Hernâni Matos (Fotografia de Miguel Belfo).
Como noticiámos na última edição do jornal E, a Câmara Municipal de Estremoz declarou a caducidade do protocolo de cedência de instalações no Centro Cultural Dr.Marques Crespo, que tinha assinado com a Associação Filatélica Alentejana (AFA) e deu 30 dias à associação liderada por Hernâni Matos, para entregar as instalações. A sociedade e os agentes culturais estremocenses agitaram-se, mas a autarquia manteve a decisão. Passado esse tempo, impõe-se ouvir o que Hernâni Matos tem a dizer sobre a saída da AFA do Centro Cultural.
Miguel Belfo, Hugo Silva
E - Como
recebeu a notícia?
HM - Foi como se tivesse
recebido um tiro à queima – roupa. Não estávamos à espera. Tínhamos sido ali
alojados por proposta do vereador Júlio Rebelo aprovada em sessão do Município,
no final do mandato em 2005 e que deu origem a um protocolo de cedência de
instalações, subscrito pelo presidente do Município Luís Mourinha, então membro
da CDU e por mim próprio.
Júlio Rebelo perdeu as eleições seguintes, mas o
executivo PS eleito, presidido por José Fateixa, honrou o protocolo anterior, o
qual foi renovado em finais de 2006, subscrito por José Fateixa e por mim. Uma
das cláusulas de caducidade do contracto de cedência de instalações era a
invocação pelo Município da necessidade das mesmas, que foi o que agora
aconteceu. Daí que não tivéssemos outra solução senão sair, que foi o que
fizemos, tendo entregue as chaves das instalações na data limite fixada pelo
Município. Na oportunidade, agradecemos todo o apoio anteriormente concedido e
que remonta a 1983.
E – Acha que
o Município tem efectivamente necessidade das instalações utilizadas pela AFA,
visando fins de Arquivo Municipal?
HM – Creio que sim, uma vez
que tenho conhecimento que o Arquivo Municipal está disseminado por vários
locais e nalguns casos a documentação está em risco, o que não pode acontecer,
visto que essa documentação é a memória escrita do concelho. Todavia não posso
deixar de realçar que, se por um lado, as instalações utilizadas como sede
reúnem condições para albergar parte do Arquivo Municipal, já a sala de
exposições, nem lá perto, uma vez que essa sala dá acesso ao Museu Rural e à
sala de exposições de A BILHA projecto de arte, de Carlos Godinho. A não ser
que o Município erga algumas paredes nessa sala, não é viável utilizá-la para
fins de arquivo. De resto, as condições ambientais não são as melhores. Mas o
Município lá sabe.
E – Que
medidas tiveram que tomar na sequência da decisão do Município?
HM - Em primeiro lugar a procura de
um espaço público onde as duas colecções de bonecos de Estremoz e a colecção de
olaria, pudessem ser visitadas. Em segundo lugar a necessidade de nos descartarmos
de enorme quantidade de equipamento, ficando só com aquele que se adequasse ao
espaço a alugar. Esse descarte foi concretizado e o espaço foi alugado. Só a
procura de espaço público para expor a barrística de Estremoz se gorou.
E - O que
aconteceu?
HM - Contactámos
o Engº Rui Dias ,
Director Executivo da Associação “Centro Ciência Viva de Estremoz”, que foi
visitar à sala de exposições da AFA, as duas colecções de bonecos de Estremoz e
a colecção de olaria. Dissemos-lhe que íamos dali embora e gostaríamos que as
colecções ficassem num espaço público visitável. Como o Centro Ciência Viva se
debruça sobre as Ciências da Terra e o barro é uma rocha sedimentar,
parecia-nos que as colecções poderiam ali ficar, se no Centro houvesse um
espaço disponível. Seria uma parceria mutuamente enriquecedora. O Engº Rui Dias ficou entusiasmado com
a proposta, declarando que haveria que celebrar um protocolo, pedindo-lhe eu
que fosse ele a fazê-lo depois de férias, a partir de outros já existentes.
Tudo ficou acordado pela palavra entre homens de bem. Há disso testemunhas.
Disse-nos ainda que as colecções poderiam ir para lá quando quiséssemos. Em
primeiro lugar foram transportadas as colecções com as peças acondicionadas em
grades, que ficaram no rés-do-chão, à espera de poderem ir para o 2º andar,
para a sala que lhes fora destinada. Quando a sala foi limpa, transportámos
para lá 13 estantes exposicionais, 39 prateleiras, 13 vidros e uma roda de
oleiro, com recurso a carregadores contratados, os quais tiveram que vencer 2
lances de escada, pois o monta-cargas estava avariado. Após o equipamento estar
todo montado e limpo, só faltava levar para lá, as grades com as colecções a
montar. Antes de isto acontecer, sou contactado pelo Eng Rui Dias que me disse que o
nosso acordo verbal estava sem efeito, que ele tinha cometido um erro e que
tínhamos de levar tudo dali para fora. Por mais que insistisse para que me
dissesse qual tinha sido o erro, recusou-se a fazê-lo, o que terá de fazer
depois do seu regresso de férias, uma vez que não posso aceitar que não o faça.
Voltou então tudo à estaca zero e tivemos que transportar dali para fora tudo o
que tínhamos levado e não foi pouco.
E - E depois?
HM - Depois pensámos na Escola Secundária da Rainha Santa Isabel, que era um local
igualmente adequado, pois na Escola houve cursos de olaria e foi graças à acção
de Sá Lemos, director da Escola, que nos anos 30 do século passado, renasceram
os bonecos de Estremoz. Para além disso existia já um espaço, dedicado à
memória da Escola. Nesse sentido contactámos o actual director da Escola,
professor José Salema, que nos informou que tal não era viável, uma vez que o espaço
ainda disponível, iria ser utilizado na exposição de trabalhos antigos de
alunos, de acordo com projecto do Conselho Directivo. Tivemos pena, mas foi a
realidade crua e dura.
E – Como viu
a solidariedade de que foi alvo, tal como a AFA?
HM - Ficámos sensibilizados,
por que corresponde ao reconhecimento do que fizemos em termos culturais. Foi
no vosso jornal, a palavra amiga de 5 ex - Vereadores da Cultura, bem como de
duas figuras cimeiras da cultura local. Mas foi também na rua, a solidariedade
do povo anónimo. A todos o nosso muito obrigado. Bem hajam!
E - Neste momento qual é o ponto da situação?
HM - Estamos em compasso de
espera. Há que “Bailar conforme a música” e ter em conta que “Há mais marés que
marinheiros”, bem como “Mudam os ventos, mudam os pensamentos”. “ A ver vamos
como diz o cego”.
E – Quer comentar tudo o que se passou?
HM – Faço-o, citando um dos livros da Bíblia: “Pai, perdoa-lhes; porque não sabem o que fazem.” (Lucas 23 34).
E – Que mensagem deixa aos nossos leitores?
HM – Citarei apenas Manuel
Alegre na “Trova do Vento que passa”: “Mesmo na noite mais triste/ em tempo de
servidão/ há sempre alguém que resiste/ há sempre alguém que diz não.”
Espero sinceramente que haja uma rapida solucao.
ResponderEliminarNao se pode deixar por terra tanta historia.
Como diria um amigo meu: "nem que seja numa tipica adega aberta ao publico".
Acredito numa rapida solucao.
Natália:
EliminarObrigado.
Os meus cumprimentos.
Caro Hernâni,
ResponderEliminarÉ extraordinário o trabalho consistente, regular e de qualidade inquestionável que faz, divulgando a nossa História como muito pouco se conhece ou se lembra, remoçando-nos a memória!
Ainda bem que está aí. É graças a si, e a poucos como o Hernâni, que ficamos com a certeza que vale a pena seguirmos o nosso caminho!!!
Obrigada por tudo, porque além da História temos cultura contemporânea, que só enriquece quem o lê!!
Cordiais cumprimentos, Eduarda.
Eduarda:
EliminarObrigada pelo seu comentário e pelo interesse manifestado.
Os meus cumprimentos.
Caro amigo Hernani
ResponderEliminarFiquei estupefacta com o sucedido. Vê-se a cada passo por este País fora, que história e património nas suas diversas vertentes, não interessam, é desprezado, ignorado. O amigo citou Manuel Alegre, eu direi um ditado popular. "Os cães ladram mas a caravana passa"! E passará certamente. Bem haja pela perseverança.
Céu:
EliminarObrigado pelo seu comentário.
Os meus cumprimentos.
Com tanto espaço livre no Palácio dos Marqueses de Monforte e Praia, não lugar para tão importante coleção? E com candidatura a Património da Humanidade? É espantoso!!!! Coragem e muitos parabens pelo trabalho desenvolvido!
ResponderEliminarTeresa:
EliminarObrigado pelo seu comentário.
Os meus cumprimentos.
Parabéns pelo esforço q tem exercido pela cultura. Há sempre alguém q resiste. Estamos consigo e contra aqueles que menosprezam a história cultural. Obrigada Amigo Hernâni. Continue.
EliminarObrigado, Lina.
EliminarOs meus cumprimentos.
Embora desconhecendo o real trabalho realizado pela associação, sou contra. Por princípio, sou sempre contra qualquer medida que prejudica a cultura e que é justificada por uma qualquer razão. Razões, reais ou virtuais, é o que não falta. Infelizmente, a cultura vai faltando...
ResponderEliminarJoão:
EliminarObrigado pelo seu comentário.
Os meus cumprimentos.
Abraço de solidariedade.
ResponderEliminarObrigado, Luís. Um abraço.
EliminarLamento caro amigo o sucedido com a AFA. O Coleccionismo nem sempre é visto como Cultura pelas edilidades. E ainda por cima com colecções/exposições permanentes relacionadas com a terra/região. Não haverá um cantinho (e interesse,claro) na antiga Escola Técnica?...
ResponderEliminarTambém nós, em Setúbal, estamos num espaço cedido pela CMS (CDU)...mas a troco de uma renda mensal. Talvez assim seja mais seguro. Ou não? Por isso, um grande abraço e boa sorte, pois nem sempre é pelo merecimento que as coisas acontecem.
José:
EliminarNa minha entrevista, eu fala na hipótese da Escola Industrial, que também se gorou.
Obrigado pelo teu comentário.
Um grande abraço para ti.
Já nada me espanta. A falta de palavra, a mentira, o deixa andar, é apanágio de gente que se serve... e não serve!
ResponderEliminarForça e nada de desânimos! Mas que custa, custa!...
Um abraço, amigo Hernâni .
mfernanda/.
Fernanda:
EliminarObrigado pelo seu comentário.
Eu sou da natureza de não me render.
Os meus cumprimentos.
Meu caro Hernâni Matos ao ler a tua entrevista percebo nas entrelinhas como estás magoado com toda esta situação? Enquanto a lia lembrei-me : e a vivenda onde estava a GNR? era um local central, airoso e situa-se numa das avenidas mais bonitas de Estremoz. Não sei a quem pertence, mas parece-me uma vivenda tão simpática para albergar as tuas colecções. É só mais uma das muitas sugestões que já te devem ter dado nestes últimos dias. Um beijo da amiga Zuzu
ResponderEliminarZuzu:
EliminarObrigado pelo teu comentário.
Beijinhos.