No passado dia 7 de Fevereiro completaram-se
sessenta e quatro anos sobre a morte de um estremocense adoptivo, muito
estimado pela comunidade local e que a gadanha da morte ceifou prematuramente
aos 28 anos de idade. Foi a 7 de Fevereiro de 1952 que morreu em Lisboa, o
poeta, professor e pedagogo Sebastião da Gama (1924-1952), natural de Vila
Nogueira de Azeitão, onde nasceu a 10 de Abril de 1924. Licenciado em Filologia
Românica pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa em 1947, ainda
nesse ano iniciou a sua actividade de professor do Ensino Técnico, que exerceu
em Lisboa, Setúbal e Estremoz.
Atingido
pela tuberculose, a conselho médico foi viver para a Serra da Arrábida, que
conjuntamente com a sua tragédia pessoal são temas principais da sua obra. Esta
inclui: Serra-Mãe (poesia, 1945); Loas a Nossa Senhora da Arrábida (poesia,
1946); Cabo da Boa Esperança (poesia, 1947); O Segredo é Amar (prosa, compilação
de Matilde Rosa Araújo, 1969); A Região dos Três Castelos (prosa, 1949); Campo
Aberto (poesia, 1951); Pelo Sonho é que Vamos (poesia, 1953); Diário (1958);
Itinerário Paralelo (poesia, compilação de David Mourão-Ferreira, 1967); Cartas
I (1994). Foi ainda colaborador de jornais como O Setubalense e Brados do
Alentejo, bem como de revistas como Árvore e Távola Redonda.
Em Estremoz, a sua prática pedagógica, fruto da sua
rara sensibilidade, da sua personalidade e do seu carácter, deixou marcas
profundas no coração dos alunos, que sempre o recordaram com saudade, pela sua extraordinária
dimensão humana no convívio escolar.
Conheci o poeta na minha infância e dele falo na
minha crónica ”Memórias do Espírito Santo”, datada de 2010: “No nº 2 – 2º
morava o poeta Sebastião da Gama, natural de Azeitão e que viera para Estremoz
em 1950, como professor efectivo da Escola Industrial e Comercial de Estremoz e
que estabeleceu uma forte ligação afectiva com a nossa cidade, patente nos seus
Poemas e no seu Diário.
Sebastião da Gama sofria de tuberculose renal,
diagnosticada muito cedo e tinha consciência que ia ter uma morte prematura,
por isso amou a vida e a natureza intensamente, o que se reflectiu nos seus
escritos.
A 5 de Fevereiro de 1952 deixaria para sempre o
Largo do Espírito Santo, 2 – 2.º, rumo ao Hospital de S. Luís dos Franceses, em
Lisboa, onde viria a falecer após 2 dias de intensa agonia. Lembro-me desse
fatídico dia 5 de Fevereiro de 1952, como se fosse hoje. Lembro-me de ele, meu
vizinho, partir para uma viagem sem regresso.
Eu, hoje com 63 anos, um metro e noventa de altura
e mais de cem quilos de peso, era um puto que usava bibe e andava numa Mestra,
a Menina Teresinha, percursora das actuais Educadoras de Infância e que dava
Escola no nº 1, nos baixos da Casa de Sebastião da Gama. Eu, que na época tinha
veleidades ciclistas, andava de triciclo no passeio em frente da Casa de
Sebastião da Gama, que me conhecia muitíssimo bem e que por vezes me fazia uma
festa na cabeça, como se faz aos miúdos, sem maldade alguma.
Ainda guardo um desdobrável impresso a sépia com a
sua foto e uma cabeça de Cristo crucificado, com poemas seus, que após a sua
morte, foi oferecido aos amigos e aos vizinhos, em Sua Memória.
Hoje, estou aqui a falar dele e do Largo que ele
tanto amava. Cinquenta e sete anos depois, é uma modesta, mas sentida evocação
do puto ciclista que impunemente andava de triciclo frente à sua casa. E que ao
contrário do que Veloso ouviu de Camões no Canto V dos Lusíadas, jura que nunca
ouviu do Poeta o comentário. "Ouve lá, Hernâni amigo, este passeio é
melhor de descer que de subir!".”
Presentemente já não ando de triciclo, mas sou um
homem de caminhadas ou se preferirem um caminheiro da esperança, que se revê no
profundo humanismo da obra que nos legou Sebastião da Gama. Daí que a terminar,
cite o seu poema “O sonho”, incluído na obra póstuma ”Pelo Sonho é que Vamos”: “Pelo
sonho é que vamos, / comovidos e mudos. / Chegamos? Não chegamos? / Haja ou não
haja frutos, / pelo sonho é que vamos. // Basta a fé no que temos. / Basta a
esperança naquilo / que talvez não teremos. / Basta que a alma demos, / com a
mesma alegria, / ao que desconhecemos / e ao que é do dia a dia. // Chegamos?
Não chegamos? // – Partimos. Vamos. Somos.”
Sem comentários:
Enviar um comentário