Isabel. O acto inaugural das exposições assumiu a forma de uma sessão solene realizada no dia 27 de Abril, no Teatro Bernardim Ribeiro, em cujo átrio funcionou um posto de correio que em toda a correspondência apresentada para o efeito, apôs um carimbo comemorativo com o busto de Tomaz Alcaide. Na ocasião, foram postos a circular pelos Correios de Portugal, inteiros postais comemorativos do 1º Centenário do Nascimento de Tomaz Alcaide, com design de Sofia Martins e onde aparece em primeiro plano Tomaz Alcaide no papel de Rigoletto. Em segundo plano, o busto do cantor fotografado em 1936, por Max, em Bruxelas.

TOMAZ ALCAIDE – CANTOR LÍRICO
A carreira de Tomaz Alcaide como cantor lírico decorreu por cerca de 22 anos, de 1924 a 1948 e projectou-o com extraordinário brilho na cena lírica internacional, com repetidas actuações no famoso Scala de Milão, San Carlo, de Nápoles, Real de Roma, Ópera de Paris, Ópera Estadual de Viena, Festivais de Salzburgo, Teatro Real de La Monnaie, em Bruxelas, e enfim, na generalidade dos mais importantes teatros da Europa e da América do Norte e do Sul.
Alcaide foi uma grande vedeta internacional da Ópera, graças aos atributos excepcionais de que dispunha e que lhe permitiram guindar-se rapidamente ao mais elevado nível e cotação internacionais. Dotado de uma bela e inconfundível voz de tenor lírico, conduzida por uma técnica superior de respiração, as suas interpretações atingiram rara beleza e adequação ao estilo musical e carácter das personagens que desempenhava. Se aliarmos a todos esses dons, um árduo estudo e uma figura ideal para a representação das personagens do seu repertório, um cuidado extremo na indumentária e na caracterização e um verdadeiro talento de actor, teremos a explicação cabal do seu sucesso. Alcaide utilizava todas as possibilidades dinâmicas e cromáticas da sua voz como meio expressivo ao serviço da interpretação musico-dramática. Alcaide cantava em português, espanhol, italiano, francês, inglês e alemão, línguas que lhe eram familiares.
Mas as preocupações artísticas e culturais de Alcaide não se confinaram aos cuidados com a sua imagem de grande intérprete internacional. Ainda no auge da sua carreira, começou a manifestar por actos, a preocupação crescente pelo estado de coisas completamente negativo que se verificava entre nós no que respeita à organização de um teatro lírico internacional. Assim, em 1937, apresentou um primeiro plano para a organização e nacionalização do nosso teatro lírico, que previa entre outras medidas, o ensino e o profissionalismo. Este plano falhou na altura, por falta de apoios necessários.
Alcaide gravou vários discos, nomeadamente para a Columbia e rodou filmes em Portugal e em França.
A partir de 1962, desempenhou o lugar de Mestre de Canto, interpretação e cena da Companhia Portuguesa de Ópera do Teatro da Trindade, onde desde o início imprimiu aos trabalhos um clima de seriedade, exigência artística, competência e dedicação.
Tomaz Alcaide deu à Companhia Portuguesa de Ópera, o sentido da dignidade artística feito da exigência de um nível elevado, do constante apelo à necessidade de uma representação dramática adequada e moderna, de uma montagem e encenação dos espectáculos de acordo com a índole dos textos, enfim, a consciência clara de que a Ópera é um espectáculo de síntese que só poderá perdurar no coração do público quando o binómio músico-dramático que a define, tenha plena realização.
Além do ensino de canto e interpretação, devem destacar-se as suas encenações, das quais ainda hoje são consideradas como paradigmáticas as das Óperas “Bhoéme” e “Weerther”.
Posteriormente, a sua lição, o seu exemplo e as suas ideias foram seguidas e o teatro lírico português profissionalizou-se e nacionalizou-se com os seus corpos artísticos organizados e qualificados: Companhia Residente de Cantores Nacionais, Orquestra, Coro, Companhia de Bailado e Corpos Técnicos.
Tomaz Alcaide pertenceu ao reduzido número de artistas portugueses cuja actuação era solicitada, e não tolerada, pelos mais exigentes promotores de espectáculos, no plano internacional.
No consenso dum sem número de melómanos e críticos de há poucas dezenas de anos, era o protagonista sem rival dum ”Fausto” de Gonot e dum “Pescador de Pérolas” de Bizet.
Um dos traços marcantes da personalidade de Tomaz Alcaide foi sem dúvida o seu ardente portuguesismo, que se manifestou sempre por acções e palavras, no que fez e no que escreveu, como aconteceu no seu livro de memórias “Tomaz Alcaide, Um cantor no Palco e na Vida”, dado à estampa em 1961. Foi assim que recusou a naturalização italiana, que lhe era oferecida por ocasião da guerra da Abissínia, única forma de poder continuar a extraordinária carreira que estava a fazer em Itália, e que assim perdeu, o que não o impediu contudo de atingir o mais elevado nível na cena lírica internacional. Deste modo, Tomaz Alcaide faz não só parte da Cultura Musical Portuguesa, como da Cultura Musical Mundial.
Publicado inicialmente em 12 de Novembro de 2011


sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Dia de São Martinho


Ilustração de Júlio Gil (1924-2004) para o livro "CANTARES DE TODO O ANO"
 de Júlio Evangelista. Colecção Educativa. Série F. Nº 6. Campanha Nacional
de Educação de Adultos. Lisboa, s/d.

São Martinho é festejado a 11 de Novembro, dia em que por tradição se prova o vinho novo, pois São Martinho é pretexto para molhar a goela. Reza a tradição algarvia que em 383, São Martinho de Tours, solicitou ao imperador Máximo ajuda material para a construção de um convento. Foi bem recebido pelo imperador e participou num banquete com os membros da corte. No banquete bebeu-se em demasia e foram tantas as bebedeiras que o banquete foi desde logo, classificado como martinhada. Segundo consta, esta terá sido a origem de São Martinho ser o patrono dos bêbados, embora nada permita afirmar que tenha sido daqueles que se excederam na bebida.
São abundantes os provérbios relativos ao S. Martinho, sendo de salientar a existência de variantes regionais:
- A cada bacorinho vem o seu S. Martinho.
- A cada porco vem o seu S. Martinho.
- As geadas de São Martinho levam a carne e o vinho.
- Dia de São Martinho prova o teu vinho.
- Dia de São Martinho, castanhas e vinho.
- Dia de São Martinho, come-se castanhas e bebe-se vinho.
- Dia de São Martinho, lume, castanhas e vinho.
- Dia de São Martinho, mata o teu porco e prova o teu vinho.
- Dia de São Martinho, vai à adega e prova o teu vinho.
- Em dia de S. Martinho atesta e abatoca o teu vinho.
- Em dia de São Martinho semeia os teus alhos e prova o teu vinho.
- Em dia de São Martinho vai à adega, prova o vinho e faz o teu magustinho.
- Em São Martinho tapa o teu portalzinho, ceva o teu porquinho e fura o pipinho.
- Em São Martinho, mata o teu porco, assa castanhas e prova o teu vinho.
- Martinho bebe o vinho, deixa a água para o moinho.
- No dia de S. Martinho mata o teu porco e prova o teu vinho.
- No dia de S. Martinho vai à adega e prova o vinho.
- No dia de S. Martinho, come-se castanhas e bebe-se vinho.
- No dia de S. Martinho, fura o teu pipinho.
- No dia de S. Martinho, lume, castanhas e vinho.
- No dia de S. Martinho, mata o porquinho, abre o pipinho, põe-te mal com o teu vizinho.
- No dia de S. Martinho, mata o teu porco e bebe o teu vinho.
- No dia de S. Martinho, mata o teu porco, chega-te ao lume, assa castanhas e prova o teu vinho.
- No dia de S. Martinho, vai à adega e prova o teu vinho.
- No dia de S. Martinho: lume, castanhas e vinho.
- No dia de São Martinho fura o teu pipinho.
- No dia de São Martinho mala o teu porco, chega-te ao lume, assa castanhas e prova o teu vinho.
- No dia de São Martinho mata o porquinho, abre o pipinho, põe-te mal com o teu vizinho.
- No dia de São Martinho mata o teu porco, chega-te ao lume, assa as castanhas e bebe o teu vinho.
- No dia de São Martinho, castanhas, lume e vinho.
- No dia de São Martinho, fecha a adega e prova o teu vinho.
- No dia de São Martinho, mata o porco e prova o teu vinho.
- No dia de São Martinho, mata o porquinho, chega-te ao lume, assa castanhas e bebe o teu vinho.
- No dia de São Martinho, vai à adega e prova o teu vinho.
- No dia de São Simão, semear, sim, marear, não.
- No São Martinho, fura o teu pipinho.
- O Sete-Estrelo pelo S. Martinho, vai de bordo a bordinho; à meia-noite está a pino.
- O Verão de São Martinho começa no Todos-os-Santos.
- O Verão de São Martinho, a vareja de São Simão e a cheia de Santos são três coisas que nunca faltaram nem faltarão.
- Pelo S. Martinho castanhas assadas, pão e vinho.
- Pelo S. Martinho deixa a água pró moinho.
- Pelo S. Martinho mata o teu porquinho e semeia o teu cebolinho.
- Pelo S. Martinho nem nado nem no cabacinho.
- Pelo S. Martinho prova o teu vinho; ao cabo de um ano já não te faz dano.
- Pelo S. Martinho semeia favas e linho.
- Pelo S. Martinho semeia o teu cebolinho.
- Pelo S. Martinho todo o mosto é bom vinho.
- Pelo São Martinho abatoca o pipinho.
- Pelo São Martinho abatoca o teu vinho.
- Pelo São Martinho bebe o bom vinho e deixa a água para o moinho.
- Pelo São Martinho deixa a água para o moinho.
- Pelo São Martinho larga o soitinho.
- Pelo São Martinho mata o porquinho, prova o teu vinho e não te esqueças do teu vizinho.
- Pelo São Martinho mata o teu porquinho e semeia o teu cebolinho.
- Pelo São Martinho prova o teu vinho, larga o soito e mata o porquinho.
- Pelo São Martinho prova o teu vinho; ao cabo de um ano já te não faz dano.
- Pelo São Martinho prova teu vinho.
- Pelo São Martinho semeia o teu cebolinho, que o meu já está nascidinho.
- Pelo São Martinho, lume, castanhas e vinho.
- Pelo São Martinho, mata teu porco e bebe teu vinho.
- Pelo São Martinho, nem nado, nem no cabacinho.
- Pelo São Martinho, semeia fava e linho.
- Pelo São Martinho, semeia o teu cebolinho.
- Por São Martinho mata o teu porco e prova o teu vinho.
- Por São Martinho semeia o teu linho.
- Por São Martinho, nem favas nem vinho.
- Por São Martinho, prova teu vinho.
- Por São Martinho, semeia fava e linho.
- Por São Martinho, todo o mosto é bom vinho.
- Quem bebe no S. Martinho, faz de velho e de menino.
- São Martinho, bispo; São Martinho, papa; S. Martinho rapa;
- Se o Inverno não erra caminho, tê-lo-ei pelo São Martinho.
- Se o Inverno não erra caminho, temo-lo pelo S. Martinho.
- Se o Inverno não erra o caminho, cá virá no São Martinho.
- Se o Inverno não erra o caminho, tê-lo-ei pelo S. Martinho.
- Se queres pasmar o teu vizinho, lavra, sacha e esterca pelo S. Martinho.
- Verão de S. Martinho säo três dias e mais um bocadinho.
- Vindima em Outubro que o S. Martinho to dirá.

Publicado inicialmente a 11 de Novembro de 2011

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Estremoz - Tipos populares do Mercado


O amola-tesouras Paulino no Mercado de Estremoz, nos anos 60
do séc. XX. Foto de Margarida Ribeiro.

Nos anos sessenta do séc. XX, na zona do mercado de sábado, o Rossio Marquês de Pombal em Estremoz era palco da acção dos mais diversos tipos de vendedores e prestadores de serviços:
- Cauteleiros como o Saragoça, o Cartolinha ou o Zé Guilherme que prometiam a sorte grande, que algumas vezes venderam;
- Poetas populares como o Miguel Gordinho de Santiago de Rio de Moinhos, que por ali vendia folhinhas com os seus versos;
- Amola-tesouras como o Paulino, de Santiago, com a sua bicicleta devidamente apetrechada com pedra de amolar giratória, caixa de ferramentas diversas que lhe permitiam além de amolar tesouras e facas, reparar guarda-chuvas danificados, umas vezes pelos rigores do tempo, outras pela incúria dos proprietários;
- Soldadores como o Jerónimo ou o Laureano, também de Santiago, que punham pingos e fundos. Eles arranjavam vasilhame metálico furado ou danificado pelo uso. Umas vezes bastavam uns pingos de solda ou um remendo. Porém, outras vezes era necessário um fundo ou uma asa nova. Por vezes também punham “gatos” em objectos de loiça que se tinham partido: alguidares, travessas de ir à mesa e mesmo penicos. Como eu gostava de os ver trabalhar! Era sempre um acto pautado por muita paciência e cuidado, que mais lembrava uma operação cirúrgica de reconstrução. E no fim, lá tínhamos o alguidar, a travessa ou o penico, que como Fénixes renascidas, retomavam a função que lhes estava destinada;
- Vendedores da banha de cobra, junto à fonte do Sátiro;
- Vendedores ambulantes de roupas e bugigangas, como o Painho, sem dúvida o maior fala-barato que conheci, mestre em “palheta” que usava em profusão para convencer os compradores mais hesitantes. O seu proscénio era a também a zona do Sátiro. De resto, mais comedido, por ali actuava também o Bravinho, de Borba;
- Engraxadores junto ao Posto da Polícia de Viação e Trânsito. Entre eles o Xico Gago e o filho Menino João, bem como o Algarvio e o Caelhas;
- Moços de fretes como o Dário, o Cereja e o Algarvio, que transportavam a bagagem a passageiros dos autocarros do João Cândido Belo, acabados de chegar à estação do Rossio;
- Aguadeiros como a "Espanhola", cuja proximidade era providencial no Verão, quando o calor sufocante, nos encortiçava a boca e ameaçava derreter os miolos.


 O poeta popular Miguel Gordinho vendendo folhas de versos no
Mercado de Estremoz, nos anos 60 do séc. XX. Foto de Margarida Ribeiro.

 A aguadeira "Espanhola" no Mercado de Estremoz, nos anos 60 do séc. XX.
Foto de Margarida Ribeiro.

sábado, 5 de novembro de 2011

Provérbios de Novembro


O Mês de Novembro (c. 1510). Gerard Horenbout  (c. 1465–1541).
Breviário Grimani (28 cm x 21,5 cm). Biblioteca Nazionale Marciana, Venice.

De salientar que os  provérbios de Novembro são o reflexo do calendário agro-pastoril, que nos códices medievais e renascentistas, para além dos símbolos astrológicos e zodiacais, aparecem ilustrados com cenas de engorda de porcos.

- As geadas de São Martinho levam a carne e o vinho.
- De Santa Catarina ao Natal, bom chover e melhor nevar.
- De Santos ao Natal é bom chover e melhor nevar.
- De Santos ao Natal perde a padeira o cabedal.
- De Santos ao Natal, ou bem chover ou bem nevar.
- De Todos-os-Santos ao Advento, nem muita chuva nem muito vento.
- De Todos-os-Santos ao Natal, bom é chover e melhor nevar.
- De Todos-os-Santos ao Natal, bom é chover e melhor nevar.
- De Todos-os-Santos ao Natal, perde a padeira o capital.
- De Todos-os-Santos ao Natal, perde a padeira o natural.
- De Todos-os-Santos até ao Natal, perde a padeira o cabedal.
- Depois dos Santos, neve nos campos.
- Dia de Santo André quem não tem porco mata a mulher.
- Dia de Santo André, porcos pelo pé.
- Dia de São Martinho prova o teu vinho.
- Dia de São Martinho, castanhas e vinho.
- Dia de São Martinho, come-se castanhas e bebe-se vinho.
- Dia de São Martinho, lume, castanhas e vinho.
- Dia de São Martinho, mata o teu porco e prova o teu vinho.
- Dia de São Martinho, vai à adega e prova o teu vinho.
- Dos Santos ao Advento, nem muita chuva nem muito vento.
- Dos Santos ao Natal é bom chover e melhor nevar.
- Dos Santos ao Natal é Inverno natural.
- Dos Santos ao Natal perde a padeira o cabedal.
- Dos Santos ao Natal, Inverno geral.
- Dos Santos ao Natal, Inverno natural.
- Dos Santos ao Natal, perde o marinheiro o cabedal.
- Em dia de Santo André, o tremoço não está, nem na saca, nem no pé.
- Em dia de Santo André, quem não tem porco que mate, amarra a mulher pelo pé.
- Em dia de São Martinho semeia os teus alhos e prova o teu vinho.
- Em dia de São Martinho vai à adega, prova o vinho e faz o teu magustinho.
- Em Novembro põe tudo a secar que pode o sol não voltar.
- Em São Martinho tapa o teu portalzinho, ceva o teu porquinho e fura o pipinho.
- Em São Martinho, mata o teu porco, assa castanhas e prova o teu vinho.
- No dia de Santo André diz o porco, quié-quié.
- No dia de Santo André vai à esquina e traz o porco pelo pé.
- No dia de Santo André, pega o porco pelo pé; se ele disser quié-quié, diz-lhe que tempo é; se ele disser que tal-que tal, guarda-o para o Natal.
- No dia de Santo André, quem não tem porco mata a mulher.
- No dia de São Martinho fura o teu pipinho.
- No dia de São Martinho mala o teu porco, chega-te ao lume, assa castanhas e prova o teu vinho.
- No dia de São Martinho mata o porquinho, abre o pipinho, põe-te mal com o teu vizinho.
- No dia de São Martinho mata o teu porco, chega-te ao lume, assa as castanhas e bebe o teu vinho.
- No dia de São Martinho, castanhas, lume e vinho.
- No dia de São Martinho, fecha a adega e prova o teu vinho.
- No dia de São Martinho, mata o porco e prova o teu vinho.
- No dia de São Martinho, vai à adega e prova o teu vinho.
- No dia de São Simão, semear, sim, marear, não.
- No São Florêncio, o Inverno vai-se ou volta.
- No São Martinho, fura o teu pipinho.
- Novembro à porta, geada na horta.
- Novembro é quente no começo e frio no fim.
- Novembro pelos Santos, neve nos campos.
- Novembro põe tudo a secar, pode o sol não tornar.
- Novembro, ou bem chover ou bem nevar.
- Novembro, semear.
- Novembro, semear; Dezembro, nascer.
- O Verão de São Martinho começa no Todos-os-Santos.
- O Verão de São Martinho, a vareja de São Simão e a cheia de Santos são três coisas que nunca faltaram nem faltarão.
- Outubro, Novembro e Dezembro, não busques o pão no mar, mas torna ao teu celeiro e abre teu mealheiro.
- Outubro, Novembro e Dezembro, não busques o pão no mar.
- Pelo Santo André (30/11) agarra o porco pelo pé.
- Pelo Santo André (30/11), neve no pé.
- Pelo São Martinho abatoca o pipinho.
- Pelo São Martinho abatoca o teu vinho.
- Pelo São Martinho bebe o bom vinho e deixa a água para o moinho.
- Pelo São Martinho deixa a água para o moinho.
- Pelo São Martinho larga o soitinho.
- Pelo São Martinho mata o porquinho, prova o teu vinho e não te esqueças do teu vizinho.
- Pelo São Martinho mata o teu porquinho e semeia o teu cebolinho.
- Pelo São Martinho prova o teu vinho, larga o soito e mata o porquinho.
- Pelo São Martinho prova o teu vinho; ao cabo de um ano já te não faz dano.
- Pelo São Martinho prova teu vinho.
- Pelo São Martinho semeia o teu cebolinho, que o meu já está nascidinho.
- Pelo São Martinho, lume, castanhas e vinho.
- Pelo São Martinho, mata teu porco e bebe teu vinho.
- Pelo São Martinho, nem nado, nem no cabacinho.
- Pelo São Martinho, semeia fava e linho.
- Pelo São Martinho, semeia o teu cebolinho.
- Pelos Santos, favas por todos os cantos.
- Pelos Santos, neve nos campos.
- Por Santo André o Sete-Estrelo posto é.
- Por Santos semeia trigo e colhe cardos.
- Por São Clemente, alça a mão da semente.
- Por São Martinho mata o teu porco e prova o teu vinho.
- Por São Martinho semeia o teu linho.
- Por São Martinho, nem favas nem vinho.
- Por São Martinho, prova teu vinho.
- Por São Martinho, semeia fava e linho.
- Por São Martinho, todo o mosto é bom vinho.
- Por Todos-os-Santos, semeia trigo, colhe castanhas.
- Por Todos-os-Santos, neve nos campos.
- Por Todos-os-Santos, semeia trigo e colhe cardos.
- Se em Novembro ouvires trovão, o ano que vem será bom.
- Se o Inverno não erra caminho, tê-lo-ei pelo São Martinho.
- Se o Inverno não erra o caminho, cá virá no São Martinho.

Publicado inicialmente a 5 de Novembro de 2011


NOVEMBRO (SIGNO SAGITÁRIO, de acordo com o painel). Painel de azulejos encimado
pela designação  latina do mês e pelo respectivo Signo de Zodíaco, encerrado num círculo. 
Representa o abate de árvores para cortar lenha para o próximo Inverno. Sala 106 da
Universidade de Évora, antigo Colégio do Espírito Santo, inaugurado em 1553.

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Novembro, mês da engorda


Novembro (1412-1416). Irmãos Limbourg (370/80–1416). Les très riches heures
du Duc de Berry. Manuscript (Ms. 65), 294 x 210 mm. Musée Condé, Chantilly.

Novembro é o décimo-primeiro mês do ano no calendário gregoriano e juliano. Tem a duração de 30 dias. A sua designação provém do étimo latino novem (nove), uma vez que era o nono mês do calendário romano, que começava em Março.
Novembro, em astrologia, começa com o trópico astrológico oeste, com o Sol no signo de Escorpião e termina no signo de Sagitário.
Em astronomia, o Sol começa na constelação de Balança, passa através da constelação de Escorpião cerca de 24 a 29 e termina na constelação de Ophiuchus, que é a única constelação zodiacal, não associada a qualquer signo astrológico.
No calendário republicano francês, Novembro correspondia aos meses de Brumário [(Brumaire) - 22 de Outubro a 20 de Novembro] e Frimário [(Frimaire): 21 de Novembro a 20 de Dezembro].
No antigo calendário japonês, Novembro é denominado Shimo-tsuki (11º mês), que para os japoneses é o mês da geada.
Novembro é um mês de Outono no Hemisfério Norte e de Primavera no Hemisfério Sul. Por isso, Novembro no Hemisfério sul é o equivalente sazonal de Maio no Hemisfério Norte e vice-versa.
Novembro começa no mesmo dia da semana que Fevereiro em anos comuns e Março em todos os anos. Novembro termina no mesmo dia da semana em Agosto de cada ano. Novembro começa no mesmo dia da semana que Junho do ano anterior em anos comuns e Setembro e Dezembro do ano anterior, em anos bissextos. Novembro termina no mesmo dia da semana que Março e Junho do ano anterior em anos comuns e Setembro do ano anterior em anos bissextos.
Os signos do Zodíaco correspondentes ao mês de Novembro são:
- Escorpião (23 de Outubro - 22 de Novembro)
- Sagitário (23 de Novembro – 21 de Dezembro)
A pedra zodiacal de Novembro é o topázio e a flor é o crisântemo.
Como noutros meses há datas especiais a assinalar, sob a forma de Dias Nacionais, Internacionais e Mundiais:
01 de Novembro - Dia de Todos os Santos
01 de Novembro - Dia da Luta Contra o Cancro
02 de Novembro - Dia de Finados
05 de Novembro - Dia Mundial do Cinema
06 de Novembro - Dia Internacional para a Prevenção da Exploração do Meio Ambiente em Tempos de Guerra e Conflito Armado)
08 de Novembro - Dia Europeu da Alimentação e da Cozinha Saudáveis
09 de Novembro - Dia Internacional contra o Fascismo e o Anti-Semitismo
10 de Novembro - Dia Mundial da Ciência para a Paz e Desenvolvimento
11 de Novembro - Dia de São Martinho
11 de Novembro - Dia do Armistício
14 de Novembro - Dia Mundial da Diabetes
15 de Novembro - Dia Nacional da Língua Gestual Portuguesa
16 de Novembro - Dia Internacional para a Tolerância
16 de Novembro - Dia Nacional do Mar
17 de Novembro - Dia Nacional do Não Fumador
18 de Novembro -  Dia Europeu da Protecção das Crianças contra a Exploração Sexual e o Abuso Sexual
19 de Novembro - Dia Internacional do Homem
20 de Novembro - Dia da Industrialização da África
20 de Novembro - Dia Universal da Criança
21 de Novembro - Dia Mundial da Televisão
21 de Novembro - Dia Europeu da Fibrose Quística
24 de Novembro - Dia Nacional da Cultura Científica
25 de Novembro - Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra as Mulheres
29 de Novembro - Dia Internacional de Solidariedade com o Povo da Palestina
3ª quarta-feira de Novembro - Dia Mundial das Doenças Pulmonares Obstrutivas Crónicas
3ª quinta-feira de Novembro - Dia Mundial da Filosofia
3º domingo de Novembro - Dia Mundial da Memória das Vítimas de Acidentes da Estrada
Em Novembro não há feriados nacionais, uma vez que o governo português, por imposição da troika, eliminou do calendário, de 1913 até 1917, inclusive, os tradicionais feriados de Corpo de Deus, 5 de Outubro, 1 de Novembro e 1 de Dezembro. Todavia, mantêm-se os seguintes feriados municipais
6 de Novembro - Boticas, Paços de Ferreira, Rio Maior, Valpaços (Criação do Município)
11 de Novembro - Alijó, Meda, Penafiel, Pombal, Torres Vedras (São Martinho)
19 de Novembro -  Odivelas, Trofa (Criação do Município)
23 de Novembro - Gavião (Foral manuelino)
24 de Novembro - Entroncamento (Criação do Município)
24 de Novembro - Sines (Elevação a Vila)
25 de Novembro - Calheta (Santa Catarina)
27 de Novembro - Guarda (Foral de D. Sancho I)
30 de Novembro - Mesão Frio (Santo André)
O calendário litúrgico da Igreja Católica é o seguinte:
01 – Todos os Santos.
02 – Todos os Finados.
03 - São Martinho de Porres; São Humberto de Liège; Santa Sílvia.
04 - São Carlos Boromeu. Bispo.
05 - São Zacarias; Santa Isabel; Santa Bertila; Beato Guido Maria Conforti.
06 - São Leonardo de Noblac; Beato Nuno Álvares Pereira.
07 - São Prosdócimo; São Wilibrordo; Beato Francisco Palau, Confessor; 
08 - São Godofredo; Cinco Santos Escultores Mártires.
09 - Santo Orestes: São Teodoro Mártir; Beata Elisabete da Trindade Catez.
10 - São Leão Magno, Papa e Doutor; Santo André Avelino.
11 - São Martinho de Tours.
12 - São Josafat Kuncewicz, bispo e mártir.
13 - Santo Estanislau Kostka; São Diogo de Alcalá; Beato Eugênio Bossilkov.
14 - Santo Serapião.
15 - Santo Alberto Magno, bispo e doutor; São Leopoldo III.
16 - Santa Gertrudes; Santa Margarida.
17 - Santa Isabel da Hungria,religiosa.
18 - Santo Frediano; São Romão;
19 - São Roque Gonzáles e companheiros; São José José Kalinowski.
20 - São Félix de Valois; Santo Edmundo.
21 - São Gelásio I, Papa.
22 - Santa Cecília; Beato Tomás Reggio.
23 - Santo Clemente I, papa e mártir; Santa Felicidade e sete irmãos; Santo Columbano, religioso.
24 - Santo André Dung-Lac.
25 - Santa Catarina de Alexandria; São Pedro Bispo de Alexandria.
26 - São Leonardo de Porto Maurício; Santo Humilde de Bisignano.
27 - Santo Virgílio; Santa Catarina Labour.
28 - São Tiago das Marcas.
29 - São Saturnino de Toulouse. 
30 - Santo André, Apóstolo.
De salientar que os  provérbios de Novembro são o reflexo do calendário agro-pastoril, que nos códices medievais e renascentistas, para além dos símbolos astrológicos e zodiacais, aparecem ilustrados com cenas de engorda de porcos. 
  
Publicado inicialmente em 4 de Novembro de 2011

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Dia de Todos-os-Santos


Regresso do "Pão por Deus" (1-11-1930).
Fotografia de autor desconhecido, recolhida "on line".


DIA DE TODOS-OS-SANTOS
O dia de Todos-os-Santos é celebrado pela Igreja Católica como uma festa em honra de todos os santos e mártires, conhecidos e desconhecidos.
No Alentejo, no dia de Todos-os-Santos, era ainda tradição nos anos sessenta-setenta do século passado, as crianças juntarem-se em pequenos grupos e andarem pelas ruas, de porta em porta, para “Pedir os Santinhos”. Naturalmente que só batiam às portas das casas mais abastadas ou julgadas como tal. Quando eram bem sucedidos e eram-no em geral, recebiam pão, bolos, maçãs, romãs, castanhas, nozes, amêndoas, etc. Eram oferendas que guardavam religiosamente nos seus talegos, nos quais as transportavam para as suas casas, onde ajudavam a mãe e o pai a fazer frente às duras condições de vida da esmagadora maioria dos intervenientes. Alguns desempregados, outros com empregos de miséria e outros ainda sujeitos à sazonalidade dos ciclos agrícolas de produção. Quanto aos ofertantes alguns eram-no por espírito de caridade cristã. Todavia, alguns imbuídos de espírito mais laico, faziam-no por espírito de solidariedade.
Uma tal tradição remonta a Lisboa no ano de 1756, um ano após o devastador terramoto que destruiu Lisboa no dia 1 de Novembro de 1755 e em que morreram milhares de pessoas, pelo que a população na sua maioria pobre, mais pobre ficou ainda.
A coincidência da data do terramoto com a data de 1 de Novembro, com significado religioso, conduziu a que sectores da população, aproveitando a solenidade do dia, tenham desencadeado, por toda a cidade, um peditório, visando atenuar a situação miserável em que se encontravam. Para tal, percorriam a cidade, batiam às portas e pediam esmola, mesmo que fosse pão, visto reinar a fome pela cidade. Pediam então: "Pão por Deus". Tal tradição perpetuou-se no tempo e propagou-se a todo o país, assumindo cambiantes em cada local. Todavia, a tradição está praticamente extinta desde os anos oitenta do século passado. Actualmente, os média, pressionados e distorcidos pelo peso globalizante da cultura anglo saxónica, ignoram completamente tradições como “Pedir os santinhos” e enfiam-nos pela casa dentro e pelas cachimónia abaixo, tradições como o “Halloween”, que nada têm a ver com a nossa identidade cultural.

A TRADIÇÃO ORAL
O dia de Todos-os-Santos está registado no adagiário português, onde são conhecidas máximas como as seguintes:

- “De Todos os Santos até ao Natal, perde a padeira o cabedal.” [4]
- “Pelos Santos, novos esquecem velho.” [4]
- “Por Todos os Santos semeia trigo, colhe cardos.” [1]
- “Por Todos os Santos, a neve nos campos.” [1]

A nível de cancioneiro popular, o dia de Todos-os-Santos é uma data grata para alguns:

“Dia de Todos os Santos
É que eu comecei a mar:
Quem com Santos principia
Com Santos deve acabar.” [3]

O Peditório do “Pão por Deus” está igualmente assinalado no cancioneiro popular:

“Bolinhos, Bolinhós,
Para mim e para vós,
Pelos vossos finados
Que estão enterrados
Ao pé da vera cruz
Para sempre. Amem, Jesus.
Truz; truz; truz.” (Coimbra) [2]

LONGE VÁ O AGOIRO
Faço votos para que nas condições duras que o país atravessa, não tenham muitos que recorrer ao Peditório do “Pão por Deus”, para conseguir fazer face às dificuldades diárias numa sociedade madrasta que alguns teimam em fazer retroceder no tempo.

BIBLIOGRAFIA
[1] – DELICADO, António. Adagios portuguezes reduzidos a lugares communs / pello lecenciado Antonio Delicado, Prior da Parrochial Igreja de Nossa Senhora da charidade, termo da cidade de Euora. Officina de Domingos Lopes Rosa. Lisboa, 1651.
[2] – LEITE DE VASCONCELLOS, J. Cancioneiro Popular Português. Volume III. Acta Universitatis Conimbrigensis. Coimbra,1983.
[3] – THOMAZ PIRES, A. Cantos Populares Portugueses, vol. I. Typographia Progresso. Elvas, 1902.
[4] - ROLAND, Francisco. ADAGIOS, PROVERBIOS, RIFÃOS E ANEXINS DA LINGUA PORTUGUEZA. Tirados dos melhores Autores Nacionais, e recopilados por ordem Alfabética por F.R.I.L.E.L. Typographia Rollandiana. Lisboa, 1841.

ROSSIO E HOSPITAL REAL DE TODOS-OS-SANTOS
Painel de azulejos de oficina de Lisboa, da 1ª metade do século XVIII (114 cm x 348 cm) existente no Museu da Cidade, Lisboa. No primeiro plano, tipos populares comercializam bens de consumo. No lado esquerdo é representado o Chafariz de Neptuno, equiparado ao dedicado a Apolo, existente no Terreiro do Paço.
O Hospital Real de Todos-os-Santos tinha fachada virada para o Rossio. Mandado erigir por D. João II em 1492, a sua construção só terminou no reinado de D. Manuel I, nos primeiros anos do século seguinte. Edifício de vanguarda na época, acolheu os primeiros internamentos em 1502 e o número de enfermarias foi crescendo ao longo do tempo: 3 (1504), 16 (1520) e 25 (1715).
O Hospital Real de Todos-os-Santos foi desactivado na sequência do Terramoto de 1755, ocorrido a 1 de Novembro desse ano, o qual foi responsável pela destruição quase completa da cidade de Lisboa.

Publicado inicialmente a 2 de Novembro de 2011

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Estremoz - Mercado das hortaliças

Estremoz - Mercado das hortaliças
Fotografia de Rui Alves

Nos anos sessenta do século XX, o mercado das hortaliças, decorria como hoje nas duas placas de calçada à portuguesa, existentes frente à Câmara.
Na placa de baixo, logo à entrada do mercado, ficavam os vendedores de árvores, arbustos e plantas de viveiro, seguidos pelo lado da Câmara, do tabuleiro da venda de caça, do Zé Correia e do pai. Depois eram as barracas do brinhol, primeiro a do João Brinholeiro e depois a da Ti Hilarina, das quais irradiava um cheiro intenso a massa frita e a azeite requentado. Seguiam-se as barracas dos enchidos, onde se vendia de tudo aquilo que o porco dá: pés, orelhas, focinheira, costeletas, lombinhos, cachola, chouriços, paios, paias, farinheira branca e farinheira preta, morcela, presunto, etc. Ali vendiam o Zé Torra, o Diogo Pimenta, o Ilídio, o Godinho e os irmãos Véstia, cada um deles com a sua barraca. Do outro lado da placa ou seja para o lado da estrada, ficavam os tabuleiros dos regateiros que vendiam fruta. Uns só vendiam no tempo do melão e da melancia vinda de comboio, dos campos de Santa Eulália, junto a Elvas. Era o caso do Júlio Regateiro e do António Regateiro. Outros vendiam durante todo o ano e tinham outros tipos de fruta. Era o caso do Romico, do Israel e do velho Mariano.
Na placa de cima, logo à entrada, do lado da Câmara havia mais barracas: a do Leandro Ervanário, as do pão do Anacleto Paulino e do José Resga, bem como a dos bolos da Ti Maria Paizé. Nesta placa havia três filas de tabuleiros, delimitando duas ruas para circulação dos consumidores. Ali se instalavam hortelões e regateiros.
E para quem porventura não saiba, havia uma diferença abissal entre uns e outros. Os regateiros eram intermediários de produtos hortícolas, que revendiam o que tinha sido produzido por outros. Em contrapartida, hortelões eram aqueles que tratavam da sua horta ou da que pertencia ao patrão, dono de uma qualquer quinta ou herdade.
Estes últimos viviam em sintonia com a Terra-Mãe numa época em que toda a agricultura era biológica, em que não se comiam coisas fora de época e não havia nem estufas, nem produtos hortícolas importados. Para além do domínio absoluto de alfaias como a enxada e o sacho, exerciam na horta, com mestria, as sábias operações de cavar, plantar, estrumar, semear, regar, sachar, mondar, desbastar, enxertar, transplantar, proteger da geada e colher. Em suma: eram eles os agentes de transmutação da Terra-Mãe em produtos hortícolas.
No mercado das hortaliças só se vendia o que a terra dava em cada época. Alguns dos produtos que lá se vendem hoje, naquela época não se vendiam. Presentes, de acordo com a época, eram: hortaliça (agriões, alfaces, beldroegas, brócolos, couves, couves-flores, espinafres, nabiças, repolhos), legumes (ervilhas, favas e feijão-verde), legumes secos (feijão e grão), raízes (batata, beterraba, cenoura, nabo, rabanete, rábano), condimentos (alhos, cebolas, coentros, hortelã, malagueta, salsa), frutos de sobremesa (abrunhos, ameixas, cerejas, figos, laranjas, limões, maçãs, marmelos, melancias, melões, morangos, nêsperas, peras, pêssegos, romãs, tangerinas, uvas), fruto secos (ameixas, avelãs, figos, nozes, uvas) e outros frutos (abóbora, azeitona, beringela, gila, mogango, pepino, pimento).
Hortelões de Santa Maria eram: António Mourinha e José Mourinha, a Herdade da Granja, a Herdade da Fonte Cansada, a Quinta do Marquês, o José de Paulo da Quinta do Maduro, Carlos Gaudêncio e o irmão, Miguel Quintaneiro e Chico Ferreira. Doutras freguesias eram: o Maltinha de Mamporcão, o Manuel Semedo da Frandina e a Ti Hermínia da Horta da Galega, em Santo André. Regateiros havia que eu me lembre, o Marcolino e a Jerónima. Logo à entrada da placa de cima e do lado esquerdo eram os tabuleiros do casal João Serrano e Zefa dos Queijos.
No mercado das hortaliças, o lugar era certo e estava aprazado com a Câmara. Ali eram descarregados de madrugada os produtos hortícolas, transportados em carroças desde as freguesias. Feito isto, hortelões e regateiros guardavam as carroças numa das estalagens da cidade. Aí desatrelavam a besta que ficava à manjedoura, até serem horas do regresso a casa. Nessa época existiam cinco estalagens em Estremoz. Uma do Peúgas, no Rossio Marquês de Pombal. Duas dos Irmãos Gaudêncio, uma na Avenida Condessa de Cuba e outra na Rua 31 de Janeiro. Nesta última rua e do lado oposto, existia ainda a estalagem do Aires. Finalmente, na Rua Serpa Pinto ficava a estalagem do Lopes.
Pelas oito da manhã já havia gente no mercado, a qual procurava sempre os melhores produtos e os mais frescos, antes de estarem escolhidos. Contudo, havia quem por necessidade só fosse comprar ao levantar dos tabuleiros, pois os produtos perecíveis eram então vendidos mais baratos.
A partir das nove da manhã aparecia o fiscal da Câmara. Ainda me lembro do velho Barriga e do Manuel Vida nestas funções. Iam de tabuleiro em tabuleiro para receberem a taxa devida ao aluguer, a que se acrescentava no Verão a taxa das gigantescas sombrinhas, montadas pelo diligente Barranhão. E, se no Verão, o Sol era escaldante, no Inverno, o frio era de rachar. Hortelões e regateiros não dispensavam o capote, trocando alguns deles o chapéu pelo boné de orelhas. Havia mesmo quem fizesse lume numa lata, junto ao tabuleiro. É que mãos engadanhadas não deixam ninguém trabalhar.
O mercado terminava pela hora de almoço, pois era hora de cada um regressar às suas casas. Uns com as compras. Outros com o produto das vendas e aquilo que não tinha sido vendido. Todavia, muitos dos vendedores não o faziam logo. Tapavam o(s) tabuleiro(s) com um pano de serapilheira atado por um baraço e iam retemperar forças numa taberna ou casa de pasto do seu agrado. Só depois iam às estalagens aparelhar as bestas nas carroças para carregar o que tinham deixado no mercado. E por fim lá seguiam em direcção a casa, para regressar no sábado seguinte.