Pastor das migas (1948). Mariano da Conceição (1903-1959). Museu Rural de Estremoz.
O núcleo
base do figurado de Estremoz reúne mais de uma dezena de pastores, dos quais um
é conhecido por pastor das migas. Esta imagem exibe alguns dos atributos do
pastor: samarra de pele de borrego ou de ovelha, safões, botas de cabedal, calças de
saragoça ou de burel castanho, casaco de ganga azul e camisa clara com pregas,
de colarinho alto de pontas dobradas, fechado por um par de botões cor de
latão. O pastor está sentado num banco paralelepipédico de cor castanha,
provavelmente de madeira. À sua frente um barranhão com migas, no qual está
mergulhada uma colher que ele segura com a mão direita. Por sua vez, a mão
esquerda segura um pão assente na perna do mesmo lado.
Desta
figura existem duas variantes: - PM1 – O barranhão está em cima dum cilindro de
cor castanha, presumivelmente um cepo de madeira, pelo que o artefacto
representa um pastor (com barrete na cabeça) que está a comer migas. Esta é a
representação de Isabel Carona; - PM2 – O barranhão assenta numa trempe preta,
de ferro, tendo por baixo, achas de lenha a arder. A imagem representa um
pastor a fazer as migas. Desta variante existem duas sub-variantes: - PM2A – O
pastor tem na cabeça um chapéu aguadeiro. Assim é representado por José
Moreira; - PM2B – O pastor cobre a cabeça com um gorro. Esta a figuração de
Mariano da Conceição e demais barristas, à excepção de José Moreira. Em
qualquer das variantes, a figura está assente numa base trapezoidal de cor
verde, pintalgada de branco, amarelo e zarcão, numa alegoria a um chão atapetado
por erva e tufos coloridos de flores silvestres.
O vocábulo
“migas” é o plural do substantivo feminino “miga”, derivado etimologicamente do
latim ”mica” (parcela, migalha, grão, partícula, corpúsculo).
A
referência literária mais antiga sobre migas remonta a 1523, é devida a Gil
Vicente e surge no “Auto Pastoril Português”, no diálogo entre duas pastoras:
“CATERINA - Rogo-te que no-lo digas.
MARGARIDA - Mas é pera adivinhar / e quem quer que o acertar / eu a fartarei
de migas.”. Também Fernão Rodrigues Lobo Soropita (séc. XVI-XVII), em “Carta de
um negro a uma dama com um soneto” se refere a migas: “…confio, me será mais
saborosa que migas de azeite com vez de vinho em cima. Entretanto ,
bem podeis fazer conta que estou a curtir, como cordovão em pelame, e não
haverá cousa que me desatolle desta tristeza.”.
Mais
recentemente das migas nos fala João Falcato (Elucidário do Alentejo – 1953):
“Modestas, sem a fragrância da Açorda, sem o apreço agradecido do Caspacho, as
Migas são o pilar da resistência duma raça aos convites estranhos para loucas
transformações.”
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