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quarta-feira, 23 de dezembro de 2020

Auto de Natal

 

Personagens (da esquerda para a direita) e de cima para baixo:
Dona Victória Augusta, Maurício, Aurora, Frei António, Catarina, Flora, Amora
 e Pandora. Falta aqui o autor do auto, que também é personagem do mesmo.


À Boniqueira Joana Santos,
criadora dos personagens deste auto,
à excepção de um que lhe é pré-existente
e para que conste, sou eu.

Prólogo
O enredo desenrola-se numa casa da baixa citadina de Estremoz. Ocorre na actualidade, em situação de pandemia. Os personagens remontam a tempos que já lá vão. Nasceram das mãos da Boniqueira Joana Santos, que os pôs à guarda do dono casa, que por isso também é personagem. O perfil de todos os intervenientes é descrito como segue.
Personagens
- D. AUGUSTA VITÓRIA (Dama): Senhora com pelo na venta e ligações remotas ao costado dos Braganças. Exige ser tratada de acordo com o estatuto social que considera ser o seu. Veste à moda do Antigo Regime e a roupa que usa vem toda de Paris. Gosta de andar de sombrinha, para o que der e vier. Está alojada no salão no topo de um móvel alto, como convém à sua augusta pessoa.  
- MAURÍCIO (Peralta): Cavalheiro charmoso, elegantemente vestido, de cabelo e bigode cor de cinza, marcas da patina do tempo. Os olhos grandes e profundos, atestam que é um homem com experiência de vida. O chapéu às três pancadas indicia que é um “bom vivant”. É um eterno apaixonado. Ama Aurora, a luz dos seus olhos. Ocupa um lugar de eleição: uma das prateleiras de uma estante colocada num local discreto e reservado da sala de estar.
- AURORA (Senhora de pezinhos): Mulher sensível, bela e elegante. Aperalta-se primorosamente para agradar a Maurício. Está sempre onde Maurício se encontra.
- FREI ANTÓNIO (Santo António): Franciscano, enverga o hábito simples consignado pela Ordem. Milagreiro, dado a leituras e sermões. Vive retirado no oratório do quarto do dono da casa, consciente das suas responsabilidades de Santo Protector.
- CATARINA (Ceifeira): Alentejana com memória de muitas lutas e esperança nos amanhãs que hão de vir. Permanece no último andar da casa, assente num pedestal, junto a uma janela. Com o seu olhar de moura encantada, ávida das claridades do Sul, está sempre atenta e perscruta o horizonte da charneca, à espera que chamem por si.
- FLORA (Primavera): Figura transbordante de alegria e calor humano, que personifica a harmonia associada à renovação da natureza. Está num nicho da sala de entrada, pronta a dar as boas vindas a quem vier por bem.
- AMORA (O Amor é Cego): Figura da qual irradia calor, paixão e disponibilidade para o amor carnal e doce. Encontre-se na sala de entrada, no mesmo nicho onde está Flora.
- PANDORA (Primavera de toucado): Figura da qual resplandece fertilidade, abundância, riqueza e prosperidade. Permanece na sala de entrada, no mesmo nicho onde estão Flora e Amora.
- ANTÓNIO ALTURAS (Pessoa que eu cá sei): Coleccionador e investigador coca-bichinhos de tudo o que tem a ver com a identidade cultural alentejana. Tem à sua guarda, várias criações da Boniqueira Joana Santos, o que não é tarefa fácil, já que todas têm alma e vida, paixão, ideais, convicções e credos, que por vezes as fazem entrar em conflito umas com as outras. Serve-se então das suas capacidade de negociador nato, as quais lhe permitem sanar conflitos. De resto e por precaução (Homem prevenido vale por dois), alojou-os lá em casa, distribuindo-os por várias divisões, tendo em conta as afinidades e as dissemelhanças entre eles.
Acção
Tudo começa quando António Alturas chega a casa. Na sala de entrada é recebido por Flora, Amora e Pandora, que lhe dirigem uma saudação, praticamente em uníssono:
- Seja bem-vindo António Alturas!
Ao que ele replica:
- Como é que estão Suas Graças?
E elas respondem:
- Estamos algo preocupadas. Frei António não pára de arengar. Ouve-se aqui tudo como se estivesse-mos ao pé do oratório. E o que é aborrecido é que ele repete sempre o que está a dizer.
A resposta não se faz tardar:
- Fiquem descansadas que eu já vou ver o que se passa.
E dito isto dirige-se para o quarto contíguo onde se encontra o oratório com Frei António. Aí, dá com o frade, de má catadura e cara de poucos amigos, pelo que lhe pergunta:
- O que é que se passa Frei António?
O frade põe logo tudo em pratos limpos:
- Meu caro António Alturas: Estou farto de reclusão e aproxima-se o Natal. Quero ir à Missa do Galo e depois cear com os meus irmãos argilosos que estão espalhados pelas divisões desta casa.
António pergunta-lhe então:
- E Frei António já sabe se eles querem cear consigo? E ir mesmo à Missa do Galo?
A resposta vem de rompante:
- Então não hão de querer? Era o que faltava não quererem…
António toma então uma decisão rápida:
- Pois fique sabendo, Frei António, que não há Missa do Galo para ninguém e não pode haver ceia conjunta cá em casa. Cada um come onde está e fica o assunto resolvido.
O frade não desarma e pergunta:
- Mas porquê? Dê-me uma razão forte, homem de Deus.
A resposta não demora:
- Ouça Frei António: São ordens do outro António, o Costa, que também é de gancho. É tudo por causa da pandemia. A Missa do Galo fica para o ano que vem, que o Galo não se importa. Quanto à ceia, cada um come onde está. D. Augusta Vitória, Frei António e Catarina têm de cear sozinhos. Aurora ceia com Maurício e, por fim, Flora ceia com Amora e com Pandora. São ordens para se cumprir!
Mas o frade não está pelos ajustes e replica:
- Cá em casa não há liberdade religiosa nem de circulação.
O anfitrião atira-lhe então com esta:
- Ah, ele é isso? Pois fique sabendo Frei António que se me continua a azucrinar, vou falar com o Superior da Ordem. Vou-lhe contar que de vez em quando dá umas escapadelas do oratório, para ir à procura de moças com bilhas partidas.
Foi remédio santo. O frade ficou manso que nem um cordeiro. As suas últimas palavras foram:                                                                         
- Pronto, meu caro António Alturas, não se fala mais no assunto.
Com o problema do frade resolvido, António Alturas foi dar conta das determinações aos outros membros da comunidade argilosa, um a um, ouvindo então as suas respostas. Primeiro foi D. Augusta Vitória que declarou:
- Ir à Missa do Galo com este tempo? Que horror, só de pensar nisso, fico com arrepios de frio. Quanto a ceias separadas, acho mesmo muito bem. Pode contar com a minha inteira colaboração. Não gosto nada de misturas. Mais vale prevenir que remediar.
Seguidamente foram Maurício e Aurora, falando o primeiro em nome de ambos:
- Nós vivemos um para o outro e sentimo-nos bem aqui no nosso cantinho. Missa do Galo e ceia conjunta? Não, obrigado!
Depois foram Flora, Amora e Pandora, falando a última em nome de todas:
- A nossa vida é o Carnaval que está à porta. Não queremos correr riscos. Por isso, dispensamos a Missa do Galo e a ceia conjunta. Pode contar com a nossa colaboração incondicional.                      
Por fim, foi Catarina:
- Eu à Missa do Galo não ia, que não sou dessas coisas. Mas agora, não haver ceia colectiva, acho mal. Não tem jeito nenhum a gente cear sozinhos. A gente juntos tem mais força.
António vê-se então obrigado a recorrer a argumentos mais fortes:
- A Catarina não se importa de poder vir a prejudicar companheiros? Onde é que está a sua consciência de classe?
Ao ver-se confronta com este argumento inescapável, a atitude de Catarina suaviza-se e ela acaba por ceder:
- Tem razão companheiro. Eu já sofri muito e por isso estou disposta a sofrer ainda mais se for preciso, para ajudar a construir um Mundo Novo.
Levanta então a foice no ar e grita a plenos pulmões:
- Avante, camaradas!
CAI O PANO
 
Publicado inicialmente a 23 de Dezembro de 2020

Dama (2020). Joana Santos (1978-  ).
 
Peralta (2020). Joana Santos (1978-  ).
 
Senhora de pézinhos (2020). Joana Santos (1978-  ). 

Santo António - Gancho de meia (2020). Joana Santos (1978-  ).
 
Ceifeira (2020). Joana Santos (1978-  ). 

Primavera (2020). Joana Santos (1978-  ). 

Amor é cego (2020). Joana Santos (1978-  ). 

Primavera de toucado (2020). Joana Santos (1978-  ). 

sábado, 19 de setembro de 2020

Presépios e inovação


Adoração dos pastores. Jorge da Conceição (1963 - ).

CRÉDITOS
Fotografias por cortesia dos barristas
Afonso Ginja, Irmãs Flores, Isabel Pires,
Jorge da Conceição, Maria Luísa da Conceição
e Ricardo Fonseca.

Presépios da Tradição
A recuperação da produção de Bonecos de Estremoz, extinta desde 1921, foi concretizada em 1935 e nos anos seguintes, graças à acção do escultor José Maria de Sá Lemos (1892-1971), que para o efeito recorreu primeiro à velha barrista Ana das Peles (1869-1945) e depois ao mestre oleiro Mariano da Conceição (1903-1959).
Uma tal recuperação incluiu as seguintes figuras de presépio: Berço do Menino Jesus (das pombinhas), Berço do Menino Jesus (dos putto), Nossa Senhora ajoelhada, São José ajoelhado, 3 Reis Magos em pé, 3 Reis Magos a cavalo, Pastor ofertante com um borrego ao colo, Pastor ajoelhado com um chapéu à frente, Pastor ajoelhado com um borrego à frente, Pastor ofertante das pombas, burro e vaca.
Com estas figuras de Presépio podem ser montados vários tipos de Presépio:
- PRESÉPIO DE TRONO OU ALTAR – Montado num trono ou altar com três degraus. No segundo e da direita para a esquerda, figuram Nossa Senhora ajoelhada, o Berço do Menino Jesus e São José. No terceiro degrau e também da direita para a esquerda, encontram-se os 3 Reis Magos em pé (Belchior, Baltasar e Gaspar). No primeiro degrau e igualmente da direita para a esquerda, acham-se o Pastor ofertante com um borrego ao colo, o Pastor ajoelhado e o Pastor ofertante das pombas.
- PRESÉPIO DE 3 FIGURAS: Nossa Senhora ajoelhada, Berço do Menino Jesus e São José ajoelhado.
- PRESÉPIO DE 5 FIGURAS: Nossa Senhora ajoelhada, Berço do Menino Jesus, São José ajoelhado, burro e vaca.
- PRESÉPIO DE 6 FIGURAS (Adoração dos Magos): Nossa Senhora ajoelhada, Berço do Menino Jesus, São José ajoelhado e os 3 Reis Magos em pé ou a cavalo.
- PRESÉPIO DE 6 FIGURAS (Adoração dos Pastores): Nossa Senhora ajoelhada, Berço do Menino Jesus, São José ajoelhado, Pastor ofertante com um borrego, Pastor ajoelhado e Pastor ofertante das pombas.
- PRESÉPIO DE 8 FIGURAS (Adoração dos Magos): Nossa Senhora ajoelhada, Berço do Menino Jesus, São José ajoelhado, 3 Reis Magos em pé ou a cavalo, burro e vaca.
- PRESÉPIO DE 8 FIGURAS (Adoração dos Pastores): Nossa Senhora ajoelhada, Berço do Menino Jesus, São José ajoelhado, 3 Pastores, burro e vaca.
- PRESÉPIO DE 9 FIGURAS (Adoração dos Magos e dos Pastores): Sagrada Família, 3 Reis Magos a pé ou a cavalo e 3 Pastores.
- PRESÉPIO DE 11 FIGURAS (Adoração dos Magos e dos Pastores): Sagrada Família, 3 Reis Magos a pé ou a cavalo, 3 Pastores, burro e vaca.
Para além destes presépios, que são os mais simples, podem a partir deles, montar-se presépios mais complexos recorrendo a figuras das fainas agro-pastoris.
Todos estes presépios poderão ser designados por “Presépios da Tradição” e continuam ainda a ser modelados por alguns barristas enfocados na morfologia, na cromática e na estética de Sá Lemos.

Presépios da Inovação
Como manifestação legítima da sua liberdade criativa e da sua auto-estima, os barristas foram introduzindo marcas identitárias muito próprias, produzindo figuras de Presépio e Presépios que fogem à estética de Sá Lemos e de seus seguidores. Para tal e recorrendo ao seu próprio estilo, foram reformulando essa estética em múltiplos domínios: morfológico, cromático e estético. Para além disso, passaram a juntar várias figuras numa peça única e a apresentar Presépios dentro de maquinetas e lâminas, retomando aqui uma prática que já era corrente nos sécs. XVIII e XIX. De resto, as figuras de presépios passaram a estar enquadradas em múltiplos contextos, que não necessariamente aqueles que simulam os tempos bíblicos.
Todos estes presépios que fogem à estética de Sá Lemos e dos seus seguidores, recebem a designação de “Presépios da Inovação”.
Sem sombra de dúvida que a nível de execução de Presépios, os maiores inovadores foram Isabel Pires, Irmãs Flores, Jorge da Conceição e Ricardo Fonseca. Apesar disto, barristas como as Irmãs Flores e Ricardo Fonseca continuam a modelar “Presépios da Tradição”. Pelo contrário, barristas como Isabel Pires e Jorge da Conceição deixaram há muito de criar Presépios que possam receber aquela designação.
Os “Presépios da Inovação” aqui reproduzidos não são mais que uma amostra representativa daqueles, já que eles são em número muito maior.

Balanço Final
À semelhança do que se passou com as imagens devocionais, creio ter ficado demonstrado de uma forma insofismável, a importância assumida pela “Inovação” como factor de enriquecimento e valorização do domínio dos “Presépios”.

Publicado inicialmente em 19 de Setembro de 2020

Presépio de 3 figuras. Afonso Ginja.

Presépio de 3 figuras. Afonso Ginja.

Presépio de 3 figuras. Afonso Ginja.

Presépio de 5 figuras. Afonso Ginja.

Presépio. Carlos Alves.

Presépio de trono ou de altar (4 andares). Irmãs Flores.

Presépio de cantarinha. Irmãs Flores.

Presépio alentejano. Irmãs Flores.

Presépio. Irmãs Flores.

Presépio. Irmãs Flores.

Presépio. Irmãs Flores.

Presépio. Irmãs Flores.

Presépio. Irmãs Flores.

Presépio de montanha. Irmãs Flores.

Maquineta com Presépio. Irmãs Flores.

Berço do Menino Jesus. Isabel Pires.

Presépio de 3 figuras. Isabel Pires.

Presépio de 4 figuras com Anjo. Isabel Pires.

Presépio de trono ou altar, reformulado (3 andares), com 1 anjo. Isabel Pires.

Presépio de trono ou altar, reformulado (3 andares), com 5 anjos. Isabel Pires.

Presépio alentejano. Isabel Pires.

Presépio alentejano. Isabel Pires.

Presépio alentejano. Isabel Pires.

Presépio alentejano. Isabel Pires.

Maquineta com Presépio. Isabel Pires,

Berço do Menino Jesus. Jorge da Conceição.

Berço do Menino Jesus. Jorge da Conceição.

Presépio de trono ou altar (3 andares)s, reformulado. Jorge da Conceição.

Presépio de 3 figuras. Jorge da Conceição.

Presépio de 3 figuras. Jorge da Conceição.

Presépio com a Sagrada Família (Só uma peça). Jorge da Conceição.

Presépio com a Sagrada Família (Só uma peça). Jorge da Conceição.

Presépio de 6 figuras (Adoração dos Magos). Jorge da Conceição.

Presépio representando a Adoração dos Magos (Só uma peça). Jorge da Conceição.

Presépio de 12 figuras com cenário (18 peças). Jorge da Conceição.

Presépio de 3 figuras. Maria Luísa da Conceição.

Presépio alentejano. Maria Luísa da Conceição.

Presépio de assobio. Maria Luísa da Conceição.

Presépio de 3 figuras. Ricardo Fonseca.

Presépio de 3 figuras. Ricardo Fonseca.

Adoração dos Magos. Ricardo Fonseca.

Presépio alentejano. Ricardo Fonseca.

Presépio alentejano. Ricardo Fonseca.

Presépio alentejano. Ricardo Fonseca.

Presépio alentejano. Ricardo Fonseca.

Presépio. Ricardo Fonseca.

Presépio. Ricardo Fonseca.

Presépio de galinheiro. Ricardo Fonseca.