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sábado, 22 de outubro de 2016

ANTÓNIO GUTERRES VISTO POR COELHO RIBEIRO (Entrevista conduzida por Hernâni Matos)

Hernâni Matos (entrevistador) e Coelho Ribeiro (entrevistado).

José Coelho Ribeiro, 82 anos, bancário aposentado e membro do Partido Socialista, foi Presidente da Câmara Municipal do Fundão no mandato 1976-1979 e Presidente da Assembleia Municipal de Estremoz no mandato 1986-1989, cidade em que se fixou em 1980. Natural de Medelim (Idanha-a-Nova), mantém relações de estreita amizade com António Guterres, eleito recentemente Secretário-geral da ONU. Daí a razão da presente entrevista.

O DESPERTAR DE COELHO RIBEIRO
Como e quando, é que o cidadão Coelho Ribeiro despertou para a intervenção cívica e política?
A questão que me coloca leva-me a recuar até ao ano de 1954. Se me permite e para responder à sua pergunta, vejo-me obrigado a invocar esta data, tendo em conta a gravidade dos acontecimentos em que me vi envolvido. Foi, sem dúvida, o marco que gerou a minha repulsa à ditadura de Salazar e de Caetano. No mês de Junho desse ano, estando em Lisboa, caminhava para o café Martinho, para me encontrar com conterrâneos. Ao aproximar-me do Teatro Dona Maria II, ouvi  nas proximidades do Coliseu dos Recreios, uma gritaria cujo teor não consegui perceber. Curioso como os demais, interrompi o meu caminho, para perceber o que se estava a passar. Ao aproximar-se o pequeno grupo de manifestantes, ouviram-se com clareza, palavras de ordem contra a ditadura, exigindo a liberdade de todos os povos das colónias portuguesas (É que na Índia Portuguesa, tinha ocorrido a penetração de Satiagrais, que entravam com uma conduta pacífica, mas pretendiam uma progressiva ocupação do território). Foi então  que surgiu a GNR a cavalo, agredindo à  bastonada todos os que se atravessavam no seu caminho. Tentando fugir, subi a Rua Nova do Almada e junto dos Armazéns do Chiado fui interceptado por uma brigada da PSP, que me obrigou a parar e me levou debaixo de prisão para o Governo Civil. Na sequência desta ocorrência, associei-me aos opositores da ditadura.  
Quando, como e porquê, ingressou no PS?
Foi em Junho de 1974, que pelo motivo apontado e a convite de um médico e amigo fundanense, me filiei no Partido Socialista. 
Como é que o bancário Coelho Ribeiro se transformou em Presidente da Câmara Municipal do Fundão?
Em 1976, no decurso do processo eleitoral para as primeiras eleições autárquicas, ocorreu na sede do PS do Fundão um intenso debate, com vista à indigitação do candidato à Presidência da Câmara Municipal do concelho. Nesta discussão encontrava-se presente o meu amigo António Guterres. Numa dessas reuniões, alguém fez surgir o nome de um militante que viria a ser rejeitado. Foi então que outra pessoa indicou o meu nome, tendo eu declinado o convite. Perante tal impasse, apareceu mais tarde o camarada Mário Soares, que me convenceu a aceitar a indigitação, argumentando que com a eleição não sairia do Fundão, ao contrário do que teria acontecido se tivesse aceite ser candidato a Deputado nas eleições para a Assembleia Constituinte e para a 1ª Assembleia Legislativa. Foi assim que vim a ser eleito Presidente da Câmara Municipal do Fundão.

A AMIZADE COM ANTÓNIO GUTERRES
Quando é que conheceu António Guterres?
Como já referi anteriormente, conheci o António Guterres em 1976,  no decurso do processo eleitoral para as primeiras eleições autárquicas.
Qual a natureza da sua amizade com António Guterres?
A natureza da nossa amizade foi e é essencialmente política. 
Como é que caracteriza o amigo António Guterres como pessoa e como político?
Não resisto à tentação de referir nesta entrevista uma ida com o meu camarada ao Seminário do Fundão, em Novembro de 1979, no decurso da campanha eleitoral para as eleições legislativas desse mesmo ano. Tendo em conta que a Igreja Católica sempre atacara o Partido Socialista, interroguei-o acerca do que iríamos discutir com o Reitor do Seminário. Disse-me para ter calma e assim fiz. Fomos admiravelmente recebidos pelo Reitor. Durante a conversa, estive quase sempre calado, a escutar o diálogo entre eles, até que o Reitor me solicitou que facultasse a máquina de rasto da Câmara, com vista ao alargamento do campo de futebol do Seminário, ao que eu acedi. Já fora das instalações, perguntei ao António, o que é que ele pensava beneficiar com aquela reunião. Respondeu-me que se dali se conseguisse amortecer os ataques da Igreja Católica local ao Partido, já seria um grande benefício. E assim foi, já que nessas eleições, ela não atacou o PS. Desta passagem das nossas vidas, entre muitas outras, consegui perceber que estava em presença de um homem com qualidades humanas e políticas excepcionais. A sua vitória nas eleições para Secretário-geral da ONU, constitui o melhor testemunho das suas extraordinárias competências como notável cidadão português.

DA BEIRA PARA O ALENTEJO
Depois de terminar em 1979 o seu mandato como Presidente da Câmara Municipal do Fundão, o cidadão Coelho Ribeiro fixou-se em 1980 na cidade de Estremoz, onde assumiu novamente a sua condição de bancário. A mudança de localidade foi uma mera questão profissional ou traduziu algum desencanto com o Fundão ou mesmo ruptura com o PS local?
Em 1980, por motivo da minha actividade profissional, fixei residência na cidade de Estremoz, decidido a acabar com a minha actividade política e autárquica. Todavia, no ano de 1982, o José Costa e o João Matos bateram-me à porta para me convidarem a participar numa reunião na sede local do Partido Socialista. Foi aqui, que começou o princípio do meu envolvimento nas eleições autárquicas de Estremoz, vindo a ser Presidente da Assembleia Municipal. Estes dois militantes do meu Partido, tornaram-se os meus maiores amigos nesta cidade.
Em 1986, dando a impressão de que acabou de efectuar a sua travessia no deserto, integrou com êxito a lista vencedora à Assembleia Municipal de Estremoz. Como é que o cidadão Coelho Ribeiro aparece novamente activo como autarca socialista?
Por influência dos camaradas anteriormente referidos, José Costa e João Matos.

GUTERRES VISTO POR COELHO RIBEIRO
Na sua vida política, António Guterres foi Deputado à Assembleia da República, Presidente da Assembleia Municipal do Fundão, Secretário-geral do PS, Primeiro Ministro de Portugal, Presidente da Internacional Socialista e Alto Comissário da ONU para os Refugiados. Como é que o cidadão Coelho Ribeiro encara o desempenho de todos estes cargos pelo seu amigo António Guterres?
Desempenhou com grande êxito todos os cargos para que foi designado, exercendo as suas funções de uma forma altamente competente.
Quais as expectativas que tem como corolário da eleição de António Guterres para Secretário-geral da ONU?       
Como aconteceu em todos os cargos anteriormente desempenhados, prevejo um imenso sucesso nas suas novas e futuras funções, já que as suas capacidades são enormes.
Quer enviar daqui uma mensagem ao amigo António Guterres?             
Envio-lhe daqui um fraternal abraço e reitero-lhe o meu incondicional apoio.

Encontro do PS na Covilhã, nos finais da década de 70. Da esquerda para a direita:
Coelho Ribeiro e esposa, Francisco Carlos Ferreira (Deputado do PS à Constituinte
pelo Círculo de Castelo Branco) e António Guterres. O braço que se vê à direita,
é de Mário Soares.

Hernâni Matos

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