sexta-feira, 5 de novembro de 2010

D. Nuno Álvares Pereira - Um herói em tempo de crise



Assim se vai às estrelas (i)   
                              Virgílio (Eneida, 9, 641)

1. D. NUNO ÁLVARES PEREIRA PROCLAMADO SANTO

Filho ilegítimo de D. Álvaro Gonçalves Pereira, prior do Hospital, D. Nuno Álvares Pereira terá nascido em Cernache do Bonjardim ou Flor da Rosa em 24 de Junho de 1360. Foi para a Corte aos 13 anos, sendo armado cavaleiro por Dona Leonor Teles com o arnês do Mestre de Avis, de quem se torna amigo. Adere à causa do Mestre, que o nomeia fronteiro da comarca de Entre Tejo e Odiana.
Vencedor da Batalha dos Atoleiros (6 de Abril de 1384), de Aljubarrota (14 de Agosto de 1385) e de Valverde (15 de Outubro de 1385), D. Nuno Álvares Pereira desempenhou um papel fundamental na resolução da crise de 1383-1385 com Castela e na consolidação da independência. Por isso sempre foi, desde sempre, muito justamente considerado como um símbolo da independência nacional.
Nomeado Condestável do Reino e Mordomo-mor, recebeu ainda de D. João I, os títulos de 3º conde de Ourém, de 7º conde de Barcelos e de 2º conde de Arraiolos.
Em 1388 iniciou a edificação da capela de São Jorge de Aljubarrota e, em 1389, a do Convento do Carmo, em Lisboa, onde se instalaram os frades da Ordem do Carmo, no ano de 1397.
Após a morte de sua esposa, Leonor de Alvim, com quem casara em 1376, torna-se Carmelita em 1423, recolhendo ao Convento do Carmo, em Lisboa, onde ingressa sob o nome de Irmão Nuno de Santa Maria. Ali permanece até à sua morte em 1 de Novembro de 1431, aos 71 anos de idade e já com fama de Santo.
Durante os últimos anos de vida, aquele que foi considerado o homem mais rico de Portugal, abandona todos os títulos nobilárquicos, desfaz-se de todas as riquezas materiais e procura ajudar os mais necessitados de Lisboa, tornando-se num mendigo a juntar esmola para entregar a quem precisava de comer. O Rei ordenou então que deixasse de pedir e concedeu-lhe sustento, que este repartia de igual forma pelos mais humildes e necessitados, junto dos quais procurava a riqueza interior.
D. Nuno Álvares Pereira foi beatificado em 23 de Janeiro de 1918 pelo Papa Bento XV e é desde 26 de Abril de 2009, mais um Santo português, após a cerimónia de canonização em Roma, do Beato Nuno de Santa Maria. O anúncio fora feito pela Santa Sé, no final do Consistório de 21 de Fevereiro de 2009, presidido por Sua Santidade o Papa Bento XVI.
Em nota pastoral da Conferência Episcopal Portuguesa divulgada em Fátima a 6 de Março de 2009, a propósito da Canonização de D. Nuno Álvares Pereira, pode-se ler:
“A pessoa e acção de Nuno Álvares Pereira são bem conhecidas do povo português. A nível civil, é lembrado em monumentos, praças e instituições; a nível religioso, é celebrado em igrejas, imagens e associações. Figura incontornável da nossa história, importa revitalizar a sua memória e dar a conhecer o seu testemunho de vida. Para além de ser um modelo de santidade, no seguimento radical de Cristo, que “não veio para ser servido mas para servir” (Mateus 20, 28), apraz nos pôr em relevo alguns aspectos de particular actualidade, para todos os homens e mulheres de boa vontade:
- Nuno Álvares Pereira foi um homem de Estado, que soube colocar os superiores interesses da Nação acima das suas conveniências, pretensões ou carreira. Fez da sua vida uma missão, correndo todos os riscos para bem servir a Pátria e o povo.
- Em tempo de grave crise nacional, optou corajosamente por ser parte da solução e, numa entrega sem limites, enfrentou com esperança os enormes desafios sociais e políticos da Nação.
- Coroado de glória com as vitórias alcançadas, senhor de imensas terras, despojou se dos seus bens e optou pela radicalidade do seguimento de Cristo, como simples irmão da Ordem dos Carmelitas.
- Não se valeu dos seus títulos de nobreza, prestígio e riqueza, para viver num clima de luxos e grandezas, mas optou por servir preferencialmente os pobres e necessitados do seu tempo.”
Mais adiante aquela nota pastoral acrescenta: “Vivemos em tempo de crise global, que tem origem num vazio de valores morais. O esbanjamento, a corrupção, a busca imparável do bem estar material, o relativismo que facilita o uso de todos os meios para alcançar os próprios benefícios, geraram um quadro de desemprego, de angústia e de pobreza que ameaçam as bases sobre as quais se organiza a sociedade. Neste contexto, o testemunho de vida de D. Nuno constituirá uma força de mudança em favor da justiça e da fraternidade, da promoção de estilos de vida mais sóbrios e solidários e de iniciativas de partilha de bens. Será também um apelo a uma cidadania exemplarmente vivida e um forte convite à dignificação da vida política como expressão do melhor humanismo ao serviço do bem comum.
Os Bispos de Portugal propõem, portanto, aos homens e mulheres de hoje o exemplo da vida de Nuno Álvares Pereira, pautada pelos valores evangélicos, orientada pelo maior bem de todos, disponível para lutar pelos superiores interesses da Pátria, solícita por servir os mais desprotegidos e pobres. Assim seremos parte activa na construção de uma sociedade mais justa e fraterna que todos desejamos.”
Também a propósito da canonização de D. Nuno Álvares Pereira, Sua Excelência o Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, em mensagem divulgada a 26 de Abril de 2009, proclamou:
“Hoje é um dia de alegria para todos os Portugueses.
A canonização de Nuno Álvares Pereira constitui um gesto que honra uma das figuras mais marcantes da nossa História, uma figura em que os Portugueses se revêem como símbolo de amor ao seu País, de defesa corajosa da independência nacional, de vontade de triunfar mesmo nas horas mais difíceis.
Orgulhamo-nos com a canonização de Nuno Álvares Pereira, pelo que ela representa de reconhecimento do valor exemplar de um português heróico e ilustre.
Um português que soube também ser humilde, o que o levou a retirar-se do gozo das grandezas mundanas em nome da fé que possuía.
Recordo o seu epitáfio: “As suas honras terrenas foram incontáveis, mas voltou-lhes as costas. Foi um grande Príncipe, mas fez-se humilde monge”.
De facto, Nuno Álvares Pereira soube voltar as costas às honras terrenas que conquistara através de feitos heróicos.
Mas não voltou as costas ao seu amor por Portugal, pois foi em nome desse amor que o Condestável comandou tropas em defesa da independência de uma nação ameaçada.
O “forte Dom Nuno”, como lhe chamou Camões, é um exemplo para todos nós e, muito em particular, para as nossas Forças Armadas.
Congratulo-me pela canonização de Nuno Álvares Pereira e estou certo de que este gesto ficará inscrito na nossa memória colectiva e será motivo de orgulho e de alegria para todos os que amam o nosso País e a sua história.”
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2. D. NUNO ÁLVARES PEREIRA NA CULTURA PORTUGUESA
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Talvez a referência mais antiga a Nuno Álvares Pereira na poesia portuguesa, seja a cantiga que os pobres cantavam à porta do Convento do Carmo, onde ele se havia recolhido. Tal cantiga, recolhida dos manuscritos de Azurara, foi coligida por Teophilo Braga (ii) no seu "Cancioneiro Popular" [2]:

O Gram Condestabre
Em o seu Mosteiro
Dá-nos sua sôpa,
Mail-a sua rôpa,
Mail-o seu dinheiro.

A bênção de Deos
Cahiu na Caldeira
De Nunalves Pereira,
Que abondo cresceu
E todolo deo.

Se comer queredes,
Nom bades alem:
Don menga non tem,
Ahi lo comeredes,
Como lo bedes.”

Camões (iii) , em termos exactos ou simbólicos, de um modo explícito ou implícito, faz referência ao Condestável nada menos que 14 vezes em “Os Lusíadas” [3], chamando-lhe o "forte Nuno" e logo no Canto I, onde indica o assunto global da obra, na 12ª estrofe, evoca a figura de São Nuno, ao dizer:

“Por estes vos darei um Nuno fero,
Que fez ao Rei o ao Reino tal serviço,
…………………………………………………………”

No Canto IV, Vasco da Gama prossegue a narrativa da História de Portugal ao rei de Melinde, iniciada no Canto III, narrando agora a história da 2.ª Dinastia, começando pela a revolução de 1383-85, incidindo fundamentalmente na figura de Nuno Álvares Pereira e na Batalha de Aljubarrota. Na estrofe 30, após o início da batalha é logo destacada a acção de Nun’Álvares:

"Começa-se a travar a incerta guerra;
De ambas partes se move a primeira ala;
Uns leva a defensão da própria terra,
Outros as esperanças de ganhá-la;
Logo o grande Pereira, em quem se encerra
Todo o valor, primeiro se assinala:
Derriba, e encontra, e a terra enfim semeia
Dos que a tanto desejam, sendo alheia.”

e na estrofe 45, Nun’Alvares é reconhecido como o artífice da vitória contra os castelhanos:

"O vencedor Joane esteve os dias
Costumados no campo, em grande glória;
Com ofertas depois, e romarias,
As graças deu a quem lhe deu vitória.
Mas Nuno, que não quer por outras vias
Entre as gentes deixar de si memória
Senão por armas sempre soberanas,
Para as terras se passa Transtaganas.”

No Canto VIII, Paulo da Gama explica ao Catual o significado dos símbolos das bandeiras portuguesas, contando-lhe episódios da História de Portugal nelas representados. E na estrofe 32 diz:

"Se quem com tanto esforço em Deus se atreve,
Ouvir quiseres como se nomeia,
Português Cipião chamar-se deve;
Mas mais de Dom Nuno Alvares se arreia:
Ditosa pátria que tal filho teve!
Mas antes pai, que enquanto o Sol rodeia
Este globo de Ceres e Netuno,
Sempre suspirará por tal aluno.”

De acordo com o Professor Doutor Márcio Moniz [5]: ”Nuno Álvares Pereira recebe por parte de Camões a consideração dada aos grandes heróis da pátria. Na condição de artífice da vitória na Batalha de Aljubarrota, que impediu a dominação castelhana durante a crise de 1383-1385, o Condestável terá um espaço, em termos de quantidade de estâncias ou oitavas do poema, que poucas personagens terão. Além disso, o poeta concede-lhe a voz narrativa num discurso feito durante a reunião do Conselho Real, em Abrantes, para decidir sobre a batalha, cuja força retórica só se assemelha à fala de outras importantes personagens do poema, como o Velho do Restelo, Inês de Castro e o Gigante Adamastor.” Para aquele Professor de Literatura: “Os adjectivos com que o poeta qualificará a pessoa e as acções do herói também são representativos da deferência que lhe tem Camões. Nuno Álvares Pereira é forte, feroz, leal, verdadeiro, grande, valoroso, entre outros adjectivos que lhes ressaltam as qualidades físicas, morais e éticas. Ou seja, toda a descrição busca qualificá-lo como figura central e responsável não só pela vitória na Batalha de Aljubarrota, mas também pela construção e afirmação da liberdade do reino, governado por um novo rei, alçado ao trono por uma nova dinastia, a de Avis.”
Outros poetas escreveram sobre Nuno Álvares Pereira. Em 12 de Dezembro de 1928, Fernando Pessoa (iv) , escreveu o poema:

“NUN’ÁLVARES PEREIRA

Que auréola te cerca?
é a espada que, volteando,
Faz que o ar alto perca
Seu azul negro e brando.

Mas que espada é que, erguida,
Faz esse halo no céu?
É Excalibur (v) , a ungida,
Que o Rei Artur te deu.

Esperança consumada,
S. Portugal em ser, (vi) 
Ergue a luz da tua espada
Para a estrada se ver.(vii)"

Este poema seria integrado na “Mensagem” [7], que como nos diz António Quadros no seu artigo “O título da mensagem” in [6] é “um livro hermético, com uma mensagem oculta, que ao ser recebida inicia o recipiente nos mistérios que ela própria contém”. Em “Nun’Alvares Pereira”, poema estruturado em três estrofes (quadras), à maneira de diálogo, o poeta dirige-se a D. Nuno, a quem em cada estrofe formula uma pergunta, apresentando de seguida uma resposta. D. Nuno Álvares Pereira fora beatificado em 23 de Janeiro de 1918 pelo Papa Bento XV e apesar de canonicamente ter sido apenas beatificado, a crença popular considera-o Santo (Santo Condestável) celebrando a sua festa religiosa a 6 de Novembro. Na primeira estrofe do poema, o poeta aponta a santidade de Nun’Álvares e associa heroísmo e santidade. Na segunda estrofe, a espada de Nun’Álvares é celebrada como um instrumento de força duplamente material e espiritual, que não é uma simples arma de Guerra, mas aquela que foi abençoada por Deus, tal como a “Excalibur” do Rei Artur. Esta referência a “Excalibur” permite inferir metonimicamente a herança inglesa na História de Portugal e implicitamente o Santo Graal.
Pessoa na “Mensagem” e Camões em “Os Lusíadas” cantam Portugal e em particular Nun’Alvares, mas de um modo bastante diferente. Camões canta o início do império real, através da narração e da descrição, valorizando o passado e o nacionalismo. Por sua vez, Pessoa canta o fim do império português, duma forma abstracta e interpretativa, exaltando o futuro ao cantar um Portugal que há-de voltar a ser glorioso (o do Quinto Império), bem como o nacionalismo universalista.
Outros poetas como Guerra Junqueiro, Corrêa d'Oliveira, Afonso Lopes Vieira, Augusto Casimiro, Fernando Pessoa, Mário Beirão, Miguel Torga, Couto Viana, Moreira das Neves, etc, cantaram igualmente Nun’Alvares.
Para além da poesia, a bibliografia acerca de Nuno Álvares Pereira, aproxima-se do milhar de títulos, número que inclui crónicas, livros de História, artigos de jornais e revistas, biografias, hagiografias, etc. Por ordem cronológica merece a pena destacar a seguinte bibliografia:
1. LOPES, Fernão. Chronica de El-Rei D. João I. Escriptorio. Lisboa, 1897-1898 (7 vol).
2. ANÓNIMO. Crónica do Condestabre de Portugal de Dom Nuno Alvarez Pereira, do século XV. Edição F. França Amado. Coimbra, 1911.
3. MARTINS, J. P. Oliveira. A Vida de Nun'Alvares, Lisboa, 1893.
4. CARDOSO, Elias. A Bibliografia Condestabriana. Instituto Carmelitarum. Roma, 1958.
5. ALMEIDA, Fortunato. História da Igreja em Portugal. Livraria Civilização, Porto, 2000 (4 volumes).
Nuno Álvares Pereira motivou “(…) também músicos, que produziram variedade de cânticos e de hinos (Manuel Nunes Formigão, Venceslau Pinto, Inácio Aldossoro, M. Pacheco, Luiz Gonzaga Mariz, José Ferreira...) desde as remotas chacóinas ou músicas com que os habitantes da zona saloia de Lisboa abrilhantavam as suas peregrinações ao túmulo do Conde Santo na Igreja do Convento do Carmo”. [4]
Passemos agora à iconografia de D. Nuno Álvares Pereira. Segundo D. Carlos Azevedo, Bispo Auxiliar de Lisboa [1]: “As descrições fisionómicas de Nuno de Santa Maria, referidas pelos cronistas carmelitas, apontam como características principais do seu rosto: comprimido e branco, nariz afilado, olhos pequenos e vivos, sobrancelhas arqueadas, rugas na testa, boca pequena, cabelo e barba ruivos, sendo esta pouco densa e caída.” Segundo o Prelado: “Quando se trata de iconografia de santos, a primeira questão é saber se há “verdadeira efígie”. Ora, para São Nuno de Santa Maria é considerado um retrato do século XV, no espaldar da sacristia do Convento do Carmo de Lisboa, de meio-corpo e vestido como donato carmelita (meio-irmão). Este quadro ardeu no terramoto de 1755, mas conservam-se muitas figurações semelhantes”. No artigo citado é dada a conhecer vasta iconografia do Condestável, representando-o como donato carmelita e em veste de guerreiro. Da iconografia referida, salientamos alguma que nos parece merecer destaque:
- Pintura seiscentista sobre tábua (Moura);
- Xilogravura da “Crónica do Condestabre”, da edição de Germão Galhardo (1526);
- Azulejos setecentistas da Igreja de Nossa Senhora da Orada, em Sousel;
- Estátua do escultor Vítor Bastos (1873) no Grupo Escultórico do Arco da Rua Augusta, em Lisboa;
- Desenho de António Carneiro (1927) conservado no Museu de Amarante;
- Estátua de Leopoldo de Almeida (1966), frente ao Mosteiro da Batalha.
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3. D. NUNO ÁLVARES PEREIRA NA FILATELIA PORTUGUESA
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Os Correios de Portugal associaram-se à Canonização do Beato Nuno de Santa Maria, emitindo um selo (Fig. 1) cujo design é do Atelier Acácio Santos/Túlio Coelho, a partir de foto de retrato de D. Nuno Álvares Pereira, óleo sobre tela, de autor português desconhecido, do século XVI, pertencente a colecção particular. Os selos com 40x30,6 mm foram impressos a off-set em folhas de 50 sobre papel de 102g/m2, com denteado 13 x Cruz de Cristo. A tiragem foi de 330.000 exemplares. Foi igualmente emitido um sobrescrito de 1º dia, formato C6 e uma pagela cujo texto é subscrito pelo Cardeal D. José Saraiva Martins. Houve obliterações de 1º dia em Lisboa (Fig. 2), Porto, Funchal e Ponta Delgada.

Fig. 1
Fig. 2
Julgamos ter interesse destacar aqui algumas peças filatélicas centradas na figura do Herói e Santo. Assim:
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Fig. 3 - D. NUNO ÁLVARES PEREIRA NA BATALHA DOS ATOLEIROS - Postal máximo realizado com selo da taxa de 5 C, utilizada como taxa complementar, reproduzindo desenho de Alfredo Roque Gameiro baseado na imaginação do artista e gravura da firma Thomas de La Rue (Londres). Selo emitido em 1928 para comemorar a Independência de Portugal (3ª Emissão). Postal editado por A.F. (António Furtado), reproduzindo o desenho utilizado no fabrico do selo. Obliteração ordinária de 27.11.1928 (1º dia de circulação do selo), de LISBOA CENTRAL/3ª SECÇÃO, capital do Reino, de onde o Condestável D. Nuno Alvares Pereira partiu para a Batalha dos Atoleiros, que se travou a 6 de Abril de 1384, a meia légua de Fronteira, entre o exército português sob o seu comando e o exército castelhano, comandado pelo seu irmão, D. Pedro Alvares Pereira, Prior do Crato.

Fig. 4 - BATALHA DE ALJUBARROTA - Postal máximo realizado com selo da taxa de 20$00, reproduzindo desenho de Luís Filipe de Abreu, litografado na Imprensa Nacional – Casa da Moeda. Selo emitido em 1985 para comemorar o 6º Centenário da Batalha de Aljubarrota. Postal da “Colecção Lusitana”, reproduzindo aguarela de Alberto de Souza. Obliteração ilustrada concordante de S. JORGE - PORTO DE MÓS, de 14/8/85, comemorativa do 6º Centenário da Batalha de Aljubarrota, travada nesse local no final da tarde de 14 de Agosto de 1385, entre tropas portuguesas comandadas por D. João I de Portugal e por D. Nuno Álvares Pereira, e o exército castelhano de D. João I de Castela. Esta batalha saldou-se por uma derrota definitiva dos castelhanos, o fim da crise de 1383-1385 e a consolidação de D. João I como rei de Portugal, o primeiro da dinastia de Avis.

 Fig. 5
Fig. 6
Fig 5. e Fig 6. NUN’ALVARES NA HORA DE VALVERDE. Fig. 5 - Exterior de Bilhete-postal de Boas Festas (Nº 30) do serviço nacional, com selo de $25, azul claro do tipo “TUDO PELA NAÇÃO”, da emissão de 1940, com sobrecarga “ISENTO/PORTARIA/10.509” tipo I, da emissão de 1943, redigido a 12 DEZ 44 na Ilha do Sal – Cabo Verde, com marca do dia, de partida, a obliterar o selo (Fig. 5 – metade inferior). À esquerda da marca do dia, a marca “Censurado”, manuscrita a vermelho e logo por baixo, a rubrica do censor militar. Ainda no exterior do bilhete-postal, marca de Passagem de Censura Militar, circular, com 25 mm de diâmetro, batida a violeta e que era aplicada pelo censor militar, sediado na estação dos correios do local de chegada. Nesta marca, as indicações: M.G. (Ministério da Guerra) e C.M.P.T. (Censura Postal Militar Telegráfica), seguida da indicação que o carimbo é de passagem (P) e o censor militar o número 42, o qual rubricou à esquerda da marca do dia. Ilustração de Jaime Martins Barata no interior (Fig. 6 – metade direita): “NUN’ALVARES NA HORA DE VALVERDE”.

Fig. 7 - D. NUNO ÁLVARES PEREIRA - Postal máximo realizado com postal de edição privada, não identificada, reproduzindo gravura em madeira de autor desconhecido, impressa no verso da folha de rosto da "Chronica do Condestabre", de Femão Lopes, editada em Lisboa, em 1526 por Gusmão Galhardo. Selo da taxa de 15 C, utilizada nos impressos internos, reproduzindo a mesma gravura e emitido em 1931 para assinalar o 9° Centenário da Morte de D. Nuno Álvares Alvares Pereira. Obliteração ordinária de 1.11.1931 (1° dia de circulação do selo e data do 5° Centenário da Morte de D. Nuno Alvares Pereira), de dupla elipse de LISBOA CENTRAL/1ª SECÇÃO, cidade que ajudou a defender dos castelhanos na sua qualidade de fronteiro e defensor da Comarca de Entre e Ondiana. Em Lisboa se situa o Convento de Santo Maria do Carmo, onde o Condestável depois de ter posto termo à carreira militar, professou ordens monásticas em 1.4.1931 e viria a morrer em 1.11.1431.
Fig. 8 - D. NUNO ÁLVARES PEREIRA - Bilhete-postal do serviço nacional, com selo de 25 C, rosa-carmim, da emissão “Lusíadas”, de 1934. Composição da chapa com grafia “Enderêço” e selo 28 mm acima da 1ª linha da direcção. Tiragem em cartolina camurça. Utilização no serviço internacional com recurso a par de selos comemorativos, de 15 C, do 9° Centenário da Morte de D. Nuno Álvares Alvares Pereira, de 10 C de Padrões da Grande Guerra e de 40 C da emissão Lusíadas, como complemento de porte de 1$00, o qual foi excedido em 5 C. Expedido a 22-8-34 de PORTO CENTRAL / 3ª SECÇÃO para BUDAPEST. Circulação durante o chamado “Período de recurso”.

Fig. 9 - D. NUNO ÁLVARES PEREIRA - PATRONO DA INFANTARIA - Bilhete-postal comemorativo, de taxa paga, válido para o serviço nacional. Design do atelier Acácio Santos/Túlio Coelho. Porte de 0,32 € do serviço nacional e prémio de registo simples de 1,30 €. Obliteração comemorativa ilustrada de MAFRA, de 14-8-2009, primeiro dia de circulação do Bilhete-postal. Expedido de Mafra para a Amadora.
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(i) - Do latim: “Sic itur ad astra” – alusão à subida ao céu, típica dos heróis.
(ii) - Joaquim Teophilo Fernandes Braga (1843-1924), poeta, historiador da literatura, ensaísta e político português.
(iii) - Luís Vaz de Camões (c. 1524 - 1580), considerado como o maior poeta de língua portuguesa.
(iv) - Fernando Pessoa (1888-1935), poeta e escritor português, considerado um dos maiores poetas da Língua Portuguesa, com valor comparado ao de Camões.
(v) - “Excalibur” é a fabulosa espada do Rei Artur, figura lendária britânica que de acordo com o folclore e literatura medievais, teria comandado a defesa contra os invasores saxões aportados à Grã-Bretanha no início do século VI. A existência histórica do Rei Artur é contestada por historiadores modernos e diversas fontes apontam a escassez dos seus antecedentes históricos. As lendas sobre o Rei Artur apresentam duas versões distintas sobre a origem de “Excalibur”:
- O “Ciclo do Lancelote-Graal”, importante fonte literária de lendas arturianas, escrita originalmente em francês nos anos 1210-1220 e que consta de uma série de cinco volumes em prosa, que relatam a história da demanda do Santo Graal e o romance entre o cavaleiro Lancelote e a rainha Genebra. Segundo o “Ciclo do Lancelote-Graal”, ”Excalibur” seria a espada presa na pedra.
 - O “Ciclo do Pseudo-Boron”, relevante conjunto de textos literários medievais sobre as lendas arturianas, escrito originalmente em francês nos anos 1230-1240, consiste numa modificação do “Ciclo do Lancelote-Graal”. O material do livro de Lancelote, que descreve o romance considerado pecaminoso entre Lancelote e a rainha Genebra, foi em grande parte omitido. Em contrapartida, é dada mais ênfase ao livro da Demanda do Santo Graal e aos aspectos cristãos da história. Segundo o “Ciclo do Pseudo-Boron”, a espada foi oferecida a Artur pela Dama do Lago, por intercessão de Merlin, seu conselheiro druida e havia sido forjada por um duende ferreiro.
A palavra “Excalibur”, deriva aparentemente do galês “Caledfwlch”, que combina os elementos “caled!” (batalha dura), e “bwlch” ( brecha, lacuna, entalhe). Na sua obra, Historia Regum Britanniae, Geoffrey de Monmouth, terá no século XII latinizado a palavra “Caledfwlch” para “Caliburnus”. A maioria dos celticistas considera o termo “Caliburnus” de Geoffrey como derivado dum antigo texto galês perdido, no qual “bwlch” ainda não tinha sido latinizado para “fwlch”. Nas fontes francesas antigas este tornou-se então “Escalibor”, “Excaliboor” e, finalmente, o familiar “Excalibur”.
Segundo as lendas, “Excalibur” seria uma espada mágica, inquebrável e que tornava o seu portador quase invencível, uma vez que lesões com perdas de sangue, não o matariam, já que as feridas recebidas não sangrariam em pleno.
(vi) - Através duma metonímia e duma metáfora, D. Nuno é transformado pelo poeta em “São Portugal em ser“, personificando assim o que há de místico em Portugal.
(vii) - Em jeito de prece, o poeta suplica ao beato que nos ilumine com a sua luz para que encontremos o caminho da pátria, isto é, a grandeza de Portugal.
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BIBLIOGRAFIA
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[1] - AZEVEDO, D. Carlos (Bispo Auxiliar de Lisboa). Iconografia do Santo Condestável. [http://condestabre.blogspot.com/2009/04/iconografia-do-santo-condestavel-por-d.html] – 6-12-2009.
[2] - BRAGA, Theophilo. Cancioneiro Popular, vol. 3. Imprensa da Universidade. Coimbra, 1867.
[3] - CAMÕES, Luís. Os Lusíadas. Instituto Camões. Lisboa, 2002.
[4] - GOMES, Pinharanda. S. Nuno de Santa Maria – Nuno Álvares Pereira. Antologia de documentos e estudos sobre a sua espiritualidade. Editora Zéfiro. Sintra, 2009.
[5] - MONIZ, Márcio Ricardo Coelho. A Figura do Santo Condestável em “Os Lusíadas”. [http://www.zenit.org/article-20700?l=portuguese] – 6-12-2009.
[6] - PESSOA, Fernando. Mensagem, Edição Crítica de José Augusto Seabra, Fundação Engº António Almeida. Lisboa, 1993.
[7] - PESSOA, Fernando. Mensagem. Lisboa: Parceria António Maria Pereira. Lisboa, 1934.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

A candeia na literatura oral


INTERIOR - COZINHA COM VELHA E CÃO (1909) - Alfredo Roque Gameiro (1964-1935). Aguarela
sobre papel (54 x 73 cm). Colecção particular. São visíveis duas candeias: uma à esquerda
da estanheira e outra na chaminé, à direita.

A candeia (do latim “candela”) era um utensílio doméstico rústico usado na iluminação, ainda em meados do século passado. É constituído por um recipiente, geralmente em barro, ferro ou folha-de-flandres com um bico, por onde sai uma torcida (pavio) alimentada pelo óleo combustível contido no recipiente, o qual possui ainda um gancho para suspensão nas paredes.
As primeiras candeias terão surgido no neolítico [8]. O material com que foram manufacturadas e os óleos combustíveis estiveram sempre em relação directa com o meio, assim como a sua forma e tipologia procuraram dar resposta às necessidades dos utilizadores [9].
Existem referências bíblicas à utilização da candeia, como por exemplo:
- “E disse-lhes: Vem porventura a candeia para se meter debaixo do alqueire, ou debaixo da cama? não vem antes para se colocar no velador?” (Marcos 4:21)
É abundante o adagiário português referente à candeia:

- “A alegria que se esconde é candeia apagada.“
- “A candeia a espirrar, e as nuvens a chorar.“
- “A candeia que vai à frente alumia duas vezes.“
- “A candeia que vai à frente é a primeira que alumia.“
- “A candeia que vai à frente é a que alumia melhor.“
- “A candeia, debaixo do alqueire, não comunica a sua luz.“
- “À luz da candeia faz tua meia.“
- “À luz da candeia, não há mulher feia.“
- “À luz da candeia, nem mulher nem teia.“
- “A mulher e a seda, de noite à candeia.“[2]
- “Abafou-me na almotolia, de noite, a candeia.“
- “Alegria certa, candeia morta.“
- “Alegria secreta, candeia morta.“
- “Candeia que vai à frente, alumia duas vezes.“
- “Candeia que vai adiante, alumia duas vezes.“
- “Casa sem homem, nem a candeia dá luz.“
- “Da pequena candeia, grande fogueira“. [2]
- “De pequena candeia, grande fogueira.“
- “Meia vida é a candeia, e o vinho é outra meia.“ [2]
 - “Meia vida é a candeia.“
- “Não há santidade sem candeia.“ [2]
- “Nem bois à noite, nem mulher à candeia.“
- “Nem mulher nem teia, à luz da candeia.“
- “O ignorante e a candeia, a si queima e a outros alumeia.“
- “O ignorante e a candeia, a uns queima e a outros alumeia.“
- “O ouro, a donzela e a teia, à candeia.“
- “O que se vê não precisa candeia.“
- “O trigo e a teia, à candeia.“ [2]

O cancioneiro popular também assinala a presença da candeia, uma vezes em termos da sua utilização:

“Candeias tenho no monte,
candeias na aldeia tenho,
candeias tenho defronte,
com candeias vou e venho." [6]

“Esta casa está bem feita,
E a madeira bem polida.
A candeia por estar alta,
A dona por ser bonita.“ [1]
         (Quintos)

“Aqui dentro d’esta casa
‘Stá uma candeia accêsa.
Quanto dás a quem a apague
Com dois beijos á franceza?” [5]

Porém, outras vezes é referida em termos da sua não utilização:

“Quem quiser ôvir cantar,
Vá ás grades da cadeia,
Ovirá cantar os presos,
Ás escuras, sem candeia.“ [5]

A candeia é ainda referida em contexto de paixão amorosa:

“Meu coração é candeia,
Azeite o teu coração,
os teus olhos são torcidas
que nunca criam morrão.“ [6]

“A candeia por estar alta,
não deixa de alumiar,
meu amor por estar lá longe
não deixa de m’alembrar.“ [6]

“Dei um nó na fita verde,
desatei-o à candeia,
já hoje vi meu amor,
já posso passar sem ceia." [6]

Existem múltiplas superstições populares relativas à candeia:

- “É mau agoiro estalar três vezes a luz do azeite.” [3]
- ”Quando a candeia espirra, ou lume estala, é sinal de presente em casa.” [3]
- “Afirma-se em Óbidos que quando cai o morrão da candeia é sinal de presente. Semelhante superstição existe em Cinfães, onde, no entanto, se acrescenta que se se falar nisso o presente já não vem".” [8]
- “O morrão da candeia pode ainda anunciar outros acontecimentos: quando está muito grosso e florido, haverá cadeias para os donos da casa (Carviçais, Moncorvo); quando cheira mal, morre gente dentro em breve (idem).” [8]
- “Não se devem apagar os morrões, que caem acesos no chão, porque estão alumiando as almas do purgatório.” [3]
- “Se a candeia cai e entorna o azeite, é agoiro de coisa má, como igualmente dá azar despedir-se alguém de uma pessoa beijando-a com luz na mão: geralmente morre a mais velha (Lisboa). Não é bom pôr a luz acesa (candeia, candeeiro) no chão; afirma-se em Lisboa que breve entrará a Justiça nessa casa.” [8]
- “Quando uma pessoa se vai deitar, não deve pôr a luz no chão, porque aparecem as almas.” [3]
- “Por toda a Estremadura se diz que não é bom beber vinho à noite com luz na mão. Em Carviçais, Moncorvo, especifica-se que quem o fizer perderá o juízo.” [8]

Também são conhecidas algumas imagens metafóricas, usadas na gíria portuguesa:

“Estar com a candeia na mão = Estar a morrer”
“Estar com a candeia às avessas = Estar zangado”

É de resto conhecida uma lengalenga que fala de candeias:

As refeições

“Que é o almoço?
Cascas de tremoço.
Que é o jantar?
Bordas de alguidar.
Que é a ceia?
Morrões de candeia.”

A vastidão desta recolha em relação a um tema tão restrito como é a “candeia” é por si só revelador da riqueza da nossa literatura oral, um filão com potencial que urge explorar, abem da nossa cultura popular.

Publicado inicialmente em 12 de Outubro de 2010

[1] – DELGADO, Manuel Joaquim Delgado. Subsídio para o Cancioneiro Popular do Baixo Alentejo. Vol. I. Instituto Nacional de Investigação Científica. Lisboa, 1980.
[2] – DELICADO, António. Adagios portuguezes reduzidos a lugares communs / pello lecenciado Antonio Delicado, Prior da Parrochial Igreja de Nossa Senhora da charidade, termo da cidade de Euora. Officina de Domingos Lopes Rosa. Lisboa, 1651.
[3] - PEDROSO, Consiglieri. Contribuições para uma Mitologia Popular Portuguesa e Outros Escritos Etnográficos. Publicações D. Quixote. Lisboa, 1988.
[4] – PEIXOTO, Rocha. ETHNOGRAPHIA PORTUGUESA/ILLUMINAÇÃO POPULAR. Imprensa Portuguesa. Porto, 1905.
[5] - PIRES, A. Thomaz. Cantos Populares Portugueses, vol. IV. Typographia e Stereotypia Progresso. Elvas, 1910.
[6] - SANTOS, Victor. Cancioneiro Alentejano – Poesia Popular. Livraria Portugal, Lisboa, 1959.
[7] - VASCONCELLOS, J. Leite de. Cancioneiro Popular Português. Volume III. Acta Universitatis Conimbrigensis. Coimbra,1983.
[8] - VASCONCELLOS, J. Leite de. Etnografia Portuguesa. Volume V. Imprensa Nacional-Casa da Moeda. Lisboa, 1982.
[9] - VASCONCELLOS, J. Leite de. As Religiões da Lusitânia. Volume I. Imprensa Nacional, 1897.

LAREIRA-ESTREMOZ - Bilhete-postal ilustrado da 3ª Série de
"A EDITORA", reproduzindo desenho a tinta da China aguarelada
de Alberto de Souza (1880-1961), executado no início do século XX.
À esquerda, junto à cortina, está uma candeia suspensa da chaminé.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

A bandeira nacional


PORTUGAL NA GUERRA - Bilhete-postal ilustrado com aguarela de
Alfredo Roque Gameiro (1864-1935). Edição da firma Paulo Guedes
e Saraiva,de Lisboa (1921). Selado na Casa da Moeda com selo
impresso de 6 C, rosa escuro, tipo Ceres.

O modelo da actual Bandeira Nacional, símbolo da soberania da República, da independência, da unidade e integridade de Portugal é o adoptado pela República instaurada pela Revolução de 5 de Outubro de 1910.
Foi aprovado por decreto da Assembleia Nacional Constituinte datado de 19 de Junho de 1911, publicado no Diário do Governo n.º 141 de 20 do mesmo mês, após ser seleccionado, entre várias propostas, o duma comissão cujos membros incluíam Columbano Bordalo Pinheiro, João Chagas e Abel Botelho.
O teor do decreto então aprovado é o seguinte:
"1.º A Bandeira Nacional é bipartida verticalmente em duas côres fundamentaes, verde escuro e escarlate, ficando o verde do lado da tralha. Ao centro, e sobreposto à união das duas côres, terá o escudo das Armas Nacionaes, orlado de branco e assentando sobre a esfera armilar manuelina, em amarello e avivada de negro. As dimensões e mais pormenores de desenho, especialização e decoração da bandeira são os do parecer da commissão nomeada por decreto de 15 de Outubro de 1910, que serão immediatamente publicados no Diário do Govêrno.
2.º O hymno nacional é A Portuguesa”.
Este decreto teve a sua regulamentação adequada, publicada no Diário do Governo n.º 150 (decreto de 30 de Junho de 1911), a qual veio dispor que:
"Em cumprimento do decreto da Assembleia Nacional Constituinte, de 19 do corrente mês de junho, se publica, para ter a devida execução, o seguinte:
Artigo l.º A Bandeira Nacional é bi-partida verticalmente em duas cores fundamentaes, verde-escuro e escarlate, ficando o verde do lado da tralha. Ao centro, e sobrepoato á união das duas côres, terá o escudo das Armas Nacionaes, orlado dó branco e assentando sobre a esfera armillar manuelina, em amarello e avivada de negro.
Art. 2.° O comprimento da bandeira será de vez e meia a altura da tralha. A divisória entre as duas cores fundamentaes deve ser feita do modo que fiquem dois quintos do comprimento total occupados pelo verde, e os três quintos restantes pelo vermelho, O emblema central occupará metade da altura da tralha, ficando equidistante das orlas superior e inferior.
Art. 3.° Nas bandeiras das differentes unidades militares, que serão talhadas em seda, a esfera armillar, em ouro, será rodeada por duas vergonteas de loureiro, tambem em ouro, cujas hastes se cruzam na parte inferior da esfera, ligados por lanço branco, onde, como legenda immortal, se inscreverá o verso camoneano: Esta é a ditosa pátria minha amada.
Altura d’esta bandeira — 1m,20.
Comprimento — 1m,30.
Diâmetro exterior da esfera — 0m,40.
Distancia entre o diâmetro da esfera e a orla superior da bandeira — 0m,35.
Distancia entro o diâmetro da esfera e a orla inferior da bandeira — 0m,45.
Art. 4.° A orla do jack será verde e do largura iguala um oitavo da tralha. O escudo e a esfera armillar assentarão sobro o pano central, escarlate, ficando equidistante das orlas superior e inferior. A altura do emblema central será de três sétimos da tralha. O comprimento do jack será igual ao da tralha. As flâmulas ser5o verdes e vermelhas.
Art. 5.° Nos sellos, moedas e mais emblemas officiaes, a esfera armilar será sempre rodeada pelas duas vergonteas de louro, com as hastes ligadas por um laço, conforme o desenho adoptado para as bandeiras regimentaes.”
Como a legislação sobre o uso da bandeira se encontrava dispersa e incompleta, mais recentemente o Decreto-lei n.º 150/87 de 30 de Março veio estabelecer as regras sobre as quais se rege o uso da bandeira.

Modelo da actual Bandeira Nacional.

A Bandeira de Portugal tem um significado republicano e nacionalista. Na perspectiva da Comissão encarregada da sua criação, podemos sistematizar, de uma forma simplificada, o simbolismo dos vários elementos da bandeira:

Publicado inicialmente em 7 de Outubro de 2010.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

A Portuguesa

Por ocasião do Ultimato Inglês de 1890, Henrique Lopes de Mendonça (1856-1931)  escreveu, com música de Alfredo Keil (1850-1907), “A Portuguesa”, marcha fremente e empolgante, de intensa expressão patriótica que se tornou um sucesso e se popularizou em todo o país, por interpretar fielmente o sentimento patriótico de revolta contra o ultimato que a Inglaterra, em termos altivos e vexatórios, impusera a Portugal.

Versão inicial da letra e música de “A Portugueza”.

De salientar que a proclamação "contra os canhões, marchar, marchar", presente no refrão, é uma versão rectificada da letra original na qual se apregoava "contra os bretões, marchar, marchar", uma vez que o hino tinha sido produzido para reagir ao ultraje inglês.
Todavia, a marcha que fora concebida para unir os portugueses em torno de um sentimento comum, foi cantada pelos revolucionários de 31 de Janeiro de 1891, pelo que a partir daí a Monarquia proibiu a sua execução em actos oficiais e solenes.

31 de Janeiro, proclamação da República no Porto - 1891. A PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA
DAS JANELLAS DA CAMARA MUNICIPAL. Gravura de Bertrand Dete in in A Ilustração,
Paris 1891, vol. 3, p. 73.

Quando da implantação da República em 1910 "A Portuguesa" emerge espontaneamente de novo, sendo tocada e cantada nas ruas de Lisboa, tornando-se na sua versão completa, um consagrado símbolo nacional. A Assembleia Constituinte de 19 de Junho de 1911, que aprovou a Bandeira Nacional, proclamou "A Portuguesa" como Hino Nacional.

 Versão actual da letra e música de “A Portuguesa”.

Em 1956, constatando-se a existência de algumas variantes do Hino, não só em termos melódicos como nas instrumentações, especialmente para banda, o Governo nomeou uma comissão encarregada de estudar a versão oficial de "A Portuguesa", a qual elaborou uma proposta que seria aprovada através da resolução do Conselho de Ministros publicada no Diário do Governo, 1ª série, nº 199, de 4-9-1957. Esta versão oficial é a que está actualmente em vigor. A letra foi simplificada, tendo sido elaborada a versão para grande orquestra sinfónica, da autoria de Frederico de Freitas, e, a partir desta, a versão para grande banda marcial, pelo major Lourenço Alves Ribeiro.

Publicado em 6 de Outubro de 2010

domingo, 3 de outubro de 2010

A revolução do 5 de Outubro de 1910 e a mudança de paradigma


Fig. 1 - Proclamação da República Portuguesa. Estampa de autor desconhecido 1910.

O derrube da Monarquia a 5 de Outubro de 1910 foi fruto da acção doutrinária e política do Partido Republicano Português, criado em 1876 e cujo objectivo essencial foi desde o princípio, a substituição do regime.
As questões ideológicas não eram primordiais na estratégia dos republicanos, uma vez que para a maioria dos seus simpatizantes, bastava ser contra a Monarquia, a Igreja e a corrupção política dos partidos tradicionais.
Determinados eventos como as Comemorações do Tri-Centenário da Morte de Camões (1880) (Fig. 2) e o Ultimatum inglês (1890) (fig.3) foram aproveitados pela propaganda republicana, que se procurou identificar com os sentimentos nacionais e as aspirações das massas populares. O Partido Republicano alcançou então enorme popularidade.
Na noite de 3 para 4 de Outubro de 1910, eclodiu em Lisboa um Movimento Revolucionário, impulsionado pelo Partido Republicano e apoiado pela Marinha de Guerra e por forças do Exército. Após dois dias de combate (Fig.4 a fig.19), o Movimento Revolucionário triunfa devido à incapacidade de resposta do Governo, que não conseguiu reunir tropas que dominassem os cerca de duzentos revolucionários que na Rotunda resistiam de armas na mão. Ao Governo monárquico não resta outra saída senão demitir-se. A família real abandona o país. A República é proclamada na manhã de 5 de Outubro, das janelas da Câmara Municipal de Lisboa (Fig. 20 a fig. 23) e é constituído imediatamente um Governo Provisório (Fig. 25), presidido pelo Dr. Teófilo Braga, que assume como tarefa fundamental uma mudança radical nas instituições vigentes. [1]
Com a queda da Monarquia a 5 de Outubro de 1910, há uma mudança de paradigma. Uma Monarquia com oito séculos é substituída por uma República que tomou o poder nas ruas de Lisboa e depois de o proclamar às varandas da Câmara Municipal, o transmitiu para a província à velocidade do telégrafo.
As instituições e símbolos monárquicos (Rei, Cortes, Bandeira Monárquica e Hino da Carta) são proscritos e substituídos pelas instituições e símbolos republicanos (Presidente da República, Congresso da República, Bandeira Republicana e A Portuguesa), o mesmo se passando com a moeda e as fórmulas de franquia postais.

[1] – De acordo com a Revista “O Occidente”, nº 1144 e 1145 de 20 de Outubro de 1910, era o seguinte, O PROGRAMA Do GOVERNO: “Desenvolver a instrução; assegurar a defeza nacional, procurando colocar Portugal em condições de verdadeiro e sério aliado com a Inglaterra; desenvolver as colónias sob a base do self-gouvernement; conceder plena autonomia ao poder judicial; criar o sufrágio universal e livre, assegurar o crédito público; desenvolver a economia nacional; estabelecer o equilíbrio do orçamento; fazer respeitar todas as liberdades necessarias, expulsar frades e freiras em harmonia com as nossas seculares leis liberaes; instituir a assistencia social, decretar a separação da egreja do estado; remodelar os impostos.”
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Publicado inicialmente a 3 de Outubro de 2010  


Fig. 2 -  Festas do Tri-Centenário da Morte de Camões – Chegada do Cortejo
Cívico à Praça Luís de Camões (Desenho de Casanova -  Revista “O Occidente”,
nº 61 de 8 de Julho de 1880).

Fig. 3 - Manifestação patriótica em Lisboa, de repúdio pelo Ultimatum inglês, junto
ao monumento aos Restauradores (Desenho de L. Freire – Revista “O Occidente”,
nº 399 de 21 de Janeiro de 1890).

Fig. 4 - A Avenida da Liberdade, palco da Revolução (Fotografia reproduzida na Revista
“O Occidente”, nº 1144 e 1145 de 20 de Outubro de 1910).

Fig. 5 - Um aspecto do acampamento revolucionário, no alto da Avenida da Liberdade
(Cliché da “Mala da Europa”, reproduzido na Revista “O Occidente”, nº 1144 e 1145
de 20 de Outubro de 1910).

Fig. 6 - No acampamento revolucionário, o povo armado, nas barricadas que levantou
(Fotografias reproduzidas na Revista “O Occidente”, nº 1144 e 1145 de 20 de Outubro de 1910).

Fig. 7 - O acampamento revolucionário, povo, soldados de Infantaria 16 e Artilharia 1,
fazendo pontarias (Fotografias reproduzidas na Revista “O Occidente”, nº 1144 e 1145
de 20 de Outubro de 1910).

Fig. 8 - Revolucionários do 5 de Outubro entrincheirados na Rotunda (Fotografia de
Anselmo Franco – Arquivo Fotográfico do Arquivo Municipal de Lisboa).

Fig. 9 - No acampamento revolucionário, alguns momentos de armistício (Instantâneos
de Joshua Benoliel, reproduzidos na Revista “O Occidente”, nº 1144 e 1145 de 20 de
Outubro de 1910).

Fig. 10 - Revolucionários triunfantes hasteando a bandeira da República no seu
acampamento na avenida da Liberdade (Fotografia reproduzida na Revista
“O Occidente”, nº 1144 e 1145 de 20 de Outubro de 1910).

Fig. 11 - Revolucionários na Rotunda (Fotografia de Joshua Benoliel – Arquivo PCD).

Fig. 12 - Mulheres presentes nas barricadas da Rotunda (Fotografia de Joshua Benoliel –
- Arquivo PCD).

Fig. 13 - Mulheres presentes nas barricadas da Rotunda (Fotografia de autor não identificado,
provavelmente  Joshua Benoliel).

Fig. 14 - Lado a lado, civis e militares nas barricadas da Rotunda (Fotografia de Joshua
Benoliel – Arquivo PCD).

Fig. 15 - Os marinheiros que desembarcaram dos navios de guerra, passando no Rocio,
dirigem-se para o acampamento da Revolução na Avenida da Liberdade (Fotografia da
Revista “O Occidente”, nº 1144 e 1145 de 20 de Outubro de 1910).

Fig. 16 - Manifestação entusiástica de apoio à revolução republicana por parte de
populares e de soldados da Guarda Fiscal que empunham a bandeira republicana.
(Fotografia de Joshua Benoliel – Arquivo Fotográfico do Arquivo Municipal de Lisboa).

Fig. 17 - O quartel-general dos revolucionários instalado na casa
do Sr. Costa Lopes na Avenida da Liberdade (Fotografia reproduzida
na Revista “O Occidente”, nº 1144 e 1145 de 20 de Outubro de 1910).

Fig. 18 - No Largo das duas Igrejas. Os revolucionários percorrem em trens
as ruas de Lisboa (Fotografia reproduzida na Revista “O Occidente”,
nº 1144 e 1145 de 20 de Outubro de 1910).

Fig. 19 - No Rocio – Os revolucionários saúdam o povo de Lisboa que os aclama
(Fotografia do Estúdio Mário Novais - Arquivo Fotográfico do Arquivo Municipal
de Lisboa).

Fig. 20 - O povo em frente à Câmara Municipal de Lisboa durante a proclamação da
República (Fotografia de Joshua Benoliel – Arquivo Fotográfico do Arquivo Municipal
de Lisboa).

Fig. 21 - O povo em frente à Câmara Municipal de Lisboa aclama a proclamação da
República (Fotografia de Joshua Benoliel – Arquivo Fotográfico do Arquivo Municipal
de Lisboa).

Fig. 22 - O Governador Civil, Eusébio Leão, à varanda da Câmara Municipal de Lisboa, após a proclamação
da República, aconselha comedimento nos ânimos populares (Fotografia de Joshua Benoliel – Arquivo
Fotográfico do Arquivo Municipal de Lisboa).

Fig. 23 - Inocêncio Camacho, à varanda da Câmara Municipal de Lisboa, após a proclamação da República,
lê os nomes dos membros do Governo Provisório (Fotografia de Joshua Benoliel – Arquivo Fotográfico do
Arquivo Municipal de Lisboa).

Fig. 24 - Depois da revolução, recolhendo as armas (Fotografia reproduzida na Revista “O Occidente”,
nº 1144 e 1145 de 20 de Outubro de 1910).


Fig. 25 - Bilhete-postal humorístico da época com o GOVERNO PROVISÓRIO DA REPÚBLICA. Da esquerda
para a direita: BRITO CAMACHO (Ministro do Fomento), AMARO JUSTINIANO DE AZEVEDO GOMES
(MINISTRO DA MARINHA E DO ULTRAMAR), ANTÓNIO JOSÉ DE ALMEIDA (Ministro do Interior), TEÓFILO
BRAGA  (Presidente do Conselho de Ministros), ANTÓNIO XAVIER CORREIA BARRETO (Ministro da Guerra),
BERNARDIM MACHADO (Ministro dos Negócios Estrangeiros), AFONSO COSTA (Ministro da Justiça e Cultos),
JOSÉ RELVAS (Ministro das Finanças).