sexta-feira, 8 de novembro de 2024
José Maldonado Cortes homenageado na Feira da Golegã
quinta-feira, 24 de outubro de 2024
José Maldonado Cortes homenageado na Feira da Golegã
quinta-feira, 18 de janeiro de 2024
Temporada Tauromáquica de 1886 (Setembro a Dezembro)
Temporada Tauromáquica de 1886
(Meses de Setembro a Dezembro)
Luís Brito da Luz
Iniciou-se o mês de Setembro com uma corrida
noctuma, que esteve quase cheia, em Lisboa, no Campo de Sant'Anna, a qual estava agendada
para o mês de Agosto no dia 26 e foi primeiramente transferida para o dia 2 em virtude do espada Guerrita e seus bandarilheiros irem tourear a Cáceres só podendo estar em Lisboa nesse dia. Acabou esta corrida por ser antecipada
para o dia 1 em consequência do espada
e sua quadrilha irem tourear a Aranjuez no sábado dia quatro. Sendo considerado por muitos entendedores o melhor bandarilheiro á altura, foi propositadamente o empresário
António da Costa Guerra a Cáceres para fechar contrato com
esta primeira figura. O curro escolhido e apartado de há muito era pertença
de D. Marcos de Noronha
(Vagos). Guerrita, rapaz elegante
bem-parecido , mostrou que os elogios nos jornais espanhóis
eram mais que justos , sendo extraordinário no trabalho de capa e muleta que demostrou no décimo touro que lhe coube picar a sós, tendo-o enfeitado primeiro
com alguns pares de
bandarilhas postas com toda a perícia, mostrando ser um artista consumado nos passes de muleta e de capote.
A maneira elegante
como se colocava na frente do touro e o garbo como tirou quatro passes de peito valeram-lhe a maior das ovações
que ultimamente tinha havido naquela
praça. O sétimo touro também lhe pertenceu
quebrando a espinha
quando saltava á trincheira falsa sendo
arrastado para dentro quase morto. O cavaleiro José Bento de Araújo
picou bem, embora por vezes fosse um pouco precipitado. O outro cavaleiro Manuel Mourisca Júnior picou
o primeiro touro da lide com bastante mestria não sendo tão feliz no touro que lhe coube na segunda parte.
Torerito, Manene e Molina bandarilheiros da quadrilha de Guerrita trabalharam com bas tante distinção. Roberto
Peixinho e Minuto
bandarilharam bem e com correcção. Chamada de atenção para o divertimento dos chapéus na praça, demonstração de agrado que devia ser refreada pois era altamente
cansativa para os artistas e maçadora para os espectadores por dar lugar a um intervalo imenso. A direcção
da corrida esteve muito longe de ser boa porque o inteligente, andando a reboque da voz do público, muitas vezes não percebeu
os touros mandando-os recolher quando os artistas os estavam a aproveitar no trabalho
de capote.
Dia 5 no Campo de Sant'Anna
teve lugar a festa artística, benefício do banda rilheiro João Calabaça, toureiro arrojado
e diligente, e de Joaquim
Gaiato. Treze touros, todos puros, da
afamada raça de gado bravo de A. Luiz da Veiga e, á altura, pertencentes a Manuel da Silva Victorino , os quais cumpriram. O cavaleiro José Bento de Araújo foi arrojado
como sempre. O distinto
cavaleiro amador D. Luiz do Rego picou um touro mantendo os seus créditos.
Dos bandarilheiros portugueses só Peixinho esteve muito bem e a par de El Minuto.
O novel toureiro Silvestre Calabaça, filho do beneficiado , lidou um touro mostrando disposição para o tou reio. O beneficiado
fez uma brilhantíssima figura mantendo
os seus créditos de bom artista.
No geral, foi uma boa corrida.
Em Montemor-o-Novo , por ocasião da grande feira anual, nos dias 5 e 6 pelas quatro horas da tarde estavam anunciadas duas corridas de dez touros cada uma, das acreditadas manadas
dos herdeiros do Conde de Atalaia. Tomaram
parte os cavaleiros amadores D. António
de Portugal e Castro, Joaquim
Fiuza Guião e Aires Saturnino assim como o insigne espada espanhol Vicente
Mendes, El Pescadero
e os bandarilheiros João do Rio Sancho,
J. Maria da Costa, J. dos Santos, A. Gonçalves e A. Xavier Delgado.
Na segunda corrida,
tomou parte Filipe
Aragon, El Minuto. Finalmente um grupo de homens de forcado, dos campos de Montemor, fizeram lindas e valentes pegas.
Voltando ao Campo de Sant'Anna,
agora no dia 9, aconteceu
uma corrida nocturna,
que devia ter sido realizada
a vinte e nove do mês de Agosto,
de treze bons touros, oito deles para pé e pertencentes a Paulino da Cunha e Silva, descendentes da afamada raça de gado bravo de Rafael José da
Cunha e os restantes, para cavalo,
de extraordinária bravura
pertencentes a Emílio Infante da Câmara, Carlos
Marques, Jacinto Freire e Roberto & Irmão que os ofereceram, alguns célebres pela sua
ferocidade como o Foguete, o Desertor e o Carvoeiro. Os cavaleiros foram António Maria Monteiro que diligenciou agradar
e José Bento de Araújo que lidou um dos touros a pé, bandarilhando e trasteando á muleta, tal como já tinha executado
no dia vinte e dois de Agosto
em Vila Franca, trajando o elegante costume
andaluz. Terminou a fazer uma excelente pega de costas por se ver perseguido pelo touro, sendo muito ovacionado. Dos bandarilheiros portugueses Calabaça
e José da Costa obtiveram aplausos assim como os espanhóis Pescadero
e Minuto. Houve uma lide a ferros de palmo por Minuto e Calabaça.
A praça estava iluminada com três mil luzes, cujo ensaio de iluminação ocorreu
dia sete.
No domingo dia 12 de Setembro, estava
anunciado um torneio
tauromáquico promovido por uma comissão de aficionados em beneficio de uma família desvalida na praça de touros do Campo de Sant'Anna em Lisboa. Os touros em número de treze, todos puros,
eram pertencentes a D. Marcos
da Silva Noronha (Vagos), iguais aos que foram corridos
na última nocturna
do dia um de Setembro. Reapareceu o afamado
J. M. Casimiro Monteiro que estava há muito afastado
desta primeira arena.
Também a afamada
e notável matadora
de touros, que tinha obtido calorosos aplausos
nas praças de Sevilha, Cádis e Jerez,
considerada em toda a Espanha a non plus ultra da arte e do arrojo, a sra. D. Carmen Lucena, La Garbancesa
e sua quadrilha (dois bandarilheiros) marcaram presença no cartaz.
Anunciados estavam também os nossos melhores bandarilheiros.
Projectava o deputado
Jaime da Costa Pinto dar na praça de
Almada uma tourada cuja receita
seria em favor das obras da igreja
desta vila convidando para o efeito o cavaleiro
José Bento de Araújo a participar no evento.
Na vila
da Moita do Ribatejo,
por ocasião das festas em honra de Nossa Senhora da Boa Viagem, tiveram lugar duas corridas
nos dias 13 e 14. Os vinte e dois touros puros apresentados eram pertença de dois lavradores
de Benavente que, pela primeira
vez alugaram para esta praça, sendo doze para a primeira corrida
de João Vicente de Almeida
e os outros dez para a corrida do dia catorze de João Sabino Fernandes. Tomaram parte nestas corridas o cavaleiro José Maria Casimiro
Monteiro e os bandarilheiros Robertos, João Calabaça, José Maria da Costa e Augusto
Monteiro. O gado só entrou
na praça depois da chegada
do comboio da manhã. Os bilhetes estiveram
á venda na loja do sr. José Maria da Purificação Gaspar, na vila da Moita. Os preços
dos comboios de ida e volta (Lisboa-Setúbal) tinham preços
reduzidos no valor de trezentos
réis.
Organizada pelo antigo
aficionado, nesta altura empresário, António da Costa Guerra, teve lugar no dia 19 em Lisboa, na praça do Campo
de Sant'Anna uma corrida de doze touros bravos e de boa estampa comprados
a D. Caetano de Bragança
(Lafões), alguns dos quais muito saltadores que prejudicaram bastante
o trabalho dos artistas. Os cavaleiros da corrida foram
Manuel Mourisca Júnior e José Bento de Araújo que toureou com o costumado
arranjo, mostrando o primeiro ser o cavaleiro
correcto que se conhecia aproveitando os touros que lhe couberam e
sabendo vencer o seu soberbo
cavalo de combate
que pretendia negar-se, e que diligenciou em grandes upas deitar fora da sela o cavaleiro. O distinto matador Punteret bandarilhou com arte o sétimo touro acabando por passa-lo de muleta com tanto
garbo e destreza que obteve uma ovação. El Minuto e Calabaça
foram muito aplaudidos.
Pescadero esteve infeliz, não fazendo nada com as bandarilhas , apanhando um grande boléu por ter sido colhido
em cheio no quinto touro. Estavam anunciados
também Vicente Roberto e
Roberto da Fonseca assim como seu sobrinho João Roberto, os quais não tivemos
notícias da sua actuação. A praça apresentou
a grandiosa decoração
que tinha na corrida por amadores que se verificou
por ocasião do casamento
de Suas Altezas Reais o Príncipe D. Carlos e a Rainha D. Amélia.
Também no dia 19 estava anunciada para a praça de touros
de Torres Novas uma
corrida de dez vacas bravas pertencentes a Viúva Sirgado
& Filhos. Noticiados
estavam também o cavaleiro amador Victor Carlos
Martins acompanhado por um simpático grupo de conhecidos
artistas. A corrida compunha-se por dois chistosos
intervalos pelo Pae Paulino & Companhia.
Para as tardes de 21 e 22 de Setembro, durante as festas do Senhor da Piedade, em Elvas preparavam-se duas corridas de touros tendo sido a praça tomada
de arrendamento pelo sr. Lobão Rasquilha.
Para dia 26 anunciou-se para o Cartaxo uma corrida de touros pertencentes aos lavradores e criadores Irmãos Robertos com o cavaleiro
José Bento de Araújo, e os bandarilheiros Vicente Roberto, Roberto da Fonseca, João Roberto, José dos Santos e António
Augusto. Os camarotes
estiveram à venda no estabelecimento do sr. Joaquim Mendonça.
Também no mesmo dia em Almada teve lugar uma corrida com doze touros de José Maria dos Santos para os cavaleiros D. António de Portugal que foi substituído por Alfredo Tinoco, Joaquim Fiuza Guião e José Gabriel
Holbeche Júnior que penso ser a corrida projectada pelo deputado Jaime da Costa Pinto anunciada no periódico a 12 de Setembro. Os touros não se prestaram
ao torneio tendo farpeado Tinoco
o primeiro e o sétimo touro da corrida, este último a ferros curtos, tendo-os aproveitado bem. A Guião coube-lhe o terceiro e o nono procurando-os
com muito sangue frio metendo
alguns ferros com arte. Já Gabriel Holbeche
farpeou bem o quinto e foi muito feliz no décimo primeiro.
Todos os três cavaleiros foram ovacionados e brindados com pastilhas, ramos de flores e coroas com fitas de seda. Quanto aos bandarilheiros trabalharam bem João Calabaça e Sancho que
bandarilharam o segundo
da tarde. O quarto coube a José da Costa
e João Laureano e o sexto outra vez a João Calabaça agora
a par com Augusto Monteiro. Sancho, Costa e Silvestre
bandarilham o oitavo
e João Laureano e Neves o décimo. Fecharam João Calabaça, Sancho e Silvestre
o décimo segundo. O festejado
Sol e dó da Sobreda
tocou muito bem alguns trechos de
música e a filarmónica Incrível Almadense executou muito bem ao intervalo
uma peça de música muito aplaudida. Corrida
que gerou muita celeuma empregando os progressistas de Almada todos os meios lícitos e ilícitos para que esta festa de caridade não de realizasse. Após esgotadas todas as desculpas desde a pouca solidez da praça até à pouca competência dos cavaleiros, lembraram-se de empalmar a música que estava comprometida a tocar durante o evento.
Para intentá-lo vieram a Lisboa pedir um vapor que ficasse à disposição destes almadenses progressistas para irem esperar El-Rei. A ideia era desviar a música da corrida obrigando
a banda a ir tocar a bordo, gorando-se
as expectativas com a recusa da filarmónica Almadense. Não foram enviados polícias
para a praça e exigiram
do administrador que o regedor
substituto presidisse à corrida. O Dr. Juzarte,
administrador do concelho,
para obedecer às exigências dos mandões teve de sujeitar-se ao triste papel
de ver a corrida da trincheira. E para não haver dúvidas de que toda a guerra partiu destes falsos progressistas, pois os verdadeiros estavam indignados, de conveniência e com o consentimento das autoridades mandaram
distribuir um manifesto
insensato contra o deputado Costa Pinto.
Igualmente a 26 estava uma corrida de touros anunciada para Setúbal em beneficio
dos corpos da Associação Setubalense das Classes Laboriosas e da Associação dos Bombeiros Voluntários
da cidade. O gado foi cedido por José Maria
dos Santos a quem tanto a cidade
deve. Foi cavaleiro
Manuel Mourisca e bandarilheiros Minuto, Pescadero, Calabaça
entre outros.
A nocturna no Campo de Sant'Anna que estava anunciada
para 23 de Setembro foi transferida, por causa do mau tempo, para dia 2 de Outubro com doze touros do lavrador
D. Marcos da Silva de Noronha (Vagos)
iguais aos que tanto entusiasmo causaram na nocturna de um de Setembro. O campino
Joaquim Estalagem, conhecido
em todo o Ribatejo e criado deste notável
lavrador, farpeou um touro a cavalo. Os cavaleiros
foram António Monteiro e José Bento que foi substituído por Mourisca. Bandarilharam Roberto, João Roberto,
João Calabaça e os
espanhóis Pescadero Minuto e Silverio.
Nos dias 3 e 4 em Vila Franca, por ocasião da grande feira anual, anunciaram-se duas corridas de touros.
A 5 de Outubro anuncia-se pela última vez na praça de touros em Belém, as touradas burlescas
aos domingos, segundas,
quintas e sábados.
A 17 de Outubro teve lugar em Setúbal uma corrida de touros em beneficio do conhecido bandarilheiro Ajú. Esta corrida deveria ter sido realizada no dia 10, mas o curro de touros puros, apartados
a capricho para esta corrida,
pertencentes ao lavrador J. Costa Freire, apesar
de vir acompanhado de bastantes criados,
tresmalhou-se na condução, impedindo a corrida
de se realizar naquele dia. Foi uma boa tourada
apesar de só se conseguirem trazer à praça sete touros. João Pedro realizou um salto à vara e uma sorte de gaiola magníficos, dois touros foram farpeados
a cavalo e trabalharam muito bem os bandarilheiros dos quais tomou parte Minuto. Houve intervalo
de pretos (toureiros
africanos) e anunciaram-se fantoches
diabólicos e outros
atractivos. No sexto
touro teve uma chamada entusiástica o lavrador, inteiramente justa , com os touros fugidos
há doze dias não seria fácil encontra-los mais bravos.
A última corrida
da época no Campo de Sant'Anna aconteceu
a 24 de Outubro com doze touros corpulentos e bravos de Carlos Marques
para o cavaleiro Manuel Mourisca e os melhores bandarilheiros portugueses ,
tais como Roberto, Peixinho entre outros. Também actuou
o espanhol Minuto, que se despediu nessa tarde partindo depois para Montevideu assim como o insigne espada Rafael Guerra
(Guerrita) e seus destros bandarilheiros Juan Molina e Manuel Roiz (El Manene), artistas de apreço, os quais actuaram pela primeira vez na noctuma
do dia um de Setembro.
Só dois touros falharam, um para o cavaleiro
e outro para a lide a pé. O primeiro cavaleiro tauromáquico português, à altura, esteve correcto
com um touro mau e
o seu cavalo russo a intimidar-se com ele, negando-se à lide. Pena foi a ignorância de alguns espectadores, castigados severamente pelo público com uma apupada
que não perceberam que outro qualquer
cavaleiro nas mesmas
condições não fazia sequer metade do que Mourisca fez. Guerrita
esteve primoroso com o capote
e com a muleta alcançando uma grande ovação.
Lamentando os espadas
espanhóis de executarem
o trabalho dos bandarilheiros , sabendo apenas quando aqui chegavam
que tinham de bandarilhar e em condições muito piores que em Espanha, obrigados a fazer um trabalho
forçado, desvantajoso para o artista e para o público, pedia-se que trabalhassem mais de capote e muleta e não fossem obrigados a bandarilhar. Roberto da Fonseca esteve esplêndido, Minuto, Peixinho e Rafael distinguiram-se. José da Costa colocou muito bem dois pares de ferros. Uma salva ao empresário
Guerra que sobrepôs a qualquer
interesse mesquinho o interesse da arte. Boa tourada com casa bem composta.
A última notícia
da época dizia respeito a uma corrida
em Almada, marcada para o dia 19 de Dezembro e promovida por uma comissão
de ilustres almadenses, corrida essa que não chegou a realizar-se em virtude do gado se ter tresmalhado , chegando um dos touros
a descer até Cacilhas. O animal
próximo da cortina
do cais investiu com um catraeiro, o qual lhe furtou
o corpo, indo o bicho parar à água, tendo sido posteriormente laçado a muito custo e atado a uma carroça.
Agradecimentos
O autor agradece a minúcia e o detalhe manifestado na pronta ajuda de João Baptista Malta, seu primo e muito próximo , interessado e apaixonado aficionado tauromáquico.
BIBLIOGRAFIA
ALMEIDA, Jayme Duarte de - Enciclopédia Tauromáquica ilustrada. - Lisboa: Editorial Estampa, 1962.
ALMEIDA, Jayme Duarte de
- História da Tauromaquia técnica e evolução
artística do toureio. - Lisboa Artis Lda, 1951-1953. - 2 vol.
Publicações em série
DIARIO ILLUSTRADO / Fund. Pedro Correia da Silva. - Lisboa Impr. de Souza
Neves, 1872-1911 - Publicação diária referente
aos n.os 4 556, 1 de Janeiro
até 4 917, 31 de Dezembro
de 1886.