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terça-feira, 25 de outubro de 2016

58 - O aguadeiro - 8


Aguadeiro (2014).
Jorge da Conceição (1963-  ).
Colecção particular.
Figurado de Estremoz – 3
Vimos que o núcleo base do figurado de Estremoz inclui um exemplar conhecido por “Aguadeiro”, conjunto constituído por uma figura antropomórfica masculina (o aguadeiro) e uma figura zoomórfica (o burro). Trata-se de uma peça produzida pelos sucessivos barristas, utilizando as suas próprias marcas de identidade, mas sem fugir aos traços gerais do modelo original. Todavia, nem todos assim procederam, quando ao modo de Estremoz, manufacturaram figuras, que duma forma insofismável, continuam a traduzir a identidade cultural regional e local, observável em tempos ainda não muito recuados.
O aguadeiro de Jorge da Conceição (2014) é um conjunto constituído por uma figura antropomórfica masculina (o aguadeiro), um carrinho de mão para transporte de cântaros e a fonte na qual se abastece de água. Representa um aguadeiro rural trajando à maneira de meados do séc. XX, com o braço direito pendente, empunhando um cocho de cortiça para beber água e o braço esquerdo erguido, com a mão segurando um lenço branco com que limpa o suor. Na cabeça, dois pontos negros em fundo branco, representam os olhos, encimados por dois traços castanhos de espessura diferente, que figuram as pestanas e as sobrancelhas. No nariz em relevo, estão representadas as narinas. Na boca, os lábios avermelhados igualmente em relevo. O cabelo é castanho-escuro, penteado para trás, com patilhas laterais e apresenta também volumetria, tal como as orelhas que estão a descoberto. A figura enverga calças em relevo, de cor castanha e camisa ainda em relevo, de cor cinzenta, com as mangas arregaçadas, fechada no peito por três botões brancos de forma semiesférica e é atada à frente, à moda dos eguariços. Os botins são analogamente castanhos, ainda que duma tonalidade diferente das calças.
À frente do homem encontra-se um carrinho de mão, com dois pés e dois braços, de cor castanha, sugerindo madeira. A roda com seis raios, similarmente castanhos, apresenta o aro exterior cinzento-escuro, lembrando ferro. O estrado do carrinho apresenta duas cavidades para transporte de cântaros, orladas com um anel em relevo e de cor cinzento-escuro, alvitrando borracha. No buraco da frente está encaixado um cântaro de tom avermelhado, evocando barro e cujo gargalo se encontra vedado por uma tampa de cor castanho-claro, supostamente de cortiça. O buraco de trás, está parcialmente encoberto por um chapéu aguadeiro preto, de fita igualmente preta.
A fonte, de cor branca, aparentando alvenaria caiada, tem um depósito em forma de urna ornamentada por grinaldas de flores, é encimada por uma vieira e ostenta duas gárgulas antropomórficas, tudo em relevo. Das bocas das gárgulas saem tubos de cor cinzento-escuro, aparentando ferro e dos quais jorra “água” de tom prateado. A urna está emoldurada a azul do Ultramar. Sob a bica da direita encontra-se um cântaro semelhante ao anterior, a recolher água e cuja tampa está assente no bordo da taça, em cor branca de mármore com veios.
O conjunto assenta numa base rectangular de cor verde bandeira, pintada lateralmente num tom castanho-avermelhado.
O exemplar de figurado de Estremoz aqui descrito exige uma confecção mais complexa e morosa do que o espécimen anteriormente descrito. Para além disso e já não é pouco, corresponde em termos de imaginário do seu criador, a uma ruptura com aquilo que vinha sendo feito, elevando assim a nossa barrística a um novo patamar, como já tinha acontecido na criação de outros modelos. É caso para dizer que ocorreu aqui uma mudança de paradigma, a qual se regista e se valoriza.

Hernâni Matos

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