segunda-feira, 6 de maio de 2024

Poesia Portuguesa - 190

 




Áspera é a terra em que vivemos

Egito Gonçalves (1920-2001)


Áspera é a terra em que vivemos:
Avara nas entregas da alegria,
Pródiga em tristezas. Ásperos
Também os símbolos misérrimos
Que deltam o escasso oxigénio.

Onde a mulher, o beijo da vitória,
o fogo de artifício, a aclamação?

Áspero é o amor de armas na mão,
a falta de lençóis, a flat de cimento…
Áspera a noite rude e a miragem
em que sempre se crispam os nossos dentes.

De que tamancos nascerá a vida?
E onde o soro, o sal, o seu tempero?

Á pera a costura onde se esconde
o piolho propulsor. Na forja ainda
o martelo que epitafe o seu destino,
o peso que o arraste ao seu inferno.

Que fado nos persegue? Que guitarra
acompanha esta dor?


Egito Gonçalves (1920-2001)

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