PAVÂO - Argos Panoptes, gigante com cem olhos, a quem Hermes cortou a cabeça,
foi transformado por Hera, em pavão, ave sagrada em cuja cauda pôs os seus cem olhos.
VENHAM MAIS CEM!
É sabido que em termos dialécticos, o acumular de quantidade gera uma nova qualidade. Este facto indesmentível que povoa os múltiplos aspectos do conhecimento humano, faz com que um jornal como o “Ecos” [1] ao editar o seu número cem, se liberte da sua condição de decenário para transitar por direito próprio para outro patamar, agora o correspondente à sua condição de centenário. Fazemos votos para que este salto dialéctico consubstancie uma mudança de paradigma.
Somos habitantes dum mundo em permanente devir, em que os fenómenos da globalização apátrida tendem a pulverizar e desintegrar todo e qualquer arreganho de identidade cultural nacional. A análise da conjuntura levou-nos há muito a partilhar esforços com outros, nomeadamente todos aqueles que pensam diferente de nós, visando a possibilidade de terçarmos em defesa da nossa dama: a Cultura Popular. Esse é o sentido de sermos colunistas do “Ecos”, com o posto anarco-libertário de “franco-atirador” num espaço de intervenção jornalística plural.
Se o “Ecos” fosse um bolo, pôr-lhe-íamos cem velas. Porém não é um bolo e velas não se coadunam muito com o papel que serve de suporte físico à imprensa escrita. Como assinalar então esta efeméride? Através duma viagem meteórica pela literatura de tradição oral.
Somos habitantes dum mundo em permanente devir, em que os fenómenos da globalização apátrida tendem a pulverizar e desintegrar todo e qualquer arreganho de identidade cultural nacional. A análise da conjuntura levou-nos há muito a partilhar esforços com outros, nomeadamente todos aqueles que pensam diferente de nós, visando a possibilidade de terçarmos em defesa da nossa dama: a Cultura Popular. Esse é o sentido de sermos colunistas do “Ecos”, com o posto anarco-libertário de “franco-atirador” num espaço de intervenção jornalística plural.
Se o “Ecos” fosse um bolo, pôr-lhe-íamos cem velas. Porém não é um bolo e velas não se coadunam muito com o papel que serve de suporte físico à imprensa escrita. Como assinalar então esta efeméride? Através duma viagem meteórica pela literatura de tradição oral.
BÍBLIA
O número “cem” é profusamente referido na Bíblia, onde logo no primeiro dos livros sagrados se destacam referências como:
- “Eis a descendência de Sem: Sem, com a idade de cem anos, gerou Arfaxad, dois anos depois do dilúvio.” (Génesis 11:10) - “Abraão prostrou-se com o rosto por terra e começou a rir, dizendo consigo mesmo: "Poderia nascer um filho a um homem de cem anos? Seria possível a Sara conceber ainda na idade de noventa anos?" (Génesis 17:17)
- “UIac semeou naquela terra, e colheu o cêntuplo naquele mesmo ano; o Senhor o abençoava. (Génesis 26:12)
- “Comprou por cem moedas de prata aos filhos de Hemor, pai de Siquém, o pedaço de terra onde havia levantado a sua tenda. (Génesis 33:19)
- “Eis a descendência de Sem: Sem, com a idade de cem anos, gerou Arfaxad, dois anos depois do dilúvio.” (Génesis 11:10) - “Abraão prostrou-se com o rosto por terra e começou a rir, dizendo consigo mesmo: "Poderia nascer um filho a um homem de cem anos? Seria possível a Sara conceber ainda na idade de noventa anos?" (Génesis 17:17)
- “UIac semeou naquela terra, e colheu o cêntuplo naquele mesmo ano; o Senhor o abençoava. (Génesis 26:12)
- “Comprou por cem moedas de prata aos filhos de Hemor, pai de Siquém, o pedaço de terra onde havia levantado a sua tenda. (Génesis 33:19)
MITOLOGIA GREGA
O número “cem” está na mitologia grega associado a personagens como Argos Panoptes, Ládon ou os Hecatônquiros.
Argos Panoptes era um gigante com cem olhos. Servo fiel de Hera, foi incumbido pela deusa de tomar conta de Io, princesa e amante de Zeus transformada em novilha. Era um excelente boieiro, visto que mantinha cinquenta dos seus olhos abertos, enquanto dormia. Para a libertar do jugo de Zeus, Hermes o pôs a dormir e de seguida cortou a sua cabeça. Hera homenageou-o, transformando-o em pavão, ave sagrada em cuja cauda pôs os seus cem olhos.
Ládon era um dragão com um corpo de serpente onde tinha cem cabeças que falavam línguas diferentes, Foi a que ele que Hera, mulher de Zeus, tornou guardião do jardim das Hespérides, com a tarefa de proteger a macieira de frutos de ouro, árvore que Gaia lhe tinha oferecido no dia de casamento com Zeus.
Os Hecatônquiros ou Centimanos eram três gigantes da mitologia grega, que possuíam cem braços e cinquenta cabeças. Eram irmãos dos 12 Titãs e dos 3 Ciclopes, filhos de Urano e Gaia: Briareu, Coto e Giges.
Argos Panoptes era um gigante com cem olhos. Servo fiel de Hera, foi incumbido pela deusa de tomar conta de Io, princesa e amante de Zeus transformada em novilha. Era um excelente boieiro, visto que mantinha cinquenta dos seus olhos abertos, enquanto dormia. Para a libertar do jugo de Zeus, Hermes o pôs a dormir e de seguida cortou a sua cabeça. Hera homenageou-o, transformando-o em pavão, ave sagrada em cuja cauda pôs os seus cem olhos.
Ládon era um dragão com um corpo de serpente onde tinha cem cabeças que falavam línguas diferentes, Foi a que ele que Hera, mulher de Zeus, tornou guardião do jardim das Hespérides, com a tarefa de proteger a macieira de frutos de ouro, árvore que Gaia lhe tinha oferecido no dia de casamento com Zeus.
Os Hecatônquiros ou Centimanos eram três gigantes da mitologia grega, que possuíam cem braços e cinquenta cabeças. Eram irmãos dos 12 Titãs e dos 3 Ciclopes, filhos de Urano e Gaia: Briareu, Coto e Giges.
PROVÉRBIOS
São de referir os seguintes:
- A cem avisa quem um castiga.
- A cem fustiga quem um castiga.
- Ao cabo de cem anos os reis são vilões e ao cabo de cento e dez são os vilões reis.
- Cem amigos é pouco e um inimigo é muito.
- Cem cães a um osso.
- Cento de um ventre, cada um de sua mente.
- Cento de vida, cento de renda e cem léguas de parentes.
- Deus fecha uma porta e abre um cento.
- Guerra, caça e amores, por um prazer cem dores.
- Ladrão que rouba ladrão tem cem anos de perdão.
- Largos dias têm cem anos.
- Mais vale um dia do discreto que cem do néscio.
- Mais vale um farto que cem famintos.
- Mais vale um que saiba mandar, do que cem a trabalhar.
- Mais vale uma aguilhada que cem arres.
- Mais vale uma dor que cem.
- Mais vale uma vista do dono que cem brados do abegão.
- Mede cem vezes e corta uma.
- Perdido por cem, perdido por mil.
- Perdido por um, perdido por cem.
- Quem engana ao ladrão, cem dias ganha de perdão.
- Quem num jogo fará um erro, fará cento.
- Quem faz um cesto, faz um cento.
- Um doido fará cem.
- Um louco é capaz de fazer cem loucos.
- Um pai para cem filhos e não cem filhos para um pai.
- Um só doido endoidece cem.
- A cem fustiga quem um castiga.
- Ao cabo de cem anos os reis são vilões e ao cabo de cento e dez são os vilões reis.
- Cem amigos é pouco e um inimigo é muito.
- Cem cães a um osso.
- Cento de um ventre, cada um de sua mente.
- Cento de vida, cento de renda e cem léguas de parentes.
- Deus fecha uma porta e abre um cento.
- Guerra, caça e amores, por um prazer cem dores.
- Ladrão que rouba ladrão tem cem anos de perdão.
- Largos dias têm cem anos.
- Mais vale um dia do discreto que cem do néscio.
- Mais vale um farto que cem famintos.
- Mais vale um que saiba mandar, do que cem a trabalhar.
- Mais vale uma aguilhada que cem arres.
- Mais vale uma dor que cem.
- Mais vale uma vista do dono que cem brados do abegão.
- Mede cem vezes e corta uma.
- Perdido por cem, perdido por mil.
- Perdido por um, perdido por cem.
- Quem engana ao ladrão, cem dias ganha de perdão.
- Quem num jogo fará um erro, fará cento.
- Quem faz um cesto, faz um cento.
- Um doido fará cem.
- Um louco é capaz de fazer cem loucos.
- Um pai para cem filhos e não cem filhos para um pai.
- Um só doido endoidece cem.
TRAVALÍNGUAS
A nível de travalínguas é conhecido o seguinte:
Se com cem serras
Se serram cem ciprestes
Quantos ciprestes
Se serram com seiscentas serras?
Se serram cem ciprestes
Quantos ciprestes
Se serram com seiscentas serras?
ADIVINHAS
É conhecida uma adivinha em cuja formulação entra o número “cem”:
Um gavião quando andava a caçar, passa por cima de um pombal e diz:
- Olá pombal das 100 pombas!
Ao que uma pomba branca respondeu:
- Para serem 100 pombas são precisas estas, outras tantas como estas, metade destas, mais um quarto destas e contigo gavião 100 pombas serão.
Pergunta-se: quantas pombas tinha o pombal?
CANCIONEIRO POPULAR
No que se refere ao cancioneiro popular, este também assinala a presença do número “cem”:
De cantigas tenho um cento,
E fil-as todas num dia,
Todas estas cantiguinhas
Eu canto à minha Maria.
E fil-as todas num dia,
Todas estas cantiguinhas
Eu canto à minha Maria.
Évora é grande, grandiosa,
muito linda em monumentos;
tem por lá mui belas coisas,
coisas d’arte são aos centos.
muito linda em monumentos;
tem por lá mui belas coisas,
coisas d’arte são aos centos.
GÍRIA PORTUGUESA
No âmbito da gíria portuguesa são conhecidas expressões como:
Andar com cem olhos = Estar muito vigilante
Cavalo de cem moedas = Coisa ou pessoa muito vistosa
Cem cães a um osso = Muitos a desejar a mesma coisa
Cem por cento = Pessoa impecável = Eficiente
Centenas de vezes = Muitas vezes
Cavalo de cem moedas = Coisa ou pessoa muito vistosa
Cem cães a um osso = Muitos a desejar a mesma coisa
Cem por cento = Pessoa impecável = Eficiente
Centenas de vezes = Muitas vezes
ALCUNHAS
No que respeita a alcunhas alentejanas são conhecidas as seguintes:
- CEM – Alcunha outorgada a um homem que tinha este número quando andava na tropa (Portel e Castro Verde).
- CEM À HORA – O receptor anda muito depressa (Elvas, Ourique e Estremoz).
- CEM GRAMAS - Designação atribuída a um indivíduo que é muito magro (Odemira).
- CEM À HORA – O receptor anda muito depressa (Elvas, Ourique e Estremoz).
- CEM GRAMAS - Designação atribuída a um indivíduo que é muito magro (Odemira).
TOPONÍMIA
Quanto à toponímia são conhecidos os seguintes topónimos:
CEM – Lugar da freguesia de Folhada, concelho de Marco de Canaveses.
CEM – Lugar da freguesia de Lagares, concelho de Felgueiras.
CEM – Lugar da freguesia de Rio de Moinhos, concelho de Arcos de Valdevez.
CEM DE BAIXO – Lugar da freguesia de Lagares, concelho de Felgueiras.
CEM DE RIBA – Lugar da freguesia de Lagares, concelho de Felgueiras.
CEM SOLDOS – Lugar da freguesia da Madalena, concelho de Tomar.
CEM – Lugar da freguesia de Rio de Moinhos, concelho de Arcos de Valdevez.
CEM DE BAIXO – Lugar da freguesia de Lagares, concelho de Felgueiras.
CEM DE RIBA – Lugar da freguesia de Lagares, concelho de Felgueiras.
CEM SOLDOS – Lugar da freguesia da Madalena, concelho de Tomar.
PARA ONDE VAI A TRADIÇÂO ORAL?
A importância da literatura de tradição oral resulta de ela ser veiculada através do diálogo inter-geracional, transmissor de valores familiares, sociais, morais e culturais. Sem a transmissão desses valores, perde-se a memória do passado e a identidade cultural regional e nacional. É o que acontece, quando tagarelas de “internetês” comunicam freneticamente em chats ou redes sociais. Essa malta usa o número cem na forma decimal para substituir a proposição "sem" ou numa palavra as sílabas “sem”, “sen” “cen”, como ilustram exemplos como: “100abrigo”, “100pre”, “100tar”, “100to”. Trata-se da demolição da língua portuguesa, pelo uso da fonética em detrimento da etimologia, pelo eliminar da pontuação e da acentuação, com o mais completo desrespeito pelas regras gramaticais que muitos não chegaram sequer a conhecer, o que é algo inteiramente execrável. Como Fernando Pessoa somos levados a dizer “A minha pátria é a língua portuguesa.”, bem como “Ortografia também é gente. A palavra é completa vista e ouvida”. Como Zeca Afonso, de quem parafraseámos o título de aberura do presente post, somos levados a dizer:
Não me obriguem a vir para a rua
Gritar
Que é já tempo d' embalar a trouxa
E zarpar
[1] - Quinzenário de Estremoz, onde mantenho a coluna “O FRANCO-ATIRADOR”.
O SACRIFÍCIO DE ABRAÃO (1635) - Rembrandt (1606-1669).
Óleo sobre tela (132,8x139,5 cm). Museu Hermitage, Leningrado.
Segundo o Génesis, Abraão teria sido pai de Isaac aos 100 anos
e mais tarde Deus pediu-lhe uma verdadeira prova de fé,
determinando que levasse o seu filho para oferecê-lo em holocausto.
Porém, quando levantou a mão para sacrificar o seu filho, foi impedido
pelo Anjo do Senhor.
HERMES MATANDO ARGUS PANOPTES - Vaso grego do séc. V a.C., atribuído ao pintor Argos.
Museu de História da Arte, Viena.
O DRAGÃO LÁDON - Iustração de Arthur Rackham (1867-1938)
HECATÔNQUIRO (Cartoon recolhido em Templo de apolo.net).