domingo, 3 de outubro de 2010

A revolução do 5 de Outubro de 1910 e a mudança de paradigma


Fig. 1 - Proclamação da República Portuguesa. Estampa de autor desconhecido 1910.

O derrube da Monarquia a 5 de Outubro de 1910 foi fruto da acção doutrinária e política do Partido Republicano Português, criado em 1876 e cujo objectivo essencial foi desde o princípio, a substituição do regime.
As questões ideológicas não eram primordiais na estratégia dos republicanos, uma vez que para a maioria dos seus simpatizantes, bastava ser contra a Monarquia, a Igreja e a corrupção política dos partidos tradicionais.
Determinados eventos como as Comemorações do Tri-Centenário da Morte de Camões (1880) (Fig. 2) e o Ultimatum inglês (1890) (fig.3) foram aproveitados pela propaganda republicana, que se procurou identificar com os sentimentos nacionais e as aspirações das massas populares. O Partido Republicano alcançou então enorme popularidade.
Na noite de 3 para 4 de Outubro de 1910, eclodiu em Lisboa um Movimento Revolucionário, impulsionado pelo Partido Republicano e apoiado pela Marinha de Guerra e por forças do Exército. Após dois dias de combate (Fig.4 a fig.19), o Movimento Revolucionário triunfa devido à incapacidade de resposta do Governo, que não conseguiu reunir tropas que dominassem os cerca de duzentos revolucionários que na Rotunda resistiam de armas na mão. Ao Governo monárquico não resta outra saída senão demitir-se. A família real abandona o país. A República é proclamada na manhã de 5 de Outubro, das janelas da Câmara Municipal de Lisboa (Fig. 20 a fig. 23) e é constituído imediatamente um Governo Provisório (Fig. 25), presidido pelo Dr. Teófilo Braga, que assume como tarefa fundamental uma mudança radical nas instituições vigentes. [1]
Com a queda da Monarquia a 5 de Outubro de 1910, há uma mudança de paradigma. Uma Monarquia com oito séculos é substituída por uma República que tomou o poder nas ruas de Lisboa e depois de o proclamar às varandas da Câmara Municipal, o transmitiu para a província à velocidade do telégrafo.
As instituições e símbolos monárquicos (Rei, Cortes, Bandeira Monárquica e Hino da Carta) são proscritos e substituídos pelas instituições e símbolos republicanos (Presidente da República, Congresso da República, Bandeira Republicana e A Portuguesa), o mesmo se passando com a moeda e as fórmulas de franquia postais.

[1] – De acordo com a Revista “O Occidente”, nº 1144 e 1145 de 20 de Outubro de 1910, era o seguinte, O PROGRAMA Do GOVERNO: “Desenvolver a instrução; assegurar a defeza nacional, procurando colocar Portugal em condições de verdadeiro e sério aliado com a Inglaterra; desenvolver as colónias sob a base do self-gouvernement; conceder plena autonomia ao poder judicial; criar o sufrágio universal e livre, assegurar o crédito público; desenvolver a economia nacional; estabelecer o equilíbrio do orçamento; fazer respeitar todas as liberdades necessarias, expulsar frades e freiras em harmonia com as nossas seculares leis liberaes; instituir a assistencia social, decretar a separação da egreja do estado; remodelar os impostos.”
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Publicado inicialmente a 3 de Outubro de 2010  


Fig. 2 -  Festas do Tri-Centenário da Morte de Camões – Chegada do Cortejo
Cívico à Praça Luís de Camões (Desenho de Casanova -  Revista “O Occidente”,
nº 61 de 8 de Julho de 1880).

Fig. 3 - Manifestação patriótica em Lisboa, de repúdio pelo Ultimatum inglês, junto
ao monumento aos Restauradores (Desenho de L. Freire – Revista “O Occidente”,
nº 399 de 21 de Janeiro de 1890).

Fig. 4 - A Avenida da Liberdade, palco da Revolução (Fotografia reproduzida na Revista
“O Occidente”, nº 1144 e 1145 de 20 de Outubro de 1910).

Fig. 5 - Um aspecto do acampamento revolucionário, no alto da Avenida da Liberdade
(Cliché da “Mala da Europa”, reproduzido na Revista “O Occidente”, nº 1144 e 1145
de 20 de Outubro de 1910).

Fig. 6 - No acampamento revolucionário, o povo armado, nas barricadas que levantou
(Fotografias reproduzidas na Revista “O Occidente”, nº 1144 e 1145 de 20 de Outubro de 1910).

Fig. 7 - O acampamento revolucionário, povo, soldados de Infantaria 16 e Artilharia 1,
fazendo pontarias (Fotografias reproduzidas na Revista “O Occidente”, nº 1144 e 1145
de 20 de Outubro de 1910).

Fig. 8 - Revolucionários do 5 de Outubro entrincheirados na Rotunda (Fotografia de
Anselmo Franco – Arquivo Fotográfico do Arquivo Municipal de Lisboa).

Fig. 9 - No acampamento revolucionário, alguns momentos de armistício (Instantâneos
de Joshua Benoliel, reproduzidos na Revista “O Occidente”, nº 1144 e 1145 de 20 de
Outubro de 1910).

Fig. 10 - Revolucionários triunfantes hasteando a bandeira da República no seu
acampamento na avenida da Liberdade (Fotografia reproduzida na Revista
“O Occidente”, nº 1144 e 1145 de 20 de Outubro de 1910).

Fig. 11 - Revolucionários na Rotunda (Fotografia de Joshua Benoliel – Arquivo PCD).

Fig. 12 - Mulheres presentes nas barricadas da Rotunda (Fotografia de Joshua Benoliel –
- Arquivo PCD).

Fig. 13 - Mulheres presentes nas barricadas da Rotunda (Fotografia de autor não identificado,
provavelmente  Joshua Benoliel).

Fig. 14 - Lado a lado, civis e militares nas barricadas da Rotunda (Fotografia de Joshua
Benoliel – Arquivo PCD).

Fig. 15 - Os marinheiros que desembarcaram dos navios de guerra, passando no Rocio,
dirigem-se para o acampamento da Revolução na Avenida da Liberdade (Fotografia da
Revista “O Occidente”, nº 1144 e 1145 de 20 de Outubro de 1910).

Fig. 16 - Manifestação entusiástica de apoio à revolução republicana por parte de
populares e de soldados da Guarda Fiscal que empunham a bandeira republicana.
(Fotografia de Joshua Benoliel – Arquivo Fotográfico do Arquivo Municipal de Lisboa).

Fig. 17 - O quartel-general dos revolucionários instalado na casa
do Sr. Costa Lopes na Avenida da Liberdade (Fotografia reproduzida
na Revista “O Occidente”, nº 1144 e 1145 de 20 de Outubro de 1910).

Fig. 18 - No Largo das duas Igrejas. Os revolucionários percorrem em trens
as ruas de Lisboa (Fotografia reproduzida na Revista “O Occidente”,
nº 1144 e 1145 de 20 de Outubro de 1910).

Fig. 19 - No Rocio – Os revolucionários saúdam o povo de Lisboa que os aclama
(Fotografia do Estúdio Mário Novais - Arquivo Fotográfico do Arquivo Municipal
de Lisboa).

Fig. 20 - O povo em frente à Câmara Municipal de Lisboa durante a proclamação da
República (Fotografia de Joshua Benoliel – Arquivo Fotográfico do Arquivo Municipal
de Lisboa).

Fig. 21 - O povo em frente à Câmara Municipal de Lisboa aclama a proclamação da
República (Fotografia de Joshua Benoliel – Arquivo Fotográfico do Arquivo Municipal
de Lisboa).

Fig. 22 - O Governador Civil, Eusébio Leão, à varanda da Câmara Municipal de Lisboa, após a proclamação
da República, aconselha comedimento nos ânimos populares (Fotografia de Joshua Benoliel – Arquivo
Fotográfico do Arquivo Municipal de Lisboa).

Fig. 23 - Inocêncio Camacho, à varanda da Câmara Municipal de Lisboa, após a proclamação da República,
lê os nomes dos membros do Governo Provisório (Fotografia de Joshua Benoliel – Arquivo Fotográfico do
Arquivo Municipal de Lisboa).

Fig. 24 - Depois da revolução, recolhendo as armas (Fotografia reproduzida na Revista “O Occidente”,
nº 1144 e 1145 de 20 de Outubro de 1910).


Fig. 25 - Bilhete-postal humorístico da época com o GOVERNO PROVISÓRIO DA REPÚBLICA. Da esquerda
para a direita: BRITO CAMACHO (Ministro do Fomento), AMARO JUSTINIANO DE AZEVEDO GOMES
(MINISTRO DA MARINHA E DO ULTRAMAR), ANTÓNIO JOSÉ DE ALMEIDA (Ministro do Interior), TEÓFILO
BRAGA  (Presidente do Conselho de Ministros), ANTÓNIO XAVIER CORREIA BARRETO (Ministro da Guerra),
BERNARDIM MACHADO (Ministro dos Negócios Estrangeiros), AFONSO COSTA (Ministro da Justiça e Cultos),
JOSÉ RELVAS (Ministro das Finanças).

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Irmãs Flores - Bonequeiras de Estremoz

A literatura filatélica

O nosso fado de coleccionadores leva-nos a deambular por aqui e por ali, à procura dum objecto que não encontramos, qual alquimista que procura sem sucesso a pedra filosofal, qual cavaleiro que procura igualmente sem sucesso o Santo Graal, mas não é por isso que deixam de procurar.
Por vezes até encontramos, mas a magreza da carteira não nos permite alimentar veleidades de posse. Resta-nos então a possibilidade de registo com o olhar, qual chapa fotográfica que procura fixar através do brometo, a beleza dum objecto que nos encheu as medidas.
Muitas vezes no regresso do mercado de sábado, marcados pelo sucesso ou insucesso de alguma compra, somos conduzidos sem dar por isso, à oficina-loja das irmãs Flores, duas barristas nossas vizinhas, a quem visitamos amiúde no Largo da República, em Estremoz, fascinados pela magia emergente das suas mãos de barristas populares. Por vezes, quando damos por nós, estamos lá em plena semana, o que tem o triplo significado de que o sábado anterior passou há muito, que o próximo ainda vem longe e de que gostamos muito de falar com elas, enquanto assistimos à gestação e ao nascimento dos bonecos. Poderá, porventura, haver maior felicidade para um coleccionador que a possibilidade de com o olhar, poder ser cúmplice com os criadores no próprio acto de criação?
As irmãs Flores, Maria Inácia e Perpétua, de seus nomes, discípulas de mestra Sabina Santos, com ela aprenderam a nobre arte do barro e com ela aprenderam a respeitar o que de mais genuíno têm os bonecos de Estremoz, no que respeita a modelos e tipos característicos, formas, cores e tintas. Mas, também e simultaneamente criaram novos modelos e apostaram em novos tamanhos, que têm vindo a enriquecer a vastíssima galeria de modelos de bonecos de Estremoz. São de sua criação há muito, bonecos como “Senhora a ler”, “A filatelia”, "A literatura filatélica", “O farmacêutico”, “A gastronomia”, “A florista”, “O acabamento da ceifa”, “Cristo na cruz” ,“Camponês rico“, bem como novos de modelos de presépio. Naturalmente que continuam a executar modelos tradicionais, como “Primaveras”, “O amor é cego”, “Púcaros”, “Cantarinhas”, “Peraltas “, “Cavaleiros”, “Pastores”, “Ceifeiras”, “Negros floristas”, etc., pois a imaginária popular é vasta.
Os bonecos são fabricados por elementos: cabeças, troncos, pernas, braços, que depois são montados de modo a constituir os bonecos. Estes, tal como nós, nascem nus e só depois é que recebem vestidos, capas, safões, cabelos e chapéus. Todas as peças são afeiçoadas à mão, à excepção do rosto dos bonecos, que é feito com moldes e sempre assim foi, devido à dificuldade em o fazer manualmente. As ferramentas que utilizam para trabalhar o barro são a palheta ou teque (de madeira, plástico ou metal, que permite escavar o barro e dar-lhe forma), os furadores (para furar) e o batedor (para estender o barro (embora haja quem o faça com o rolo da maça).
Antes de serem cozidos, os bonecos têm de secar durante vários dias. Depois de cozidos, os bonecos levam um dia para arrefecer. Só então podem ser pintados. Nesta operação são utilizados pincéis finos de várias espessuras e tintas fabricadas com pigmentos minerais: vermelhão (vermelho), almagre (vermelho escuro), zarcão (cor de laranja), terra de sena (castanho), verde bandeira (verde), azul do ultramar (azul), alvaiade (branco) e pó de sapato (preto). As tintas são feitas misturando os pigmentos com água e cola de madeira, um pouco a olho, mas na quantidade adequada para que a tinta agarre bem ao barro e não salte quando se lhe põe verniz, uma vez que depois da pintura estar seca (o que é rápido), os bonecos são envernizados para fixar a tinta.
As irmãs Flores são continuadoras da arte das “boniqueiras”, mulheres referidas em acta do Município de Estremoz de 10 de Outubro de 1770, conforme investigação recente de Hugo Guerreiro. Dessas boniqueiras são as peças do século XVIII e século XIX que estão no Museu Municipal Prof. Joaquim Vermelho, em Estremoz.


Pastor a comer as migas

Coqueira

Cozinha dos ganhões

Mulher a fazer chouriços

Castanheira

Mulher a cozinhar
Primavera de arco

Senhora a ler

Lavradeira de Viana do Castelo

domingo, 26 de setembro de 2010

Sermão de Santo António aos peixes

Com que os mudos peixes,
                                       saem ouvindo ao ar aberto.”

                                                         CAMÕES (Écogla 6ª das Rimas Várias)

SERMÃO DE SANTO ANTÓNIO AOS PEIXES (séc. XVIII).
Painel de azulejos da Igreja de Santo António dos Capuchos,
na freguesia de Oliveira do Castelo, em Guimarães.

Quando me vejo aflito, exteriorizo a minha preocupação com um oportuno:
-“Valha-me Santo António!”
O meu desabafo não é, porém, um desabafo isolado e singular. É que Santo António está sempre presente na vida quotidiana do povo, invocado pelos responsos ou orações que lhe são dirigidos ou, presente em imagens que nos rodeiam.
Já no século XVII o padre António Vieira dizia num dos seus famosos sermões [1], que os portugueses para tudo pediam o auxílio de Santo António. Pregava ele: “Se vos adoece o filho, Santo António; se vos foge o escravo, Santo António; se mandais a encomendas, Santo António; se esperais o retorno, Santo António; se aguardais a sentença, Santo António; se perdeis a menor miudeza da vossa casa, Santo António; talvez se quereis os bens da alheia, Santo António.”
-“Valha-me Santo António!”, é por vezes o meu desabafo. E que melhor maneira de Santo António me valer, senão levar-me a escrever sobre ele.
Nascido em Lisboa no dia 15 de Agosto de 1195, a sua intensa vida religiosa e apostólica estará porventura na origem da sua morte, aos 36 anos, a 13 de Junho de 1231, no Convento de Arcella, perto de Pádua. Canonizado em Maio do ano seguinte pelo Papa Gregório IX, foi declarado oficialmente Padroeiro de Portugal em 1932 e proclamado por Pio XII, Doutor da Igreja, em 1946.
Segundo o Papa Leão XIII, Santo António é o Santo de todo o Mundo: “A fama dos seus muitos milagres, tendo-se espalhado por todos os povos, contribui para aumentar o lustre e a glória do nome português e em especial da cidade de Lisboa que o teve por filho” [2].
A circunstância de o seu dia festivo (13 de Junho) coincidir com as festas do Solstício de Verão, fazem com que seja um dos mais populares santos celebrados em Portugal, com permanente presença honrosa na Literatura, na Pintura, na Escultura, Azulejaria, na Música, no Folclore, na Arte Popular e na Filatelia (selos, inteiros e marcas postais).
Dentre as muitas representações possíveis de Santo António, escolhemos para tema deste post, um painel de azulejos do séc. XVIII, da Igreja de Santo António dos Capuchos [3], na freguesia de Oliveira do Castelo em Guimarães, que representa o "Sermão de Santo António aos peixes". Vejamos o que nos diz o Padre António Vieira (1608-1694) no seu “Sermão de Santo António aos peixes” publicado pela primeira vez em 1682:
“Pregava Santo António em Itália, na cidade de Rimini [4], contra os hereges, que nela eram muitos; e como erros de entendimento são dificul¬tosos de arrancar, não só não fazia fruto o Santo, mas chegou o povo a se levantar contra ele, e faltou pouco para que lhe não tirassem a vida. Que faria neste caso o ânimo generoso do grande António? Sacudiria o pó dos sapatos, como Cristo aconselha em outro lugar? Mas António, com os pés descalços, não podia fazer esta protestação; e uns pés, a que se não pegou nada de terra, não tinham que sacudir. Que faria logo? Reti¬rar-se-ia? Calar-se-ia? Dissimularia? Daria tempo ao tempo? Isso ensinaria porventura a prudência ou a covardia humana; mas o zelo da glória divina, que ardia naquele, não se rendeu a semelhantes partidos. Pois que fez? Mudou somente o púlpito e o auditório, mas não desistiu da sua doutrina. Deixa as praças, vai-se às praias; deixa a terra, vai-se ao mar, e começa a dizer a altas vozes: “Já que me não querem ouvir os homens, ouçam-me os peixes! Oh! maravilhas do Altíssimo! Oh! poderes do que criou o mar e a terra! Começam a ferver as ondas, começam a concorrer os peixes, os grandes, os maiores, os pequenos; e, postos todos por sua ordem com as cabeças de fora da água, António pregava, e eles ouviam”.
Diz a lenda que os peixes pequenos se chegavam aos grandes e, sem temor deles, se lhes abrigavam debaixo das barbatanas. É de resto o que nos diz esta quadra popular:

"Santo António Português,
Quando foi pregar ao mar,
Até os peixes na água,
Se puseram a escutar!" [5]

Termino, fazendo votos que este post tenha sido do vosso agrado. Caso contrário terei de dizer com redobrado denodo:

- “Valha-me Santo António!”



[1]-O padre António Vieira pregou dois sermões sobre Santo António: um em Roma, na Igreja dos Portugueses, outro na Baía, na Igreja de Santo António. Vêm ambos na edição dos “Sermões” publicada em Lisboa no ano de 1855.
[2]-Carta de Leão XIII, ao Cardeal Patriarca de Lisboa, de 2 de Maio de 1895.
[3]-O Convento e a Igreja e de Santo António dos Capuchos, localizados na freguesia de Oliveira do Castelo em Guimarães, começaram a ser construídos em 1664 por D. Diogo Lobo da Silveira, Prior da Colegiada e antigo Provedor da Misericórdia. A igreja, entretanto arruinada e demolida, seria reedificada em 1742. Foi, então acrescentado o coro alto e o segundo andar do claustro. Em 1748 foi construída a sacristia e em 1763 foi refeita a fachada da igreja, ao gosto barroco.
[4]-Rimini, cidade do NE de Itália, na região de Emília, província de Forli, situada na costa do Adriático e na foz do Mareccha, a 44º 3’ 43" de latitude Norte. A cidade de Rimini teve origem na antiga Ariminum, fortaleza e posto de grande importância política e militar no período romano. Já na Idade Média, Rimini foi porto de importância e domínio dos Malatesta, senhores cruéis e requintados mecenas. Actualmente é uma das maiores e mais famosas estações balneares de Itália.
[5]-Quadra recolhida por Armando de Mattos (ver Bibliografia).

BIBLIOGRAFIA
- Chagas, M. Pinheiro. Portugueses Ilustres. Porto, 1983.
- Grande Enciclopédia Luso-Brasileira.
- Informações prestadas pela Embaixada de Itália.
- Matos, Hernâni António Carmelo de. Bilhetes-Postais Comemorativos do VII Centenário do Nascimento de Santo António de Lisboa in Catálogo da Inteiromax - Eça de Queiroz 2000, Póvoa de Varzim, Agosto de 2000.
- Mattos, Armando de. Santo António nas Tradições Populares, Porto, 1937.

SANTO ANTÓNIO PREGANDO AOS PEIXES (1ª metade do séc. XVII).
 Painel de azulejos (6 x 5). Fabrico de Lisboa.
Proveniente das Escadinhas do Jogo da Pela, Lisboa.
 Museu Antoniano, Lisboa. 
SANTO ANTÓNIO PREGANDO AOS PEIXES (c. 1725 - 1745).
 Painel de azulejos (111x80 cm).
 Museu Nacional do Azulejo, Lisboa. 
SANTO ANTÓNIO PREGANDO AOS PEIXES (séc. XVIII).
Painel de azulejos da Igreja do Convento dos Capuchos, Lisboa.
SANTO ANTÓNIO PREGANDO AOS PEIXES (séc. XVIII).
Painel de azulejos da Igreja do Convento dos Capuchos, Lisboa. 
SERMÃO DE SANTO ANTÓNIO AOS PEIXES (séc. XVIII).
Painel de azulejos da Sé de Aveiro.
SERMÃO DE SANTO ANTÓNIO AOS PEIXES (séc. XVIII).
Painel de azulejos da Capela Baptismal da Sé de Lisboa. 
SERMÃO DE SANTO ANTÓNIO AOS PEIXES (séc. XVIII).
Painel de azulejos da Igreja do Convento de Santo António da Lourinhã. 
SERMÃO DE SANTO ANTÓNIO AOS PEIXES (séc. XVIII).
Painel de azulejos da Igreja de Nossa Senhora da Vitória,
ilha de Santa Maria, Açores.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Alberto de Souza e Estremoz

 
Fig. 1 - Carro alentejano. 

"Grande Artista!
Alberto de Souza realizou toda a sua obra
de olhos voltados para Portugal
– sem os desviar um momento da terra que lhe foi berço."


JÚLIO DANTAS
(in Prefácio do livro de Alberto de Souza
“50 Anos de Vida Artística”)

Sou cartófilo desde que me reconheço como coleccionador, aí pelos dez anos de idade. E a Cartofilia servir-me-ia de trampolim para outros voos como a Etnografia, uma vez que a Cartofilia é um poderoso auxiliar daquela, visto os postais ilustrados registarem para a perpetuidade, elementos recolhidos num dado contexto geográfico, social e temporal, relativos às características de uma determinada comunidade, rural ou urbana: o seu traje, a sua faina, os seus usos e costumes, as suas festas e romarias.
O registo cartófilo, tanto pode ter por base o cliché dum fotógrafo com sensibilidade ou pendor para as questões da identidade cultural regional, como as pinceladas magistrais de pintores que sentiram estética, plástica e cromaticamente, o pulsar do Povo Português, o Povo que lava no rio, que apascenta o gado na charneca ou na montanha, que cavalga na lezíria, que charrua a terra-mãe ou que da rede lançada ao mar, recolhe o seu e o nosso pão nosso de cada dia.
Creio que o pintor mais representado na cartofilia portuguesa seja Alberto de Souza (1880-1961), notável aguarelista e ilustrador, que calcorreou o país de lés a lés na primeira metade do século XX, funcionando como consciência plástica da Nação, pela oportunidade e rigor do registo etnográfico, efectuado através das suas exemplares aguarelas.
Alberto de Souza esteve em Estremoz no início do século XX, tinha então vinte e poucos anos e aqui registou aspectos do traje e usos e costumes locais, perpetuados em desenhos que “A EDITORA”, divulgou em postais ilustrados da sua 3ª série, a qual incluía motivos de Estremoz, Évora e Beja. Os motivos de Estremoz são: CARRO ALENTEJANO (Fig. 1), UM POÇO (Fig. 2), QUINTAL (Fig. 3) e LAREIRA (Fig. 4). Estes postais deram a volta ao mundo. O mais antigo que integra a minha colecção, tem aposto sobre selo de 25 reis de D. Carlos I (tipo Mouchon), o carimbo de LISBOA CENTRAL / 3ª SECÇÃO de 21-10-1904, local de onde foi expedido para Londres, onde chegou a 24-10-1904, conforme revela a marca de chegada à estação de PADDINGTON, na capital inglesa. Como curiosidade refiro que tenho outro circulado em 1906, expedido pelo escritor Ramalho Ortigão (1836-1915) - uma das figuras principais da Geração de 70 - de Lisboa para Estocolmo, na Suécia, dirigido ao então Ministro Plenipotenciário do Reino, António Feijó (1859-1917), diplomata e poeta consagrado. O desenho de um homem culto e consciência plástica da Nação (Alberto de Souza), a servir de abraço fraternal e a ligar dois amigos afastados (Ramalho Ortigão e António Feijó.
Mas, a relação de Alberto de Souza com Estremoz, não ficou por aqui. Alberto de Souza seria posteriormente o autor de uma aguarela (Fig. 5), propriedade da Câmara Municipal de Estremoz e que esteve na base da confecção de um cartaz para a afamada Feira-Exposição de Maio de 1926, em Estremoz. Nesta aguarela, na parte superior, a parte antiga do burgo, confinada às muralhas do Castelo e, dominando tudo, altaneira e vigilante sobre a planície, a Torre de Menagem, ex-líbris de Estremoz. Em primeiro plano, o pastor de ovelhas, arrimado ao seu cajado, com o tarro com as comedorias do dia, envergando o seu traje regional constituído pelo pelico, pelos safões, pelo lenço em redor do pescoço e pelo chapéu de aba farta, que é tema de quadra brejeira no cancioneiro regional:

“Alentejo não tem sombra,
Senão a que vem do céu.
Assente-se aqui, menina,
À sombra do meu chapéu.”

Sobre o traje, diz-nos Luís Chaves, etnólogo que na época também por aqui andava: “O traje surge-nos como produto natural do meio, isto é, de quanto dentro e à volta do homem existe, e tudo o que influi no espírito e actua nele. Desde a escolha e adopção de tecidos, até à cor e forma, desde a ornamentação ao arranjo das partes componentes, tudo aí tem razão de ser como é, e tem de estar onde está.”.
Hoje, o pastor da região já não se veste assim e as encostas do monte onde se ergue o Castelo de Estremoz, são vinhas e não campos de semeadura de trigo. Daí a importância desta e de todas as outras aguarelas de Alberto de Souza no registo etnográfico. Sublinhe-se que a Etnografia (do grego έθνος, ethnos - nação, povo e γράφειν, graphein - escrever) é o método utilizado pela Antropologia na recolha de dados, através do contacto efectuado entre o antropólogo e o grupo humano, objecto do seu estudo. Sublinhe-se ainda que a Antropologia (do grego άνθρωπος, anthropos - homem e λόγος, logos - pensamento) é a ciência que estuda o Homem e a Humanidade, em geral. Por isso, Alberto de Souza foi um antropólogo e um antropólogo social porque se dedicou à observação das técnicas, usos, costumes, crenças, regras de conduta e de comportamento de grupos sociais. E que trabalho extraordinário ele produziu ao longo da sua vida! Uma ínfima parte desse trabalho é constituído por 39 aguarelas, propriedade da Fundação Portuguesa das Comunicações, retratando trajes populares portugueses e que serviram de base à edição pelos CTT, em 1941, de bilhetes-postais ditos oficiais.
Como filatelista e cartofilista, possuo estes postais na minha colecção. Esta circunstância, aliada ao facto de coleccionar bonecos de Estremoz, viria a dar os seus frutos. Vejamos como.
Fascinado pela magia emergente das suas mãos de barristas populares, frequento amiúde a oficina e a loja das Irmãs Flores, no Largo da República, em Estremoz. Gosto muito do trabalho destas senhoras, Maria Inácia e Perpétua, de seus nomes, discípulas de mestra Sabina Santos, que com ela aprenderam a nobre arte do barro e com ela aprenderam a respeitar o que de mais genuíno têm os bonecos de Estremoz, no que respeita a modelos e tipos característicos, formas, cores e tintas. Mas, também e simultaneamente, criaram novos modelos e apostaram em novos tamanhos, que têm vindo a enriquecer a vastíssima galeria de modelos de bonecos de Estremoz.
Pois bem, às Irmãs Flores, afamadas barristas da nossa terra, lancei oportunamente o desafio de criarem novos modelos de bonecos (Fig. 7), inspirados em aguarelas de Mestre Alberto de Souza (Fig. 6). Elas aceitaram o repto e o resultado traduziu-se na bela e magnífica Exposição “Bonecos das Irmãs Flores inspirados em Aguarelas de Alberto de Souza sobre Traje Popular Português”, que em Fevereiro-Março-Abril de 2007, esteve patente ao público na Sala de Exposições do Centro Cultural Dr. Marques Crespo, onde até agora, foi das exposições mais visitadas. Depois disso, a barrística popular estremocense ficou ainda mais rica.
Depois deste sucesso, pensei que a Memória de Alberto de Souza merecia ainda muito mais. Como agente cultural, a consciência da importância da sua Obra, levou-me a tomar a iniciativa de promover uma Exposição de Pintura em Sua Homenagem, o que acabaria por ser feito numa iniciativa conjunta da Associação Filatélica Alentejana, da Câmara e do Museu Municipal de Estremoz e, da Família de Alberto de Souza. Paralelamente a esta Exposição decorre o Salão Filatélico FILAMOZ 2008, comemorativo do 25º Aniversário da Associação Filatélica Alentejana, onde quatro expositores põem em evidência o trabalho desenvolvido pelo Artista na concepção de selos e postais dos Correios. São eles: António Cristóvão (Emissões Camilo Castelo Branco), João Soeiro (Emissões Independência de Portugal), Miranda da Mota (IV Centenário do Nascimento de Camões) e Hernâni Matos (Inteiros Postais reproduzindo Trajes Populares Portugueses baseados em Aguarelas de Alberto de Souza).
Para perpetuar no espaço e no tempo, esta homenagem a Alberto de Souza, a Associação Filatélica Alentejana encomendou aos Correios de Portugal, o fabrico de dois selos personalizados, novo tipo de selos, criados pela Portaria nº 1335/2007 de 10 de Outubro. Um dos selos reproduz o auto-retrato de Alberto de Souza em 1950 (Fig. 8) e o outro, a aguarela que serviu de base ao cartaz da Feira-Exposição de Maio de 1926, em Estremoz (Fig. 9).
No acto inaugural da Exposição funcionou no local um posto de correio, provido de carimbo comemorativo (Fig. 10), reproduzindo o auto-retrato de Alberto de Souza, carimbo este concedido para o evento pelo Serviço de Filatelia dos CTT, com o apoio da Federação Portuguesa de Filatelia, os quais também se associaram na Homenagem àquele que, através dos seus rigorosos e vigorosos traços e das suas pinceladas de Mestre, criou obras primas que, para nosso deleite ficaram perpetuadas nas fórmulas de franquia dos nossos Correios.

Publicado inicialmente a 23 de Setembro de 2010

Fig. 2 - Um poço.

Fig. 3 - Quintal. 

Fig. 4 - Lareira.

Fig. 5 – Aguarela que serviu de base para o cartaz da Feira-Exposição
de Maio de 1926.

Fig. 6 – Lavradeira de Viana do Castelo.I nteiro Postal nº 8,
da emissão de 1941.

Fig. 7 – Lavradeira de Viana do Castelo. Boneco de Estremoz,
das Irmãs Flores.

Fig. 8 - Selo de correio normal, reproduzindo o
auto-retrato de Alberto de Souza (1950).

Fig. 9 - Selo de correio normal, reproduzindo aguarela

 de 1926, de Alberto de Souza.

 

Fig. 10 - Carimbo Comemorativo de Homenagem a Alberto de Souza.