Museu Nacional de Etnologia.
No Museu Nacional de Etnologia existe um exemplar de Nossa Senhora a Cavalo, identificada como sendo de Ana das Peles e de data anterior à que já descrevi, já que a barrista faleceu em 1945. Nele é de realçar que a burrinha marcha para o lado direito do observador e Nossa Senhora está virada para o lado direito da asinina e com as costas viradas em sentido oposto (NSAC – tipo 2).
Quase
todos os barristas posteriores compõem Nossa Senhora a Cavalo como o fez
Mariano da Conceição (NSAC – Tipo 1). Exceptua-se José Moreira, discípulo de
Ana das Peles, que produziu exemplares de Nossa Senhora a Cavalo, quer do tipo
1 como do tipo 2, como nos mostra a colecção Hernâni Matos.
Liberdade
da Conceição, talvez por uma questão de afecto, executava as suas figuras à
semelhança das de seu marido, Mariano da Conceição. Porém, nos anos 80 do séc.
XX, resolve adicionar adereços na composição da Fuga para o Egipto. Assim, a
cabeça de São José está rematada por um disco dourado com raios incisos,
configurando um resplandor espetado com um arame na cabeça. Por sua vez, Nossa
Senhora encontra-se adornada por uma coroa também dourada. Vejamos a razão de
ser de tais adornos.
Comecemos
pelo resplandor. De acordo com a religião católica, os seres gloriosos emanam
luz espiritual ou “aura”, que é um símbolo divino de santidade. Trata-se de um
vestígio do culto solar materializado por uma ”auréola” em torno da cabeça e
dos corpos, simbolizando a glória para o ser na sua totalidade. Em pintura e
escultura, a auréola, resplandor ou resplendor é um disco de raios de metal ou
um aro metálico, geralmente dourado, colocado na cabeça das imagens de Cristo e
por extensão da Virgem Maria, dos Anjos, dos Santos e dos Mártires.
Vejamos
agora a coroa. A intensa devoção dos católicos por Maria, mãe de Jesus,
levou-os a atribuir-Lhe inúmeros títulos, entre os quais o de "Rainha do
Céu", que remonta ao século XII e que nessa qualidade é invocada doze
vezes: Rainha dos Anjos, dos Patriarcas, dos Profetas, dos Apóstolos, dos Confessores,
das Virgens, dos Mártires, de Todos os Santos, do Santíssimo Rosário, da Paz, Concebida
sem Pecado Original e Levada aos Céus. Ora, a coroa como ornamento que cinge a
cabeça, é símbolo de soberania, de nobreza, de dignidade e de glória. A sua forma
circular traduz a perfeição e a participação da natureza celeste. A coroa une,
através da coroada, o que está acima e abaixo dela: Deus e os homens.
Anteriormente
a Liberdade da Conceição, no figurado de Estremoz, o resplandor emergia apenas das
cabeças de Santo António e de São João Batista e a coroa da cabeça de Nossa
Senhora da Conceição.
A
inovação de Liberdade, não foi seguida nem sua filha Marisa Luísa, nem por sua
cunhada Sabina. Por sua vez, as Irmãs Flores começaram por confeccionar a Fuga
para o Egipto, tal como o fazia Sabina da Conceição, de quem são discípulas.
Todavia acabaram por seguir a inovação introduzida por Liberdade, facto a que
não será estranho o interesse manifestado pelo público, habituado a reconhecer
o resplandor e a coroa como atributos de santidade, que são parte integrante
das imagens religiosas veneradas nas Igrejas.
Publicado inicialmente em 22 de Fevereiro de 2016
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