sexta-feira, 3 de maio de 2024

Poesia Portuguesa -173

 




Ciclo do álcool
Francisco José Tenreiro (1921-1963)


1
Quando seu Silva Costa
Chegou na ilha
Trouxe uma garrafa de aguardente
Para o primeiro comércio.

A terra era tão vasta
Havia tanto calor
Que a água
Parecia não ter potência
Para acalmar a sede da sua garganta.

Seu Silva Costa
Bebeu metade...

E sua garganta ganhou palavra
Para o primeiro comércio.

2
A lua batendo nos palmares
Tem carícias de sonho
Nos olhos de Sam Márinha.
Silêncio!
O mar batendo nas rochas
È o eco da ilha.
Silêncio!
Lá no longe
Soluçam as cubatas
Batidas dum luar sem sonho.
Silêncio!
No canto da rua
Os brancos estão fazendo negócio
A golpes de champagne!

3
Mãe Negra contou:
"eu disse:
filhinho
beba isso coisa não...
Filhinho riu tanto tanto!..."

Nhá Rita calou-se.
Só os olhos e as rugas
Estremeceram um sorriso longínquo.

- E depois Mãe-Negra?

"Oh!
Filhinho
Entrou no vinhateiro
Vinhateiro entrou nele..."

Os olhos de nhá Rita
Estão avermelhando de tristeza.

"Hum!
Filhinho
Ficou esquecendo sua mãe!"

Francisco José Tenreiro (1921-1963)

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