sexta-feira, 26 de abril de 2024

Poesia portuguesa - 141





Caminhemos serenos

Papiniano Carlos (1918-2012)

Sob as estrelas, sob as bombas,
sob os turvos ódios e injustiças,
no frio corredor de lâminas eriçadas,
no meio do sangue, das lágrimas
caminhemos serenos.

De mãos dadas,
através da última das ignomínias,
sob o negro mar da iniquidade
caminhemos serenos.

Sob a fúria dos ventos desumanos,
sob a treva e os furacões de fogo
aos que nem com a morte podem vencer-nos
caminhemos serenos.

O que nos leva é indestrutível,
a luz que nos guia connosco vai.
E já que o cárcere é pequeno
para o sonho prisioneiro,

já que o cárcere não basta
para a ave inviolável,
que temer, ó minha querida?:
caminhemos serenos.

No pavor da floresta gelada,
através das torturas, através da morte,
em busca do país da aurora,
de mãos dadas, querida, de mãos dadas
caminhemos serenos.

Papiniano Carlos (1918-2012)

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