“Quando chega o domingo, / faço tenção de todas as
coisas mais belas / que um homem pode fazer na vida.” Assim começa o “Poema de Domingo” do
neo-realista Manuel da Fonseca. Daí que no passado dia 23 de Outubro, dia de
São João de Capistrano, eu e a minha companheira, tenhamos resolvido levar à
prática a máxima do Turismo de Portugal, que recomenda fazer turismo cá dentro.
Enfarpelados com os nossos fatos de ver a Deus, resolvemos ir almoçar fora e
visitar os nossos museus. Foi uma aposta num dia diferente, independentemente
do que viesse a ser o balanço final da opção tomada, já que como nos diz o
pedagogo-poeta Sebastião da Gama: “Pelo sonho é que vamos, / Comovidos e mudos.
/ Chegamos? Não chegamos? / Haja ou não frutos, / Pelo Sonho é que vamos.”.
Trata-se de um excerto do seu poema “Pelo sonho é que vamos”, que de acordo com
J. R. Ribeiro, se assumiu como “…a metáfora da esperança, da coragem e da
vontade de correr riscos…”.
Alecrim, alecrim aos molhos
A gastronomia alentejana é património culinário
legado pelos nossos ancestrais. É património para mastigar, para saborear e
para lamber os beiços, a comer e a chorar por mais, já que barriga vazia não
conhece alegrias. Daí que seja de importância primordial a escolha do local onde
se quer honrar simultaneamente Héstia e Baco. Para tal, escolhemos o
restaurante Alecrim. Lá diz o rifão: “Quem pelo alecrim passou e um raminho não
apanhou, do seu amor não se lembrou”. É que para os romanos esta planta
aromática simbolizava o amor, para além da utilização plural que ainda hoje
tem: culinária, medicina, perfumaria, religião e religiosidade popular. Daí que
o nome de baptismo do restaurante seja merecedor dos meus encómios. O mesmo
posso dizer do ambiente, do cardápio, da carta de vinhos, da confecção e do
padrão de atendimento, os quais são excelentes e nos cativam para voltar. O périplo
turístico a que nos propusemos, não poderia ter começado melhor.
Museu Municipal de Estremoz
Museu Municipal de Estremoz
Na rota a que nos apresentáramos, a primeira visita
foi ao Museu Municipal de Estremoz, actualmente Centro UNESCO para a
Valorização e Salvaguarda do Boneco de Estremoz. Aqui o seu director Hugo
Guerreiro tem desenvolvido um trabalho notável, sendo ele o mentor da
Candidatura do Figurado de Barro de Estremoz a Património Cultural
Imaterial da Humanidade.
Pese embora as conhecidas dificuldades de acesso
para pessoas com mobilidade reduzida, é um templo de Cultura Popular que há
muito despertou o meu culto, já que os bonecos de Estremoz me estão na massa do
sangue. Ali vou com frequência para observação dos mesmos, visando a recolha de
elementos para a elaboração de estudos que desde 2014 têm sido publicados numa
secção mantida em permanência no jornal “Brados do Alentejo”. É a minha forma
de proclamar que subscrevo com alma e coração, a Candidatura dos Bonecos de
Estremoz a Património Cultural Imaterial da Humanidade. Visitar o Museu
Municipal é gratificante, uma vez que saio de lá sempre revigorado e com a alma
cheia.
Galeria Municipal D. Dinis
Para aqui nos dirigimos para visitar "DA
MEMÓRIA", exposição de artesanato de Manuel Serrano, patente ao público
até 13 de Novembro deste ano. A Galeria equiparada a Museu, está fechada às
segundas-feiras, que é o dia de descanso semanal dos museus. Surpreendentemente
estava fechada também ao domingo. Algo frustrados, continuámos a rumo traçado.
Palácio dos Marqueses de Praia e Monforte
Chegado aqui e por ter a mobilidade reduzida,
procurei utilizar o elevador para subir ao 1º andar, o que não foi possível,
uma vez que a porta de acesso ao mesmo se encontrava fechada à chave. Viria a
ser informado posteriormente que se tratava de uma questão de segurança, uma
vez que ali se encontra armazenado o espólio do desactivado Museu Rural de
Estremoz. A solução foi subir a pé dois lances de escada. Mereceu a pena o
esforço, já que está ali patente ao público até ao próximo dia 27 de Novembro,
a exposição “BRINQUEDO PORTUGUÊS", do coleccionador Hélder Máximo Martins.
Trata-se de uma viagem aos tempos da nossa infância, a revisão dos brinquedos
com os quais construímos a nossa personalidade, que muitas vezes exigiam
actividade física e com os quais exercitávamos a nossa imaginação criadora,
praticávamos o exercício da liberdade, desenvolvíamos a nossa socialização e
reforçávamos o espírito colectivo. A exposição permite ainda despertar
consciências de pais e educadores para os riscos sociais representados pelas consolas,
os jogos de vídeo, de computador e de telemóvel. Uma exposição que se
recomenda.
Núcleo Museológico da Alfaia Agrícola
O fascínio da ruralidade levou-nos a dirigir para
ali, visando uma revisitação das memórias dos ciclos de produção da faina
agro-pastoril (pastorícia, trigo, azeitona, cortiça, vinha, etc.), através dos
utensílios utilizados pelo Homem e dos aprestos usados pelos animais. Não fomos
bem sucedidos, uma vez que à semelhança da Galeria Municipal D. Diniz, o Núcleo
Museológico se encontrava igualmente encerrado.
Algo vai mal no reino da Dinamarca
O propósito inicial de fazer turismo cá dentro foi
globalmente positivo, ainda que não tenha sido integralmente cumprido. Todavia,
isso para nós não constituiu problema, uma vez que temos disponibilidade para
efectuar as visitas noutro dia qualquer. Lá diz o adágio: “O que não se faz no
dia de Santa Maria, faz-se noutro dia”. Contudo, o problema existe e é
pertinente para forasteiros, nacionais e estrangeiros. Ficam com a má imagem de
espaços exposicionais que deveriam estar abertos ao público e se encontram
fechados ao domingo, num fim-de-semana, que é quando as famílias têm
disponibilidade para estar juntas e viajarem. Não sei se este encerramento é
fruto de falta de pessoal ou de baixas por doença. O que sei dizer é que acho
estranho. Sou levado a parafrasear o provérbio "Vinho e linho não têm
domingo”, dizendo que “Museus não têm domingo” e à semelhança de Hamlet na peça
homónima de William Shakespeare, sou levado a proclamar que: “Algo vai mal no reino
da Dinamarca”.
Hernâni Matos
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