segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Tempo para falar do tempo


Vénus, Cupido e o Tempo (Alegoria da Luxúria) (1540-1545). Agnolo Bronzino
(1503-1572). Óleo sobre Madeira (147 x 117 cm). National Gallery, London.

A História é um relato crítico dos acontecimentos do passado, no qual o Homem foi o actor principal. Não há História sem Homem, como também não há História, sem espaço e sem tempo, variáveis físicas indispensáveis à caracterização dos cenários onde decorre a acção. A História é assim um fluxo de acontecimentos que se sucedem na teia quadrimensional espaço-temporal, onde estamos inseridos, seja por graça de Deus ou fruto do Big-Bang. Para o caso tanto faz.
Vejamos o que sobre o tempo nos diz a nossa Literatura de Tradição Oral. A nível do Adagiário Português, múltiplas sentenças proclamam que o tempo é algo que flui:
- “O tempo é ligeiro e não há barranco que o detenha.”
- “O tempo que vai não volta.“
- “O que o tempo traz, o tempo leva.“
- “O tempo corre e tudo descobre.“
- “O tempo é o relógio da vida.“
Outros adágios sublinham o valor do tempo:
-“ O tempo não é elástico.“
- “Sem tempo nada se faz.“
- “O tempo é dinheiro.“
Por outro lado, existem também provérbios que nos advertem relativamente à perda de tempo:
– “Quem o tempo sabe poupar, muito tem a ganhar.“
– “O tempo perdido não se recupera “
- “Quem tem tempo e tempo espera, tempo perde.“
Finalmente existem aforismos relativos às mudanças de tempo:
– “Mudam-se os tempos, mudam os pensamentos.“
– “Mudam-se os tempos, mudam as vontades.“
– “Outros tempos, outros costumes.“

A nível de lengalengas, é bem conhecida a seguinte:

O TEMPO

“O tempo pergunta ao tempo
Quanto tempo o tempo tem.
O tempo responde ao tempo
Que o tempo tem tanto tempo
Quanto tempo o tempo tem.”

O tempo mede-se em “horas”, que têm como submúltiplos o “minuto” e o “segundo” e, como múltiplos, o “dia”, a “semana”, o “mês”, o “ano”, o “século” e o “milénio”. Algumas destas unidades de tempo são referidas no Adagário Português:
Minutos
- “Amizade de um dia, recordação de um minuto.”
- “Mais vale ficar vermelho cinco minutos, que amarelo toda a vida.”
- “Mais vale perder um minuto na vida do que a vida num minuto.”
Horas
- “De uma hora para a outra, cai a casa. “
- “Em má hora nasce, quem má fama alcança.”
- “Há horas do Diabo.”
- “Há horas felizes.”
- “Há horas para tudo.”
- “Todos têm a sua hora.”
- “Uma hora melhora outra.”
Dias
- “Ainda não se acabou o dia de hoje.”
- “Amizade de um dia, recordação de um minuto.”
- “Bons dias em Janeiro pagam-se em Fevereiro." “
- “De manhã se faz o dia.”
- “Fevereiro coxo, em seus dias vinte e oito."
- “Há mais dias que linguiças." “
- “Mais criam dias que meses." ““
- “Nada como um dia depois do outro.
- “Não há como um dia depois do outro.”
- “Nem todos os dias há carne gorda."
- “O dia de amanhã, ninguém viu.”
- “Os dias são do mesmo tamanho, mas não se parecem”
- “Quando a fome aperta, os minutos parecem séculos.”
- “Roma e Pavia não se fizeram num dia.”
- “Tudo tem seu dia.”
- “Um hóspede ao cabo de três dias enjoa.”
Semanas
- “A semana do trabalhador tem seis dias, a do preguiçoso seis manhãs.”
- “Não há semana sem quinta-feira.”
- “Quem à semana bem parece, ao domingo aborrece.”
- “Se esta semana é curta, sete dias traz a outra.”
Meses
- “A água falta nos meses, mas nunca falta no ano."
- “De pendão a grão, trinta dias são.”
- “Deixar correr trinta dias por um mês.”
- “Mais criam dias que meses."
- “Todo o mês volta outra vez.”
Anos
- "A água falta nos meses, mas nunca falta no ano."
- "Antes ano tardio do que vazio."
- "Ao ano andar, aos dois falar." “
- “A velhice não está nos anos.”
- “Ao moço e ao galo, um ano.”
- “Atrás de ano, ano vem.”
- “Os anos não perdoam.”
Séculos
- “A História se repete através dos séculos.”
- “De século em século, a História repete-se.”
- “Largos dias têm cem anos.”
- “Quando a fome aperta, os minutos parecem séculos.”

Segundo a Mitologia Popular Portuguesa, o tempo de vida de uma pessoa tem a ver com o dia de nascimento e a sua orientação geográfica ao dormir:
- Quem nasce em dia de Natal, vive muito tempo. [1]
- É bom dormir com a cabeça para o Nascente, porque se vive muito tempo, de acordo com o adágio:
“Cabeça para o Nascente
E pés para o Poente,
Viver eternamente.” [1]
A Mitologia Popular Portuguesa refere-se também à simultaneidade de acontecimentos, a qual pode ser benéfica:
- Se duas pessoas abrirem a boca ao mesmo tempo, hão-de ser compadres ou vizinhos. [1]
Todavia, a simultaneidade de acontecimentos pode ser malévola:
- Se duas ou mais pessoas lavam as mãos ao mesmo tempo na mesma bacia, ou se limpam à mesma toalha, nesse dia jogam à pancada. [1]
- Se dois casamentos se fazem ao mesmo tempo, um deles há-de ser infeliz porque a felicidade foge inteiramente para o outro. [1]
- Se duas pessoas bebem água ao mesmo tempo, uma delas adoece. [1]
- Quando na mesma terra, dois relógios dão horas ao mesmo tempo, é sinal que aí está para morrer alguém. [1]
O tempo é tema central de telas criadas por grandes nomes da pintura universal, dos quais destacamos, agrupados por períodos:
- RENASCENTISMO: Domenico di Michelino (1417-1491), italiano; Agnolo Bronzino (1503-1572), italiano
- MANEIRISMO: Gian Battista Zeloti (c. 1526-1578), italiano;
- BARROCO: Simon Vouet (1590-1649), francês; Pietro Liberi (1605-1687), italiano; Jean-François de Troy (1679-1752), francês; François Lemoyne (1688-1737), francês;
- RÓCÓCÓ: Giovanni Battista Tiepolo (1696-1770), italiano;
- ROMANTISMO: Francisco de Goya y Lucientes (1746-1828), espanhol;
“Porque o tempo gasta tudo” e “Tempo bastante sempre é pouco”, julgo chegado o tempo de dar por terminado este texto..

BIBLIOGRAFIA
[1] - CONSIGLIERI PEDROSO, “Supertições Populares”, O Positivismo: revista de Filosofia, Vol. III. Porto, 1881.

O Triunfo da Fama, o Triunfo do Tempo e o Triunfo da Eternidade. Domenico di Michelino
(1417-1491). Tempera sobre painel em fundo dourado (42 x 177 cm). Colecção privada.

O Tempo, as Virtudes e a Inveja Libertada pelo Diabo (c. 1553). Gian Battista Zeloti (c.1526-1578).
Óleo sobre tela. Palazzo Ducale, Venice. 

O Pai Tempo Dominado pelo Amor, pela Esperança e pela Beleza (1627). Simon Vouet (1590-1649).
Óleo sobre tela (107 x 142 cm). Museo del Prado, Madrid. 

O Tempo Vencido pela Verdade (c. 1665). Pietro Liberi (1605-1687). Óleo sobre tela (114 x 157 cm).
Colecção privada.

Uma Alegoria ao Tempo Revelando a Verdade (1733). Jean-François de Troy (1679-1752).
Óleo sobre tela. National Gallery, London.

O Tempo salvando a Verdade da Falsidade e da Inveja (1737). François Lemoyne (1688-1737).
Óleo sobre tela (149 x 114 cm, alargado para 181 x 148 cm). Wallace Collection, London. 

Uma Alegoria com Vénus e o Tempo (1754-1758). Giovanni Battista Tiepolo
(1696-1770). Óleo sobre tela (292 x 190 cm). National Gallery, London.

O Tempo e as Velhas Mulheres (1810-1812). Francisco de Goya y Lucientes
(1746-1828). Óleo sobre tela (181 x 125 cm). Musée des Beaux-Arts, Lille.

4 comentários:

  1. Muito bom o trabalho sobre o tempo...O tempo que passa tão rápido...que realmente é mesmo importante saber utilizá-lo e rentabilizá-lo...isto parece fácil de dizer!mas na verdade perdemos tanto tempo em futilidades...Mas todos os dizeres sobre o tempo, e as lengas - lengas que se constróiem à volta deste tema é assunto impressionante...como impressionante são as telas desenhadas pelos Pintores que encaravam o tempo como um tema com interesse...um dos quadros que mostra tive a sorte de o fixar quando estive de visita ao Museu do Prado em Madrid,cujo título achei interessante"O Pai Tempo dominado pelo amor,pela esperança e pela beleza..."Quero aida aproveitar este tempo para lhe agradecer este artigo e espero o tempo que for preciso para ler todos os seus trabalhos reunidos e transformados em livro...Um Abraço da Ana Carita.

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  2. Ana.
    Obrigado mais uma vez pelo seu estimulanted comentário.
    Um abraço para si, também.

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  3. .... E ,julgo chegado o tempo de agradecer esta "dádiva" tão cuidadosamente elaborada à volta da "teia quadrimensional espaço-temporal" e as escolhas que fez para abordar a "experiência do existir humano" . É um tema que me fascina e fico à espera que tenha TEMPO para "Etiquetas : Filosofia, Literatura, Poesia..."Peço desculpa pelo atrevimento.
    Conceição

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