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quinta-feira, 23 de julho de 2020

Bonecos de Estremoz: Tintas de pintura e pigmentos


 Mulher das castanhas – Oficinas de Estremoz de finais do séc. XIX. Colecção do autor.
Tintas de pintura
Após a cozedura, e depois de terem arrefecido, os Bonecos estão em condições de serem coloridos. A cor de cada um dos seus componentes pode ser conseguida através da aplicação de tintas de pintura, constituídas basicamente por um pigmento mineral, um aglutinante (veículo de cor neutra ou sem cor que suspende o pigmento e confere à tinta a sua aderência) e um diluente. Têm sido utilizadas no decurso do tempo, vários tipos de tintas de pintura: - TINTAS DE ÓLEO – Os pigmentos minerais são adicionados a ligantes que são óleos secativos como o óleo de linhaça, o qual por oxidação do ar origina uma película elástica que adere ao suporte e fixa as partículas do pigmento. O diluente usado é a aguarrás. - TINTAS DE COLA OU GOMA – Os pigmentos são juntados a ligantes como a cola ou goma e como diluente utiliza-se a gema de ovo. Eram as tintas usadas por Gertrudes Rosa Marques (1840-1921), de acordo com Luís Chaves (*) - TINTAS DE GRUDE – Ti Ana das Peles e Mariano da Conceição terão sido os primeiros a usá-las. Nelas o ligante era a grude, hoje caído em desuso, e que era uma cola de origem animal usada em carpintaria para ligar peças de madeira. Apresentava-se comercialmente no estado sólido, sob a forma de barras, que visando a sua utilização tinham de ser fracturadas e imersas em água fria durante cerca de seis horas para amolecer. A grude era depois aquecida em banho-maria até derreter completamente e poder ser utilizada. Para além da sua utilização como cola, a grude foi ainda utilizada como ligante de pigmentos minerais. Sabina da Conceição, Liberdade da Conceição e José Moreira foram os últimos barristas a utilizar a grude como ligante, de acordo com os cânones tradicionais seguidos por Ana das Peles e Mariano da Conceição. Fizeram-no até à década de 70 do séc. XX e deixaram de a usar, já que a sua utilização não era prática. Esta exigia que uma pequena porção de cada pigmento fosse vertida numa tigelinha de barro, à qual era igualmente adicionada grude derretida, sendo depois a mistura homogeneizada, mexendo-a com uma pequena bola de barro cozido que tinha cravado como cabo, um pedaço de arame. Com o arrefecimento, a grude solidificava, pelo que havia necessidade de com frequência aquecer as tigelinhas num fogareiro a carvão e homogeneizar a mistura, a fim de poder ser utilizada na pintura do barro. Para além disso, a grude apresentava outro inconveniente que era apodrecer e começar a cheirar mal. - TINTAS DE ÁGUA DE COLA - Com o abandono da grude, houve barristas que começaram a utilizar água de cola branca de madeira como ligante dos pigmentos, por permitir uma utilização mais cómoda. - TINTAS DE ÁGUA – Alguns barristas usam actualmente tintas de água, caracterizadas pela presença de um ligante solúvel na água. Inicialmente estas tintas usavam como aglutinantes, substâncias como amido, caseinatos, dextrinas, gelatina, gomas, etc. Tratavam-se de tintas inferiores sob um ponto de vista de protecção do suporte. Actualmente, este tipo de tintas utiliza como ligante uma dispersão de resinas, que as torna mais resistentes aos agentes atmosféricos.
Pigmentos:
Os pigmentos são corantes, que no caso dos Bonecos são, em geral, pigmentos inorgânicos obtidos a partir da trituração e pulverização de minerais, seguida de purificação ou tratamento industrial. Os pigmentos absorvem selectivamente a luz que neles incide, pelo que a luz reflectida é que determina a cor do objecto. Os pigmentos têm que reunir determinadas características: - Insolubilidade na água; - Facilidade de mistura com os líquidos que lhes servem de veículo; - Opacidade, ou seja capacidade de revestir as superfícies com a menor quantidade possível de pigmento; - Inalterabilidade à acção da luz, do ar, do calor e da humidade; - Secagem rápida. Como exemplos de pigmentos de utilização mais corrente, destaco: - CASTANHO: Terra de Siena crua (mistura de óxido de ferro hidratado, sílica, alumina e dióxido de manganês), terra de Siena queimada (resultante da calcinação da Terra de Siena crua); - VERMELHO: Almagre (ocre vermelho - argila corada pelo sesquióxido de ferro anidro), vermelhão (sulfureto de mercúrio II), zarcão (tetróxido de chumbo); - AMARELO: Litargírio (óxido de zinco), ocre amarelo (argila corada pelo sesquióxido de ferro hidratado), amarelo de crómio (cromato de chumbo), cromato de zinco; - VERDE: Verde de crómio (sesquióxido de crómio), verde de cobre (hidróxicarbonato de cobre), verde de zinco, verde inglês (mistura de cromato de chumbo e ferrocianeto ferroso), verde de cobalto (mistura de óxido de zinco e de óxido de cobalto); - AZUL: Azul do Ultramar (obtido da rocha lápis-lázuli), azul da Prússia (ferrocianeto férrico), azul de cobalto (aluminato de cobalto II); - BRANCO: Alvaiade (Óxido de zinco), dióxido de titânio, carbonato de chumbo, sulfato de bário, sulfato de chumbo; - PRETO: Preto de Marte (óxido de ferro II), preto de manganês (dióxido de manganês), pó de sapato (pigmento resultante da combustão de resinas queimadas). Os locais onde se podiam comprar pigmentos minerais em Estremoz, nos anos 80 do séc. XX, eram os seguintes: Mendes, Meira & Niza, Lda (Largo dos Combatentes da Grande Guerra, 13 e 14), Drogaria Loução (Largo General Graça, 49) e Drogaria Lélé (Largo da República, 38). Esta era, sem dúvida, a casa que tinha maior variedade de pigmentos, opinião partilhada pelo pintor Armando Alves. Actualmente, a aquisição de tais pigmentos pode ainda ser feita na firma Merino e Sadio (Rua 1º de Dezembro, 27).

(*) - CHAVES, Luis. Arte popular do Alentejo - Etnografia Artística - Os barristas de Estremoz, a oficina e a técnica in Portucale – Revista Ilustrada de Cultura Literária, Scientífica e Artística, VI. Porto, 1933 (pág. 186 a 189). 

BIBLIOGRAFIA
MATOS, Hernâni. Bonecos de Estremoz. Edições Afrontamento. Estremoz / Póvoa de Varzim, Outubro de 2018 (pág. 51 a 53).

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