FIg. 1 - Mestre
Mário Lagartinho (1935-2016), decano da olaria e o último oleiro de
Estremoz. Fotografia do Arquivo Fotográfico Municipal de Estremoz / BMETZ –
Colecção Joaquim Vermelho.
Nasceu a 22 de Junho de 1935 na Rua Magalhães de
Lima, nº 15, freguesia de Santo André, concelho de Estremoz. Filho legítimo de
Marcolino Augusto Lagartinho, de 26 anos, natural da mesma freguesia, e de
Leonilde da Conceição Raleiro, de 30 anos, natural da freguesia de Alcáçova,
concelho de Elvas (2). Começou a modelar o barro aos 12 anos de idade, na
Olaria Regional, situada na Rua do Afã, em Estremoz e que era propriedade de
Mestre José António Ourelo – Zé Russo (1916-1980), formado na Olaria Alfacinha
e que adquirira a oficina a Mestre Cassiano, fundador da Regional, já avançado
na idade. A 2 de Maio de 1958, com 23 anos de idade, casou catolicamente na
Igreja Paroquial de Santa Maria com Ana Pascoal Ourelo, de 22 anos, doméstica,
natural da freguesia de Santo André, concelho de Estremoz, onde nasceu a 11 de
Janeiro de 1936, filha de César Augusto Pascoal e de Albertina de Jesus
Carrapiço, moradores na Rua dos Carvoeiros nº 6, da mesma freguesia. Pelo
casamento, a noiva adoptou o apelido Lagartinho de seu marido (1). A Olaria
Regional viria a passar das mãos de José Ourelo para Mário Lagartinho, que
nunca deixou os seus créditos em mãos alheias e foi um oleiro de nomeada.
A necessidade de aumentar os seus rendimentos levou
Mestre Lagartinho (Figs. 1 e 2), nos anos 70-90 do século passado, a
confeccionar Bonecos de Estremoz, o que fez por auto-aprendizagem a partir de
exemplares que lhe foram emprestados por José Marcelino Moreira. Tenho, na
minha colecção, alguns desses exemplares que me foram cedidos pela sua esposa,
Ana Pascoal Ourelo Lagartinho. Mestre Lagartinho reproduziu então os exemplares
do conjunto dos “Bonecos da Tradição”. Foi bonequeiro, mas era sobretudo oleiro
e era ele que cavava o barro dos barreiros e o preparava, até este estar capaz
de ser afeiçoado pela suas mãos. Os Bonecos eram também cozidos em forno de
lenha, prática que foi abandonada. Sua mulher (Fig. 2), além de pintar a
produção do marido, também confeccionava os seus próprios Bonecos. Uns e outros
eram comercializados no stand da Olaria Regional, no Rossio Marquês de Pombal,
em Estremoz. Para além da mulher, Ana Pascoal Ourelo Lagartinho (1936-2024),
Mestre Lagartinho transmitiu os seus saberes a Arlindo Ginja (1938-2018), que
viria a ser seu discípulo. Em termos pessoais, Mário Lagartinho nunca conseguiu
recuperar do abalo causado em 2011 pela morte do filho, também ele Mário
Lagartinho, ex-jogador de hóquei do Clube de Futebol de Estremoz, do qual foi
treinador, assim como do Hóquei Clube Vasco da Gama, de Sines, cidade onde foi
o grande impulsionador daquela modalidade. Foi assim que, a 4 de Setembro de
2016, na sua casa da Rua João de Sousa Carvalho, lote 25, 1º esqdº, em
Estremoz, se regista o falecimento com a idade de 81 anos, de Mestre Mário
Lagartinho, decano da olaria e o último oleiro de Estremoz, o que constituiu
uma tragédia cultural, numa cidade que já foi um dos maiores centros oleiros do
Alto Alentejo. Estremoz ficou luto e, com a cidade, a Cultura Popular
Alentejana, da qual o Mestre foi um ícone (3), (5). Mestre Mário Lagartinho
partiu, mas deixou connosco as suas criações: bilhas, moringues, garrafas de
água, barris e púcaros que, entre outros, saíram das suas mãos mágicas de
oleiro. Os seus Bonecos estão dispersos por colecções particulares, como é o
caso da minha. Também o Museu Municipal de Estremoz conta no seu acervo com
exemplares, tanto de olaria como de Bonecos de Estremoz, afeiçoados pelas suas
mãos. Por iniciativa daquele Museu, a sua obra foi objecto de destaque recente
nas exposições: “Mário Lagartinho - Olaria de Estremoz” (2004) e “Motivos
decorativos na olaria de Estremoz do século XX” (2013), às quais há que
acrescentar “O vasilhame de barro de Estremoz” (2012), graças à iniciativa da
Associação Filatélica Alentejana. Pessoalmente, Mário Lagartinho, a quem
conhecia desde os anos 70 do século passado, concedeu-me o privilégio da sua
amizade, o que permitiu organizar, em 1999, uma jornada de divulgação da olaria
de Estremoz na Escola Secundária, quando era director do seu Centro de
Recursos. Foi um evento que nos marcou a todos, Mestre Mário, professores e
alunos, já que as raízes da Escola entroncam na antiga Escola Industrial de
António Augusto Gonçalves, por onde paira a memória do Curso de Olaria e de
Mestre Mariano da Conceição (o Alfacinha) que, conjuntamente com ti Ana das Peles
e sob a acção do Director Sá Lemos, fizeram com que os Bonecos de Estremoz, em
processo de extinção, se tornassem numa Fénix renascida das cinzas. Morreu
Mário Lagartinho, o último oleiro de Estremoz. Pessoalmente, como não tenho
espírito sebastianista, não estou à espera de um novo Sá Lemos, que venha a
reactivar a extinta olaria de Estremoz. Apenas me resta o registo da sua
Memória, que me leva a proclamar, alto e bom som:
- MÁRIO LAGARTINHO, PRESENTE!
BIBLIOGRAFIA
(1) - Mário Augusto Raleira Lagartinho - Assento de
Casamento Informatizado nº 633 de 2015, da Conservatória do Registo Civil de
Estremoz.
(2) - Mário Augusto Raleira Lagartinho - Assento de
Nascimento Informatizado nº 351 de 2014, da Conservatória do Registo Civil de
Estremoz.
(3) - Mário Augusto Raleira Lagartinho - Assento de
Óbito nº 487 de 2016, da Conservatória do Registo Civil de Estremoz.
(4) - MATOS, Hernâni. Mário Lagartinho, bonequeiro de Estremoz in Brados do Alentejo nº
890, 29/09/2016. Estremoz, 2016 (pág. 15).
(5) - MATOS, Hernâni. Mário Lagartinho, o último oleiro
de Estremoz in Brados do Alentejo nº 889, 15/09/2016. Estremoz, 2016
(pág. 1 e 6).
Fig. 2 - Mestre Mário Lagartinho (1935-2016) e sua
mulher Ana Lagartinho (1936-2024),
bonequeiros. Fotografia do Arquivo Fotográfico
Municipal de Estremoz /
BMETZ – Colecção Joaquim Vermelho.
Mulher a lavar a roupa.
Pastor com tarro.
Pastor das migas.
Mulher a vender chouriços.
Bela homenagem a um operário/mestre na arte da olaria.
ResponderEliminarQue a sua pena/computador,professor ,não se canse de continuar o trabalho de divulgação desses artistas que tão desconhecidos são..não são vedetas das tvs.
É essa a minha intenção.
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