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terça-feira, 11 de janeiro de 2011

A Póvoa de Varzim e o Mar


PÓVOA DE VARZIM (s/data).
João José Vaz (1859-1931).
Óleo sobre madeira.

A Póvoa de Varzim é uma bela cidade do Douro Litoral, cuja origem remonta ao período romano-lusitano. É um importante centro piscatório e procurada praia de banhos. O mar é ali omnipresente. Ali se sente a presença tutelar do mar, que às vezes também é carrasco dos pescadores.
A minha relação com a Póvoa remonta a 1983, ano em que me apaixonei por uma poveira que viria a ser minha mulher. Ávido de conhecimentos de etnografia, desde logo procurei reunir alguns conhecimentos de etnografia naval, sobre a qual escreveram António Santos Graça, Octávio Lixa Filgueiras e Manuel Lopes. Fiquei então a saber que o barco e a lancha poveira tinham divisa constituída por desenhos pintados à proa e à ré, ficando ao centro o nome. Estavam repletos de siglas, que eram a "escrita" do pescador poveiro, usada como brasão de família em todos os objectos que lhe pertenciam em terra ou no mar e que por isso eram marcados nos barcos, nos mastros, nos paus de varar, nos lemes, nas velas, nas redes, etc. Na Póvoa do Mar, como dizem os poveiros, graças à acção de Manuel Lopes foi reconstituída e posta a navegar uma Lancha Poveira do Alto, de velas enfunadas pelo vento tão necessário à navegação. Daí que reze o cancioneiro:

“Quero bem ao vento norte,
Que é vento da minha terra;
Também quero bem ao sul,
Que me faz andar à vela.”

Vela que, segundo o cancioneiro, protege também da tempestade:

“Ó mar, caixão dos navios,
Ó cama dos marinheiros;
Debaixo da vela grande,
Se aguentam os aguaceiros.”

Segundo o cancioneiro, o mar dá o pão, mas também dá a morte:

“A vida de marinheiro,
É uma vida triste e dura,
Pois toda a vida trabalha,
Em cima da sepultura.”

Por isso, o meu conterrâneo, poeta Silva Tavares diz que:

"Se pudessem ser contadas,
Formava-se um mar de dores,
com as lágrimas choradas
pelas mães dos pescadores!”

Pescador que é conhecido por ”lobo do mar”, a quem apetece perguntar com António Correia de Oliveira:

“Donde és tu, lobo do mar?
Donde és tu, ó pescador?
De Portugal? – “pois num foste!
Sou da Pòiva, meu Senhor!”

Antes de português, o pescador é da Póvoa.
Para Raul Brandão, “Aqui o homem é acima de tudo pescador.”, pescador que Antero de Figueiredo considera “... o valente campino do mar alto e das ondas de arrebentação...”
Os homens e rapazes vestiam outrora camisolas poveiras, de lã branca, bordada em ponto de cruz com motivos em preto e vermelho. Estas camisolas eram tradicionalmente feitas pelas mães, mulheres e noivas dos pescadores, que nelas bordavam motivos como âncoras, chaves, corações, siglas, vertedouros, remos cruzados, etc.
No folclore, o “Fandango Poveiro” e as “Torradinhas da Póvoa de Varzim”, são exemplos de danças tradicionais poveiras, executadas pelo Grupo Folclórico Poveiro, organizado em 1936 por Santos Graça, que na época recuperou e divulgou o vistoso traje branco que ele tão bem descreve em “O Poveiro”. Segundo ele, “As raparigas vestem colete vermelho de pano bérre; saias de branqueta branca com faixa; lenço branco pelos ombros; cachené caído no pescoço e descalças. Os rapazes usam calças brancas de baeta crepe, colete de pano piloto, camisa branca, percinta branca de riscas, solêtas nos pés e catalão na cabeça”.
O mar da Póvoa e tudo o que com ele se relaciona está de resto magistralmente registado na pintura portuguesa, conforme documento. 

PESCADORES NA PRAIA  (s/data).
 João José Vaz (1859-1931).  
BARCO NA PRAIA COM FIGURAS  (s/data).
João José Vaz (1859-1931).
PRAIA DA PÓVOA DE VARZIM (SÉC. XIX-XX).
João José Vaz (1859-1931).
Óleo s/ tela (50x30 cm).
Museu de Grão Vasco, Viseu.
PÓVOA - PRAIA DE PESCADORES (1888).
 António Carvalho da Silva Porto (1850-1893).
 Óleo sobre madeira (55,8x41,8 cm).
Museu Nacional de Soares dos Reis, Porto.
PRAIA DOS PESCADORES - PÓVOA DO VARZIM (1884).
 João Marques de Oliveira (1853 -1927).
Óleo sobre madeira (35x22,5 cm).
Colecção particular. 
VISTA DA PRAIA.
João Marques de Oliveira (1853-1927).
Óleo sobre madeira (35x22,5 cm).
Colecção particular.
PRAIA DA PÓVOA DE VARZIM (1884).
António Carvalho da Silva Porto (1850-1893).
Óleo sobre madeira (31,5x20,9 cm).
Museu Nacional de Soares dos Reis, Porto.

PRAIA DA PÓVOA DE VARZIM (1881).
António Carvalho da Silva Porto (1850-1893).
 Óleo s/ madeira (55x31,5 cm).
Casa-Museu Dr. Anastácio Gonçalves, Lisboa.
PÓVOA DE VARZIM  (Séc. XIX).
António Carvalho da Silva Porto (1850-1893).
 Lápis grafite e pastel s/ papel (30x23 cm).
Museu de José Malhoa.
PRAIA DA PÓVOA DE VARZIM (1881-1888).
António Carvalho da Silva Porto (1850-1893).
Óleo s/ madeira (50,8x33,8 cm).
Casa-Museu Dr. Anastácio Gonçalves, Lisboa.
À ESPERA DOS BARCOS.
 João Marques de Oliveira (1853-1927).
Óleo sobre tela (45x38 cm).
PRAIA DA PÓVOA DE VARZIM (1873-1927).
 João Marques de Oliveira (1853-1927).
Óleo s/ madeira (51x34,2 cm).
Museu de Grão Vasco, Viseu.
PRAIA DE PESCADORES, PÓVOA DE VARZIM (SÉC. XIX).
João Marques de Oliveira (1853-1927).
Óleo sobre madeira (45x33 cm).
Museu de José Malhoa, Caldas da Rainha.
MARINHA-PÓVOA DO VARZIM (SÉC. XIX).
João Marques de Oliveira (1853-1927).
Informação Técnica: Óleo sobre madeira (59,5x41 cm).
Museu de José Malhoa, Caldas da Rainha.
A APANHA DO SARGAÇO (1841-1888).
 António Carvalho da Silva Porto (1850–1893).
 Óleo sobre Madeira (55,5x41,5 cm).
Museu Nacional de Soares dos Reis, Porto.
A PRAIA (s/data).
João Vaz (1859-1931).
Óleo sobre tela (47,5 x 57,5 cm).
Casa Museu Anastácio Gonçalves, Lisboa.
PRAIA DE BANHOS (1884).
 João Marques de Oliveira (1853-1927).
 Óleo sobre tela (69,5x47,5 cm).
Museu do Chiado - MNAC, Lisboa.
PRAIA DE BANHOS, PÓVOA DE VARZIM, PORMENOR (1884).
João Marques de Oliveira (1853-1927).
Óleo s/ tela (60,5x47 cm).
Museu do Chiado - MNAC, Lisboa.

RECANTO DE ALDEIA, PÓVOA DE VARZIM (1882-1890).
João Marques de Oliveira (1853-1927).
Óleo s/ madeira (37x23 cm).
Museu do Chiado - MNAC, Lisboa.
 
PÓVOA DE VARZIM (SÉCULO XIX).
 João Marques de Oliveira (1853-1927).
 Aguarela sobre papel (15,3x22,8 cm).
Museu Nacional de Soares dos Reis, Porto.

10 comentários:

  1. A Póvoa! Meu caro Hernani, faz aqui falta o que está escrito na estátua do Vasques Calafate, na Póvoa. Sabes o que é? Vou procurar onde tenho isso escrito para te mandar. Há muitos livros relacionados com a Póvoa. Camilo passava lá os dias que podia, a esturrar umas massas no Chinês, com as espanholas. E há um livro já deste século, muito envolvido na atmosfera da Póvoa, o "Adeus às Virgens". A Agustina tem muitas páginas absolutamente de olhar poveiro. E o Régio também. Apesar de passar o tempo em Portalegre, como sabes, em todos os seus escritos há o cheiro, o som da ronca, a nortada de fim de tarde e o ruído cavo e assustador das ondas mais batidas. Adoro a Póvoa!

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  2. Bom dia.

    Parabéns pelo artigo, sobre a belíssima Póvoa dos pescadores. A minha mãe é poveira e o meu pai caxineiro e tendo eu nascido em 1975 ainda tive a sorte de disfrutar da velha praia do peixe, onde as mulheres tratavam de acarretar o que vinha nas chatas para cima para a lota. Passei muito da minha infância ali, enquanto a minha mãe tratava desse peixe e depois vendia-se à face da estrada até final do dia, eu um puto todo contente com um safio em cada mão a vender. Jamais esquecerei esses tempos magníficos entre a minha gente, nos areais dos quadros que nos mostra aqui, tempos esses "limpos" pela modernidade. Ficam as memórias... e uma certa pobreza etnográfica que tem formas de ser reavivada, mas não o é.

    Atentamente,
    www.caxinas-a-freguesia.blogs.sapo.pt

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  3. Bom, depois das fabulosas crónicas do Alentejo, aqui temos o Mar, esse mar que corre nas veias de todos nós ! E que belos quadros aqui nos trouxe, alguns de que me lembro, outros que tenho esperanças de vir a conhecer !
    Mais uma vez obrigada e, por favor, continue!

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  4. Mais um excelente post, Hernãni!...Desta vez foste às searas de ondas, complementando com uma homenagem casadoira. O mar é como as nossas ondas de trigo, fala com o vento e ondula até à perdição.
    Que fabulosa reprodução de quadros sobre o tema. Ficou-me nas vistas " A Espera dos Barcos" de João Marques de Oliveira.
    O meu abraço de felicitações.

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  5. Claro, além do texto - magnifico, como sempre...- as imagens, as pinturas, claras, quentes, cheias de mar, como teria de ser ! Obrigada, amigo Hernâni, por mais esta lufada de ar fresco e lavado !
    mf/.

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    1. Fernanda:
      Muito obrigado pelo seu comentário, que como sempre é um estímulo no sentido de procurar fazer sempre melhor.
      A escrita é entre muitas outras coisas, a procura da perfeição. Esta nem sequer assimptoticamente é atingida. Todavia, o que conta é o nosso esforço de operários da palavra. Sejamos pois os obreiros dum mundo em reconstrução, que se quer mais livre, mais justo e mais fraterno.

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  6. Boas Hernâni,

    Respeito muito esta gente os pescadores, pelas condições de trabalho, pela incerteza de ir e voltar, pelo seu espirito de sacrificio. Se virmos uma localidade de pescadores vimos com certeza muitas mulheres de luto pelos seus entes queridos que foram e não mais voltaram
    Quando nós estamos nas nossas caminhas no quentinho estão estes homens a arriscar a única vida que têm.
    Sou completamente a favor de melhores condições para eles e suas familias. No aspecto profissional penso que deverão ser dadas todas as condições para que possam trabalhar com a máxima segurança.
    As familias deles precisam.

    Abraço

    Abilio

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  7. Amigo, Hernâni Matos, usei algumas das fotos aqui postadas sobre a Póvoa antiga na composição (em video)de uma musica da Póvoa, "Ala Arriba pela Póvoa".
    Um Abraço
    Bonfim Milhazes

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    1. Fez bem.
      Já vi o vídeo.Recordar é preciso.
      Um abraço para si também e bom Natal.

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