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sexta-feira, 14 de outubro de 2022

Cerâmica de Redondo – Prato Brasonado


Fig. 1 - Prato brasonado, de barro vermelho, vidrado, de Redondo.
Olaria desconhecida. 3º quartel do séc. XX.

Faça-se luz e a luz fez-se
Adquiri recentemente um pequeno prato brasonado, de barro vermelho, vidrado, de Redondo (Fig. 1). Na origem da aquisição esteve o facto de ser mais um exemplar brasonado a juntar à minha pequena colecção. Ao contrário daqueles que o precederam, adquiri-o sem saber o que representava. Todavia e como é meu timbre, assumi desde logo a missão de suprir esta lacuna, consultando a bibliografia disponível e que cito no final do presente estudo.
A primeira ideia que me surgiu no espírito foi a de o brasão poder corresponder a algum titular de Redondo. Admiti que o tipo de titular pudesse vir a ser identificado pela espécie de coroa que encima o escudo de armas. Foi tiro e queda, uma vez que vim a descobrir que o título era o de Conde e que a lista de condados de Portugal dava conta da existência do título de Conde de Redondo. Faltava conhecer a imagem de tal brasão, o que veio a acontecer. Revelo de seguida todo o percurso do meu estudo.

Uma incursão ao universo heráldico
Os títulos nobiliárquicos eram distinções concedidas pelo Rei aos aristocratas, que permitiam diferenciar o posicionamento hierárquico dos diferentes membros da aristocracia e que tinha em conta as funções desempenhadas pelos respectivos titulares e a sua posição hierárquica em relação ao Rei. Os títulos nobiliárquicos eram vitalícios e hereditários. Os títulos de nobreza, em número de cinco, por ordem hierárquica decrescente eram: Duque, Marquês, Conde, Visconde e Barão.
A cada título corresponde um brasão de armas, encimado por um coronel [1], o qual varia com o tipo de título:

Fig. 2 – Coroneis de títulos nobiliárquicos.

Foquemo-nos apenas nos títulos de Conde. A outorga de títulos condais em terras portuguesas é anterior à Fundação da Nacionalidade e remonta ao tempo dos reis godos. Na Idade Média, um Conde era um senhor feudal, dono de um ou mais castelos e de terras denominadas Condado: Todavia, a partir do século XIV, o título nobiliárquico foi utilizado apenas como grau de nobreza. A atribuição do título pressupunha o reconhecimento da fidelidade ao monarca e o desempenho da função de conselheiro do Rei. No decurso da Monarquia Portuguesa (1143-1910) foram atribuídos 418 títulos condais, que tal como os restantes títulos nobiliárquicos foram extintos com a proclamação da República em 1910.
O título de Conde de Redondo, que foi o título não real que teve mais titulares, foi criado pelo rei D. Manuel I, por carta datada de 2 de Junho de 1500, a favor de D. Vasco Coutinho (c.1450-1522) [2]. No entanto, de acordo com a compilação Resenha das famílias titulares do reino [6], este título foi criado por D. João II de Portugal, em 16 de Março de 1486 e atribuído igualmente a. D. Vasco Coutinho. Na página 378 do referido livro, assim como na página 483 do livro Memorias Historicas e Genealogicas dos Grandes de Portugal [1] (Fig. 3), vem reproduzido o brasão do Conde de Redondo.

Fig. 3 – Armas dos Condes de Redondo.

Até á Implantação da República em 1910 houve 17 portadores do título Conde de Redondo, sendo o 17º, D. Fernando José Luís Burnay de Sousa Coutinho (1883-1945). Após a Implantação da República, foi abolido o sistema nobiliárquico, tendo ficado pretendentes ao título ao título: D. António Luís Carvalho de Sousa Coutinho (1925-2007) e D. Fernando Patrício de Portugal de Sousa Coutinho.

Descrição do Brasão de Armas dos Condes de Redondo
O brasão de armas dos Condes de Redondo (Fig. 3) apresenta uma composição muito simples. O escudo está dividido em quarteis: No 1º e 4º quarteis estão representadas cinco quinas (escudos). No 2º e 3º quarteis está representado um leão.
As 5 quinas simbolizam os 5 reis mouros derrotados por D. Afonso Henriques na batalha de Ourique. Cada quina contém 5 bolinhas brancas que representam as chagas de Jesus Cristo na cruz, o qual teria aparecido a D. Afonso Henriques antes do início daquela Batalha.
O leão, considerado o rei dos animais goza da reputação de força, de bravura e de nobreza. O simbolismo heráldico do leão traduz poder, orgulho, domínio, segurança, sabedoria e justiça. O leão está representado com as garras e a língua expostas, pelo que é habitual dizer que a figura se encontra armada (garras) e lampassada (língua). A posição do leão leva a dizer que ele está numa atitude rampante ou de combate. Na verdade, ele está representado em pé, erecto de perfil, com as patas dianteiras levantadas, assente numa pata traseira e com a outra levantada, pronta para o ataque.
O escudo está encimado por um coronel cujo desenho configura um coronel de Conde.

Descrição do prato
Prato em barro vermelho, vidrado, de Redondo. Covo, brasonado, de pequenas dimensões (18x12x3,5 cm), com superfície interna de cor creme, de aba larga ligeiramente côncava e bordo plano. Decoração esponjada a verde na aba. Decoração esgrafitada e pintada no fundo com base em tricromia verde-amarelo-ocre castanho. O motivo decorativo configura o Brasão de Armas de Conde em representação naif. O escudo, esgrafitado a ocre castanho, encontra-se dividido em quarteis. No 1º e 4º quarteis está representado um leão esgrafitado a ocre castanho em fundo amarelo. No 2º e 3º quarteis estão representadas cinco quinas (escudos), esgrafitadas a ocre castanho e com fundo verde, tudo em fundo creme. O escudo encontra-se rematado por um coronel, esgrafitado a ocre castanho em fundo amarelo e cujo traçado corresponde a um coronel de Conde.
O brasão condal encontra-se ladeado por dois ramos, aparentemente de alecrim, esgrafitados a castanho em fundo verde. De realçar que a flor do alecrim está associada à coragem, à fidelidade e à espiritualidade.

Nota final
Comparando o brasão do prato (Fig. 1) com o brasão dos Condes de Redondo (Fig. 3), concluo que no prato e relativamente ao brasão dos Condes de Redondo, os cavalos trocaram a posição com as quinas e vice-versa. Presumo que o oleiro tenha pretendido perpetuar no barro, o brasão dos Condes de Redondo, mas tenha trocado a posição das figuras heráldicas nos quarteis.

BIBLIOGRAFIA
[1] - CAETANO DE SOUSA, D. António. Memorias Historicas e Genealogicas dos grandes de Portugal. Regia oficina SYLVIANA e, da Academia Real. Lisboa, 1775. [Em linha]. Disponível em: https://books.google.pt/books/about/Memorias_historicas_e_genealogicas_dos_g.html?id=LncOAAAAQAAJ&printsec=frontcover&source=kp_read_button&hl=pt-PT&redir_esc=y#v=onepage&q&f=false [Consultado em 11 de Outubro de 2022].
[2] - GENEALL. Condes de Redondo. [Em linha]. Disponível em: https://geneall.net/pt/titulo/1057/condes-de-redondo/ . [Consultado em 11 de Outubro de 2022].
3[3] – REI DE ARMAS. Brasão. [Em linha]. Disponível em: https://reidarmas.com/brasao . [Consultado em 11 de Outubro de 2022].
[4] – SIGNIFICADOS. Alecrim. [Em linha]. Disponível em: https://www.significados.com.br/alecrim/ . [Consultado em 11 de Outubro de 2022].
[5] – SIGNIFICADOS. Títulos de Nobreza. [Em linha]. Disponível em: https://www.significados.com.br/titulos-de-nobreza/ . [Consultado em 11 de Outubro de 2022].
[6] - TORRES, João Carlos Feo Cardoso de Castelo Branco e; MESQUITA, Manuel de Castro Pereira de. Resenha das Familias Titulares do Reino de Portugal. Imprensa Nacional. Lisboa, 1838. [Em linha]. Disponível em: https://ia802701.us.archive.org/4/items/resenhadasfamili02silvuoft/resenhadasfamili02silvuoft.pdf . [Consultado em 11 de Outubro de 2022].
[7] - WIKIPÉDIA. Conde de Redondo. [Em linha]. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Memorias_Historicas_e_Genealogicas_dos_Grandes_de_Portugal_-_Conde_de_Redondo.png . [Consultado em 11 de Outubro de 2022].
[8] - WIKIPÉDIA. Conde de Redondo. [Em linha]. Disponível em: https://www.wikiwand.com/pt/Conde_de_Redondo . [Consultado em 11 de Outubro de 2022].
[9] - WIKIPÉDIA. Lista de condados em Portugal. [Em linha]. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Lista_de_condados_em_Portugal . [Consultado em 11 de Outubro de 2022].

Hernâni Matos



[1] Um coronel é uma pequena coroa com ornamentos fixados num anel de metal. É utilizado por nobres nos seus brasões de armas para mostrar a hierarquia nobiliárquica do detentor.

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