sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Vem aí o Ano Novo!


A magistral ilustração de Stuart de Carvalhais (1887-1961), com a qual ilustro a presente crónica, tem por título “Cumprimentos do Ano” e foi publicada na capa da revista “Ilustração Portuguesa”, nº 410, de 29 de Dezembro de 1913. Ela sugere a despedida do “Ano Velho”, aí representado por um ancião de ar respeitável, sentado, vencido decerto pelo desgaste e pelas mazelas da vida. Junto a ele, duas crianças, das quais a mais velhinha lhe entrega um ramo de flores, decerto como reconhecimento do legado positivo que o Ano Velho lhes doou.
Não tenho motivo algum que me leve a crer que esta alegoria de Stuart não fosse apropriada em 1913. Todavia, considero que, actualmente, ela carece de sentido. Por isso me despeço de 2011 com mágoa, azedume e revolta, porque os portugueses nunca perderam tanta qualidade de vida e direitos democráticos como no ano de 2011. Pelo menos até agora. E porquê? Por culpa dos políticos que temos, dos políticos que tivemos e dos políticos que não tivemos, ainda que uma maioria significativa de nós, os gostasse de ter tido.
Conhecedor da obra do poeta popular António Aleixo (1899-1949), identifico-me bastante com o seu pensamento, a começar pelo modo como o poeta se enquadra na Sociedade:

“Sou um dos membros malditos
dessa falsa sociedade que,
baseada nos mitos,
pode roubar à vontade.“

Concordo também com o juízo que faz do Poder:

“Acho uma moral ruim
trazer o vulgo enganado:
mandarem fazer assim
e eles fazerem assado.”

Na óptica do poeta, é um juízo que não é nada positivo:

“Há tantos burros mandando
em homens de inteligência,
que às vezes fico pensando,
se a burrice não será uma ciência...”

Por isso o poeta considera ter o direito de protestar:

“Não me dêem mais desgostos
porque sei raciocinar...
Só os burros estão dispostos
a sofrer sem protestar!”

E vai ao ponto de advertir o Poder:

“Vós que lá do vosso império
prometeis um mundo novo,
calai-vos, que pode o povo
q'rer um mundo novo a sério!”

Proclama igualmente que a situação pode (e digo eu, deve) mudar:

“Esta mascarada enorme
com que o mundo nos aldraba
dura enquanto o povo dorme,
quando ele acordar, acaba.”

Perder a vida será na sua opinião, o que menos importa:

“Que importa perder a vida
em luta contra a traição,
se a Razão mesmo vencida,
não deixa de ser Razão? “

Nunca o pensamento de António Aleixo foi tão pertinente como hoje, por congregar duma forma excepcional uma análise da situação com alguma orientação para a acção. E acreditem que eu percebo da poda. Sou da geração do Maio de 68 em Portugal, doutros tempos de luta e porventura o primeiro divulgador de António Aleixo em Lisboa, em sessões de Canto Livre, em que participavam companheiros como o Zeca, o Adriano, o Fanhais ou o Fanha. Eu era um alentejano fininho com um metro e noventa de altura e olhos de carneiro mal morto. Quando ocupávamos a cantina de Ciências para afrontar o Poder, este cagava-se todo e mandava a polícia de choque contra nós. Nós não nos cagávamos, porque tínhamos tudo no sítio. A nossa força era a consciência política, a unidade, a disciplina e a resistência militante. Tínhamos na massa do sangue a poesia do Daniel Filipe (1925-1964) - Pátria Lugar de Exílio:

“(…) Tendes jornais.
usai-os
tendes exércitos
usai-os
tendes polícia
usai-a
tendes juízes
usai-os
usai-os contra nós
procurai esmagar-nos
cantando resistimos.”

Mais de quarenta anos depois, com toda a adrenalina dos meus 65 anos, repudio a política canalha que nos (des)governa e proclamo alto e bom som:


quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

A Adoração dos Magos na Pintura Universal


A ADORAÇÃO DOS MAGOS (c/ 1320)
Giotto (c/ 1267 – 1337)
Têmpera em painel (45 × 44 cm)
Metropolitan Museum of Art, New York


“A Adoração dos Magos” é o tema central de telas criadas por grandes nomes da pintura universal, dos quais destacamos, associados por épocas/correntes da pintura:
IDADE MÉDIA - Giotto (c/ 1267 – 1337), italiano;
RENASCENÇA - Irmãos Van Limburg (1375 – 1416), holandeses; Fra Angelico (1387 – 1455), italiano; Rogier van der Weyden (1399/1400 – 1464), flamengo; Andrea Mantegna (1431 – 1506), italiano; Hugo van der Goes (c/ 1440 – 1482), flamengo; Sandro Botticelli (c/ 1445 – 1510), italiano; Hans Memling (c/ 1433 – 1494), flamengo; Leonardo da Vinci (1452 – 1519), italiano; Hieronymus Bosch (c/ 1450 – 1516), holandês; Geertgen tot Sint Jans (c/ 1460/65 – c/ 1488/93), holandês; Domenico Ghirlandaio (1449 – 1494), italiano; Filippino Lippi (c/ 1457 – 1504), italiano; Albrecht Dürer (1471 – 1528), alemão; Pieter Bruegel “O Velho” (c/ 1520 – 1569), flamengo; Pieter Aertsen (1507/08 – 1575), flamengo;
BARROCO - Peter Paul Rubens (1577 – 1640), flamengo; Diego Rodriguez da Silva y Velázquez (1599 – 1660), espanhol;
As referências bíblicas à “Adoração dos Magos” surgem em MATEUS 2:
“1. Tendo, pois, Jesus nascido em Belém de Judá, no tempo do rei Herodes, eis que magos vieram do oriente a Jerusalém.
2. Perguntaram eles: Onde está o rei dos judeus que acaba de nascer? Vimos a sua estrela no oriente e viemos adorá-lo.
3. A esta notícia, o rei Herodes ficou perturbado e toda Jerusalém com ele.
4. Convocou os príncipes dos sacerdotes e os escribas do povo e indagou deles onde havia de nascer o Cristo.
5. Disseram-lhe: Em Belém, na Judeia, porque assim foi escrito pelo profeta:
6. E tu, Belém, terra de Judá, não és de modo algum a menor entre as cidades de Judá, porque de ti sairá o chefe que governará Israel, meu povo {Miquéias 5,2}.
7. Herodes, então, chamou secretamente os magos e perguntou-lhes sobre a época exacta em que o astro lhes tinha aparecido.oração
8. E, enviando-os a Belém, disse: Ide e informai-vos bem a respeito do menino. Quando o tiverdes encontrado, comunicai-me, para que eu também vá adorá-lo.
9. Tendo eles ouvido as palavras do rei, partiram. E eis que e estrela, que tinham visto no oriente, os foi precedendo até chegar sobre o lugar onde estava o menino e ali parou.
10. A aparição daquela estrela os encheu de profunda alegria.
11. Entrando na casa, acharam o menino com Maria, sua mãe. Prostrando-se diante dele, o adoraram. Depois, abrindo seus tesouros, ofereceram-lhe como presentes: ouro, incenso e mirra.
12. E, sendo por divina revelação avisados em sonhos para que não voltassem para junto de Herodes, partiram para a sua terra por outro caminho.”

Publicado inicialmente em 28 de Dezembro de 2011

A ADORAÇÃO DOS MAGOS (1408-1409)
Irmãos Van Limburg (1375 – 1416)
Manuscrito iluminado (24 × 17 cm)
Metropolitan Museum of Art, New York
A ADORAÇÃO DOS MAGOS (c/1445)
Fra Angelico (1387 – 1455)
Têmpera em painel (Diâmetro 137 cm)
National Gallery of Art, Washington DC
A VISÃO DOS MAGOS (c/ 1445 – 1448)
Rogier van der Weyden (1399/1400 – 1464)
Óleo em painel (91 × 40 cm)
Gemäldegalerie der Staatlichen Museen, Berlin
A ADORAÇÃO DOS MAGOS (c/ 1461)
Andrea Mantegna (1431 – 1506)
Têmpera em painel (76 × 76,5 cm)
Galleria degli Uffizi, Florence
A ADORAÇÃO DOS MAGOS (c/1470/75)
Hugo van der Goes (c/ 1440 – 1482)
Óleo em painel (150 × 247 cm)
Gemäldegalerie der Staatlichen Museen, Berlin
A ADORAÇÃO DOS MAGOS (1475)
Sandro Botticelli (c/ 1445 – 1510)
Têmpera em painel (111 × 134 cm)
Galleria degli Uffizi, Florence
A ADORAÇÃO DOS MAGOS (1479)
Hans Memling (c/ 1433 – 1494)
Óleo em painel (46 × 57 cm)
Memling Museum, St.John's Hospital, Bruges
A ADORAÇÃO DOS MAGOS (1479)
Hans Memling (c/ 1433 – 1494)
Óleo em painel (46 × 57 cm)
Memling Museum, St.John's Hospital, Bruges
A ADORAÇÃO DOS MAGOS (1485-1500)
Hieronymus Bosch (c/ 1450 – 1516)
Óleo em painel (138 × 144 cm)
Museo del Prado, Madrid
A ADORAÇÃO DOS MAGOS (c/1485)
Geertgen tot Sint Jans (c/ 1460/65 – c/ 1488/93)
Óleo em painel (Painel principal: 111 × 69 cm; abas: 71 × 39 cm)
Národní galerie, Sternberg Palace, Prague
A ADORAÇÃO DOS MAGOS (1488)
Domenico Ghirlandaio (1449 – 1494)
Têmpera em painel (285 × 240 cm)
Ospedale degli Innocenti, Florence
A ADORAÇÃO DOS MAGOS (1496)
Filippino Lippi (c/ 1457 – 1504)
Óleo em painel (258 × 243 cm)
Galleria degli Uffizi, Florence
A ADORAÇÃO DOS MAGOS (1504-05)
Albrecht Dürer (1471 – 1528)
Óleo em painel (100 × 114 cm)
Galleria degli Uffizi, Florence
A ADORAÇÃO DOS MAGOS (1556-62)
Pieter Bruegel “O Velho” (c/ 1520 – 1569)
Têmpera sobre tela (124 × 169 cm)
Royal Museums of Fine Arts of Belgium, Brussels
A ADORAÇÃO DOS MAGOS (c/ 1560)
Pieter Aertsen (1507/08 – 1575)
Óleo em painel (168 × 179 cm)
Rijksmuseum, Amsterdam
A ADORAÇÃO DOS MAGOS (1617-18)
Peter Paul Rubens (1577 – 1640)
Óleo sobre tela (245 × 325 cm)
Musée des Beaux-Arts, Lyon
A ADORAÇÃO DOS MAGOS (1619)
Diego Rodriguez da Silva y Velázquez (1599 – 1660)
Óleo sobre tela (203 × 125 cm)
Museo del Prado, Madrid

domingo, 25 de dezembro de 2011

Coroas de plantas usadas no Natal


Azevinho. Imagem recolhida em http://safarigarden.commercesuite.com.br/


Durante a época natalícia, as portas de muitos lares ostentam coroas de Natal, feitas com ramagens entrelaçadas de plantas de cores diferentes:
- O azevinho, um arbusto de folhas afiadas e cortantes, com frutos de cor vermelho-vivo, o qual sobrevive ao mais rigoroso dos invernos europeus;
- O visco branco, arbusto de folhas arredondadas e de textura macia, com frutos brancos;
- A hera, planta trepadeira delicada, flexível, com folhas macias e frutos negros.
Qual a origem de tal tradição?
O azevinho era uma árvore sagrada para os druidas. No calendário celta, o azevinho corresponde ao período compreendido entre 8 de Julho e 4 de Agosto. Devido à dureza da sua madeira, os antigos celtas usavam esta árvore para confeccionar as pontas de seta. Devido a essa característica, o azevinho é considerado como símbolo de firmeza, força e resistência. Na mitologia celta, o azevinho representava o aspecto masculino das divindades e acreditava-se ter o poder de repelir o mal. O visco branco representava o aspecto feminino das divindades (imortalidade e fertilidade) e acreditava-se ser capaz de curar qualquer doença.
Na mitologia escandinava, o azevinho representava Frey (deus belo e forte que comandava o tempo e a prosperidade). O visco branco representava Freya (deusa do amor e da sensualidade). Daí advém a crença que beijar uma pessoa sob uma coroa de Natal, permitirá encontrar o amor da sua vida ou manter de forma saudável uma ligação existente, agraciando o casal com o dom da fertilidade.
A cor invariavelmente verde da hera e o seu carácter aconchegante, tornaram-na um símbolo de imortalidade, amizade e fidelidade, pelo que na antiga Grécia era entregue aos noivos na cerimónia de casamento.
O azevinho, o visco branco e a hera, pelo simbolismo que encerram, são arbustos considerados protectores. Daí serem utilizados para confeccionar coroas natalícias que se colocam nas portas, para trazer boa sorte e protecção
“Boca de hera, coração de azevinho", proclama um provérbio irlandês, repleto de sabedoria celta, provavelmente como registo da “possibilidade de se poder ser simultaneamente suave e resistente”.
Após a cristianização dos antigos cultos pagãos, o azevinho tornou-se um símbolo de Natal, acreditando-se que o azevinho, durante a fuga da Sagrada Família para o Egipto, estendeu os seus ramos para a esconder, impedindo que os soldados de Herodes matassem o Menino Jesus. Então Maria, como sinal de agradecimento, abençoou o azevinho que, desde então, permaneceu sempre verde. O verde permanente das suas folhas representa a vida eterna, as bagas vermelhas simbolizam a crucificação de Jesus e os seus espinhos afugentam os espíritos malignos.

Hernâni Matos
Publicado inicialmente a 25 de Dezembro de 2011


 VISCO BRANCO - Imagem recolhida em: http://www.varbak.com/

HERA – Imagem recolhida em: http://obotanicoaprendiznaterradosespantos.blogspot.com