Aguadeiro.
Jorge da Conceição (1963- ).
Colecção particular.
Literatura
Alentejana
Como
é sabido o(a) aguadeiro(a) era o homem ou mulher que acarretava água, que
vendia nos domicílios ou na rua. Para além disso, no Alentejo também era
designado por aguadeiro(a), o homem ou mulher que no decurso das ceifas,
distribuía água para o pessoal se dessedentar. Iremos apontar aqui algumas
referências literárias a nível de prosa.
No
século XIX surgem-nos: - José da Silva Picão - ATRAVÉS DOS CAMPOS (1883): “Lá
aliviam a miúde, para dizerem coisas ou para emborcarem golos de água fresca
que a aguadeira lhes oferece,…”. - Fialho de Almeida - O AGUADEIRO ALENTEJANO
in ÁLBUM DE COSTUMES PORTUGUESES (1888): “- E desta reclusão proposital da
mulherinha que se fez dama, e acha que ir à fonte é ocupação imprópria de uma
sécia nasceu o aguadeiro da vilota alentejana, o mariola válido e bistrado … e
que em vez de cavar nas vinhas, ou de revolver a ferro de arado o esboroento
salão dos sobreirais, anda de cachimbinho na boca, o grande relaxado, a
apregoar – quem merca a água! – pelas ruelas sonolentas do povo, onde os porcos
fossam nas estrumeiras, cigarras chiam, e um velho sino bate as horas, com uma
plangência sinistra de tam-tam.”. - Conto O MENINO JESUS DO PARAÍSO in O PAÍS
DAS UVAS (1893): “Com o camelo e o árabe, seria uma paisagem tangerina.
Substituindo porém o dromedário por um cónego, e o árabe por um aguadeiro
vestido de Saragoça, gritando “quem merca água!” adiante dum burro com cântaros
de cobre, numas cangalhas de azinho, inesperadamente a feição muda, e não há
Alentejo mais típico, nem gravura eborense mais “avant la lettre”. Entretanto o
Paraíso de Évora é principalmente notável por três coisas: pelo seu aspecto
exterior, pelo seu refeitório e pelos doces.”.
No
século XX surgem-nos sucessivamente:
-
Fialho de Almeida - Conto AVES MIGRADORAS in AVES MIGRADORAS (1914): “Lembra a
rainha Dobrada, esposa de S. M. Termo tinto, dando beija-mão aos aguadeiros.”.
- Júlio Dantas - ESPADAS E ROSAS (1919):
“Mas, para Alberto Sousa, como para o inglês Watts, “le paysage seul ne prouve
rien”; é precisa a figura humana, o animal, o pormenor etnográfico a
comunicar-lhe vida, intenção, movimento, —e assim, nas suas interpretações da
écloga alentejana há sempre, ou uma mancha negra e confusa de gado, bezoando,
cabritando, tilintando os chocalhos de cobre das Alcáçovas sob a guarda dos
alfeireiros e dos rabadões, como no admirável trecho da Feira de S. Lourenço;
ou o burro de um aguadeiro, como no Poço de Aljustrel;”. - J.A. Capela e Silva
- GANHARIAS (1939): “Começa o martírio da sêde. E os homens pedem em grita a
água que chega mórna, e que é ingerida em quantidades inverosimeis,
continuamente distribuida pelo aguadeiro.”. - Manuel da Fonseca - CERROMAIOR
(1943): - ”A maior parte dos camponeses já havia feito as compras e enchera as
vendas do largo. De quando em quando, atraídos pelas gargalhadas dos que
estavam de fora, chegavam às portas. O motivo do riso era a loucura mansa do
aguadeiro, já bêbado, de fralda de camisa fora das calças, ajoelhado diante do
burro. O meu burro é um santo!”. - Virgílio Ferreira - APARIÇÃO (1959): "A
feira abriu com grande excitação. Todo o Rossio se iluminou de festa com …
solitários vendedores de água com uma bilha e um copo ao lado,…”. - Mário
Cláudio - AS BATALHAS DO CAIA (1995): “E impingiam-lhes os talhantes as carnes
velhas e nervosas, abasteciam-nos as fruteiras das mais amargas laranjas,
forneciam-lhes os aguadeiros a vaza das nascentes dos cemitérios, se não aquela
em que haviam malevolamente mijado.”.
Hernâni Matos
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