sexta-feira, 3 de janeiro de 2025

José Lacerda no Mercado das Velharias em Estremoz


Vendedor de chocalhos. José Carlos Rodrigues (1970 - ).
Cortesia de Tói Lacerda.
 

José Lacerda é um amigo cigano de longa data, que anima semanalmente com a sua banca, o Mercado das Velharias em Estremoz. Conheço-o há tanto tempo, que me atrevo a dizer que o conheço desde sempre. É um homem bem-falante, arte que faz parte do negócio que é o seu. Em tempos tratou-me por Doutor e não sendo eu receptivo ao tratamento, promoveu-me imediatamente a Engenheiro, o que igualmente não me assentava bem, mas ele teimava dizendo:

- O meu amigo desculpe. Você tem estudos. Se não é Doutor tem de ser Engenheiro.

Eu bem lhe dizia que era só Professor e mais coisa nenhuma, mas não havia maneira de sairmos dali e eu já estava pelos ajustes. Um dia, disse-lhe:

- “Está o caldo entornado” e “Temos a burra nas couves”.

Parece que foi remédio santo. A partir daí, passou a tratar-me por amigo Hernâni e o nosso relacionamento passou a ser mais natural e saudável.

Fazemos negócio sempre que calha ter alguma peça que me encha as medidas. Ele já sabe o que me interessa e começa a cantar alto como se estivesse no Orfeão e eu, naturalmente, faço ouvidos de mercador. Por outras palavras, esgrimimos. É manha contra artimanha. E lá fazemos negócio, normalmente pouco silencioso, mas tudo acaba em bem ou em mal. Depende do ponto de vista. Umas vezes engana-me ele, outras vezes engano-o eu. E já ouvi da boca dele, aquilo que para mim é encarado como um elogio:

-  Amigo Hernâni: Você é mais cigano do que eu.

Ao longo dos tempos, o meu amigo José Lacerda tem-me vendido arte pastoril, Bonecos de Estremoz, louça de barro vermelho de Estremoz e louça vidrada de Redondo, tendo com isso contribuído para a edificação das minhas colecções. É claro que nem sempre compro, pois mesmo que me interesse, nem sempre é oportuno abrir os cordões à bolsa. É nessas alturas que ele me diz:

- O meu amigo não se preocupe. Não precisa de pagar agora. Paga depois.

O que vale é que eu estou imunizado contra a lábia dele.

José Lacerda é uma figura muito popular e uma referência no Mercado das Velharias em Estremoz. No terrado que semanalmente ocupa no Rossio de Estremoz, destaca-se a sua banca bem provida de chocalhos. Foi esse pormenor, o tema escolhido pelo seu filho Tói Lacerda, para encomendar um Boneco de Estremoz que representasse o pai no Mercado da Velharias. A criação da figura deve-se ao barrista José Carlos Rodrigues, a quem felicito pelo bem conseguido trabalho. Através dele, o cigano José Lacerda ficou perpetuado na barrística popular estremocense. Basta olhar para o Boneco que se é levado a dizer:

- Olha o Lacerda!

2 comentários:

  1. Bom dia


    Bom dia S. Professor Hernâni gostei do texto, da vossa coversa. Temos o caldo entornado temos o burro nas couves. É sempre um olho nu burro outro no sigano.

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    1. A última frase idiomática que está a usar neste comentário, não foi por mim usada no texto.

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