As migas à alentejana são confeccionadas com toucinho,
entrecosto de porco, dentes de alho, sal, massa de pimentão, pão e água.
Vejamos como são preparadas: Metem-se tiras finas de toucinho num tacho de
barro, que é levado ao lume, até o toucinho derreter. Na gordura resultante
frita-se entrecosto previamente temperado com massa de pimentão e alhos pisados
em sal. Terminada
a fritura do entrecosto, este é retirado do recipiente e aí são alourados
alguns dentes de alho esmagados. Seguidamente juntam-se fatias de pão muito
finas, que se deixam fritar ligeiramente. Junta-se então água a ferver e sal e
esmaga-se o pão com uma colher de pau. Depois deste estar esmigalhado, vai-se
mexendo com a colher, para a gordura se incorporar no pão. Com a continuação do
aquecimento, o pão começa a secar e quando a consistência é a adequada, estão
prontas as migas, que se comem acompanhadas do entrecosto frito.
As migas, tal como as açordas têm origem na “Tharid” ou
“Tárida”, étimo proveniente do árabe “Târada”, que significa “migar pão”. A
Tharid era e é cozinhada com pão cozido ou sauteado num meio mais ou menos
húmido, adicionado de gordura e até de carne. Segundo os antigos, aquela
receita era muito apreciada por Maomé (572-630), o Profeta e integrou a
gastronomia da Península Ibérica (Al-Andaluz) durante o período da ocupação
árabe (711-1492). Esta deixaria marcas muito positivas nos mais diversos
domínios, entre eles a gastronomia.
As migas à alentejana são uma das jóias gastronómicas da
ancestral cozinha transtagana, criada por mãos sábias a partir dos ingredientes
que a terra dá e que alquimicamente são transmutados em odores e sabores por
magia de saberes remotos. Daí que as migas, tal como a açorda ou o gaspacho
constituam património gastronómico do Alentejo e estejam indissociavelmente
ligadas à identidade regional. Na obra “Para uma História da Alimentação no
Alentejo", Alfredo Saramago (1997) diz-nos: “O Alentejo não conheceu uma
cozinha de rico e uma cozinha de pobre, quer dizer, um conjunto de práticas
alimentares seguidas por uma classe e ausente dos hábitos da outra. O que
separava as pessoas e as distinguia na alimentação era a quantidade e a
frequência. A açorda do rico tinha mais azeite e as migas mais carne. Uns
comiam mais chouriço e paio, outros mais toucinho e farinheira. As receitas
eram as mesmas.”
Em Lisboa e noutras regiões do país, chamam açorda às migas.
Daí que na revista Musical “Palhas e Moinhas”, de João Vasconcelllos e Sá,
estreada em Évora em 1936 e que retrata os usos e costumes alentejanos, fosse
cantado a certa altura, em referência ao Alentejo: “Terra de grandes barrigas /
onde há tanta gente gorda. / Às sopas chamam açorda / e à açorda chamam-lhe
migas;”
As migas estão presentes na nossa literatura de tradição
oral. A nível de ADAGIÁRIO registo: “As migas como as formigas”, “Não estou
para dar migas a um gato”, “Não é por falta de alho que se não fazem as migas”.
Na GÍRIA POPULAR é conhecida a expressão: Pote das migas (Barriga). Quanto a
ALCUNHAS ALENTEJANAS, assinalo: MIGAS – Alcunha outorgada a indivíduo que gosta
muito de comer migas (Aljustrel, Monforte, Portel e Santiago de Cacém); -
Epíteto atribuído a sujeito que questionado no trabalho acerca daquilo que
levava para o almoço, respondia invariavelmente: umas migas (Évora); -
Denominação herdada do pai (Moura). Por sua vez, o CANCIONEIRO POPULAR
ALENTEJANO inclui a quadra: “Para lavrar, abegões, / P’ra poupar bois, os
boeiros, / P’ra comer migas, ganhões, / P´ra laurear, carreteiros.”.
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